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Full text of "Annaes da marinha portugueza"

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600020841U 


ANNAES 


DA 


MARINHA PORTUGUEZA 


POR 


IGNACIO DA COSTA QUINTELLA, 


Vice-Almirante da Armada Real, Conselbeiro @Estaq 
do Honorario, Conselbetro do Real Conselbo da 
Marizha, e Socio Honorario da Academia 
Real das Sciencias. 


Kip 


i ae 


7 / feo , 
SO s) - ae eee 
TiN? oe ~ rt , 





LISBOA 
Na TrroGraria DA MESMA ACADEMIA. 


1839. 


24% .e. 185... 


ARTIGO 
EXTRAHIDO DAS ACTAS 
DA 
ACADEMIA REAL DAS SCIENCIAS 
DA 


SESSAO DE 9 DE DEZEMBRO DE 1836. 


D etermina a Academia Real das Sciencias, que 
sejao impresses 4 sua cesta, e debaixo do seu pri- 
vilegio, os Annaes da Marinha Portugueza, gue the 
fordo apresentados pelo sew Socie Honorario Ignacio 
da Costa Quintella. 


Joaquim José da Costa de Macedo, 
Secretaria Perpetuo da Academia. 


nossas. admiraveis Conquistas na Asia, porei em toda 
a sua luz. estawerd: ado- m..parte.para de- 
monstra-la ‘daquella mesma Historia , € entdo alguns 
celebres Navegantes do Norte , que os seus Compatrio- 
tas levantdrao até 4s nuvens, como se forao novos Ga- 


mas, ec Al ro lugar, que 
a Albuquerques, descerd6, a occupa o lugar, q 


gualmente demonstrarei, que das tres rh bagd 
sents Bueza Vina edeph e Ingleza , gue ihvadir 

uistarao hum org: __ - ms a Portugue- 
za.a.que menos opprimio os Povos daquella riquissima 
parte do Mundo, ainda Le "coktiaterteo ic e 
yiolencias, que a Justiga imparcial condemna. 

’ara dar algumas luzes a quem, com menos ida- 
de, methor saude , e mais conhecimentos do que eu, in- 
aad fazer a ek, 3) mceranee servico. de escrey 


pe cas quanto 

fe Authores 

ate. tratarao dos faa et 

! | com b puri » © ESCOm 

ndo, nos pontos controversos (que nao © $40, poucos ) 
coe gerd aa re 


maior. ie havcoe. e 

jon cone ppt hee ieee migos on 
pn nlite 

M: ria da Conta © Si 
nao sé. me 


sis oF itos agra fs € badptossp e adquirir, 
nesta gen tl etic 2, a 






































= rl 


sta de quatro Memorias , comprehendo os mesmos ob- 
jectos relativamente 4 Asia, e Africa Oriental. Na 
terceira explico o Governo Politico, Administrativo, 
e Economico da nossa Marioha em Portugal, e suas 


Conquistas. 


ik 


4 


9° 


ciente altura , se levassém mastareos de gavea , que nes 
ses tempos ainda se nao conheciao. O gurupés, quasi - 
tZo alto como. o mastro do traquete, e fazendo com a- 
quilha hum angulo de mais .de 45°, sustentava huma. 


verga pouco menor que a deste. Assim o velame des- 
tes navios reduzia-se a tres vélas redondas; e huma 


re 


Latina. He evidente , que similhantes maquinas nao- 


podiao ter a mobilidade necessaria para manobrar na 
presenca das Galés, que pela sua agilidade, e auxilio 
dos remos, tomavio todas as direcgdes que Ihes con- 
vinha, a despeito dus ventos, huma vez que o mar 
as nao embaracasse. 

As Esquadras navegavao em huma, ou muitas co- 
lumnas, segundo o numero das Galés de que se com- 
punhao. O Sugar do General , ov Almirante era no cen- 
tro.da linha, ow esta fosse linha de marcha, ou de ba- 
talha: se navegava: em duas colymnas, era a sua a de 
barlavento; ¢ a.do centro, se navegava em tres colum- 
nas. De dia. trazia, sempre a-sua bandeira larga, e de 


noite-farol_na p6pa, como signaes constantes de direce 


g40o. Os combois navegavdo a sotavento, ou ‘a barla- 
vento da Esquadra , segurido as circunstancias. 

Na presenga do inimigo, as Esquadras formavdo- 
se em linha de travez, isto he, todas as embarcagdes 
ficando com. as -proas voltadas. para o inimigo, deixan- 
do sé entre si.o intervallo necessario para que os res 
mos de humas nao embaragassem os das outras, € para 


que as Gales. inimigas nao podessem introduzir-se. no. 


meio dellas; porque a Galé investida por ambos os 


lados , ou por hum lado, e ao mesmo tempo pela proa, | 


ou Pepa , rarissima vez escapava de ser tomada. 
huma Esquadra em linha de batalha igualava 


d 


em extensdo a sua contraria, a vantagem era igual, | 


supposta a jgualdade das embarcacdes, e equipagens: . 
mas quando huma Esquadra excedia a outra.em nume- . 


2 


il 


nhao os inimigos-tempo folgado para as cercar, e rene 
der.. . 
Estes principios devido ser familiares aos bons 
Generaes daquelles seculos, por se-deduzirem da boa 
razao0, e dos exemplos das batalhas navaes dos Cartha- 

inezes , Gregos, ¢ Romanos, que pouco differido. dos 
Bortuguezes nas armas, e€ construcgao dos navios antés 
da invengao da polvora, e douso da artilheria, que 
fez perder ds Galés a sua importancia absoluta, como 
mavios de guerra, e 86 lhes deixou .alguma importan- 
cia relativa até certo témpo, segundo .as Costas ou 
Mares em que se empregavao. 

Nido sendo da minha intenc#o escrever hum Trae 
ctado de Tactica Naval antiga, creio ter dito quanto 
‘basta para se entenderem melhor os nossos ‘Historiado- 
res, e os factos narrados nestas Memorias. 

No anno de 1112 falleceo o Conde ‘D. Henrique, 
a quem succedeo seu filho D. Affonso ¥, (entao meni- 
no ), Principe igualmente Guerreiro, Politico, e Patrono 
dos homens de genio, cujo longo Reinado foi huma.se- 
rie de conquistas, e victorias eloriosas, que nao me per- 
tence relatar; porém nao esquecerei, que em 1160 foi 
a celebre jornada do Judeo Hespanhol Benjamim Tu- 
dela, 0 qual partindo de Hespanha por terra, visitou 
‘muitas Provincias da Asia, e regressou .4.Europd no 
anno de 1173, enchendo de assombro os‘seus:contem- _ 
-poraneos, ¢ deixando espalhadas as sementes do gosto 
das viagens, que depois fructificarfio tanto: na Peninsuld. 

1180-- Achando-se em Coimbra.o .celebre D. Fuas 
Roupinho, hum dos mais intrepidos, e predosos Caval- 
deiros-do seu tempo, soube ElRei que andava ‘huma -Es- 
guadra de Galés Mouriscas interceptando as communi- 
cacdes maritimas de Lisboa (1), ¢ encartegando D. 


(1) Para formar a relacio destas tres batalhas , ‘¢onsultei -a‘Monai- 
2 wu 


13 


obedece , Ihes poupava agora: ésse trabalho. D. Fuas, 
que nao via Porto,-em que recolher-se, nem outra al- 
ternativa, que a fuga, ou a peleja, escolheo esta, reso. 
luto a morrer como até alli vivera. O combate foi des- 
‘esperado , Como devia esperarsse do caracter do Gene- 
ral , e dos soldados Portuguezes daquelle seculo, on- 
“de o valor era .a primeira, e quasi a urica’ qualidade 
‘que se exigia dos- homens. He lastima, que se ignorem 
as Circunstancias desta meimoravel batalha! Nella aca- 
-bou D. Fuas Roupinho, e se perdérdo’ onze Galés, sal- 
vando-se ainda as restantes para prova decisiva de que 
os vencedores ficdrdo' tio derrotados como os vencidos. 
He quanto pude descobrir de accgSes nayaes no 
Reinado deste grande Monarcha, que falleceo no anno 
de 1185, deixando o Throno a seu filho D. Sancho I. 


Reinado @EIRei D. Sancho I. 


Este Principe teve talentos, e virtudes dignas do 
Throno; e em hum seculo de calamidades, de fomes, 
"guerras, epestés, ndo s6 mostrou o animo de hum gran- 
de Soberano, mas tambem os talentos de hum consum- 
mado Economista Politico; tal. he o elogio, que Ihe 

faz hum sabio-Escritor Inglez, que nao he prodigo de 
elogios (1). | 

' Nido achei memoria de outra expedic#o naval em 
todo o seu Reinado, que o cerco, e tomada de Silves, 
de que you tratar (2). | 


(1) Clarke, The Progress of Maritime Discovery , Cap.° 1.° 

(2) Vede Duarte Nunes de Ledo, Chronica d’EJRei D, Sancho I. — 
‘Historia Geral das Viagens, tomo 2.°, L.° 22 —.EBrandio, Monarchia. 
Lusitana, tomo 4.°, Cap.° 7.°, ainda que este Escritor nao falla da 
Fsquadra Portugtieza, de que nio teve noticia, —: Acenheiro, Chroni- 


cae dos Reis de Portugal, Cap.° 9.° mas conta este facto no anno d& 
189, : 


Certo e fora do Med:terranee. Nem og Pescadores Por- 
fugiizes $2 resiring:20 2 pescur rcs S2us mares, pois 
corst2 cue os de Lisboa. e¢ Perte fzerio hum Trarado 
com Eduarco HI, Rei de Ingiaterra, pra pescarem 
62: Costas dzque.!e Paiz, e nas Provincias ¢a Franga, 
gu= entZo0 depenlizo daquei:2 Corca <2}. Est2s ureis 
especitazOes .au2 hoje taivez pareg2o a muitos exagge- 
Facas, erao faceis naquelies tempos, em cre s6 Tavira 
tinha seus proprios setenta harcos ce pesca, e muitos 
nav:os de naregac20 Co mér 2ito, e as outras Cidades 
mar:i:mas de Portugal o mesmo a prororg3o. 

NO Reinado cesze Principe se comegarz0 a mtro- 
duzir cm Porrugal as Sciencias Mazhematicas, envoiras 
nas auimeras da Astro'ogia Judiciaria (2); e o famoso 
Napolitano Flavio Gioia descobrio a Agutha Nautica, 
Foto que muitos anos depois he que se achou a sua 

ariacZo0, e se fora0 pouco a pouco inventando metho- 
dos miis ou menos faceis e seguros }para_a conhecer 
diariamente no mar. Mais tarde descobrio-se , que a 
mesma Variagdo tambem variava; e a pesar de mitha- 
res de opservacées, ignoramos ainda as leis, que pro- 
duzem esta segunda Varizc30; e so sabemos, que em 
materia t40 importante a Navegag3o, resta muito para 
descoorir. 

1336 — Deu ElRei o commando de huma Esqua~ 
dra de vinte Gales, guarnecidas com dois mil homens, 
a D. Gongalo Camelo, que sahindo de Lisboa nos fins 
de Agosto, appareceo na Costa da Andaiuzia, e foi 
surgir na bocca ce hum riacho, quatro leguas ( entendo 


(1) Vejase a Memecria sobre a Guaxima, de José Henricues Fere 
veira, rotoms 1.9, paz. 1.‘ das Memorias Eccnomicas da Academia 
d2zs Szencias dz Lisboa; e tambem a outra interessaste Alemoria de 
Constast: 9 Boseiso de Lacerda Lobo, no tomo 4.° pag. 312 da cite= 
dz Cniierqao Acideanta. 

(2, Skenowias de Literatura da Academia das Sciencias de Lisboa, 
tomo 8.9, pag. 143, © seguiates. 





3 












3 que levavio's Gallia Ve Dale © 


Pes sii ikveleet pan ‘mais de cem 
mbarcagées no transporte da “primeiro )genero4 
or que: durow até 1550 gr annem sre te 
tantas, que navegavao differentes partes) (4).)) 10'S 






saad 
por se haverem estabele em Lisboa im 
de fe commerce de rari ‘Nagées; eusthiiviowe: oat 
muitas vezes mais de quatrocentos vasos a Ca ode 
ol 1 edndreey oasitozrerrenoMl o2ab-ormeven 0% 











ag pg a B91 

Chronica, Cap.°h 90, gt- 
cacalipan nas Memorias da Academia de 

C3)” Gorogratis bh rss inden Foe» tomo pF 117. snsen 








pida ignorancia dopelobes idan ence a rpeiasediale 
form idavel wa apparencia, do que na realidades «© )4 
“r" Chegado:o ‘Conde de Barcellos ao Alparve; esas 
Pe se a Esquadra | Castelhana , forte leicadeads 

-commandada pelo Almirante Tovar ; ‘havi 
ror fet a Costa, o attribuiova 
panico , e'sem mais:conselho , nem disposi¢ao , 
no anticipado , corre a buscar ‘Os inimigos emt 
desordem , * que acontecendoestarem pelo» mar =a 
Ihadas muitas boias das redes. dos pescadores , avdias; 
e tres léguas de distancia, arridrao.as velas oito Gas 
Iés', © forao demanda-las a remos: as owtras continuds 
rio, a navegar comilvente sone e bonan 





















nee older se nchario perth rs ues 
amon seat tos ah de Julho descobrirao estas ‘on hele 
das Galés Castelhanas, que estay4o surtas em hum 

loge chara “entdo Salres. Affonso Annes das Leis 
timeiro as vio; € communicou a noticia‘ao 

carregou logo, fazendo o mesmo as “mais 

Galés, ” porém nao quiz servir-se da Galeora para cha- 
da Esquadra, como © Annes Ihe aconse- 















pa ag envio da briosa resistencia : indy eal den 


mi. 





49° 


com duas)grossas cadéas, que a atravessavio ; ede huma; 
ede outra: } fa terra proximta muita gente, ‘com 
trons, @ engenhos para os’ proteger..O Almirante ‘Hes- 
panho i chepou ‘sem obstaculo a Sacavem, e reconhe- 
posigio dos ‘navios , © julgando-a_ inatacavel 
mi Tejo; o que os In ttambem fizerao a 
smbro (1). Admira, que hum Official tao: in 
Jigtnte y como" Tovar , nfo tentasse queimar ‘os paaro 
amontoados em hum Rio estreito, aproveitando a occa 
siio- Ehcebe de maré e vento sa que - 
padia lhe naqnella estagao! Th 
Jest Asia vA 7 de Margo entrow no Tejo 
asian a Castelhan de oirenta navios ; entre 
grandes , com muita gente de guerra. O seu 
intento ert f ardent diversio ds operacdes militares, 
wees no Alemtejo entre o o El. 
el D D. Bernando reforgado com as tropas Inglezas'do 
, seu alliado, ¢ o Exercito Hes- 
rou-se a Armada sobre Lisboa até Seteni» 
oeseraceatstn ‘andes hostilidades. por: ito e 
dutea’' margem do Tejo, sem a menor 
Mas se a nossa Marinha acabou neste eina 
liz, no seguinte a»veremos renascer das suas. praetor 
tomar hum alto vdo, que sd declinow. com a morte 
@ElRei_ D. Sebastido. ) abel 
a) hater ElRei B. Fernando no anno de age 7 


«ae 

are | Reinede @EIRei D. oto Te “ he 
‘i «| oi oo soll lee 
“rm wdhdeoes mais? ‘brilhante da-Gloris Portugueza ‘cos 
ek NT deste illustrado Monarcha , porte 
rem nelle principio aquelles immortaes descobrimentos , 
que. se. vamente -dilatando, a par dos*pro~ 


Fernio ’ 
8 pda he » Capri gs! orth atime bce) 






















42 


mandariem seu Real Nome, e que pertencerem @ sew 
Officio, ‘sob pena de serem punidos como. os que nao 
cumprem os mandados de seu_ Rer= (1). Lore 
As clausulas desta Carta sio notaveis, por com- 
hep mee parte’ da ju 40 do Almirante 
Carta det weer eae Pte determinou El iy D. Diniz ‘na 
rta 3; que extracto 
seu Reine e e péde aricab conbtetes 


m ue o que e Ofc de Almirante estavya reduzido nas suas 
poe a melhor quanda 'trdcar da 








nossa Legislacio  aofiodR 

“1. Antes 5 se sntereapse das viagens para des 
“novos ‘Paizes, cumpre. dizer 

seu author o Infante’ D. He ue (2). ramen 





Nasceo’ este: magnanimo Principe a ya Margo 

de Seedae donde e desde os primeiros annos mostrow inclina= 
militares, e estudo das Sciencias , a 

gue applicou dence logo, habilitado por buny juizo 


» © exceilente | memoria. O seu cer, que Porta 
conhecer , gt 
ninsula , € cercado de mar. pelo outro, 


Conc oe e anys se ed 
pone f Os clementos oO ue ge 
ra ser nelle poderoso, crease bie Commercio ma= 
sielhie comm. Os pores de Africa existentes alem dos 
limites, a que se estendia a navegacio costeira da Bar= 
beria, dos quaes davado confusas noticias algumas anti= 
gas Viagens, mais , ou menos acreditaveis, e as jor= 
nadas realizadas per a Asia nos dous ‘seculos 
pr ere 1 









are) Vede ‘Barros, Decada a4 Le aabeuhous ii 


43 


os primeiros descobrimentus, mandando pequenas eme 
barcacSes 4 sua custa ao longo da Costa de Africa pa- 
ra o Sal, que nao sendo ainda bem manobradas, e di- 
tigidas , adiantarao pouco os conhecimentos -praticos 
d’aquelles Paizes , como irei mostrando na ordem 
chronologica, que me propuz seguir. 

Nas duas expedigdes de Ceuta em 141g, ¢ 1419 

ampliou o Infante as suas ideas nas frequentes conversa- 
¢des com os mercadores Mahometanos, que alli concor- 
riao de Fez, de Marrocos, e de outros Reinos, e Provin- 
cias do centro.de Africa , que estavao em relagdes com- 
merciaes com os do Egypto, e da Arabia. Assim con- 
sta, que por elles souboa dos Jalofos , que confinao 
com as raias Austraes do vasto deserto de ‘Sarah e he 
provavel, gue no discurso das suas indagacées sobre a 
direcc4o, e posicao daquelles differentes Povos, viesse a 
confirmar-se em que as Costas da Arabia erfo banhadas 
pelo mar, bem como as da Africa, pela banda do Orien= 
te, noticia de que o seu raro talento talvez conjectu- 
rasse, que continuando a correr para o Sul a porcao 
da Costa Occidental d’Africa ja conhecida, se chega-~ 
ria a hum ponto, mais ou menos remoto, onde br 
cosamente ella havia mudar de direccao para o Nor- 
deste , e. fazer hum Cabo, cuja descoberta seria da mais 
alta importancia aos Portuguezes, para abrirem cami- 
nho as Regides Orientaes tao cubicadas. 

Seria aqui o lugar conveniente para lembrar os 
dous celebres Mappas, de que fazem mengao alguns Es 
criptorcs nossos: o primeiro trazido pelo Infante D. Pe- 
dro 4 volta das suas viagens no anno de 1428; e€ 0 se~ 
gundo, que ‘se diz achado noCartorio de Alcobaga em 
1528, desenhado mais de cento ec vinte annos antes: 
ambos tenho por apdcryfos (1), 4 vista do que moder= 


G1) Vede as duas Klemcrias do Conselheiro Antonio Rideiro dos 
6 


44 


pee escrevérao a favor, ou contra a sua authenti- 
ona al; pan de abalizado mcrecenentety om a 

A. gromasee: a execugao do seu yasto pla 
no de _descobertas one os conhecimen ae 





ab, Sacre aly € no seu 
herd huma seme Naune 
ca, e de Geografia, para organizar a qual chamou Sas 
bios nacionaes, ¢ estrangeiros com vantajosos partidos , 
entre elles o Mestre Jaime da Ilha de Malhorca , fa 
moso pelos conhecimentos nas Sciencias auxiliares da 
N 0, que vinha ensinar, e na construce’o de 
Cartas Geograficas , a Escola de Sagres converteo 
depois em C rtas Hy rograficas Planas, por nao servi~ 
rem aquellas para o mae da Navegacio (1), some 


‘ durérao seculos (ainda ha menos de trinta annos 


havia outras no Mediterraneo ), até que Mercator ere 


Fibs a primeira intitulada Sobre alguns Mathematicos rathipeaihdl 
etc. , ¢ a segunda =:Sobre os antigos Mappas Geograficos do Infante D. 
Pedio=E a Memoria do Academico Sebast ido Francisco. de Mendo.'Tri- 
goz0, que tem por titula=Sobre os.Descobrimentos dos 

etc., ¢ todas se achio no tomo 8.° das Memorias de Litteratura da Aca- 
demia Real de Lisboe—Vejase tambem a Obra do diligente Historias 
dor yee ay caer e-em. ny Faris Maritime Dis- 

‘ae"y Fe» que nega a verac Mappas 5 

ca ia do Teneate General Stockles, que vem no. volume 

mS eate n ene desoe ov agumentoy favor del 
es 


ae Gomeae Vede o origem das Mathematicas, etc. do mese 





46 


que Sat ere ae a saat decinddaineptae —— 
DB itignrs! comega-lo.y eeaeT wanb 
> ElRei yoko. fol ge ero. -$6-tinha: orFituloide 
gedor. Reino) achava-se na Capital 
DoUuc: faeces faltando-lhe as das Provincias»do 
Norte, que puarche via va reunir-se na Cidade do Por+ 
tng pra Sere d’alli, transportadas por mar) a Lisboa. 
_carecia!. de mais tempo, do que tardaria 


hes  osmacrese aie odes: de 
armar promptamente as rea capazes. 
navegar, e expedi-las logo para’ o Porto, a-fim de que 
reforgando-se com os navios daquella Cidade, embar- 
cassem as tr ee ee 
trada do Tejo; * pois’ que deste soccorro dependia a 
Senn ‘Capital, tonite a de ‘Be-teilo o Reino. 
_Existido apenas em Lisboa alguns desmantelados 
navios, faltos reparos, ede aparelhos, ¢ os:Arma= 
zens quasi nada continhio; e comtudo-era de i 
riosa necessidade aprestar em poucos dias: —— 
gud ‘O’zelo, co aa produzirao aqui. os 
‘costumio produzir, sendo bem ‘dirigi- 
4 oe yeah ad as NagGes em oe a Moral publica nao 
esta corrompida. Acudiraéo todos a obra tao necessa~ 
ria: ovArcebispo de Braga D. Lourengo Vicente), Pres 
0" cheio de se hora ae e do papleaen 8 guerreiro da 
seculo , \encarrega em Regia da superinten- 
dericia do SSesieie wenn huma langa na mao, ¢ o 
roquete yestido sobre a armadura), corria a cavallo 
a todas as partes em qué havia trabalhos , em - 
do nelles: Religiosos ,» Clerigos, ¢ Seculares, © quals 
quer qualidade; -e se alguns se aventuravdo a querer-se 
escusar por motivo do Seu caracter sagrado , respon~ 
 thdo a Feria Lopes —Chronica do dito Rei — a 
tbe Rodige ds Cunha. ae er 













il 


48 


songa ve Cebxaivs , Alcaide »Mor de ‘Obidos , Pe 
segui “0 partido de Castella, a quem elles cide 
mandou o General’ desemt algumas tropas, ‘e 
‘queando @ Villa; passou 4°Cidade do Porto.) = 
2yeid Vio-se -0 bom resultado “da prevengio dE 
Rei em vsahir a tempo de Lisboa a sua 
: p 0 Tejo a pt di 
ana’, 

















dra ue a 26 entrou 
, saber an 












to bordo Pedro ‘Afan de "Ribera. Surgirio os ini 
i inks parila & Cidade, cingindo: ‘toda. a: 
sde Sant Catharina até ernie Uivanteae 
Epc oe fick desta Tinha espalhario. muitas embar 
guarnecidas; estacionando Galés er 
a para vigiarem 0 Rio; de maneira, que ficou a 
Cidade perfeitamente cercada'da parte do mar, a unica 
podia vir-lhe soccorro: e o Exercito') deixando 
cis a ema yveio no dia ‘28 ae 
ites para comegar as operagdes do 
Bey, o a ralheia do objecta: distas Memo: 
Ms.) Shaw ch op yd 5 


“ied 
ou oe 


pa prghyeten da a er alla 

scone AN que poucas 
Secs Lg @ cei e foi vigorosa- 
mente nada), e Sepals | occupava , 
Beem os reunidos i tropa gu que odes mbareéraa 


navios.> . eho rae sOner]Ve SE 


én endo © aqui demittido Gonsalo Rodrigues av Sous 

























say) por se itava _aaeencnary peti meee 
em ome PEIRe . Gong 
eee reenact D.! 

Sie 20 Saat evils oe AAD a Ast 0 


Ce cen Acenheiro diz, que foi no dis ‘poekaplicats , on 2b ee] 





~~ 
* 









































com ne D aia 0 cot ico as doze -Néos-restasie 
a ae gl e tocando 0s i 












usados. naquelle tempo.) & ss 
da cageeaces. i ot > quacedaieae 





ece-la., ou » Imitando © seu 
pe Naos de a sua divisio ; e neste ee 


lés hito o 4 ~amancada encastadas 

do Bchitpeotedect hee she le 

rage hae" sloop pagan os inimiges ati para ‘rewnineé hae 
r 


“hits O Almirante: Tovar, re ado opportune: © mee 
mento de. Roig 











, 
54 


de Sevilha', que elevou a sua Armada a dezeseis Ga- 
1és, sessenta © huma  Néos, e eae muitas embarca- 

cceetiee uends. Kim consequencia deste 
Eien els eee ‘plano offensivo em de- 
feuive. Micvdeas sbbarie praia os navios' ¢ 
-¢ amarrar as Galés te epalddes qu terra, ‘ond 

















: ndante; e ‘alguns woldados, a 
da marinhagem. olwmine 
“I ota ex speriencla? nostro em breve ovacertedidestas 
= 8, ue a 27 de Agosto (1), aproveitando-se 
Hailes tc de terem maré de cheio dea 
by pio do Sol, sahirio com as suas Galés na direc. 
gio de Oeste, figurando nos movimentos hunr exerci- 
cio de manobras ; ; ¢ chegando defronte do Arsenal, on- 
de a nossa Esquadra estava disposta pelo modo que ja 
expliquei, voltérao de repente sobre see e vierao 
commette-la; fazendo ao mesmo tempo ataques falsos 
pe rte de terra, para attrahir alli a atengio dos cer- 
cadaos ees wi. 
ElRei, a cujo cuidado nao ‘escapava movimento 
algum dos sitiantes por mar, ou por terra, ao 
quella occasifio. observando do Palacio do Cas 
evolug6es das suas Galés, e logo que ellas vir rigid 
penetrando-lhe o intento, correo a galope 4 Ribeira, 
onde achou ja muitos soldados, e moradores bem at- 
mados que vinhao soccorrer os navios, ea sua presen= 
# i > nefles tal valor, que quando. os Castelhanos 
rechagados com muitos mortos, efe= 
1 de huma Galé, cujo Commandante 
Shen maenes na a a Serer 




















i 
i 






ake ye ay 


Mus Denk 






58) 


vidade dos Infantes, do genio: guerreiro da N 

Pia cata ssommas” nto ae podie | i 
tes. de novos tributos, que nio se o Jangar, sem 
convocar Cortes, ¢ descobrir por ee a — 


inviolavel : 








| emprestimos, ¢ bantite’ severa econo- 
inistragao da Fazenda, Examindrio-se pelos. 
Parton Reino’ ‘be navios de Guerra, e Commercio: 
em estado de navegar: repardrao-se os que. -erdo susce= 
ptiveis de fabrico, bit teslens alguns estrangeiros,; e& 
rao-se de novo as Galés que faltavdo para 
ae Sa de trinta, de que se queria com~ 
a, armamento se encarregou ao 
Pagan ‘ea Gomes Loureiro a in~ 








sie Falicatecee: a aie de guerra einen cuja. coms: 
missao se deu ao Infante D. Henrique nas Provincias: 
do Norte, tendo por ponto de. reunito a Cidade do 
Porto; e nas outras Provincias ao Infante» D. Pedro,» 
com o ponto de reunifio em Lisboa." \ sup obw tea 

Era de absoluta_necessidade reconhecer o estado 
das forti de Ceuta, e os seus meios de defen= 
sa; mas de hum 
tasse- Geoaiiage nos. Mouros. | € outra” 
obteve ElRei com este ardil: Chamou o Prior-do- 
to D. Alvaro ves “psi recent e o General do 
Affonso ‘Furtado de Mendonga , e instruindo-os em ‘se= 






















da unio s do Core 


ce oeiiie eo o Infae 
Bea | oe Soe ia Calls, © ‘ 





os 


o da ‘sua “verdadeira comarissioyy os aa 


, modo. tio disfareado, que nao excie. 


: 


59 


texto de tomarem refrescos, surgirdo em Centa , onde 
se dilatd4rao quatro dias (1), sondando de noite o Por- 
to, e examinanda de dia a Cidade. Seguindo dalli a 
sua viagem para a Sicilia, derao a embaixada 4 Rainha, 
e recebida a resposta negativa, que esperavdo, voltae: 
rao a Portugal com escala por Ceuta, a fim de recti» 
ficarem as primeiras observagoes. . f 
ElRei’ os ouvio em publico, com fingido senti- 
mento do mao successo da negociacio , e em particular’ 
foi bem informado do estado da Praga 4 vista ‘de huty' 
modelo, que na sua presenga construio, e lhe explia' 
cou o Prior do Crato, em que represeritava a Cidade’ 
com a sua Bahia, e nesta os melhores pontos: pdra 
ancoradouro , e desembarque. Com estas noticias sé de= 
rerminou detodo ElRei aemprehender a expedicdo, ea 
communicou logo 4 Rainha D. Filippa. O mesmo ‘fez 
em segredo ao Condestavcl, que estava ‘no Alemteo's 
indo para esse effeito encontra-lo, com pretexto ‘de’ hi 
ma cacada a Monte Mor o Novo , onde ouvid da 
bocca daquelle Heroe a completa approvagio do‘ sew 
projecto. Era porém necessario communicar este - a0 
Conselho de Estado, o que fez em Torres Vedrasq 
achdrao-se presentes 4 discuss’o deste importante nego 
cio’ (2), a Kainha, os Infantes', o Conde de Barcel4 
los ,.o Condestavel, os Mestres das ‘Ordens de Chris 
to, 8S. Tiago, e Aviz, o Prior do' Crato ; o Marechal 
do Reino Gongalo Vasques Coutiriho ,; Martim -A fion~ 
so de Mello, eo Alferes Mor Joio Gomes da Silvas 
.. ‘‘Parece que ElRei esperava opposigao da parte de 
alguns Conselheiros, porque guardando-se ‘ainda: na 
guelle seculo o costume do Senado Romano, onde‘ ed 
votos se--dav4o de maior para menor, e competindo 
| | re Ou! 
C1) Assim o diz Mattheus Pizano no seu Livro da Guerra, de Cons 
ta, nem pndia em menos tempo fazer-se similhante reconhetiajentd, 

(2) Acenheiro, Capitulo 21°; pas: oe se coe 

8 ii 


61 


quelle seculo o General em Chefe cemmandava o na- 
vio, em.que hia a sua. Insignia), 0 Conde de Barcel- 
Jos, seu irmaZo natural, D, Fernando de Braganga , fi- 
Jho do Infante D. Joao , o Marechal Gengalo Vasques 
Coutinho, o Alferes Mer Joao Gomes da Silva, Vas- 
co Fernandes de Ataide, e Gemes Martins de Temas, 
Commandavio as Nées, D. Pedro-de Castro , Gil Vas- 
_ ques da Cunha, Pedro Lourengo de Tavera, Dicgo 
“ Gomes da Silva, Jodo Rodrigues de Sa, Jodo Alvares 
Percira, irmio do Condestavel, Gencalo Annes de 
Sousa, Martim Affonso de Sousa,.Martim Lopesde Aze- 
vedo, Fernzo Lopes de Azevedo, Luiz Alvares Cabral, 
Ferndo Alvares Cabral, Estev20 Soares de Mello, Men- 
do Rodrigues de Refoios, Garcia Moniz, Paio Rodrigues 
de Araujo, Vasco Martins-de Albergaria, Alvaro da Cu 
nha, Alvaro Fernandes Mascarenhas, e Aires Goncalves 
de Figueiredo, Fidalgo de noventa annos, que'se veio 
offerecer 20 Infante com. taes instancias, que obteve 
commando de huma Nao. Offerecérao-se-lhe tambem do» 
ze Cavalleiros de Baiona quasi da mesma idade, que ten~ 
do servido em toda a guerra contra Castella, estavao apo- 
zentados comendo as tencgas que ElRei thes havia. dado; e 
posto que o Infante procurasse dissuadi-los, vicese obriga- 
do a acceita-los. ‘Tanto erao ardor, que animava a Nagao! © 

A morte da Rainha D. Filippa, acontecida nes- 
te tempo; ea peste em que ardia Lisboa, pozerio ain- 
da em contingencia a expedigao; que talvez se nao 
realisira , apesar de se acharem feitas todas as despe- 
sas, € O armamento frompto, scm a actividade, e ree 
solucao do Infante D. Henrique. 

Finalmente no dia 23 de Julho, dcixando encar- 
tegado o Governo do Reino, com Titulo de Vice-Rei, 
ao Mestre de Aviz Fernao Rodrigues de Siqueira (1), se 


(3) <Acenheiro, Cap.? 21, pag. 216, 








69 


seu sobrinho ,“ para atacar a Cidade da banda do mar. 
ElRei D. Joao, que pelo aviso:que recebéra, ja ‘tinha 
mandado bum bom reforco dquella Praga, mal soube 
agora por Tarifa da sahida do armamento de Grana- 
da, nao perdeo hum instante em concluir os aprestds 
de- hum poderoso soccorro, capaz de mallograr as ese 
perangas que Os seus inimigos fundavo em hum plano de 
campanha to bem combinado: e era tala abundancia de 
munigdes navaes, ede guerra nos Arsenaes de Lisboa, qe 
poucos dias depois sahio de Lisboa (em Agosto) 0 In 
fante D. Henrique por General da expedicao, levando 
comsigo o Infante D. Jodo; e para o Algarve expedio 
ElRei os Infantes D. Duarte, e D. Pedro para condu- 
zirem dalli novas forcas se necessario fosse. No achei 
‘nos Escritores o numero de tropas, e navios que le- 
vou o Infante D. Henrique; 0 qual chegando 4 bocca 
do Estreito, encontrou huma Fusta, em que vinha 
Affonso Garcia de Queirds com Cartas do Conde de 
Vianna , participando ter Muley Caide occupado ja 
<om as suas tropas a parte oriental da Almina , combi- 
mando os seus ataques com os do Exercito sitiante, em 
qjuanto as Galés bloqueavao o Porto. ve 
_. . A’ vista da Armada Portugueza, entrando vagae 
wosamente com vento bonancoso pelo Estreito, o Rei 
ee Granada, que se achava em Gibraltar prompto a 
embarcar para se ir unir a seu sobrinho, e gozar do 
friunfo que reputava facit, abandonou esta idea, e es- 
ealheo por mais seguro ser dalli espectador do successo, 
- A fortuna nao quiz que o Infante D. Henrique 
tivesse a gloria de destruir © armamento naval de Grae 
mada; porque em quanto navegava a buscar a Praca, 
fazia o Conde de Vianna huma sortida 4 testa da.sua 
Valente guarnigdo contra as posicées, que Muley Cai- 

€ occupava no monte. A acgao foi disputada com des- 
“perado valor por este intrepido Granadino, a quem 


73 


de nevoeiros, mais ou menos espessos, que nZo deixa- 
vao enxergar bem o que era; e ainda que a razio di- 
ctava a alguns, que existia alli huma Ilha, a supersti- 
f° figurava a outros cousas sobrenaturaes, e horrorosas. 

Nesta perplexidade resolverao-se os dois Descobridos 
res Joao Goncalves, e Tristio Vaz Teixcira a ir pes- 
soalmente examinar aquelle fenomeno; eno 1.° de Julho 
deste anno, tendo vento favoravel , partirio ambos an- 
tes de amanhecer em dous barcos, dirigindo-se ao ne- 
voeito, chegados ao qual, e ja cercadcs delle, forado 
descobrindo ‘por entre a nevoa huns picos altos, ¢ logo 
huma ponta de terra, a-que derdo nome de S, Lourea- 
¢0, € adiante da qual surgirao. 

Ao amanhecer do dia seguinte , separdrdo-se os 
dois Descobridores , para ir cada hum por sua parte em 
‘busca de lugar proprio para desembarcar, o que Tei- 
xeira fez em huma ponta, que tomou o nome de Tris- 
tz0, e Joao Goncalves em huma lapa, cujo terreno es- 
tava sovado dos pés dos lobos marinhos, e lhe deu o 
nome de Camara de Lobos, que ainda conserva, to- 
anando elle d’aqui o appellido de Camara para a sua 

~familia. : | _ 
Esta grande Ilha estava deserta, e coberta até ao 
amar de mui basto, e frondoso arvoredo (donde proce- 
«liao as nevoas, que a cercavao), que nado dava facil 
WPassagem a quem intentava penetra-lo, e por isso se 
«hamou Ilha da Madeira, nem tinha outros habitado- 


€Chronica de D, Joio I., pelo Arcebispo D. Rodrigo da Cunha, Cap.° 
©8). Ainda que Fatia e Sousa (Asia Portugueza, tomo 1.°, parte 1.7, 
cap.” 1.°) diz, gue ella foi descoberta no anno de 1419, he isso em 
Comequencia de haver marcado o descobrimento de Porta ‘Santo em 
3418; eo Padre Cordeiro (Historia Insulana, I.° 2.°, Cap.° 6.°) di- 
zendo tambem , que a Madeira se descobrio em 1419, mostrou mani- 
festa equivocagio , como ja observei, pondo o descobrimento: de’ Porto 
anto em 1420, sendo este anterior ao outro , oomo elle mesmo affir- 


10 


75 


rado a Maciote Betancourt o dominio das Ifhas de 

ancarote, Forte Ventura, Gomeira,e Ferro, perten- 
centes ao grupo das Canarias, cuja historia ‘melhor se 
poderd ver nos nossos Escritores, que Jargamente tra- 
tao desta materia, determinou conquistar as que resta- 
vao por submetter (1), e€ neste anno fez partir para es- 
se fim huma Esquadra, com dous mil e quinhentcs ine 
fantes , e cento e vinte cavallos, e por seu General em 
Chefe D. Fernando de Castro, Governador da sua Cae 
sa (2). Porém os resultados deste armamento nao cor- 
respondérao as suas esperancas , nem as despensas que se 
fizerao; porque D. Fernando de Castro, depois de re- 
duzir ao Christianismo alguns dos bocaes moradorés 


(1) Hum erudito Academico publicou ha poucos annos huma Me- 
moria (Vede as Memorias para a Historia das Navegacées, e Descobri- 
amentos dos Portuguezes; no tomo 6.°, parte 1.2 das Memorias da 
Academia das Sciencias de Lisboa, pelo Senhor Macedo), sobre a an- 
tiguidade do descobrimento daquellas Ilhas, em que pretende serem ja 
conhecidas . dos Fortuguezes no anno de 1434, ou no seguinte. Clarke 
faz mencao (The Progress of Maritime Discovery, L.° 1.°, Cap.° 
2.°) de huma embarcacéo Franceza, que por causa de naufragio apore 
tou alli entre os annos de 3326, € 13343 e parece ser a mesma, de 
que com incertesa falla Jodo de Barros (Decada 1., L.° 1.2%, Cap2% 
32), collocando com tudo este facto em época mais moderna. 

Eu farei aqui duas unicas reflexdes: 1.4 Nao parece verosimil , que 
hum Monarcha de tantos talentos, como D, Affonso IV., em cujo Reie 
arado se diz haver acontecido aquelle descobrimento, nao procurasse ti- 
rar delle as importantes ventagens, que naturalmente devia esperar, se 
fresse reconhecer todas aquellas Ilhas, que se avistio humas.das outras , 
© estabelecesse relacies com os seus habitantes; mas vemos, pelo con- 
@raio, que se perdeo até a memoria do seu descobrimento, 2.* Obser- 
‘vando a posicio geografica das Canarias, ¢ a navegacdo que fazem os 
Havios na sua volta para as Costas de Portugal, ou de Franca, segu 

3 ventos dominantes nas differentes EstacSes do anno, he moralmente 
Impossivel , que algum delles ndo descobrisse as Ilhas, Salvagem e da. 
adsiras; o que no consta haver acontecido, oo, 
(2) Barros, Decada 1.", L.° 1.°, Cap.° 12—-Galvio, Tratado 
Descobrimentos, pag. 21 — José Soares da Silva, Memorias d’Els 
Rei D, Joao J., tomo 1.°, cap. 86, : 
10 ii 


76 


daquellas Tihas, se recolheo a Portugal, eo Infante 
foi obrigado a mandar depois Antdo Gongalves com 


huma expedi¢to de menos , para os no- 
‘vos convertidos contra a facia’ dow cocvoh sibeagi 
poh 


_1429— Recebida por Procuragao nos Parte? 
Castello. de Lisboa a 24 de Julho "ara — a 
-D. Isabel, com o Duque de Borgonha F o Bom 
(1), partio desta Capital em huma peste trinta e 
oi fhe Sa e ee de Staal re mesmo anno che- 











je aesaees aes que alsa dizem ser. sia : 
D. Henrique, e outros o Infante, D. Fernando. « ~ 

1431 — Partio de Sagres em hum navio, por or 
dem do Infante D. Henrique, Fr. Gongalo Velho Ca- 
bral , ge de Al ourol com inst 










in ga  Ag huns. los , examinou , € a0s 

ba deu o nome de rmigas (3), e dalli tornou pa 
gres ; tes Unaeaetincate, rque algum mdo 

dee cerragao The obstou a fazer maiores: prorat 

escobriria entéo a Ilha, que achou no anno se- 

gine, e nao ve thy ol longe daquelle Baixo. 

de ear an mesmo Tra e 14 ie 

bagi a ina del Campo o Tratado de P 
Perpetua aor Portugal, ¢ Casella; eis-aqui hum. exe 

















4 Veja-se D. Antonio, Caetano de Sousa Raye 
Patt tomo 2,°, cap.? 4.° —Jos¢ Soares Fs 









~ epee tem cousa de milha de ex: 


53° ay 
mite a Sul, © dista da Jiha de Sey Bai e980 se 





: 


































































































78 


tas, e Mares a elle pertencentes, ou ainda no mar al+ 
to, ’ serio presos , € entregues 4s Justig¢as do menciona> 
do Reino, cujos Vassallos offendérdo , para. alli serem 
gados, © punidos segundo as Leis particulares da- 
quelle Reino: E que igual. procedimento se teria com 
os Nacionaes, ou Estrangeiros que perpetrassem Simi 
Jhantes delictos contra’ gualgver dos dous Reinos, e 
roava a hum delles, nae rite remettidos ao 


ToT t96 7 =) 

ceive os pRide ps Castella promettigo nunca perturs 
bar, ou inquietar os Reis de Portugal na posse, ¢ qua- 
hor em que estavao de todo o trato ;-¢ terras de 
, com as suas minas de ouro, e quaesquer outras 

bt eoae e terras descobertas, ¢ por descobrir, 
ilhas da ‘Madeira, Porto Santo, e Deserta, e todas as 
Ilhas dos Acores, e Ilhas das Flores, e assim as Ilhas 
do Cabo Verde (1) € todas as Ihas aré agora descober= 
tas, Shout beeen: outras que existissem das Ilhas’Cana- 
para a sede de Guiné; porque tudo o 

se Fe conquistesse, ou descobrisse nos ditos | 
se do que ja. Reis d sabido, leieteoped - 
to ficaria ‘aos eis de Portugal, exceprua omnia 
f rias, e, Palma, Forte Ventura, Gomei- 

| .Graciosa, Grio Canaria, oe 
Sy bulene Cauatioe ganhadas,, ou por 
ficariéo aos Reis de Castella. Promettiao mpert be estes 
n4o perturbar, nem molestar q wer pessoas, La 
























dito trato de Guiné, e nas ditas , © terras « 
prea ev a peal cna nome = Reis de 
¥) OU aeilveeanee 
Ormancay ees 





“heel ete sFi 


ekiy “hea reg; a bite nas proximidades de 





79 


consentir, antes sim prohibir’ que, seth licenca dds 
Reis de Portugal, fossem negociar ao dito trato, Ilhas, 
e terras de Guiné descobertas, e por descobrir, tanto 
os seus Vassallos, como outras quaesquer gentes estran- 
geiras, que estivessem nos seus Reinos, e Senhorios; 
nem que nos seus Portos se armassem, ou habilitassem 
para esse fim, nem dariao a isso em occasiao alguma fa- 
vor , ou consentimento directa, ou indirectamente; 
nem consentiriao armar, ou carregar para aquellas par- 
tes de maneira alguma. E assim, se alguns subditos do 
Reino de Castella, ou estrangeiros quaesquer, fossem 
tratar, impedir, damnificar, roubar, ou conquistar 
adica Guiné, trato, resgate, minas, terras, e Ifhas 
della descobertas, ou por descobrir, sem licenca, e 
consentimento expresso dos Reis de Portugal. serido 
Os taes punidos pela maneira explicada no artigo ante- 
cedente. Por fim, promettido os Reis de Castella -nZo © 
se intrometterem, nem embaracarem dalli por diante 
a conquista do Reino de Fez, a qual os Reis de Por- 
tugal poderido proseguir pelo modo, que bem lhes 
parecesse. : 

Que os Reis de Portugal promettido reciproca- 
mente aos Reis de Castella, de nao os perturbar na 
posse, ¢ quasi posse em que estavao das Ilhas Cana- 
rias ja conquistadas, e porconquistar, etc. (1). 

1432 — Tornou o Infante D. Henrique a mandar 
o Commendador Fr. Gongalo Velho Cabral 4 mesma 
commissao , a que féra no anno antecedente, e a 15 de 
Agosto vio huma IIha, 4 qual por ser dia consagrado 
a Assumpcio da Virgem, deo o nome de Santa Ma- 
ria, onde desembarcou da banda de Oeste em huma 
pequena praia, que chamou dos Lobos, por hayer nel- 


(3) Memorias d’ElRei D. Joio J. , tomo 4.°, pag. 270,.¢ seguin- 
tes. a | : 





8 1 


cacio. Nao sabemos em que dia dobtou elle o Cabo 
Bojador; mas he certo, que quando voltou a Sagres, 
ettava ja no Throno. ElRei D. Duarte., que mostrou 
igual prazer ao do Infante por aquelle descobrimento ; 
© ultimo acontecido na vida de sey Grande Pai (1). 
Faleceo ElRei D. Joio L. em.1g.de Agosto de 


Reivedo @EIRei D. 


read 


Duarte : 


f 


Este Principe, cheio de valor ,- de-talentos ,‘e de 
instrucg4o, subio ao Throno. na ferga da sua idade, 
dando aos Portuguezes bem fundadas esperangas ‘decon- 
tinuarem a .gozar da torrente de prosperidades, a que 
estavao habituados de muitos annos. Mas o-seu Rema- 
do foi tio breve, como infeliz. Nae he do objecto des- 
tas Memorias analysar as causas moraes, € politicas dos 
males que soffreo Portugal na vida deste virtuoso Mo- 
narcha, e dos que. se seguirao do seu prematuro fale- 
<imento; os quaes certamente nao existirido , se vives 

“&e mais alguns annos, ' ar 
Querenio mostrar quanto se interessaya no pfo- 
—Seguimemo das Descobertas, foi huma das primeiras 
=acgdes do seu Governo fazer Doagio das Ilhas da Ma- 
«leira, Porto Santo,.e Deserta ao Infante D. Henri- 
“jue, por Carta passada em Cintra a 26 de Setembro 
«de 1433 (2); € nO amno seguinte, por Carta datada de 
‘Santarem aos 26 de Outubro, cedeo o Espiritual das 


(1) Faria, Asia Portugueza, no lugar ja citado— Goes, Chronica 
do Principe D, Joio, Capitulo 8.°——Galvio, Tratado dos Descobri- 
™entos, pag. 22 —Soares da Silva, Memorias de D. Jofo I., tomo 
1, capitulo 83 — Barres, Deeada 1.2, L.° 1.°, Capitulo 4.° 

(2) Provas 4 Historia Genealogica , tomo 1.°, pag. 442. 

il 


84 


‘te em huma caverna, que ficava debaixo de huns pe- 
nedos, onde se defendérao bom espago, que durou 2 
briga, 4 custa de algumas feridas dos seus, e de huma 
que hum dos mogos tambem recebeo; sendo este o 
primeiro sangue Portuguez, que se derramou naque’ 

- barbara Regifo; e vendo os dous, que nao thes éra 
possivel forcar a entrada Gn grates voltdrao para os 


navios, onde chegérao na manha sepuinte. 
«Com esta noticia a Affonso Gongalves: com: 
gente bem armada em 


€ dos Mouros.,: de que 36 
-achou algum miseravel despojo, que por temor abando- 
ndrao na caverna; e recolhendo-se aos navios, sahio da 
- quella Baliia, a que deo c nome de Angra dos : 
© proseguio o seu descobrimento parao Sul. 
_ » Havendo navegado outras quarenta milhas, vio. 
hum Rio, que entrava pela terra na direccio de N.EY 
(he o mesmo Rio do Ouro, de que adiante fallarei) , 
e tinha na bocca huma Ilhota de aréa, em que havia 
‘tanta multidao de lobos marinhos , que os Portuguezes 
»os avalidrao em cinco mil, e eigenen eee 
aproveitar as pelles, que naquelles tempo: o 
Smates no Commercio, Affonso Goncalves , cnet todo 
-© custo queria levar ao Infante algum natural daquel- 
les Paizes, nao se contentando de interesses mercantis , 
-seguio: quarenta leguas mais avante ,.e ch va ho- 
ma ponta, a que deo nome de Pedra da Galé (1), 
Ja. similhanga gue se lhe figurou ter com huma Gale, 
achou humas redes de pescadores, que parecia@o ser 
feitas das fibras de alguma arvore, e na esperane: 
Some -algum habitante, desembarcou varias vezes na- 
quella Costa; mas nado achando o que buscava, e tem 
ja 0s mantimentos gastos, voltou para Portugal (2). 








+a 





7 


ms (1). Situada em 21° go! de Lat. N., ¢ 1° 8" de Lerg: . ; 
(2) Esta relacdo be tirada de Jodo de Barros, de Faria © Sousa, de 


od 





1437 — No fim do anno de 1435, 0 Infante D. 
Fernando (0 mais moco dos Filhos d’EIRei D. Jogo 
I.) parecendo-lhe que as rendas que possuia da Atou- 
guia, Salvaterra, e Mestrado de Aviz , nao ero suffi- 
cientes para sustentar a sua Dignidade , comparadas 
com as dos Infantes seus irmZos, pedio licenca a El- 
Rei D. Duarte para sahir do Reino (1), e ir servir a 
outro mais poderoso Monarcha , onde podesse ganhar 
honras, e Estados, que em Portugal, pela sua peque- 
nez , nunca obteria. 

Ficou ElRei descontente de similhante proposta , 
e procurando convence-lo com boas razSes, que nao 
aproveitardo,. rogou ao Infante D. Henrique o persua- 
disse a pér de parte aquelles pensamentos. Mas este 
Principe , affeigoado por extremo ao plano de conquis- 
tas na Barberia, imaginado por seu Grande Pai, con- 
fessou-lhe que era da mesma opiniao do Infante D. 
Fernando; e pedio-lhe ao mesmo tempo licenga para 
com elle passar 4 Africa, levando os seus criados, e os 
Cavalleiros das Ordens de Christo, e de Aviz, de que 
erdo Grao-Mestres (2). 
A resistencia que ElRei opréz por algum tempo 
4 vontade de seus irmaos, foi vencida logo que o In- 
fante D. Henrique teve a arte de interessar neste pro- 
jecto a: decisiva influencia da Rainha' D. Leonor; e hu- 
, ma yez approvada 4 expedicao, tratou-se dos prepara- 
tivos necessarios. Combinou E]Rei com os dous Infan- 


: . : , } 
José Soares da Silva, e da Chronica do Principe D, Jojo, nos lugares 
ja citados, : 

C1) Vede Ruy de Pina, Chronica dEfRet D. Luarte, Capitulo 
30, e© seguintes-— Acenheiro, Chronica dElRei.-D.. Jodo: 3. — Soates 
da Silva, tomo 1.°, Capitulo 75. : 

(2) Duarte Nunes de Leio, na Chronica de D. Duarte, Cap.° 6., 
diz que o Infante D. Henrique era Guem movia seu itwdo a fazer es- 
tes requerimentos a ElRei, pelo muito que desejava: fazer alguma cau 
Guista na Africa oo 7 


86 


tes, 4 0 sialon constaria_de quatro mil caval- 
“108 y rove mil e quinhentos Infantes, € quinhentos 
Gihchaes (1). Manddrao-se afretar navios aos Portos 
- de Hespanha, Inglaterra, Alemanha, ¢ Flandres, e fi- 
-erdo-se aprovisionamentos de armas, viveres , e muni- 
a re “para cuj. es mpegs "ElRei Cortes em 
vora a Is. e Abril de 1436, e nellas obteve hum 
» donativo, “que nfo foi pago sem murmuragées,, toss 
Bred get tinha por unicos defensores os dous 
ntes, , 
rs Os Fidalgos, que E/Rei_ nomeou pare -l er 
otencentes 4 sua Casa , foro: O Conde de A 
frais rt mal ue hia por Condestavel ; 0 
zie Sp breu; o Marechal Vasco. 
Seater cy “0 Meirinho Mor Joao Redri gue Cou 
~nho, seu irmio; Se timer ° me 


Ruy Gomes daSilva’ 
-Martim Vaz da Cu 


jrmZo Ruy Dias de Sousa: 3 Lionel de Lima } Jodo 
“Falcio’, D. Duarte, Senhor de Braganga, e Pedro Ro- 
“tari ‘de Castro, Da Casa do Infante Ds 
yD Heruinio de Castro, Governador da 
“sa. , com: dous filhos, D. Alvaro, eDe 
astra 508 quatro filhos de Dy Alvaro Pires de. 
‘Pedro; D. Alvaro, D. Fernando, e Dv 
cor ; Ruy de Sousa , Alcaide Mor de Marvao, e€ 
iro ii Rodrig es dé Sousa; rd Alvare 
3, Ruy » que depois foi Almirante; 
Tavares; Paio —— de > e = 


> ) Ooumesnio Escritor ° 7,, acrescenta 

opm a ‘deve entender Drei 
guerra, ane comboiavio os ‘transportes; mas parece-ine V pete 
gente de marinhagem, 







































zl 


82 


tos Commendadores; e¢ Cavalleiros da Ordem de Chris- 
to, © outras pessoas nobres, O Infante D, Fernando le- 
vou os seus criados, e os Commendadores: da Ordem 
de Aviz; e além destes, outros que se offerecérao , coe 
mo Ferniao de Sousa, e Joso Telles da Casa do Infan- 
te D. Pedro; e Alvaro de Freitas, e Joao Fogaca da 
Casa do Infante D. Joao. 
Neste tempo, sabendo ElRei que os Infantes D, 
Pedro, e D. Joao, e o Conde de Barcellos se queixa- 
vao de nao terem sido consultados em negocio de tan 
ta importancia, os chamou -ao Conselho em Leiria. no 
mez de Agosto de 1436, e expondo-lhes a materia, 
com a decjaracdo de estar ja approvada a expedicdo, 
undo somente por muita fae dos do seu Conselbo, 
mas ainda pelos seus Confessores ,.votarao apesar 
disso contra ella os dous Infantes com grande espirito, 
e erudicdo; e o Conde de Barcellos seguio a mesma 
opinido. Tudo porém foi baldado, e ElRei proseguio 
nos preparativos, dos quaes se fazido huns no Porto, 
onde o Conde de Arraiolos teve ordem de embarcar 
com as tropas das Provincias do Norte; e os outros em 
Lisboa, para onde elle foi assistir passada a Festa da 
Pascoa deste anno de 1437, a fim de dar mais calor 4 
empresa, que os dous Infantes promovido zelosamente. 
A 17 de Agesto foi ElRei 4 Sé acompanhado de 
toda a Corte, e com grande solemnidade se benzeo o 
Estandarte Real , que Jevado em Procissdo 4 Nao Ca- 
pitanea, se entregou alli ao Infante D. Henrique, fi- 
cando E]Rei a bordo aquelle dia ccm os Infantes; ‘e & 
Armada mudou o ancoradouro para Eelem. Oo 
A 22 voltcu ElRei a bordo da Capitanea a dese 
dir-se de seus Irmaos, e entregou ao Infante D. 
Henrique hum Regimento escrito do seu proprio pu- 
nho ,o qual, copiado fietmente da Chronica deste M 
narcha , he como se segue: 








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1, 
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89 


nom poderdes tomaar, nom estces mais sobr’elle dia, 
ou ora ,.e recolhee-vos:logo com toda a vossa gente 4a 
frota, e vinde-vos a Cepta, onde me esperarees atee 
ho Margo que vem; porque, prasendo a Dcos, entom 
hyrey com quantos ha em meus Regnos (1). »» 

~ OQ Infante D. Henrique,.lendo o Regimento, pré- 
metteo cumpri-lo; e.a Armada fez-se logo a véla cotn 
bom vento. A 27 chegou a Ceuta, que ainda: governa- 
va ‘o Conde D. Pedro de Menezes, e alli estava ja_o 
Conde de Arraiolos com a Esquadra do.Porto, Passan- 
do o Infante mostra ao Exercito, achou quasi seis mil 
homens, metade Infantaria, faltando-lhe oito mil pa- 
ra o numero que deyeria levar. Concorreo para este in- 
cidente a repugnancia do Povo para a expedicao, a fal- 
ta de dinheiro, e a dos navios afretados nos Portos es- 
trangeiros, que nao vierdo, os de Flandres, e Alema- 
nha por motivos de guerra, ¢ os de Hespanha por ob- 
staculos da parte do Governo Castelhano. Parece, que 
o Infante tinha sahido de Portugal com a esperanca 
de que chegarido ainda a tempo as embarcacées afre- 
tadas, ou talvez confiado em que lhe bastavdo aquellas 
tropas para a conquista de Tanger; porque este Prin- 
cipe era de espirito guerreiro, e nao cedia em auda- 
cia anenhum do seu seculo. Assim, contra a opinido 

. f 


Ci} Estas judiciosas Instrucqdes mostrio, que ElRei queria preve- 
nir o desastre que aconteceo, e de certo nao acanteceria se fossem 
executadas, Como Zald-Eenzala era Senhor de Tanger, Arzilla, @ Alca- 
cer, ordenava E]Rei ao Infante , que mandasse bloguear por mar as 
duas ultimas Pracas, para que aquelle Regulo nao tirasse reforgos com 
gue augmentar a guarnicdo de Tanger: ¢ antevendo igualmente, que 
dilatando-se 0 cerco, acudiriio a elle todas as forcas de Fez, e Mare 
rocos , determinava hutn praso sufficiente para se ganhar a Cidade; ou, 
conhecida a impossibilidade da empresa, embarcar o Exercito a salvo, 
_© que nao poderia deixar de realizar-se, construindo as Linhas de me- 
do, gue tivesse segura communicagéo com a Armada. A desgraca quiz , 
gue nada disto se executasse, | 

12 


90 


de quasi todo o seu Conselho, que votava se partici- 
frettuge ElRei o verdadeiro aie das coisas, © se es- 
eeeee a suas ordens , determinou elle proseguir a 


Partio para Tanger com os navios o Infante D. 

o, eno dia 9 de Setembro marchou por terra 
0 Mndicite tomando o caminho de Tetudo, por nio 
ser possivel forgar a pa m da serra dos Monos, ou 
‘Buthdes , cujos agres setbdbbanece Opposerdo: a mais 
‘desesperada iat a hum destacamento de mil ho- 
oC poesia Jodo Pereira tentou reconhecer os s' pas- 
SOS (If). | 


fi ¥ ini 





a) SEA no tomo 6.° bs ats Cane 
Pi 4 tele de Portugal , faz desta marcha do Exercito 
Ceuta ma estranha nareacdo ; eis-aqui as suas palay 
a9 d S=serERO, partirao oats vas de Ceuta, p 


ae 









a 

ia SO owiks ste 
v 0 olos a 

o centro., e os Infantes cobrindo a re~ 

: rater. a Tanger, desembarcitéo as. tro- 








Tanger nfo tem excelhor, 


$92 
_. Era Senhor, e Governador desta ‘Praca’, huma 
_das melhores de Africa, Zald-Benzald, que tinha sete 
amil homens de guarnigio, em que entravao Granadi- 
_nos afamados Bésteiros , ¢ estaya resoluto a defender-se 
-até 4 ultima extremidade, confiado nos poderosos soc- 


Dy ink OM FSPETANae wosseer SAM OF 
_ |, No momento em que o Exercito Portuguez toma- 
ya posigdo, espalliou-se voz de que os Mouros desam- 
-paravao a, Cidade; e como facilmente se cré o que se 
deseja, correo muita gente de pe e de cavallo a inves- 
tir as portas de que forao rechagados com. perda pelos 
defensores. ; 
_. ‘Gastou o Infante D. Henrique até ao dia 20 em 
-fortificar 0 seu Campo com hum entrincheiramento, a 
ue se davya entéo o nome de Palanque, e¢ em desem- 
-barcar viveres, artilharia, € munigdes; e neste mesmo 
“dia se deo o primeiro assalro 4 Praga em cinco pontos 
“ao mesmo tempo, conduzindo elle em pessoa dss doe 
_ataques; porém os meios de expugnagao acharao-se in- 
feriores 4 empresa, porque apenas existido quatro es- 
‘cadas, € essas tao curtas, que nao chegavao aos para- 
“peitos, © que mostra a ignorancia, ou malicia das pes- 
sOas a quem se encarregou a factura dos petrechos. 
-licos. sles forio os Portuguezes rechacados, depois 
‘de longos, e inuteis ont ae com perda de alguns 
“mortos, e de quinhentos feridos, tanto na escalada, 
_como no inyestimento das portas, que os Mouros ti- 
nhao murado por dentro. 
; Conheceo tambem o Infante por experiencia’, 
a artilheria das suas baterias, por ser de pequeno ca! 
‘molhe 5 que os Inglezes e+ arruinirio com minas quando abandonarSo 
-aguella Pray 8 pede que vosrio do molhe , intilisrio © fundo 
pat Vizinhancas da Cidade, Homa milha a Oeste da povta de Tanger 
end peguenn Ease ¢ Rio Tie Jodeia «onde cebonaea an 














94 


-\°O diaz de Outubro foi de maior perigo para os 
copes Marcharao os Mouros oda a Hm: seu 
Exercito contra os entrincheiramentos, sahio o Infante 
para !hes dar batalha formado em duas linhas, de que 
elle conduzia a segunda, e vendo-os firmes, como 
niio querizo combater, pédz em movimento a divisdo 
da esquerda da primeira linha, que era a mais forte, 
a qual ganhou huma altura, que cobria o flanco dos 
Mouros, ¢ estava guarnecida com muita gente; e avan- 
gando-se ao» mesmo tempo da direita da primeira fi- 
tha, recudrio os Mouros * aes e desordem , 
irgando com perda notayel as posigdes, que occupa- 
vie Mas durante a acgao, eae da Praca huma sor- 
tida contra o Campo, onde ficdra commandando Dio- 
Lopes de Sousa , que repellio valorosamente os 
ouros, eos fez recolher 4 Cidade. Deve-se confessar, 
que o plano dos Mouros era bem combinado; porqu 
poe ter'dos dous ataques, que tivesse feliz result: 
struiria o nosso Exercito. — ohh ahr 
» No dia §, achando-se reparadas as escadas, e 
construido hum Forte de madeira, guarnecido de es- 
pingardeiros , que se movia sobre rodas, para se empa- 
relhar com as muralhas, e facilitar a escalada , expul- 
sando dos parapeitos os sitiados, mandou o Infante dar 
zundo assalro 4 Praga por hum lugar, em que as ba 
$ tinhio arrazado o alto da muralha. Este ataque 
foi dirigido por elle proprio, ficando o resto das tros 
as debaixo de armas, commandadas pelo Infante D; 
nando, o Conde de Arraiolos, e o Bispo de Evos 
ra, para fazerem face ao Exercito Africano, se duran< 
te a acolo quizesse investir as Linhas. Fart 
O assalto foi tao infeliz, como o primeiro, e exs 
gzre,emaccsenis gee ncocou ¢ mural, og 
! imirio. com daimno, dos r 
subiiio , rs fis seairee @ pode ser, oun Laas 


a 













96 


‘mentos, resolveo o Infante D. Henrique forgar de noi- 
te a passagem para as praias de Porto dos Judeos, que 
os Mouros interceptav30, e recolher-se 4s suas embar- 
cagdes com os que podessem romper; mas ¢ 
para elles o Padre im Vieira, seu Capellao, ref 
¢irao de maneira os postos, que se julgou impossi 
abrir-caminho para o mar. Entio os Mouros offerecé- 
a0 a0 Infante deixar embarcar as tropas, ficando-lhes 
a elles o resto da artilharia, as armas, cayallos, ten- 
das, e mais bagagens, sahindo os oe 
zes sé com os seus vestidos; e entregando-se-lhes Ce 
ta com todos os cativos nella existentes. : onto 
~ Quando. se comegava a negociar sobre estas ba- 
ses, como o Exercito Mahometano se compunha de 
Negdes varias, conduzidas por Chefes independentes, 
aos quaes nao agradava o Tratado, rompeérao estes as 
4reguas, e os Portuguezes tiverio que resistir com o sea 
sostumado valor a hum furioso assalto, que : 
te horas, e em que os inimigos forao repellidos com 
Qrande estrago. — yl SD 
Neste aperto, determinou o Infante reduzir a me- 
yor ambito © seu entrincheiramento, que era muito ex- 
tenso para tao pouca gente, e aproxima-lo,do mat, @ 
que se fez em huma noite, cobrindo-se com huma no- 
va trincheira, melhor que a antiga; operac’o a que os 
ros se nao opposerdo, contentando-se com occu 
par em forca o caminho da marinha, e guardar os pa- 
gos visinhos, do Campo, no qual ja se comiao os ca 
vallos, e bestas de carga, e ja morria alguma gente. 
sede ; ue dentro das Linhas havia hum unico po- 
> que ni @ chegaya para dar de beber a cem homens; 
Je. mancita, que se nao tivessem.cahido algumas.chu- 
vas, todos teriao ot oe owl 
| ‘ie Renovou-se finalmente o Tratado, acrescentando: 
abt 










que, haveria paz por cem annos entre Porty 73) 











‘cerco, foi a Arzilla, onde. tentou inu 
oe — negociagt ieee satan do 


2 


Paso SERA: oon 


rian oan 
rade. Sa 
com. elle, 





vgs mtr a 
4 "I | Reinado ial BD. Afons noe 
lad Th i a 7h u) z | 










/ a ha subio a0 Throne. com, 
ae le , € comecou a governar aos qua- 
Seat ie - Leonor, sua nh paren? Cea 
To a on 5 passou e& hum, mod pouc 
2 nei 5 © esta. mudanga,. aind 


'w r’ 





Lh mize : dos as ear ay. 
‘stas discordias embaragarao por alguns 
yuirnento das uteis. apa ae 


ao 











ia 3 
Fae a 1 Cat =m, hum m nayio 
| es OES penance 
ae 





IJ “lo Of, 


a. Nag -3) 
mare sure droge 
pot Sirs ath = pare 2 mv Meokty 



















ey gubcn 209 pm, | Fat A. ble! i? 6' 
1. . ° 6.— , 
Ris , Gn a ° +,, Cap. 6. Sore de 








Mendas,, ot cet ad copii vugal 


sta pal -e chegando a hum Cabo, aique c 
yt ei (1), em razdo, da-cér. do terre 
cue misiicved vour Mngwm Vs wos . VINE 
Fv te oer He eter nead pap 0 










7 


eins Peipeigiae Aree gre lhe 


106) 





ser 






- 
vy 
- 

— 


rdquella Ci- 
D. Hearigde ; 





| rote: 
Camara, ¢ a quem dera o Al 


das de Arguim), por levarem informagées de que ‘po-’ 
Seti alll Razer bee ‘aresa‘ntoe"Abnirees 06 Pe < 
ha, 





(1) Vede Barros, Decada 1., L.° 1,, Cap. 8. — Soares da Silva, 
as etc., tomo 3. , Cap. 84 —Faria, tomo }., Parte ts, © 


tomo j. no fim. — a do Principe D, Joao, ° 85 onde. 
esta Viagem no anno de 144}. — Galvio, pag. apr = pe 


108 





$soas if 
communicou ao Infante. Achava-se com este, no me- 





contente a Portugal 
mesma commissio. Para segurar desta vez a viagem, 





SEH 
¢4o Velba , endescicn 4 Itha © nome daquelle Archan- 





jo, ¢ examinando-a o melhor que péde, veio informar 
de tudo ao Infante, que lhe deo a Capitania della, 
conservando ao mesmo tempo a que ja possuia de San- 
ta Maria. Estas duas Ihas tomdrao o nome de Ilhas 
dos Acores, pelos muitos que se achirio nos densos 
bosques, que as cobriado, e depois se fez commum éste 
nome 4s outras daquelle grupo, Parece que S. Migue 


‘osperou em breve tem ue no anno de 1447 
Feo ElRei D. Affonso 439 SO erie Oo nivileniel 
de nfo 5 ae dizima dos productos, que trouxessem 


(1) Vede a Historia Insulana, desde 0: Livro 5.° até ao Livro 9.4, 
“Faria, Asia Portugueza, tomos 1.°, € 3.° nos Jugares ja citados — 
Soares da Silv Memorias de D. Jojo I., tomo r., Capitulos 90; o@ 
~—Damigo de Goes, Chronica do Principe D. Joao, Capirulos 8, € 
>) pag. 2 » tomo 1., LY a., Cap.* 2.— Anno Hine 











“tre if 
ro m 






Es io Boy destino 
assados 200s indo ae 
sub am ii 














me 


pelo frondoso arvoredo, queo cobriay evendo ode 
alem delle, se encurvava ‘muito para rendoge ster 
eae o vento lhe ficava pontei- 
ro ‘pata’ continuat’: 'o sew ecimento, ancorou em’ 
hiéens Ilhota proxima do onde matou muitas Ca-! 
bras, que lhe servirao de refresco, e deixando nella ar=" 
vorada huma Cruz de pao, regressou a Portugal, onde’ 
= recebido pelo Infante com aquellas honras e mer= 
» que elle costumava a fazer aos que tao bem st Ber 
ce a . of 


T1445 — Neste anno mandou o Infante a Gougato ics 
de Cintra (1), seu Escudeiro, e homem valeroso, pe 

Commandante de kia navio, para continuar os desco~ 
brimentos, o qual indo em demanda de Cabo Branco, - 
para’ passar 4 Ilha de Arguim, em que hum Moura 
ak @); mig fevaya: t 3 iuterprete, the pees 


Re i oclil A Anicd{'s'th, fonda pt 

oss Secale do Continente para Ozsre mais de cinco —— 
do a sua menor largura ong ag pli gtppetmagy Bets: | 
| que amio as Mamas, es servem, isliseapecit 9 os 
























oe me ‘ca pequenas ik: anil hy > 
dos pita com Em huma dellas desembarcou Diniz Peaetdes se he cere 
to, que o fez em huma Alhota que esta pegada no Cabo, éomo die | 
Parros ; mas eu + gre » que elle desembarcou ie Shei oe aaa 
teim abrigo, e fica sd distante delle cousa de duas leguas, 7 
(1). ede Faria ¢ Sousa, Asia Portugueza, tomo 1. no 
res da Silva mas Memorias de D, Joio J., tomo 1., cap.” 84- 
ros , Decada 1.4% (L.° 145 Cap.® Lee Sam pag. 24 — Goes, Guosit 
aenccaate D. Salo s ao 4, si enloeh, sth alana hea 


wow Piha igheslhebonatiens chamavéo Azenegues sos Povos, 
bbitrdo da marge do Ro Senegal para © Nore, 8 Os quaes” 
Ser hua raga mixta de Arabes , cee Inabceeesuy UCI 














i + 













: ) ‘seguinte , navegardo & vise 
sb vole? que he buts sombreada de eae 
e'frontoso :arvoredo até om gt ao Leet 
sanieoaechyot secmette hum dentro ; 
sado wva/ Costa she habitada 
nos, e€ Serreres , todos seers Fi 
be —e su ines algum.: 







‘sup i a “4 Sober 


Nolle , dues Coravelas., a qneve iin 
sete! Rash as Caravelas. da. primeira v agen 
Best nia pode adutliel 


Mra elle di ais) fic bw denie” seguatas> nea 
| be Set , eee 4445, fer armar, 


et 


4 a 
124 


o sees a idea em que estavao os 
sist eee ta ges aod Daa alguma grande Povoagio. 
» €m que acharido muito oure, man- 
Midoteitabecdio. Wigs avela pequena, acomnpantiad®: 
pee om outras das = pam embarca 
= e e agua dentro dos bancos sure 
oO. as vordens que levava, ee 


ue achdrdo sempre > mais de cinco. 
bape oboe gee Rio dava sits woltae 


“als Lm row Qe 1 >}a 


, traidores , srl tudo os da m 
Dea, armas , ¢ leis sio as mesmas dos J: 
edondas. O Rio he abundante de peixe , stem muta 
em saa eared, coe ye ae exten- 
sio;,¢ ao longo eral le pice gy Pippin 
ts mutes | aH. PETe sO £8, Gants bufalos, antas, » © Ou 
pimaes S40 em. HuMe©ro excessivo, — 
ar, em. que os Portuguezes fazifo oseu comt 
ini gar, em any Sate damn a 
nant Re fees os Negros transportayo pela tetra dentro a lon 
Os Portuguezes avao deste Rio 





































godin em rama, e tecidos, cera, m marfim , © de ferro 
que levavio a vender ao Rio Recagpadapenten: 
bem ouro mui fino em ps, ¢ pe cee 


Seite Maslinais Wiis cateress ‘ote Catia ‘a foc 5a a s de 
cobre, em Caravanas de tres mil homens armados 5 ppm 
mezes na jornada, © julgava-se que hido ao. Reine de 
mno de 1578 trouxe huma Caravana cinco arrobas, 


cua ow, se as explicow, fo!’ matinee Sale 
warnDagyy my it Lusitana , tomo 1 





= 


126 


vs fe “fi vader de Antonio de 
hunt + Os seus’ 














, © ferid Portuguezes. Vena 
do-se os Negro to mal rhateeaeatles hi afastdrao-se aren 
investir pel popa a Caravela peque 

cos hometis, € esses mal armados , 

perto, a que " dcudio ‘Cadamosto; que a sqcollies Miata 
das Outras 5 e como seu fogo obrigou os Negros a po: 
apes po 1p BQOT \7%, .onted 





ella, patente bie cian de iene de or eng 

tra (1); © por meio de signaes, e exhorta : teed 

pol pean “diligencidrao attrahir os Negros a_ 
Veio ‘com effeito huma Atmadia 4 falla, e propondo- 

seelhe paz, e commercio, respondérao 0s | mt pen 

Fs sabido © que se havia ‘passado no et 

ortuguezes c carne humana; e 

fim compravao os Negros, e por isso donee 

‘zade com elles, antes os matarido a todos 3 se 

 levariao o jo ao seu Rei, que assistia dalli_ 

jornadas, Neste istante, refrescando p vento,” 

as Caravelas sobre as Almadias, que fugirao pata terra, 

__ Cadamosto , e as principaes pessoas daquella expe= 

digio, queriao ro o descobrimento do Rio, ¢ 

ja sabido ser 0 bia, porém os marinheiros i 
















1% #2 
A, Vine por esta pensgém , © por outras muitas ‘a 
Gale a2 hz in a oadene Xo Sgeadic rp ticiam wae = 
os. ‘incipior dette 2 seculo hum Offizial 1 tnghl poe 


, constrain ds exestieates cadéas ae frau a a wi 
Seitnuitouaeniiiners. 7 ove 


il 









129 


o Norte, e Ihes pareceo verem para o Sul a modo de 
outras; assim as Ilhas agora descobertas erdo quatro. 
Desta primeira Ilha se dirigirdo as Caravelas dg 
Ottras duas, que nao ficavdo tanto a sotavento da der- 
rota, que devido seguir para a sua commissdo, e ro- 
deando huma dellas, que parecia cheia de arvoredo, 
descobrirao a boca de hum Rio, que julgarao seria de 
boa agua, e surgirdo para se proverem della. Aqui des- 
embarcarao alguns homens da Caravela, e caminhando 
la margem do Rio, achdrdo algumas lagoas de excel- 
Jente sal; daqui embarcdrfo muito, e os navios reno 
v4r3e a sua aguada. Colheo-se quantidade de grandes 
tartarugas , Cuja carne era tao branca, como a de vitel- 
la, e de optimo gosto, e por isso salgdr3o muitas para. 
a viasem ; e o peixe era innumeravel, algum de espe 
cies novas, e muito saboroso. O Rio tinha de largo 
hum tiro de seta, e podia entrar nelle qualquer em- 
barcacao de 75 toneladas. Nesta Ilha se demordrdo 
dous dias, matando infinitos pombos, e puzerdo o no- 
me de Boa Vista 4 primeira que descobrirao; e a esta 
segunda o de S. Tiago, por ter ancorado nella dia de 
S. Filippe , e $. Tiago (1). 
Partirao as Caravelas na volta de Cabo Verde, 
€ em poucos dias avistarao terra em hum lugar chamae 


(1) Acho aqui huma contradicc3o manifesta; Cadamosto conta, 
que sahio de Lagos no principio do mex de Maio, e que deo o nome de 
S. Tiago a esta Ilha, per haver ancorado nella no-dia de S. Filippe, e 
S. Tiago, que he justamente no primeiro daqnelle mez. Creio por tanto 
haver erro de impressio, on de copista na data da sua sahida de Lagos, 
escrevendo-se Maio em lugar de Abril, Concorda isto com a narracio 
de Goes (Chronica do Principe D, Joio, Cap.° 8.°, em que colloca esta 
Viagem no anno de 1445), onde diz: Desta vex descobrirao estes Cae 
valleires as Ibhas de Cabo Werde , levando dexcseis dias de viagems e @ 
primeira gue virdo chamardo da Boa Vista, ¢ a outra S, Filippe, por 
chegarem a ella no 1.° de Maio; ed terceira chamardo do Maio pela 
IDESIUNA TALEO, 


17° 


131 ~ 


tc de cincoenta milhas da foz; e aqui a largura do Rio 
nao chegava a huma milha, e era o ponto mais estrei- 
to delle, em que desaguavao muitas ribeiras. Surtas as 
Caravelas , mandou-se com hum dos interpretes 0 mes- 
mo Negro a Battimansa, coi hum presente, e propo- 
‘sic¢des em nome d@’ ElRei de Portugal, para estabelecer 
boa amizade, e correspondencia commercial , 0 que 0 
Regulo acccitou , e por seu mandado vierao Negros 
a bordo, com quem os Portuguezes vantajyosamente tro- 
cardo grande somma dos generos, que levavao, por ¢s- 
cravos, e huma boa porcao de ouro, ainda que inferior 
4 quantidade que desejavao. FE havendo-se demorado 
onze dias, como a gente comegou a adoecer de febres 
agudas, se fizerao 4 vela. 

Segundo as poucas noticias, que podérao obter, al- 
guns destes Negros sio Mahometanos, outros Idolatras; 
€ os seus costumes, e governo similhantes ao do Sene- 
gal, porém vestem-se melhor. As suas Almadias nao 
tem vélas, nem tofetes; os remeiros vao em pé, remane 
do com humas pds quasi redondas, fazendo o ponto 
de apoio em huma das maos, e na popa vai hum ho- 
mem tambem governando com huma pa. Como estas 
embarcagdes s4o0 muito €streitas, e mergulhao pouco , 
movem-se com eXxtraordinaria rapidez. Neste Rio faz 
mator calor, que no mar, por causa do alto arvoredo, 
que assombra as suas margens, Onde se-achdo arvores 
10 corpulentas , que se medio huma, nZo das maiores, 
e tinha no pé cento e setenta palmos de circumferen- 
cia. S40 muitos os elefantes, que cria este Paiz, os quaes 
os Negres nao sabem domesticar, e os matae com aza- 
gaias, @ setas hervadas; ede hum pequeno, que elles 
matdrao nesta occasiao (qué teria tanta carne, como 
cinco, Ou seis touros) trouxe Cadamosto ao Infante 
hum pé, e parte da tromba salgada , com hum dente 
de outro grande, que tinha doze palmos de comprido; 

17 ul 


132 
cujo presente o Infante estimou sobremaneira, ¢ man 
dou tudo 4 Duqueza de Borgonha, Ha methane 
Si muitos cavallos marinhos, e infinito peixe. | 
Preity wy do Rio, navegario a Oeste para se afas~ 
s aber ae. » que co = "lien? e depois continud= 
0 20 navegando ia, com vigias, © 
eg véla, Feet fundo todas as noites, As PS teat 
huma na esteira da outra, e cada dia por escala’ 
tomava huma a Sere Ao terceiro dia virao hune 
Rio (2), oe — Fieh meia railba 5 e a 












pactee a tomar res da terra, 3 as. quaes cohiaias com 
a noticia, de que este Rio se chamava de Casamansa, 

nome do Senhor daquelle Paiz, que habitaya cousa de 
sete sete. legen elle acima, e ndo se achava entao alli, 
por haver ido 4 guerra: por esta causa se partirao no 
dia seguinte, awaliando a distancia do Rio ao Gea 
em setenta e cinco milhas (3). 


«2, Pace ue sta © Rib dS, Pao, oito ou nove gi 


ee Devia ser 0 Rio de Santa Anna, ou a boca do Norte do Rios 
tay Sven em same mervens Sul do, Rls de Baten: 
aaah. io de Casamansa esta situado (a ponta do Norte) na latie 
Soe A a8 An raps dtd 30’, e dista do Gambia 
milbas , nae grea nea. Podem entra nelle embarcacées medias 











nas e tem dias milhas de hs e.de tres a quatro bracas - 
ed erties De mia be guarnecida de re 
banda do Norte da sua entra 

sh pee cha dos Mosquitos Este Rio 


com o Gambia, por quatro, ou cinco com © de- 
Gecko Misia’ tas entee ale v a Gosbie os Arriates, ¢ Falupos, 


133 


Continuando a sua viagem , virdo mais adiante 
cousa de quinze milhas hum Cabo, cujo terreno era. 
mais alto, e avermelhado, e por isso lhe puzerzo o 
nome de Cabo Roxo (1); e além delle achardo outro 
Rio, que lhes pareceo ter de largura hum tiro de bés- 
ta, e denomindrao Rio de Santa Anna; e mais adiante 
outro da mesma grandeza, a que chamarao de S. Dos 
mingos (2); de Cabo Roxo a este ultimo Rio arbitr4- 
rao a distancia em quarenta e cinco milhas, pouco mais 
ou menos. . 

Continuando a seguir a Costa por outra singradu- 
ra, chegdrao 4 boca de hum grandissimo Rio, que pri= 
meiro cuidarao ser hum golfo (3), cuja largura reputd- 
rao ser de mais de quinze milhas; e dobrando a ponta 
de Sul da sua foz, descobrirdo algumas Ilhas ao mar’; 
e desejando saber algumas noticias do Paiz, derao fun- 
do. No dia seguinte vierao duas Almadias, huma mui» 
to grande com trinta Negros, e outra com dezeseis, e 


Negros mui azevichados, e bocaes, que cultivio arroz, milho, e outros 
mantimentos, e muito gado, e sio bons pescadores; as.armas de que 
usio, sdo frechas, e facas. 

(1) Cabo Roxo esta siguado na latitude N. de 12° 17', e Jongitu- 
de 1° 22’. A traduccdo diz Cabo Vermelho , mas eu nao adoptei este - 
nome, por nao confundir este Cabo, que se acha hum pouco ao Sul da: 
Bahia de Rufisco, em 14° 37' de latitude, e 0°56 de longitude, com. 
© Cabo de que fallz aqui Cadamosto, o qual ainda conserva a denomi-. 
nacao de Roxo, 

(2) Passado Cabo Roxo, o primeiro Rio, a que Cadamosto cha- 
mou de Santa Anna, he o Rio de S. Domingos, ou de Cacheo; e o 
segundo, a que elle deo. este nome, he o-braco do Norte do Rio cha- 
mado das Ancoras nas: Cartas Inglezas. Os Navegantes, gue seslhe se- 
guirao, restituirio ao de Cacheo o seu verdadeiro nome ,. e esquectrio- 
© de Santa Anna, Este Rio de Cacheo esta na latitude N, de 12°.35%. 
e longitude 1° 23’, 

(3) Talvez seria este Rio o braco do Sul do das Arcoras, ot ane- 
tes o Rio de. Bissau, que pela curvatura da terra se figuraria a Cademass | 
~ muita maior. 


135 


Pires em huma do Infante D. Pedro’, com instrucc&eg: - 
ra entrarem no Rio do Quro, e darem principio 4 
Introducg4o do Christianismo entre aquelles Povos, ou 
estabelecerem algumas relagdes commerciaes. Mas co- 
mo regeitérao humas e outras proposicdes , os tres. 
Commandantes regressario para Portugal, trazendo sé 
hum Mouro velho, que voluntariamente os quiz acom-) 
anhar (e o Infante mandou restituir 4 sua patria), e 
Pam Negro que comprarao. Aqui ficou entre os Barba- 
ros hum Escudeiro por nome Joao Fernandes, com o 
projecto de examinar o interior do Paiz habitado pelos 
Azenegues, para informar depois o Infante do que vise. 
se, ajustando com Antdo Goncalves a época em que: 
havia cornar por elle. 

1446 — Partio do Algarve Nuno Tristdo (1) por 
Commandante de huma Caravcla, e desembarcando ao 
Sul do Rio do Ouro, assaltou buma Aldéa, em que 
cativou vinte pessoas; e com ellas vohtow a Portugal. 

1446 —— Neste anno expedio o Infante (2) a An- 
tio Goncalves por Commandante de tres Caravelas, 
sendo os outros dous Garcia Mendes, e Diogo Affonso, 
com ordem. de ir buscar Jofo Fernandes (por serenr 
passados sete mezes que Ia estava), objecto este do seu 
maior interesse, pelos desejos que tinha de saber por 
elle noticias exactas daquelles Povos, e dos recursos: 
commerciaes do Paiz, por ser homem que enteridia 
bem o idioma dos Azenegues, - 

Hum temporal espalhou. os navies, e Antae Gon- 
salves foi o primeiro que chegou ao Cabo Branco, on- 
de arvorou huma grande Cruz de pao, para servir ds 


(1) Vede os Escritores actma citados, menos Galvio, que nio faz 
Mencio desta pequena viagem. 

(a) Vede Earros , Cap.? 10. — Soares da Silva, Cap.° 85. — Fae 
Me Sousa nos mesmos lugares citados, onde pde esta viagem no an 
Ode 1447. — Galvdo nao faz mencio della. ' 


147 


geitado esta. honra em outfos Paizes depois de accdes, 
sem comparacao mais importantes. Diniz Annes, tame 
bem armado Cavalleiro nesta occasiZo , achando-se com 
falra de viveres, partio com as suas tres Caravelas para 
Portugal. So 
Reunidas agora todas as Caravelas de Langarote, 
poz elle em c.nsetho atacar a Itha de -Tider; e appro- 
vado. o plano, destacou tres Caravelas, que de noite se 
mettérao0 no canal, que separa aquella IIha do Conti- 
nente , para-evitar a fuga dos Mouros; os quaes, ape- 
zar disso, favorecidos das trévas, passdrao todos 4 tere 
ra firme; e ao amanhecer, vendo que as Caravelas se 
ueriZo retirar, Comegarao a dar-lhes grandes apupa- 
as, o que ouvindo Diogo Gongalves, Mogo da Camas 
va do Infante, que se achava em huma.dellas, convi- 
dow a Pedro Alemao, natural de Lagos, para saltar 
com elle em terna;-e tomando ambos algumas armas 
offensivas , langdrao-se a nado. Os Moures, julgando 
terido delles facil victoria, porque a praia era toda Ue 
yasa salta, -Os-vierto receber 4 borda d’agua com tal 
gritaria, que imcirados os da Caravela, saltdrdo logo ao 
mar quantos, sabiao nadar , sendo os. primeires Gil Gone 
calves; Escudeiro do Infante, e- Leonel Git, e -todoy 
yantos accommettérao os Mouros tao corajosamente, 
que doze. delles ficdrio sepulzados no: lodo, em que sé 
mettérgo para embaracar aos Portuguezes de tomarem 
pé no chao firme ; outros morrérao em terra pelejando; 
e. cintoenta e sete vierdo catiyos para bordo. Nae. cons 
tenres os Portuguezes desta victoria, marchdrdo no mess 
mo dia a huma Aldea distante sete legoas, cuidando 
achar nella os que havido escapado da acc4o, porém 
tudo estava ja deserto,; e apenas colhérao cinco Mouse 
fos em Outra correria, que fizerao no dia seguinte. ° 
Depois deste acontecimento, chamou Lancarote os 
Commandantes da sua Esquadra, e lhes expoz que, se- 


143 


fos dos que cativdra. Com o sentimento deste mdo re- 
sulrado , voltou para Portugal. 

Entretanto os Commandantes das tres Caravelas 
partirao de Cabo Branco com intengao de fazerem al- 
gum desembarque na Ilha da Palma, eencontrando a 
Caravela de Joao de Castilha, que se dirigia a Arguim, 
 persuadirdo a acompanha-los na sua premeditada ex- 
pedicdo, no que elle consentio. A primeira Ilha a que 
aportérao foi a Gomeira, onde os Capitaes Canareos 
Piste, e Brucho, que a governayao , os recebér4o bem, 
confessando-se por muito obrigados ao Infante do tem- 
po que estiverao em Lisboa. Os Commandantes das 

watro Caravelas, aproveitando-se da sua boa vontade, 
the pedirdo auxilio para atacarem a Iha da Palma, da 
qual os da Gomeira erao inimigos; e em consequencia 
embarcdrao-se os dois Capitaes Canareos nas. Caravelag 
com alguma gente sua, por fazerem servico ao Infan- 
te. 3 
Ao amanhecer surgirao os Portuguezes no Porta 
da Palma, e desembarcarao logo. Os primeiros habi- 
tantes , que encontrarao , forao huns pastores com mui- 
to gado ovelhum, os quaes fugirao com elle por pe- 
nhascos, e rochedos, que trepavao com extraordinaria 
agilidade; mas seguidcs com igual presteza pelos da 
Gomeira, e mesmo dos Portuguezes, de que alguns cahi- 
rao, e hum se fez em pedacos. Neste perigoso alean- 
ce se distinguio Diogo Gongalves, que ja se havia as- 
signalado em Arguim. Aos pastores acudirao muitos 
dos naturaes, que escudados com os penedos, faziao -ti- 
ros de arremesso aos invasores, que por fim se retira- 
rao com dezesete prisioneiros, em que entrava huma 
anulher de estranha corpulencia. 
Da Palma fordo as Caravelas desembarcar os dois 
Capities da Gomeira no lugar em que os recebérao 
a borda; e aqui Joao de Castillia teye a arte de per- 


























= 


= 











2 eD 






































Sta, 
i tt? 
ave. Rey ae 

yx | Sine 
al és Bella ce Rafsca, 
ys a9 











146 





correo até ao Senegal, onde nao ouzou deter-se, por 
- falta de armas, e viveres, c volrou a Portugal. Louren- 
¢0 Pires veio ao Rio do Ouro: alli comprou hum Ne- 
gro, e recebeo huma porgio de pelles de lobos marinhos, 
que os Mouros lhe derao, dizendo, que se voltasse no 
anno seguinte, terido para lhe vender. quantidade de es- 
€rayos, € ouro em pd; e com isto se recolheu ao Reino. 
»  Langarote, Alvaro de Freitas, e Vicente Dias, con- 
.servando-se unidos durante a tormenta, forao de com- 
_mum acordo 4 Ilha de Tider, em que captivarao -cin- 
coenta e nove pessoas, com que voltdrao a Portugal. — 
~ ». Diniz Fernandes, e Palagano, que havendo-se extra- 
-viado na viagem das quatorze Caravelas, i 
do. em: conserva um do outro, quando chegéréo, a Ar 
= Henin sone sdb sy es eriiabendee aa 
_Ilhas, ‘e-em consequencia derermindrao hir ao Senegal, 
»porque Diniz Fernandes j4 conhecia aquella Costa do 
.tempo. que alli veio, Dobrando o Cabo Mirick parao 
Sul (1): .e estando o tempo de calmaria, qui el- 
les mandar alguem, que a nado fosse tomar terra; /€ 
examiaasse se naquellas proximidades existia alguma: Al- 
deia; e@ posto que o mar andasse banzeiro, e¢ de ¢ 
des vagas, doze homens da Fusta de Palagano’ se 
Yio a nado, levando armas offensivas, e ganhando a praia, 


a fordo seguindo, até encontrarem doze Mouras, de; qu 

captivardo nove, e com elles tornar20 ao breton 

‘Mesino instante sobreveio tanto tempo, que a Festa 
: vo > ot Sheil 


e : wr = 
mre SRG ae) os naar 
Senta Aninw me oe me parece isto exactos porque’ Diniz F 
| pa porg 




















ee) 


y" Arguim’, cujas Ibas ficio ao Sul d'aquella porta, 

ou de Santa Anna, situado na Lat. N, 2ac® 33‘, e Long. 1° a9 4 

Ora_na posicgio em que estavio as duas Caravelas, sé tinhio que dobrar 

w Cabo Mirick (caja Lat. sio 19° 17, ¢ a Long. 1° 20°) distant 

de vinte, © cinco feguas’ao'Sul do Cabo de Santa Anna, ;para 

40 Senegal. = vist > Tae a : Gain oa 7 
i) 


we 














147 


2 ' t . 
cabrio, e encalhou na Costa, salvando-se a euarnicto ‘na 
Caravela, que correndo com o vento, -chegou a Caba 
Verde; e querendo Diniz Fernandes desembarcar, nad 
pode , pelos Negros Ihe defenderem a praia com setas 
thervadas. Aqui fez o tempo outra mudanga, de que 
Diniz Fernandes se-servio para voltar:‘ao lugar do nau- 
fragio. da Fusta, e como o casco ainda exi-tia, desem- 
barcou: em terra com Pala,ano ¢ a sua melhor gente, 
a fim de aproveitar o que podesse; e sahindo-lhe de ree 
pente setenta Mouros detrds de huns montes de aréa, 
onde os aguardavdo escondidos, férao de tal maneira re- 
cebidos dos Portuguezes (suspeitosos da cidade). que a 
maior parte alli morreo, escapando sd os que fugiriao. 
Depois desta- accfo, que fez honra aos dois Comman- 
dantes, se fez Diniz Fernandes 4 vela, e. chegou a Por- 
tugal.a salvamento. oe oo 
_Assim, de tantas embarcacdes, que “sahirao este 
anno para esta expedicao sé se perdeo huma. Fusta.: ‘ 
1446—- Deo o Infante o commando de huma Cara- 
vela a Nuno Trist?o (1), com ordem de passar 4lém 
do Cabo dos Mastros, ultimo termo do descobrimento 
de Alvaro Fernandes, o que elle executou, descobrindo 
fhum. grande Rio, em cuja boca surgio; e mettendo-se 
ma lancha com vinte e dous homens, em que entravao 
©s principaes do navio, entrou com a maré pelo Rio a 
Huscar alguma Povoacdo, e foi encontrar-s¢ com treze 
Almadias guarnecidas de oitenta robustos Negros, que 
© esperav4o em sitio apropriado, por tercm ja visto oO 
Mavio, e a direccg4o que trazia a lancha. 
Chegado Nuno Tristao-a certa distancia das Alma- 


(1) Barros no luzar citado, Cap. 14 — Galvio pag. 24, pode esto 
‘Viagem no anno de 1447 — Faria, nos lugares citados, a collocou n. 
Tresmo anno de 1447 — O mesmo segue Soares da Silva, Cap, 388 
~~ Gots Cap. 8.2, em 1446. . | 

19 u 





148 


dias , notou que se dividido, e cuidou ser para fugirem, 
8 suppondo combinagdo de ideas militares em gente 

arbara; mas enganou-se, porque os Negros de open 
apresentando-se-lhe na frente com uma diviséo da sua 
esquadrilha, o atacdrao pela pdppa com a outra, cortan- 
do-lhe ao mesmo tempo a retirada, e mettendo-o entre 
dois fogos; e como |hes nao convinha abalroar a lancia, 
conservaydo-se sempre a alcance das suas armas missivas, 
lancando sobre elle huma chuva de setas hervadas. De- 
balde Nuno Tristao fazia remar vigorosamente os mari- 
nheiros para abordar jd huma , j4 outra Almadia, a fim 
de escarmentar os Negros com a morte d’aquelles, a 
quem podesse chegar: as Almadias, que manc : 
com admiravel rapidez, evitavao o choque, e continua- 
vao o mesmo genero de peleja. A vasante da maré veio 
a tempo salvar a lancha, e ao favor della chegow Nue 
no Trist@o a sua Caravela, com dezenove homens mor 
tos, ou mortalmente feridos, em cujo numero entrog 
elle, com Joao Corréa, Duarte de Hollanda, Estevao 
de Almeida, e Diogo Machado, todos de distincto nas+ 
cimento, educados de meninos na Camara do Infante, 
além de outros Escudeiros, e Criados seus; e para com~ 
pletar a desgraca, ao atracar a Jancha ao navio, es- 
ee de modo com a ancora da roga, que morrérao 
mais dois homens. 

Tinhao ficado- unicamente na Caravela o seu Eseri- 
vio Aires Pinoco, Moco da Camara do Infante, e qua= 
tro grumetes; e cortando logo a amarra, se fizerao 4 ve= 
la, e vierdo ter a Lagos no fim de dois mezes de hu- 
pe a ea 4 téa, por nenhum delles saber dirigir a em- 

reacao. Deste desastre ficou dquelle Rio o nome de 
Nuno Tristéo. (1) 








(1) O Rio de Nuno Tristdo esti ao Sul do Rio Grande, ma Lat. 
N. 10.° 17%, ¢ Long. 4° 28', Este Rio he largo, ¢ rapido ma entrada, 


150 
vinte Negros. Alvaro Fernandes, nao querendo arrisea 
as yidas dos"seus env hum desembarque ‘de viva forga, 
gor assim lhe ser“muite ‘recommendado nas instruccde 
do Infante, e'satisfeito” de*haver adiantado’os descobr 
mentos d’aquella Costa mais, que os outros Navegantes, 
régtessou a Portugal, onde recebeo “honras, ¢) mercés 
tanto do Infante Di Henrique :)| como do Tnfante D. 
dro, Regente do Reino: ve eS tae Ter 
1446 — Neste anno’ partiréo de Lagos’ ape = 
las (1), de que era ‘Commandante em Chef Gil An 
nes, e os outros Commandantes Fernao Valarinho, mui 
eo, Soho For parroe enterso Affonso, Tou 
rengo Wias ,— ernandes 0, iogo Gongalves, 
Gomes Pires, quasi t todos Criados do Infante, e outros. 
Das Caravelas ‘pertencia huma ao Bispo do Al, arve, € 
tres aos moradores de Lagos, Esta Esquadra ~ 
4 Ilha da Madeira, por ordem do Infante, 
ber alguns viveres, e ajustar-se com outras duas 2 Cari 
velas , huma de Tristao Vaz, e outra de Garcia Ho- 
mem , genro de Toto Gongalves da Camara. 2 
~ -Daqui foi 4 Gomeira entregar os Canareos, que 
Joao de Castilha, e os outros Commandantes da sua 
conserva haviio d’alli trazido, como jé se disse. Gil Ane 
nes quiz aproveitar-se do auxilio destes Canareos , - 
dar um assalto na Ilha da Palma, 40 ue no produzio 
© effsito que esperava, pela vigilancia os habcunaaeaeD 
as duas Caravelas da Madeira, que sé a isto vinhac 
g nreg para a sua Ilha, Cabs 
adra seguio a-sua derrota para ere 
de, eee foi fasle feliz, porque os Negros se | 
dido com vantagem a favor.dos bosques, de que o Paiz 
he coberto; ¢ "de huma vez morrérao cinco Portuguezes 


1) Barros Cap. ag ore nos lugares’ citados , colloca csta vie 
Fn Sms, Silva segue o mesmo, 





























és 


| 
* & 
= ——s seme 

















153 


terra a Jodo Fernandes, e voltou para Portugal, tra- 
gendo ao Infante o primeiro Le’o, que veio daquelle 
Paiz , o qual Infante enviou de presenre a hum Fidal- 

o Inglez seu amigo , que assistia no Principado de 
Walles 

1447 — A fama dos descobrimentos das novas Re- 

gides , ¢ extranhos Povos, que os Porruguezcs successi- 
vamente faziao, attrahia a Portugal muitos homens no- 
taveis, curiosos de cousas 120 extraordinarjas ;, e entre 
estes veio hum Gentil Homem di Camara d’EIRei de 
Dinamarca, e por elle recommendado ao Infante; os 
nossos Historiadores ihe chamZo Balart, corrompendo 
talvez o-nome. Este Fidalgo ardia em desejos de via- 
jar na Costa d’Africa, para examinar de perto as ma- 
ravilhas, que entre os gelos da sua patria ouvia relatac 
daquelles climas, em que as arvores nunca se despojao 
da sua folhagem, © as producgdes da natureza 630 t0-  - 
talmente diversas. . 

_ QO Infante maacou logo armar hum navio, cujo 
commando déo a Fernao Affonso, Cavalleiro da Ordem 
de Christo, que levava huma mensagem a0 Soberano 
de Cabo Verde; e com elle se embarcou Balart, cuja 
curlosidade obrigou Fernéo Affonso a fazer huma via- 
gem costeira at¢ ao Cabo, para lhe ir mostrando tcdas 
as Bahias, Portos, Rios, e Promontorios jd descober- 
tos; € por esta causa, e por alguns ventos contrarios 
gastou seis mezes na jornada. - 

_ Chegando ao Cabo, logo que os Negros virfo a 
navio, sahirao a reconhece-lo, em som de guerra, nas 
suas Almadias; mas explicando-lhes os interpretes o 
verdadeiro objecto da viagem, e informados dos presen- 
tes destinados para o seu Principe, forao avisar o Go- 
vernador da terra, por estar o Rei dalli oito jornadas 
occupado em huma guerra no sertéo. Veio elle 4 praia 
receber em ceremonia a Jodo Affonso, ¢ a Balarr; e 

ZU 


155 


via ser conduzida por mar 4 Italia, mandou EIRei. 
aprestar ftuma Ksquadra de duas grandes Ndos, cinco 
mais pequenis, e duas Caravelas, além de dois trans- 
partes, que sahird4o primeiro com familias, e trem dos: 
passageiros, Os Commandantes das embarcacées, os: 
seus Officiacs de Guerra, e de Mar, bem como os sol- 
dados, e marinheiros forio escolhidos entre os melho- 
res; e a artilheria, ¢ munigdcs de guerra erdo sufficien- , 
tes para qualquer occurrencia imprevista: as guarnigdes | 
chegavao ao numero de tres mil homens, de que a Ca-: 
pitania Jevava quinhentos. Nomeou ElRei para Con-. 
ductor da Imperatriz,. e Capitao General de Mar e Tere , 
ra da Esquadra, durante. a sua viagem de ida, e volta, . 
o Marquez de Valenga. As outras pessoas nomeadas:, 
para.a acompanhar, além do Marquez, e dos Embai- 
xadores do, lmperador,, erfo a Condega de. Villa Real, , 
com. muitas, Donas, e outras Criadas ; 0 Bispo.de Coim-, 
hra,. Lapo,de Almeida, Lopo Vaz de Mello, Regedog, 
das Justi as, Alvaro de-Sousa , Mordomo Mor, A ffon- 
sa, de Miranda , iponies de Miranda, Gomes Freire, 
Joao Freire, D> Diogo de Castello, Fernao da Silvei-, 
ra.. Marrim_Maades de Berredo, e outros, muitos Ca-. 
valleiros. ph > | ne. 
A 25 de Outubro foi E]Rei 4 Sé coma Impera-; 
triz,,a Familia Real, e toda a Corte; e-depois.de cer 
Jebrados as Officios Divinos, a conduzio ao Cace.da Rie. 
beira, dq qual sahia huma comprida ponte sobre toneis. 
are 4 Capitania_, que ‘estava soberbamente adornada. 
& Imperatriz ficou muitos dias a bordo, espérando ven- 
to epportung, e em todos a visitou ElRei: e em hum. 
delles, achando-se. assistido das pessoas do seu Conse- 
Iho, vierao chamados 4 sua presénga os Commandan- 
tes, e mais Officiaes da Esquadra, e alli derao novo ju- 
ramento de.cumprir o que lhes fosse ordenado, ainda 
com risco da sua vida, e mandou BilRei, sob pena de 


20 ii | 


156 


morte , que todos obedecessem a quanto determinasse @ 
Capitao General. 

No dia tz de Novembro sahio a Esquadra cons’ 
bom vento, acompanhando-a ElRei com algumas em- 
barcacdes Ngeiras mais de huma legoa fora da barra. 

Para evitar o perigo talvez de haver de continuo 2 
bordo dos navios muitos fogdes accesos, regulou o Mar 

uez de Valenca as horas is comer por esta maneira : 
ho nascer do Sol jantavao os marinheiros; elle, os Fi-' 
dalgos, e todos os Militares antes do meio dia; e a Frm’ 
peratriz , sua familia, e os Embaixadores ao meio 
dia. As céas constavao de conservas ; e pao torrado 
no forno., ou peixes pequenos salgados. A mesma or 
dem se seguia em toda a Esquadra. ae ; 

Navegou esta sempre com bom tempo até embow. 
car o. Estreito.de Gibraltar, e¢ a2 22 surgio em Ceurs, 
onde a. Imperatriz desembarcou, e se demorou alguns 
dias., por vir incommodada do mar: a 29 partio com . 
vento favoravel. Na Costa de Vafenga mandou o Mar- 
quez: Huma. Caravela (talvez a Aficante) a buscar car= 
nes, pio fresco, agua, e fructas, _ . 

assow a Esquadra 4 vista de Malhorca, e a 6 de' 
Dezembro entrou no Golfo. de Leao. Sahindo delle, soe 
breveio-the vento contrario, com que se aproximoéu de 
Marsellia, onde estavdo tres Ndos, e duas Galés de Pi- 
ratas. A Hsquadra achava-se entdo dispersa,. mas reuni- 
da por’ meio de stgnaes, atacou os Piratas, queimou- 
Ihes huma das Ndos, metteo outra a pique, e tomou 
outra, escapando. as duas Galés , em que os Piratas ti- 
nhao recothide o mais precioso’ dos seus muitos roubos. 

A Esquadra ancorou em Marsellia, e logo o Go- 
vernador veio a bordo,. com as principaes’ pessoas, ¢€ 
hum presente de refrescos; e mostrando-se receoso 4 
vista da grandeza dos navios:, e quantidade de tro 
que levavao, perguntou de que Nagao erdo, € para on 





158 


oe jeg 2 oe 
ibarcoin rar a ee “¢ zlogsb enn jtOyiarg 2 obey =) 
0 145 8+=) No mn 3.45 457. vic a,Portugako Bispa, de 


sh pe Lage 
Guntioan 


oes persuad 
do | os: So hos. concorreriag, de-boa. f 
5 Bibign dass Cin (tv Hake poles... 
‘seu tio; para tratar aquelle tO, © pedir-lh 
. owt ee vers d 

carecesse; seremy ally mals: baratos;, mas em 
oe i acre: de, que 






























+ fe 
La = 7 = a 
EIN 
4 


an Spee cale | 
Tem mecessarios \vinte e cinco mil ' | 
na oe hue + 


= Duarte Quines de Leia ; a : Ala. apitulon 1 ¥8 
“‘Ugnuans. 3. sue ao 5 von, 124 





16! 


Alcacer com.os.navios mais pequenos, que vencizo mie- 
lhor a corrente. | 
Sem perda de tempo se preparou tudo para come- 
ar o desembarque ; mas como os dois navios, em que 
fide os Infantes, havido fundeado a duas legoas de dis- 
tancia, com outras quarenta embarcagdes, os mandou 
ElRei chamar ; e quando chegarao o achdrao 4 testa de 
huma linha de escaleres, e lanchas carregadas de tro- 
pas. Apenas EllRei vio o Infante D. Henrique, péz a 
sua flotilha em movimento, e 4 voga arrancada tomé- 
r4o terra ao mesmo tempo todas as embarcacdes. Esta= 
vao formados na praia quinhentos Mouros de tavallo,.e 
-muites mais de pé, que querendo-se oppdér ao desembar- 
que, forao rechagados, e carregados com tanto vigor , 
que rotos, e desbaratados, huns fugirao para Alcacer, 
ourros para as montanhas, deixando bastantes mortoa 
no campo, Dos Portuguezes ficdrao muitos feridos, ¢ 
mortos o Commendador Ruy Barreto, e Ruy Gongal- 
ves de Marchena; e¢ no alcance dos inimigos se adian- 
tou tamo Joao Fernandes da Arca, Fidalgo valoroso y 
e celebre Cortezao daquelle tempo, que. chegou ao pé, 
das myralhas, e ahi o matdrao de huma pedrada, com 
geral sentimento de toda a Corte. | 
Naquella noite desembarcou a Artilheria, e todos 
os petrechos, ¢€ instrumentos da expugnagao ; e no dia 
seguinte assult4rao os Portuguezes as trincheiras avancga» 
das, que os Mouros tinhao Jevantado para cobrir, e de. 
fender as proximidades. da Praga; e apezar de grande 
resistencia, as entrarfo, forcando-os a recolher-se dene. 
tro das muralhas. O Infante D. Henrique tentou que- 
brar as portas, 0 que lhe nao foi possivel, pela sua for- 
taleza, e pela quantidade de tiros de arremesso, e ma- 
terias incendiadas que os defensores lancava4o sobre as 
tropas , O que as obrigou a afastar-se do pé das mura- 
Jhaz, sendo ja posto.o Sol, em quanto nao chegayao: 
21 ) 


163 


so. A esta commissZo partirte em Gua: embar- 
oagGes Martim de Tavora, e Lopo de Almeida, acom4 
shados de ‘hum Rei de Armas, e levando huma Cars 
ta de desafio motada com toda a cortesia, que a Reis 
csexvem {1}. O .Mouro, instruide do objecto da Em- 
baixada, em @s aavios eatrando na Bahia de Tanger,. 
Jhes mandou atirar,; e com este desengano tornou Lope 
de Almeida para Ceuta, e Martim de Tavora seguio 
para Alcagar, onde ahegarao outros muitos Fidalgos, e 
alguns soceorros de Ceuta. | 
A 13 de Novembro appareceo o Rei de Fés sobre 
esta Praca com trinta mil homens de cavallo, multi- 
dao de gente de pe, e muite artilheria, comecando le- 
go a formar os scus ataques. . 
Rei sabendo do cerco ,.e que a Praga estava 
mal provida de viveres, attendendo a ¢stacdo invernes 
sa, partio de-Ceuta com a sua Armada, s a 20 alegpu 
a Alcagar, intentando metter-lhe soccorro, 0 que pare- — 
geo impossivel , per estar ja completarnente tercfda., ‘e | 
as buterias intmigas descobrirem a praia, ech que $8 8: 
podia desembarcar. Nestas circunstancias escreveo a Di’ 
Duarte, promettendo-lhe que em breve tornaria a soc- 
corre-le; e voltando para Portugal, desembarcou em. 
Faro , donde :passou a Evora, tentando lozo de ee-refae 
ger para a nova jornada da Africa. . 
O cerco durou cincoenta e tres dias, ea 2 de Ja-. 
seiro do anno seguinte de 1459 se retirdérao os Mouros 
eofh inrmensa perda de gente. E consideranto EiRe? 2 
vantigéem gue résultaria aquella Praca dé ter huin Mo- 
The para nelle se recolherem as embarcagSes pequenas., 
como the havia representado D. Duarte de REZESs @: 
dile mesmo -o experimentdra quando de balde .a quiz 
soceorner , resolveo-se a martda-fo ‘fazer, para ctffd 


(1) Sio as formaes palavras de Damigo de Gées no Cap. 1.6. 
21 il 


184 


se prepardrao vinte e scis embarcacées carregadas dos 

ateriaes, artifices, e trabalhadores necessarios. Che. 
fada esta Frota a Alcacar, comecou D. Duarte a con- 
struccao do Molhe a 12 de Marco daquelle mesmo ane 
no, e o deixou concluido no fim de Junho, nao obstans 
te a continua guerra, que os Mouros lhe fizerdo ps- 
ya embaragar os trabalhos (1). 

1469 — A 13 de Novembro deste anno falleceo 
em Sagres, com sessenta e sete annos de idade, o Im 
fante B. Henrique, cujos gloriosos trabalhos the tem 
merecido huma fama, que sé acabar4 com 0 Mundo, 
Os Eseritores de todas as Nacdes sao unanimes nos elo-~ 
gios, que fazem aes seus raros talentos, 4 sua’ magnani- 
midade, e aos seus conhecimentos mui superiores a0 sey 
culo em que viveo; e 0 cotlocdo a par dos melhores, e 
mais beneficos Princtpes da Europa moderna (2). 3 

' 1453 — Mandou ElRei a Soeiro Mendes, Fidal- 


(1) Ruy de Pina (Cap, 141 ) falla em termos geraes da construp 
cia deste Molhe (a que se chamava entio Couraca); mas no Manusecri- 
to de D, Vasco de Almeida achei as particularidades, que refiro., e vem 
a observagio de que custou dez mil dobras. _ 

(2) Barros ( Decada 1., Parte 1. Cap. 16.) diz, que falleceo 2 13 
de Novembro de 1463, com sessenta e sete de idade. — Ruy de'P- 
na (Chronica de D, Affonso V., Cap. 144) poe a sua morte em No 
vembro de 1459, com cincoenta e sete de idade., o que he equivocer 
Gio, ou erro de impressio. — Antonio Galvéo (Tratado dos Desco- 
brimentos, pag. 25) a colloca em 1462. — Acinheiro CChronica de 
D. Affonso) diz, que foi em 1461. — Damiio de Goes (Chronica do 
Principe D. Joio, Cap. 17., € na Chronica d’EJRei D. Manoel , Par 
te 1., Cap. 23.) affirma, que o Infante morreo a 13 de Novemlxo de 
1460 , com sessenta e sete annos de idade, —- Duarte-Nunes de Ledo 
segue a mesma opiniio, assim coma Joze Soares da Sitva no tomo 1. 
das suas Memorias de D. Joo I. — D. Antonio Caetano de Sousa pre- 
duzio hum Documento decisivo, que he a Carta de Doacfo, que EiRei 
D, Affonso V. fez ao Infante D. Fernando das I!has dos Acores , Madei- 
sa, e Cabo Verde, datata de Evora a 3 de Dezembro de 1460, na 
cna), fallando do Infante D, Henrique. diz: mea Tie, gue Deos heje. 
Historia Genealogica , tomo a. Liv. 3. Cap. 3. pag. 823s 


165 


go da sua Casa, 4 Ilha de Arguim, para construir hum 
Castello (se nao foi para acabar o que se diz estar jd 
tomecado), a fim de proteger o Commercio do ouro, 
e dos escravos , que neste tempo concorria. aquellas 
has, o qual era mais vantajoso a Portugal, do que 0 
systema até alli seguido (1). — | 
. 4462 — Neste anno (ou talvez no antecedente) man- 
dou ElRei duas Caravelas para continuarem o descobri- 
mento -da Costa de Africa: era Commandante de huma 
Pedro de Cintra, seu Escudeiro, e da outra Soeiro da 
Costa (2). | Ho, 
.  Chegados 4s duas Ilhas habitadas , que Cadamoste 
reconheceo na sua segunda Viagem, -defronte db Rio a 
que chamou Rio Grande, surgirao em huma ‘dellas, e 
trat4rao com os Negros por acenos, por sfo :entende- 
rem a sua Jinguagem; observardo tambem,, qae habica- 
vao em cabanas miseraveis, e tinhao Idolos’ de. madei- 
ra, que adoravao. Fazendo-se daqui 4 véla,:e navegan- 
do cousa de quarenta mijhas além do Rio Grande, vi- 
4o outro, que teria tres, ou quatro milhas de largo, e 
se chamava Rio de Bessegue (3) , nome de hum Ré- 
gulo, que dominava na sua entrada. FE, proseguindo 
no reconhecimento da Costa, descobrirao hum Cabo, 


(1) Barros, Decada 1, Liv. 2. Cap, 1. — Galvdo (pag. 25) p&e 
esta expedicjo em 1462. — Faria e Sousa a colloca em 1449. © 
(2) Como nio ache} nos nossos Escritores .as particularidades desta 
Viagem de Pedro de Cintra, sigo a nerracao de Cadamosto, qne escrer 
veo as noticias que Ihe deo hum Portuguez seu amigo, que parece fa- 
zia parte da guarnicio da Caravela de Pedro de Cintra; e assigno a es- 
ta Viagem 0 anno de 1462 , por mé parecer mais provavel, attenden- 
do a que este Descobridor estava de volta em Portugal no ».° de Fe 
. wereiro de 1463, epoca da sahida de Cadamosto. Vejfo-se ‘as Memo- 
rias da Academia ji citadas, onde vem as Viagens deste Veneziauc. 
Faria diz, que-foi em 146}. ° . te 8 
(3) Este Rio parece ser 0 de Nuno Tristéio ja descoberra * 








estes «d ; ‘ - 

: Guanes al ietalenad + culhsjanbesia 
Ob edagune'l u oeojcinty sie! ae free yee 

Perto de oitenta milhas adiante»do Gabo da Ver 


que todos ome ane Ce cedent 
dna m pies en atten? 
soon put hed ae 


aoe mage ag ee 
fante D. Fieorique construira. Os h irantes 
Rio tithdo 






















- nas 
i x, eemantinhao-se de arroz, milho, ¢ legumes, 
Aoyman do Cabo estaydo--duas »Lbas. renas , hua 








hum Hens a a chamérso de S. TVieeoes (3), com ser: 
) it Se e Jargura na boca; e cinco.milha 
: ia aie ac80, que a i lidar 


SEY cule at a! sie ‘cia ad = 
tines rh Jongh 







: $3 gs. ood | ae = 7 
de S Vicente , we Verde, talvez | 3/10 . 
PAR LT Beg T cau ie yr apy Sted 











ert 


gedourcs, e bom fando. Correndo oveis vinte-e-qldtro 
ml hae; descobrirto hum Cabo,.a que derio o nome de 
Cabo Ledo, por ser. mui vigoso, e alegre{1);, e adiane 


(1) Cabo Ledo (chamadu pelos Ingleres Cabo da Serra Leda, e pe’ 
low Francezes Cabo. 'Lagsim )° he a. ponta- do Sul:da entrada’ da“ Rilo Miz 
tomba, ou de: Serra Leda ,. situada na latitude N: 8° 30’, e longitude 
3° 6’. A ponta do Norte da mesma entrada chama-se ponta de Pulame, 
ou Ilha dos Leopardos. Este Rio, hum dos mais formosos da. Africa 
Occidental , corre de Odste para’ Leste , com huma foz de cinco legoas 
dé largo até: Cidade dé Freetown , Capital dos estabelecinientds lid 
gieres , constniida. na-margem: Austral, a.duas legqas e meia~ da entrae 
da, Neste ponto diminue.o Rio quasi metade da. sua Jargusa, e-assim 
continua sete legoas além da Cidade, onde. se divide em dois bracos, 
Ha neste Rio. varies has, e na entradd hunt baixo dé aréa, que tome’ 
dois tercos da sua largura. 

Os: Portuguezes faziéo aatigamente hum vantajoso Commertcio ‘nem 
ta Rio, em que-se achavio mantimentos. de. toda a especie , ouro em: 
ps... que.viaha dorsesio, ferro, algodio, cana de assucar, marfim,, 
cera, malagueta, madefras, e hums’ fructa como castanhas, chamad# 
Cla, que se carregava para differentes ‘Portes, e Ilhas, por-ser- mate 
estimada' dos Negros. Por testes; mot ivos fizarée alli: hum-esrabelecimen- 
tos dirigidos: por Bonto-Correa da, Silva, nagutel daillha de.S. Thoinds, 
que Jevou comsigo hum irmée, e outsos seus -parentes , e amigos cent’ 
as suas familias, e po anno dé 159¢ continha a sua povoacié quinhene 
tos Portuguezes; e¢ ainda hoje existem-restos das plantac6es- de -arvotest 
fact iferas, que: fizesio. Forio porém desgmparando ‘a terra a ponoa 8: 
peace, ou.prlovabandeno em-que os deixen-o Governo, a-puzar.das, 
suas reclamaqies ,.o pela.insalubridads. do clima, que he matador, para, 
os brancos , e até para os negres de outras Nacoes. 

Como o Paiz ficou abandonado dos Portuguezes, e era jd mui co- 
ntitcid®, e-freqneatado de-navios Est rangeivos 3 Henrique Stiasp’3 Inglez , 

ot-e crige alli‘ham ‘pequeno estabciecimento-eim 1736 , a.fini-des 
rgunir nelle os Negros .miseraveis, que havea em-Londres. Post em 

este prejeeto; destmitio: os Prancezss' a: povoacio em 1790; 

ies: festaurou-se em breve , porque no-anno seguiate hum Bill do-Para’ 
lamento mandou..formar, alli huma Colonia, e-em conseqyencia core, 
straidse @ pequene Cidade .de Freetown, que tem Governador:, Guar- 
nécéo -Militer, @ Officiaes-Civis necesavios. A Companhia Aftrieanarestds 
senhors-deste Commercio; e.em.1320 chegaya a poptulacio. da Colonia: 
a quatro. avil:-seigcentos o.tres. brancos, e¢ oito mik e setecentos.negsos: 
de ambos os sexosy cstevsquasi.4odos tamados.nos navios de Esceavatusa, 


— 


169 


“ow doze milhas, e nelles quebrava‘p-mar;, e era gran- 
-@issima a coreénte, com fortes mares: de enchente, e va- 
sante: chamdrao Ilha dos Baixos dquella Ilhoca; e além 
della cousa de vinte e quatro milhas ha hum Cabo, 
-que'nomedrao de Santa Anna, por ser descoberto a 26 
de Julho. Este intervallo da Costa he de pouco fundo, 
e praias de aréa. Oe 
Setenta milhas além do Cabo de Santa Anna achd- 
rio outro Rio, que denomindrao das Palmas (1), por 
haverem nelle muitas palmeiras: a sua barra, ainda que 
‘parecia larga, era toda cheia de baixos , e de parseis., 
€ por isso perigosa. Do Cabo de Santa Anna a este 
-Rio he tudo praia seguida , e outras setenta milhas mais 
avante yvirao hum Rio pequeno, a que pozerdo nome dos 
_Fumos, porque quando o dercobririo se nao via outra 
““eousa'em terra, senao fumos (2), que fazifo os naturaes 
‘do Patz. Mais além vinte e quatro milhas pelas praiad 
descobriréo hum Cabo, que entrava muito pelo mar, ‘e 
sobre elle ‘apparecia hum monte aito, e assim ihe cha-! 
‘mdrio’ Cabo dé Monte (3). Cousa de sessenta milhaw 
mais adiante estava outro pequeno, e -baixo, o qual tam= 
-_ } 


t €2) O Cabo de Santa Anna acha-+se na Iatitude N. 7° 14!/, ¢ longiq 
tide 6° 42’,.¢ he a poota Occidental da. Ilha chamada pelos Portugues 
zes © Fasulho, e pelos Inglezes Sherbero, cuja ha he mui comprida, ¢, 
© sew extremo Oriental forma a bocca do Rio das Palmas, Ora como o 
Cabo de Santa Anna fica para o Sul do Rio, ‘a que os Descobridores’ 
chamdrio ‘de ‘Santa Maria das Neves, primeiro havifo elles descobrir’ 
aquelle, do que este; mas © contrario apparece nesta narragéo, pois 
_ Vitdo o Rio em 5 de Agosto, e o Cabo em 26 de Julho. Nao nos de- 
ve admirar simithante confusio, porque o individuo, que deo as noti- 
clag'a Cademosto, nem era homem do mar, pem podia conservar na me- 
sporia asepocas dos descobrimentos, as distancias dos lugares, ¢ ovtras mil 
circunstancias , que se escrevem hora por hora a bordo dos navios, para 
mio esquecerem. = SO - 
(2) He hoje o Rio das Gallinhas na latitude N. 7° 5’. Este Rio he 
i286 pasa lanchas. 
(3) Situado na latitude N. 6° 55’, e€ longitude 7° 24/. 
| 22 












ytpinedt ona qui pe wine raters “. 
varvords ; como re in on ee | 
| douse een ane Y 









com en entedonts ao pescoco, € 1; par 
ser de homens. Os) interpretes fallirso- Jhes 1i aiowe 
mon » Negron qu bio» hue dan C ins ac “OS. 


ae 
\ 


174 


em outra gle ambos fallavao; e ElRei o ntahdou trans: 
portar alguns mezes depois em huma Caravela ao mess 
mo Rio, onde féra tomado, e bem satisfeito das. ‘da 
divas que levava. ; 
« 1463 — Sendo ElRei D. Affonso avisado (1), que 
a Cidade de Tanger podia ser surprehendida por hurti 
lugar, onde a muralha era mui baixa, e ponco vigtas 
da, deterniinou achar-se em pessoa naquella facg4o, 
contra a opiniao do Conde de Vianna D. Duarte de 
Menezes., Governador de Alcacat, que sobre isso Ihe 
eacrcveo, pedindo que com dissimulacio lhe mandasse 
algum reforco de tropas, sem. alvorocar os Mouros com 
a. sua ida, e que elle se obrigava a conseguir a enypres 
ga. As intrigas, e artificios do Conde de Villa Real, 
inimtigo do de Vianna, fizerao regeitar os ‘seus conses 
hos, e‘entregar dquelle a direcc20 do negocio, recev 
bendo logo adiantado, d custa dos bens da Coroa, 0 
premio. dés services que promettia fazer. . 
_ ° &m consequencia deste arranjamento , passou a 
Gere de Villa Real a Geuta, e desta Cidade a Tart 
fa ,‘onde se etobarcou para Tanger, e por slgumas pes 
seas que mandou desembarcar de-noite, soube que a 
murallia estava ainda ao mesme estado. Com esta ndtis 
cia, que perticipou a EiRei, foi a Gibraltar ( que -os 
Hespanhoes huviae tomado aos Mouros no.dnne anten 
cedente) , e alistando alli gente de guerra, voltem.a Ceuw 
ta com cento e cincoenta cavallos, e quatrbcentes ho- 
gaens de pé. O concerto entre ElRei ¢ elle era este: 
Que no dia em que ElRei epparacesse no mar :defron- 
te de Tanger, chegaria o Conde por terra sobre a Ci- 
dade, para auxiliar a escalada, € impedir os socgorros. 


(1) Vede Ruy de Pina na sua Chronica desde Cap. 146 até Cap, 156. 
— Atenheiro nas suas Chronicas, Cap. 23, que concorda vos factos 
princisaes. —- Danviio de Goes na Chronica do Principe D. Joao, 
Gap..47.. * : . : 7 eo a re é 

22 





172 
Porém ElRei tardow tanto em partir de Lisboa, que © 
Conde, el ancy ‘conservar mais tempo a gente s+ 
calagelee'p perigo dese descobrir o segredo; a des- \ 
Pvol Suir rave 
ap "EIReiy cu gem 4 Africa era ja ei ay 
mines reopen ¢ ol samc D. Be Fer 
ndo a 7 de Novembro de 1463, €a9 ¢ ota 
y onde achou o Conde de Odemita Ae peek os 
o Reino; e contra o parecer de todos os Oficiaey de 
pasties, ‘se fez 4 vcla com mao tempo, o qual 
gou. tanto, que foi aconselhado se recothesse a Silves, 
para salvar a sua pessoa, o que othe ne fazer: Sobre 
a noite dobrou tanto o vento, Os OS navios Cor= 
rérao grande iieco cde be perder, 'e é os mais delles -alij 
—— ao mar, excepto o navio em que hia ‘ElRef 
nao consentio se a e cousa alguma. ~Perdeo-se 
nea pe ree © Nnavio ar Affonso it : 
poser tte r. re a gente , e sogobrou 
ravela, em oe aomheo: Lourengo de Guimaraes, e 
Vogado, Escrivaes da Fazenda ~ ElRei, aaa 
doso , — — e o Rei de Armas Por- 
tugal, la 10,4 00 tempo . Seagin, 
Elite com b Infante Dz ndo diante 
e conhecendo o Conde de Vianna ‘o navio pen Bae 
darte Real, the veio fallar ao mar, edalli 
para Ceuta, em cuja Bahia se ajuntirao no a 
os navios da sua Armada, todos destrocados; x 

























agradecerem @ Deos o terem escapado do naufra 
crido infallively forao em procissto descalgos vi 
Senhera de’ Africa © Duque de Braganga com seus’ fi 
lhos,, e todos os mais Fi 

, De Ceuta eed ElRei a Alcagar, havendo rin 








173 

expedico Luiz Mentles de Vasconcellos , Fidalgo mui- 
té"intefligente nas cousas maritimas; e elle. marchou 
pol tet. com o Infante D. Fernando, o Mestré¢.d’Aviz 

. Pedro, 6 Duque, e todos os outros Fidalgos, e o 
résto das tropas. O Conde de Vianna contradisse 0 ata- 
que’ por mar, pela incerteza, e perigos que tem similhan- 
tes combinacdes; mas nao foi attendido. ElRei chegou 
a Tanger huma hora antes de amanhecer, sem ser sen- 
tido, porém as Galés n4o podérao realizar o desembar- 
que, pela furia do mar; esendo a final vistas pelos Mou- 
ros , dispardrao estes a sua artilheria, e accendérao mui- 
tos fachos. ElRei, crende que a Cidade era entrada, 

r ser aquelle o mesmo signal que neste caso tinha 
ordenado a Luiz Mendes, que fizesse, marchou para 
ella., e em breve se desenganou do seu erro; e voltan- 
do-se para as pessoas que 0 acompanhavio, disse: Nao 
me deixastes crer ao Conde D. Duarte, por ventara 
se o fizera, esta.vinda se empregdra melbor. E reti- 
rou-se logo para Alcacer, donde partio para Ceuta com 
o Infante D. Fernando. Este passou outra vez, com li- 
cenca d' ElRei, para Alcacer, levando comsigo todos os 
Fitlelgos , menos o Duque de Braganca, e o Conde de 
Villa Real, 2 fim de se achar em huma entrada que o 
Conde.de Vianna hia fazer no interior do Paiz, 2 qual 
teve. lugar no dia 4 de Dezembro; e ainda que custou 
alpum sangue, recolherao-se com duzentos e vinte ca- 
tivos, e grande quantidade de gado, de cuja preza o In- 
fante tomou para si o quinto, que pertencia .z0 Conde 
como Governador da Praca ; ElRei 0 satisfez depois pe- 
la Fazenda Real. 

Durante a demora de ElRei em Ceuta, emprehen- 
deo o Infante, sem seu consentimcnto , o assalto de 
Tanger, e para este effeito sahio dé Alcacer a 19 de 
Janeiro de 1464, sem levar comsigo o Conde de Vian- 
na , porque lhe contrariaya 0 projecto, e¢ foi escalar a 










































































esta [oedema “as boas 
acabdrdo de resolver ElRei 2. tentara 
© sComegario-se logo a” 





tro, e: fora.da ino , € a f 
—_—, de guerra, € de boces 





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artir, , Soube = EIR a 0 
seu tinh mori em 


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Cop Sraavi¥ 4 pm. bam 


OF O Conde de Warvic, foo Chef de Pardo oe ras ci 
vis de ra entre as Casas de Yor : “— im 





177 © 


cifico da Inglaterra ; successo que reduzia o negociv a 
huma transacgio diplomatica com a Corte de Londres, 
para obter a restituigao das prezas, como a final se ob- 
teve (1). | 

Desvanecida deste modo a expedig40 de Inglater- 
ra, tornou ElRei ao primeiro projecto; e como o Prin- 
cipe D. Joao, 4 forga de instancias, obteve licenga para 
a acompanhar (ainda que contra a opinido do Con- 
selho), ndo querendo acceitar a Regencia em que qtie- 
fia deixa-lo, nomeou ElRei ao Duque de Braganca 
D. Fernando , por Carta Patente dada em Lisboa a 2 
de Agosto deste anno, por seu Lugar-Tenente, para 
governar o Reino com a mesma aathoridade, que Elle 
teria , se presente estivesse , durante a sua ausencia, e a 
do Principe (2). 

No principio de Agosto entrou em Lisboa. o Du- 
que de Guimaraes, Commandante da Esquadra do Por- 
10, e das tropas das Provincias do-Norte, por quem’ 
ElRei esperava para sahir, mas sobrevindo ventos con- 
trarios, partio de Belem a 15 de Agosto, e dois dias’: 
depois ancorou em Lagos, onde ackou prompta a Es- 


© primeiro, que mandou construir hum mavio de guerra. Vece Hume, 
tomo 3. Cap. 26. . 

(1) Duarte Nunes de Leo (Cap. 40) relata este successo de outro 
modo, dizendo , que E!Rei se vingou dos Inglezes, dando Castas de 
Marca, para que cs Portuguezes podessem fazer preta nos effeitos a el- 
les pertencentes; e¢ que esta medida produzio tal consternacio, gueé 
Eduardo 1V. mandou Embaixadores a Portugal, de que se seguio total 
restituigde dos hens roubudos', ¢ pas, ¢ amizade com Portugal, até que 
Se unio com os Reinos de Castella. . 

(2) Vede a Historia Genealogica da Casa Real, tomo 5. Liv. 6. 
pag. 162, Onde vem esta notavel Carta, ‘e por ella se demonstra, que’ 
nfo ficou governandy o Conselho de Regencia, de que falla Damifo de 
Goes na Chronica do Principe D. Jofo; ‘nem podia a Princeza D. Leonor 
far na Regencia, por contar’ nessa epoca mui pouco mais de treze 
annos, : 


23 


















poe: 





ys tes! ot ei +S OE ja 
agos dilatou-se EKlRe 


-_. c ae f 


Petrechos : : e | srramentas “necessarias, nadia 

lia ‘se occupassem Os postos de tal —aag 
receber soccorro algum. Os ¢ 

sate, Seon (itaibe experiencia. fi fize 


‘id oem 








p=g-r 




















is! 
Ihe. disse: Filbo, Deos vos faga tio bom Cavalleire, 


como este que aqui jad. | 

Restava sé tomar o Castello, que era forte,.e bem 
guarnecido de gente, e munigdes. ElRei mandau loga 
commetter 4 escala, e correndo os Portuguezes ao as- 
salto com grande {mpeto, montdrio a muralha, e for- 
cdrfo os defensores a buscar abrigo nas Torres, onde 
poucos se recolhér’o, porque os de dentro fechdrio as 
portas, para evitar que os Portuguezes entrassem de 
mistura com elles; e sem quererem render-se, oppoze- 
rao to desesperada resistencia, que os mortos, e feri- 
dos de ambas as Nagées estavao em montes; e aqui 
acabou o Conde de Monsanto, de cuja morte irritados 
os soldados , nao derao quartel a ninguem. 

ElRei, e o Principe entrdrao no Castello, na maior 
forca do ataque das Torres, e se comportarz0 com des- 
temido valor, combatendo o Principe (que tinha dezeseis 
annos ) como se fosse hum simples soldado, de manei- 
ra que trazia a espada torcida dos golpes, e ensanguen- 
tada. Os Mouros, que ainda occupavao algumas Tore 
res , vendo tudo perdido, renderao-se a4 discri¢ao. 

O numero dos cativos passou dé cinco mil, em que 
entravdo duas mulheres, e hum filho, e huma filha do 

_ Moley. Xeque, senhor de Arzila (que depois subio ao 
Throno de Fés) ambos de tenra idade, cuja filha, e 
mulheres se trocdrao0 pelos ossos do Infante D. Fernan- 
do: eo filho mandou-o ElRei graciosamente a Moley 
Xeque. Morrérao dos Mouros mais de dois m.. Dos 

Portuguezes ignora-se o numero dos mortos, que de cer- 
@o foi grande. O despojo desta Praca,.que EJRei ce- 
«leo todo em beneficio do seu Exercito, avaliou-se cm 
*saitenta mil dobras (1); € para seu Governador nomeou 


(1) Damiio de Goes, e Garcia de Rezende (Chronica de D. JoiolI., 
Kop. 5.) dizem oitocentas mil dobras; Kuy de Pina, e Acenheiro di- 
zem oitenta mil, o que me fareceo mais provayel, 


16% , 
Gouda de Valence D. Henrique de Menezes, filho do 


illustre Conde de Vianna D. Duarte de Menezes. 
rs Mohey: Xeque, que neste tempo andava occupado 
fa guerra ‘civil de.Hés, avisado que EtRei D. Aftonsg 
estava sobre Arzila , ‘marchou a‘sqccorre-la; mas che 
gando a Alcacer Quibir, soube’ que. estava tomadai e 
Féeceando, que ElRei quizesse proseguir na guerra, e lhe 
obstasse ao’ projecto, que tinha formado dese fazer Ra 
de Fés, llie mandou offefecer treguas, as quaes se com— 
~elufr4o por vinte annos, com as clausulas que contio 
as nossas Historias. 

_ Os moradores de Tanger, aterrados com a tomada 
de: Arzila, e sem esperanca de soccorro pela guerra ci—— 
vil em que ardia toda a Mauritania, abandontrio a Cie— 
daite, € passdrdo-se com os seus bens para differentes == 
partes, de que avisado ElRei, mandou a grio pressa — 
tmarchar o Marquez de Monte-Mor com hum groso <— 
destacamento para occupar aquella Praca, como fez no <# 
dia 28, achando nella muita artilheria, e municdes de = 
guerra; e com 0 Principe, e.0 resto do Exercito o ve-—— 

uio de perto. Alli nomeou para Governador a Ruy de=a® 
Mello , que depois foi Conde de Odemiras e.derxando—— 
Ihe huma boa guarnigao; sahio a 17 de Setembro coma 
toda a Armada, e entrou em Lisboa a salvamento. 

1472 — Continuando a correr a Costa d’Africa ‘oss 
descobridores mandados por Fernato Gomes, descobrios=™ 
Fernio do Po (1), Cavalleiro da Casa Real, humatflha,; — 
que ainda hoje conserva o seu nome, nao obstante elle 
chamar-the llha Formosa (2), pelo aspecto que apre~ 
sentava 0 vigoso,.¢ Copado, que a cobria. toda. 


Ci) Vede Barras, Decada 1. Liv. 2. Cap. 2.— Antonio Gaivdo » 
pag. 25. - - Faria, Asia Portugueza, tomo 1. Parte 1.— As noticias 
de todos estes Escritores sio muito escacas. ' 

" (2) Beta iba he muito alta, e tem o ancoradouro em huma Behiz 
da banda do N.O. com fundo de vinte bracas. A sua latitude S. to- 


$63 


Outros Navegantes Portuguezes, de quem se igno- 
rio of nomes ,- descobrirao. neste meamo.aano 2s-F)has 
de S. Thomé, Principe (1), e Anno Bom .2); e hum 
F. de Siqueira , Cavalleira da Casa Real, descobrio 
neste anno, ou no seguinte o Cabo de Santa Cathari- 
na (3), ultimo termo a que chegarao os descobrimen- 
tos no Reinado de D. Affonso V. , que falleceo em Cin- 
tra a 28 de Agosto de 1481. 


waloow 


mada na, Bahia he de 3° 34/, e a longitude de 26° 50’, . Outros ay 
signio-lhe differente posicio. Em tempos antigos tiverio os Portugues 
zee alli hum Ferte. « : a See ae _ 
(1) <A.ttha de S. Thome estd Leste Gesta cont o Rio de:Gabin} 
FRouco mais ow menos. O Porto he da banda de Leste, ¢ tem paugg 
undo; mas surge-se féra delle em cinco, e seis bracas, aréa,, com: abrie 
go dos ventos , menos da banda de Leste, que he perigosd,.No Forte 43 
Batitude N. he de 27’, € a longitude dé 25° 20/-40’. A Hha-do Ptin- 
exipe est$.na latitude N. de 1° 22’, ¢ longitude de 25° 37" 40" Terq 
Tham boos-Porto da -baadea de E.N.E., com -fundo -dé: cinco e- meig até 
seis bragas e mea na entrada, todo limpo. Antes de. chegar ao Porta 
tem duas Enseadas com bom funtlo, e capazes de muitos navios; ¢ 
smreis ‘outra da-parte de-Oeste- com quinze btacas te Finds 'Hntpo, e boa’ 
ageada. Em outro tempo tiravase grande interessé. destas dwas ‘Tihas, 

como direi adiante.. . me re 
. CG) Esta Iha he mui fertil , ¢ alta, Tem o ancoradouro dat banda 
do Norte, com fundo de aréa branca, e de seis bracas para cima. Law 
wseude S. 1° 25’, elongitude'z3° 454 5 | 
(G3). Latitude: do Cabo 29 79S: ,. 6 fohglude48@ ast i 5 


184 
re “eG 4“ & OSs a Os &, “Os “Oy Os “On 


PARTE PRIMEIBA. 


SEGUNDA MEMORIA, 


COMPREHENDENDO DESDE O ANNO DR 1481 
ATE’ AO ANNO DE 1521. 


RetnADO D’ Exrer D. Joxo II. 


| iF EPOCA em que este Monarcha subio ao Thro <««€ 
no, a fama das viagens dos Portuguezes fazia esqueces =C 
as dos Fenicios , Carthaginezes, Gregos, e Romanos ’ 
em quanto as vantagens commerciaes , que ellas produ-mt- 
ziao , erdo inferiores ao alto conceito, que tinhao for- —~- 
mado as Nacdes da Europa. Achava-se descoberta bu —#- 
ma grande extensdo da Costa Occidental da Africa ) 
mas faltavao nella estabelecimentos permanentes, 4 exsommxe 
cepcdo do Castello de Arguim, em que se concentras=as- 
se 0 tratico, que alguns navios soltos entretinhio con=—1 
os Portos, e Rios mais conhecidos: nem mesmo o Cas==- 
tello de Arguim se achava agora em situagdo capaz diiillle 
preencher similhantes fins, por se haverem ampliad © 
tanto os descobrimentos posteriores 4 sua fundacio, quam 
distava muiros centos de leguas do Cabo de Santa Cammt- 
tharina, ultimo termo a que chegou a bandeira Portumm- 
ucza no Reinado antecedente. 
EIRei D. Joio, que era dotado de huma alm 2 
rande , capaz de conceber, e combinar os mais vastc—s 
projectos ; que possuia assaz conhecimentos scientificos= + 
e sobre tudo o raro talento de conhecer os homens, dB< 








186 SS 
nao caus pequena confusio ads Historias dos Desco- | 
brimentos. | 

Conhecendo ElRei a importancia de formar ham 
systema, que contestasse a certeza, e legalidade das des» 
cobertas, pois que, segundo os principios de Direito Pu- 
blico praticados na Europa, o simples acto do deseo- 
brimento de hum Paiz conferia ao descobridor certos 
direitos de propriedade territorial , ow ao menos de 
tmonopolio exclusivo do Commercio; ordenou , qué os 
Commandanres dos navios commissionados para faze— 
rem descobrimentos, levassem a seu bordo, para os col-— 
Tecar nos lugares que descobrissem, huns grandes mar—— 
cos de pedra (a que se deo o nome de Padréesy, 
timh3o na frente as Armas Reaes, e nas costes ham 
treiro em Porruguez, e Latim, em que se relatava Ga 
fiome do Soberano, o do Commandanre do navio, ee 
atmo da descoberta, rematando o Padrao com h 
Cruz no alto. Alguns destes tem sido achados moder=—— 
Hamente , como em seu lugar direi. 

- "Tad occupado andava este Principe com 0 pensa——— 
Mento de regular, ¢ ampliar o Commercio AfricanO——-—") 
Que subindo a0 Throno nos ultimos dias de A de ae 
r48r, fez partir nos principios de Dezembro do n= 
fo anno a Diogo da Azambuja com huma Esquadr—ara 
ra ir fundar o Castello da Mina. E quando dep 
nheceo melhor a configuracao daquella Costa, e ag — 
Jidade dos seus Portos, percebendo a vantagem que 4 
Wha deS. Thomé tirava da sua posiczo proxima ao Rio 
de Gabio, fez toda a diligencia pela povoar, e nomec—8 
‘por seu Governador em 1493 a Alvaro Caminha (1 7), 
@ quem entregou os filhos menores de ambos os sexe, 
a se tirdtao aos Judeos Hespanhoes refugisdos eam 
rtugal no anno antecedente. Com effeito, aquella 1a 















“@) Roy de Pina, Chronica de D, Jovo If., Cap, 68. 


187 - 


em breve encontrou em si o Commercio da Costa da 
Africa fronteira (1), e chegou no Reinado sepuinte a 
hum ponto de prosperidade quasi incrivel. 


(1) Oclima de S. Thomé, por mui quente, e mui humido he 
mecivo aos brancos, sobre tudo nos mezes de Dezembro, Janeiro, e 
Fevereiro, que sio os ce maiores calores: nos de Marco, e Setembso 
gostuma chover muito; ¢ nos de Maio, Junho, Julho, e Agosto, em 
gue rejnie os ventc$ do segundo, ¢ terceiro quadrante, he o tempo 
mais fresco , e saudavel. Em geral he raro o homem branco, que pas- 
va de cincoenta annos de idade, As doencas usuaes sdo febres gud, 
e dysenterias ; ¢ os Europeos, quando alli se estabelecem, tem quati 
sempre no principio huma grave enfermidade , de que muitos morrem, 
No anno de 1520 continha a Capital de S. Thomé perto de sete 
‘centas familias de Porruguezes, Hesparthoes, Francezes, e Genovezes, 
‘a maior parte casados, alguns delles com negras livies naturaes da ter 
te, ¢ alguns com mulatas; porque a tedo o Eoropeo, que hia estabe. 
decersse na Hha, assignava o Feitor d ElRei por via de compra, e ¢ 
preco commodo, aquella porcdo de terreno inculto, que elle podia cul- 
tivar, sequndo os meios que tinha para comprar Os escravos necessa- 
tios , pois que estes fazido todos os trabalhcs rutaes. ‘ 
Q genero pripcipal desta Ilha Cbem como da do Principe) efa 
D.awacar, cuja cana tardava cinco meves a amadurecer; e nao obstam- 
te acharese em cultura sé a terca parte della, existido em plena actis 
vidade sessenta Enzgenhos, huns movidos por agua, outros por cavalb 

» © outros a forca de braco , importando o dizimo da Fazénda Real 
de dore a quatorre mil arrobas de assucar cada anno; por’ ride fée 
calcular-se a colbeita em cento e cincoenta mil arrobas , attendendo aes 
Wscaminhos ¢ fraudes. Este assurcar nio era tdo seco, ridm tio al¥d 
como o que naquelles tempas se fabricava na Iha da Madvira: : a 

Akm do assucar, fazia esta Ilha hum grande Commercio em @icras 
tos, porque hella vinhfo reunitse quasi todos os ge os Pdértuguezes 
compravio pelos Portos de Guiné, de Fenin, e Manicongé: stim of 
moradores provido-se dos que necetsitavio para o set sérvico dotnesti- 
co, ¢ para a Agricultura, ¢ erdo tantos, gue maitos Laeratlotes pose 
hid de cet atd trezentos de ambos os sexos; 0 resto délles’ passava 
para a Jiha de S. ‘T'iago, onde convorrido a compta-los 6s navies Hes. 
panives, que commerciavio com as Indias Occidenthed. Esta ulritna 
Ilha servia de escala, e depositd entre 8. Thamé e Lisbor: ac embrirs 
tandes Portuvirezae , qué transportardo a §. ‘Thotmé os generos da Furoe’ 
Fa, tocavdo em S. Tiaco, deixavao alli as vezes parte dos seus effet- 
tos, e hido a 5, Thome casregar de assticar para Portugal. Os Negocian- 

24 


189 


Oriente, era visivel , que se os Portuguezes descobris- 
sem huma facil communicagao por mar ccm a Asia, e 
alli fizessem bons estabelecimentos nos pontos mais cone 
venientes , todas aquellas riquezas reverteriao para as 
suas maos, e Portugal viria a ser o centro do Commer- 
cio, nao sé da Europa, mas de todo o Mundo, como 
aconteceo no seculo seguinte. 

Duas cousas pareciao necessarias para pdr em execu- 
Zo este vasto plano: adquirir nogdes mais exactas so- 

re a Hydrografia do Oriente, de que quasi nada se sa- 

bia, e aperfeigoar a Construcgao Naval, e a Sciencia 
Nautica, de que dependia a sepurancga de viagens tao 
remotas por mares desconhecidos. 

Para achanar o primeiro obstaculo, mandou E]Rei 

r terra 4-India no anno de 1487 a Pedro da Covi- 
Ins , Cavalleiro da sua Casa (1), ¢ Affonso de Paiva, 
homens intelligentes , capazes de observar, e de expli- 
car © que vissem, Os quaes visitdrdo os principaes Dor. 
tos do Oriente , que servido de escalas ao Commercio, 
como largamente trat2o os nossos Historiadores; mas 
as noticias , qe por este meio tarde'se obtiverao, nao 
abrirao aos Portuguezes o caminho da India; outros 
principios produz{rao este feliz resultado. 

A Astronomia, e a Geografia vierao em soccorro 
da Arte Nautica, e destrufrao.o segundo e maior ob- 
staculo. Achava-se neste tempo em Lisboa o Astrono- 
mo Martim Bobemus, digno discipulo do celebre Joao 
Muller (2), com o qual, e os Mestres Rodrigo, e José, 


(1) Ruy de Pina (no Cap. 21 da Chronica de D, Judo I.) cha 
ra the Jodo da Covilha , e colloca esta jornada no anno de 1486; a 
Fua nassacso he mui differente da de Jodo de Parios (Decada1. Liv. 3. 
cap. $-), onde se péde ver toda esta importante transaccio, que eu sd 

ico. 

(2) Vulgarmente chamado Regio Montano, que falleceo em 1476, 

pois de publicar hum novo Calendario, e humas Ephemerides para 
“Ssinta annos, com Taboas das Declinacdes dos Astros, 


190 

ambos Meditos da Real Camara, o Bisa de Ceuta 
Diogo Ortiz, eo Licenciado Calgadilha, Bispo de Vi- 
zéu, formou Fie: huma Junta de Mathematicos, cue 
jas Sessdes se tinhio em casa de Pedro de Alcacova. 
Paréce que aos traba'hos destes Sabios se deveo a in- 
Yensio do Astrolabio ,-o melhoramento da Bussola, e 
Cartas Maritimas-Planas (j4 inventadas na escola de 
Sagres), e a formag4o, ou aperfeigoamento de novas 
Taboas de Declinacgdes dos Astros. | 

Estes conhecimentos Nauticos, vulgarizados entre os 
_ Navegantes Portuguezes, os habilitirko para emprehen- 
der quaesquct viagens, afastando-se da rotina antiga, 
que era sufficiente para descobrir a Costa da Africa 
Occidental porque serido esta seguida do Norte para 
0 Sul, logo que huma embarcagio via hum ponto jd 
conhecido, bastava que seguisse por hum rumo paralle- 
lo; e¢ se perdia a terra de vista, mettendo a préa a 
Leste, a achava outra vez. Agora porém que os Nae 
vegaintes tinhao instrumentos, e principios scientificos 
para determinarem cada dia a posicao dos Navios no 
alro mar, e dirigi-los para hum ponto qualquer, po- 
dido rodear toda a Africa até descobrir alguma passa- 
gem para a India. 

Trabalhou-se igualmente em melhorar a Archite- 
ctura Naval: construirio-se navios mais fortes, com 
huma mastreagao mais bem entendida, e com maiof 
pordo para receberem viveres, e aguada sufficientes a 
huma longa jornada; e andava ElRei tao embebido 
nestas idéas, que quando Bartholomeu Dias voltou da 
trabalhosa viagem, em que descobrio o Cabo de Boa 
Esperanga , 0 encarregou do corte das madeiras, e con- 
struccio dos navios, que intentava mandar ao descobri- 
mento do Oriente, julgando com razao, que hum Off- 
cial, que acabava de experimentar as tempestades, € pe 
rigos daguclles mares inccgnitos, era quem podia mare 


191 


tar a forca, e qualidade das embarcagces capazes de os 
arrostar e vencer (1). 

A morte nan deo o tempo necessario a este Grane 
de Monarcha para comegar aquella gloriosa expedic3o, 
que a Providencia reservava para o seu teliz Successor, 

Foi Capitao Mor da Frota, durante o seu Reina- 
do, o Conde de Abranches D. Fernando de Almada; 
por Carta passada em Béja a 14 de Marco de 1489, 
em confirmacdo de outra d’ElRei seu Pai, datada de 
Evora a 28 de Fevereiro de 1456. 

. Nos ultimos annos da sua vida mandou ElRet 
construir huma Ndo de mil toneladas, a maior que até. 
alli se tinha visto, t8o forte de costado, que as balas 
nado a podido passar; a qual fez huma sé viagem, com 
outros navios 20 Mediterraneo (2). Foi tambem obra 
sua a Torre de Caparica (Forre Velha), que guarneceo 
de muita artilheria; e tinha dererminado levantar huma 
boa Fortaleza na ponta de Belem, onde depois se fez 
a Torre de S. Vicente; de cuja Fortaleza desenhou a 

lanta Garcia de Rezende. .Estes dous Castellos ergo. 

ra defender a passagem do Rio de Lisboa para a 
Cidade, e entre elles devia collocar-se aquella grande 
Nido, como bateria fluctuante, que j4 com esse intento 
foi construida. 

Considerando ElRei, que para guardar o Estreito, 
e as Costas de Portugal contra os Corsarios de Barbe- 
ria, despendia muito nas Esquadras de Ndos, que todas 
@s annos armava, ideou guarnecer as Caravelas de ca- 
nhées de grosso calibre, que atirassem tiros razantes; 
e como efa engenhoso em todas as Artes, ¢ muito in- 
struido na artilheria , achando-se em Setubal, fez varios 


(1) Segundo Castanbeda (Liv. 1. Car. 1.) a madeira foi cortada, e 
lewada para Lisboa no ahno de 1494- 

(2) Wede a Chronica de D. Joao I. por Garcia de Rezende, nos 
Capitulos 147, e 181. | 


192 


ensaios , ¢ experiencias, e por fim péz em pratica o seu 
novo plano; e as Caravelas pequenas e ligeiras acha- 
rio-se em estado de combater, e resistir aos navios de 
alto bordo, e muitas vezes os rendéra0; porque as ba 
las destes , além de serem de pequeno calibre (ainda se 
ndo usava entao de artilheria grossa no mar), passavao 
or alto, e as balas das Caravelas furavao os navios ao 
ume da agua, e Os mettiao a pique. 

Forio por muitos annos tao temidas as Caravelas 
Portuguezas, que nenhuns navios, por grandes que fos- 
sem, as Ousavao esperar, até que as outras Nacgdes mu- 
@drdo de systema. 

1481 — Na conformidade do plano, que ja tinha 
formado para se assegurar do Commercio da Africa Oc- 
cidental, determinou ElRKei mandar construir huma For- 
taleza_ na Costa da Mina (1); e pondo este nego-io em 
Conselho , votario contra elle muitos Conselheiros, ten- 
do a empreza por arriscada, e até por impossivel, mas 
as suis razces nao fizerao impressdo no animo Real; e 
apezar de tudo, fez preparar, a grao pressa, huma ex- 
pedic#o composta de dez navios de guerra, duas gran- 
des Urcas (ou Charruas), e outras embarcacg6es de 
transporte, em que se embarcardo quinhentos soldados, 
e cem Mestres pedreiros, e carpinteiros, muitos mane 
timentos, e artigos de Commercio, municgdes, madei- 
ras, cantaria lavrada, ferragens, cal preparada, ferra- 
mentas, ¢€ todos os materiaes que se julgarao necessarios 
para construir hum bom Castello, com as suas offici- 
nas, € accommodagdes competentes. 

Para General deste Armamento nomeou ElRei a 
Diogo da Azambuja, Cavallciro da sua Casa, de gran- 
des calentos, ¢ experiencia: erio Commandantes dos 


(1) Vede Ruy de Pira, Chronica deste Rei, Cap. 3. — Galvio, 
Tratado dus Descobrimentos, paz. 26. — Earros, Decada 1. Liv. 3. 
Cap. a. — Varia ¢ Sousa, Asia Powtuzueza, como 3. no fim. 


193 


outros navies de guerra Goncalo da Fonceca, Ruy dé 
de Oliveira, Jodo Roiz Gante, Jodo Affonso , Jodo de 
Moura, Diogo Roiz, Bartholomeu Dias, Pedro de Evo- 
ra, e Gomes Ayres, todos homens nobres; e das Ursas 
Pedro de Cintra, e Fernao Affonso. ; 

A 12 de Dezembro deste arino de 1481 sahio de 
Lisboa .Diogo da Azambuja com a sua Esquadra, ten- 
do feito. partir adiante Pedro de Evora, comboiando os: 
navios de transporte, com ordem de fazer pescaria na 
grande Enseada, que fica ao S,E. de Cabo Verde, pa- 
ra provisio da Esquadra , e aguardar alli por elle. Pe- 
dro de Evora nao s6 cumprio o que lhe era encarrega@= 
do, mas.assentou pazes com o Regulo Bezeguiche, 86. 
berano daqnella Bahia, que por muitos annos consefvou 
o nome de Angra de Bezeguiche, e- parece ser a da Ilha 
da Goréa, cujas pazes contirmou Diogo da Azambuja; 
que a 24. de Dezembro re reunio 4 Esquadra, . - 7 

Levava elle instrucgées,: para que na. Costa da. Mix 
na, comprehendida entre o Cabo dag Tres. Pontas ¢ o 
Cabo das Redes (1), construisse hum Castello no- to~: 
cal, que lhe offerecesse melhores proporcOes para am< 
pliar, e proteger o Commercio naquelles Paizes ricos: 
de ouro, e de. outros artigos preciosos,; 5 ss are 

NZo querendo por consequencia confiar de pessoa 
alguma hum objecto de tanta importancia, qual a esco>: 
Jha de similhante ponto, adiantou-se da Esquadra, e foil. 
reconhecendo , e examinando toda a Costa até chegar 
Aldea das Duas Partes, em que surgio a 19 de Janeito: 
de 1482; e aqui achou a Joao Bernardes , Commandanst 
te de hum navio d’ ElRei, que estava negociando comm 
os Negros, de quem ja tinha recebido boa porcao de 


(1) Este Cabo chama-se hose Monte do Diabo , situado na latitude. 
N. 5° 28’, © longitude 13° 23’, obra de vinte legcas a leste de S, Jor. 
ge da Miua. | ’ 


29 


196 


A era Forraleta chamou ent3o Diogo da Azam- 
\ buja Castello de S. “forge da Mina (constituida de- 
pois Cidade pot Carta de is de Margo de 1486), fix 
cando aclle 'por Governador. sémente com sessenta ho~ 
mens de guarnicio, déspedio o resto da Esquadra pa- 
ra Portugal. © | 
Passados dois annos e sete mezes do seu Governo, 
o chamoa ElRei- a’ Lisboa, e sem esperar que elle Ihe 
fequerésse , premiou os s¢us relevantes servigos com % 
Magnanimidade, que costumava, | : 
1484 -~+ Neste anno mandou ElRei a Diogo Canr, 
Cavafleiro da sua’ Casa, a proseguir o reconhecimenté 
da Costa Occidental da Africa, dando-lhe tres dos noe 
vos Padrdes para os collotar nos lugares mais notavets 
que descobrisse (1). 

'  §ahio Diogo Cam de Lisboa, ndo se sabe’ em que 
dia’; ou- mez daquelle anno, com-derrotd ao Castello 
da Mina, para se prover do qué necessario lhe fosse; ¢ 
seguindo delle pata 6 Sul, dobrou o Cabe de Eopu 
Goncalves (2), que conserva o nome do seu Descobris 
dor, e:além do Cabo de Santa Catharina continuou 4 
seguir a Costa, desembarcahdo em alguns pontes, a 
que chegou a hum largo Rio, em que entrou, e surgid 
hum pouco dentro da sua boca, onde da parte do Suk 
assentou huna dos Padrdes, que levava, chamado S.: Jor 


RC (3). : 


(1) Vede Faria, Asia, tomo 1. Parte 1, — Barros, Decadat. . 
Liv. 3. Cap. 3. —- Ruy de Pina, Cap. 57, pde esta viagem no‘antid 
ate 14385.- 

(2) Este Cabo estd situado na latitude S. de 0° 56’, e longitude 
27° 477; ¢ he tao raro, que as arvores parecem sahir do mars a roda 
delle he o fundo mui limpo. - Da parte de Leste tem huma Enseads;, 
onde se pdde ancorar em oito, ot dez bracas;-e da banda: do Norte hd 
outra grande Bahia ccm bom fundo, mas tem hum baixo’na entrada.. 
-°€s) Nacerelle tempo davieese nomes aos Padrées, talvez pata que 
ficassem acs lugares oride se assentavao: 

25 il 


196 


Este Rio era o Zaire (1); assim homeado pelds na- 
turaes: os Portuguezes lhe chamarao Rio do Congo, por 
atravessar o Reino deste nome; e por muitos annos foi 
tambem conhecido pela denominaga4o de Rio do Padrao. 
- - Diogo Cam, vendo as margens do Rio mui povoa- 
das, nao ousou aventurar-se a penetra-lo, e procurou ti- 
rar informagao dos habitantes, que erio Negros azevi- 
chados, e em tudo o mais similhantes aos outros daquel- 
Ja Costa; porém os Linguas, que tinha a bordo, mesmo 
os que colhéra naquella viagem, nao os entendérdo, e 
por acenos se percebeu, que tinhao Principe poderoso , 

e habitava tantos dias de jornada pela terra dentro. 
E como ElRei lhe ordenava nas suas Instrucg6es, que 
procurasse ganhar a confianca daquelles Povos, a fim de 
Os persuadir a abracgarem o Christianismo, e a estabele- 
cerem algumas relagdes commerciaes com os Portague- 
z€s, € a0 mesmo tempo lhe parecério homens pacifi- 
cos, e de ta0 boa fé, que vinhao sem receio a bordo do 
seu navio, escolheo alguns Portuguezes intelligentes , 
pelos quaes mandou ao Rei hum presente, indo acom- 

anhados de alguns naturaes, ganhados por dadivas que 
fies fez, para os conduzirem a Cidade em que assistia , 
e marcou-lhes certo numero de dias para tornarem ao 
navio. Entretanto continuou a viver na melhor harmo- 
nia com os Negros, que o vinhio visitar, e fazer tro- 
cas de alguns generos. 


(s) O Zaire, ou Rio do Congo tem mais de duas Jegoas de iar- 
go na boca, e traz tata copia de agua, que entra doce pelo mar den- 
tro o esnaco de tres legcas, A ponta do Norte da sua entrada chama-se 
Ponta da Palmeirinha, e esta situada na latitude S. de 6° 8’, e longi- 
tude 29° 5’. A ponta do Sul chama-se da Mouta Seca, porém todas 
as Cartas lhe dio haje o nome de Ponta do Padrio, ainda que Diogo 
Cam assentou o seu Padrio mais de huma legoa distante della pelo Rio 
dentro. O Capitio Inglez Maauall subio por este Rio quarenta € cinco 
legoas, e diz que he navegavel por mais quinz, Ou vinte; © que os 
maiores navios podem entrar nelle. 


197 


-*Passatido-se porém dobrados dias, sem os seus men- 
sageiros voltarem , nem havendo noticia delles, determi- 
nou repressar a Portugal, e colhendo quatro das natw- 
_ raes para os levar a ElRet D. Joao, sahio do Rio, di- 

zendo por acenos aos outros Negros, que dalli a quinze 
‘Luas os tornaria a trazer, e que em refens delles , |hes 
deixava os que levdro o presente. 

Succedeo que estes quatro Negros erao homens 
principaes, e mais civilizados, e assim aprend ér30 com 
tanta facilidade a lingua Portugueza , que quando che- 

4rfo:ao Reino, podério dar boa informag4o do séu 
Paiz, oO que causou..a-K]Rei grandissimo prazer; e pa- 
ra que nao houvesse falta na promessa, que Diogo Cain 
fizera de os reconduzir 4:sua patria dentro daquelle Ia- 
pso de tempo, o fez partir segunda vez para Congo. 

1485 — Sahio de Lisboa Diogo Cam (1) por Com- 
mandante em-Chefe de alguns navios (2), levando hum 
Embaixador, que ElRei D. Jodo mandava ao de Con- 
go com ricos presentes, para estabelecer entre ambos 
amizade, e commercio, e o persuadir a abracar o Chri- 
stianismo. Levava igualmente bem vestidos , e trata- 
dos os Negros, que trouxera; e chegado ao Zaire, 
foi o Embaixador de Portugal recebido com grande al- 
voroco pelo Soberano, vendo que se lhe restituiao os 


(1) Vede Faria no lugar citado. — Ruy de Pina, Capitulos 57, e 
$8. — Galvio parece confundir estas duas Viagens em huma sd;5 
pag. 26. — Barros no lugar citado diz, que Diogo Cam chegou a Lis- 
boa, de volta da sua primeira viagem, no anno de 14865; por conse- 
Guencia so neste he que poderia eniprehender a segunda 

(2) Ruy de Pina (Cap. 57) diz, que ElRei caviou sua frota erm 
da, ¢ provide para muito tempo; ¢ no mesmo sentido falla em outros 
Jugares, Barros, e Faria nao lhe dio mais de hum navio: eu segui a 
opiniio de ‘Ruy de Pina, nado sé por ser hum Escritor da maice autho- 
sidade nos successos do seu tempo, mas por me’ parecer natural, cue 
EJRei mandasse hutna forca naval capaz de fazer a sua Pandeira tio’ 
sespeitada, como desejada a sua amizade por aquelles Povos. 


1399 


marem os ‘Negrds a servir-se dos bois na cultura das 
terras. Com este Embaixador enviou a Portugal mui- 
tos mancebos de boas familias, rogando.a ElRei os 
mandasse baptizar, e ensinar tudo quanto fosse neces< 
sario para poderem doutrinar os Povos quando voltas- 
sem a Congo. . _ 

. - Com isto se recolheo Diogo Cam a Portugal, on- 
de chegou no anno de 1489, e foi recebido d’ ElRei 
com as honras, e mercés, que costumava liberalizar aos 
Vassallos benemerites. = =~ 

. 1486 —..Neste anno (1) descobrio Joao Affonso dé 
Aveiro o Reino-de Benim, :situado além da Mina, cuju 
Capital estava sobre hum dos bragos:, em que se divide 
of Rio do mesmo’ nome, em que-elle surgia, e parece 
que antes havia-entrado no Rio dos Escravos (2). Des~ 
te Paiz trouxe Jodo Affonso a primeira pimenta dé 
Guiné , que appareceo em Portugal. O- Rei enviou com 
elle hum Embaixador a D. Joao II., que o tratou con 
grande magnificencia, e€ o tornou a mandar a Benim 
com. ricos presentes, e Cartas para aquelle Principe, con- 
vidando-o a ‘abracar a Fe Catholica; e com elle forio 
Sacerdores , e tambem Feitores para'crearém humd Feis 
toria, que abrangesse o Commercio da piméntai-¢ 6 dos 
escravos, de que havia quantidade.§ Ge 
' Mas o Christianismo nao prosperou' naquelle Rei- 
RO, porque o seu Soberano so buscava aproveitat-se' da 
amizade. dos Portuguezes, para se fazer temido dos.stug 


(1). Barros ,.Decada 1. Liv. 3. Cap, 3. —- Ruy de Pina, Cap. 24. 
€2) O:Rio-de Benim , chamado geralmente Rio Formioto, ¢sti si- 
tasdo na latitude N. 5° 33’, e longitude 23° 5% Este Rio tem irae 
de duas milhas de largo, mas nio he capaz de embarcacées grandes, 
a sum altura ndo excede a treze pés. Pouco al’m da stra entrada 
div ide-se emi differentes bracos, e penetra muito pelo Paiz. O Rio dos 
Bscravos fica.ciaco legoas para o Sul do de Benim, e a sua entrada he 


perigosa. | 


201 


Africa de Ptrolomeu, e os descobrimentos dos Portugue- 
zes na Costa Occidental, inclinou-se 4 opiniao de ser 
aquelle Principe incognito o Preste Jodo; e foi de pa- 
recer, que continuando-se a reconhecer a Costa para o 
Sul, se chegaria a hun ponto, em que ella forcosa- 
mente devia mudar de direccao para Leste. Esta cone 
clusio era evidente, e em consequencia determinou El- 
Rei enviar logo pessoas intelligentes, que por mar, e 
por terra tentassem resolver aquelle importante proble-. 
ma. Como eu ja fallei dos que commettérdo a jornada. 
por terra, dire agora oO que fizerao os que forao por: 
mar. 

Nomeou E/Rei para Chefe desta expedic#0, compos-’ 
ta de dous navios de guerra de cincoenta toneladas (1),: 
e hum pequeno Transporte carregado de mantimentos, 
a Bartholomeu Dias, Cavalleiro da sua Casa, e abalizas” 
do Navegante: por Piloto do seu navio foi Pedto de 
Alemquer, e por Mestre N. Leitéo. Commandava o se- 
gundo navio Joao Infante, tambem Cavalleiro da Casa: 
d’ElRei; e era seu Piloto Alvaro Martins, e Mestre 
Joao Grego. No Transporte hia de Commandante Pe- 
dro Dias, irmao do Chefe; por Piloto Jodo de S. Tia-, 
go, e por Mestre Jodo Alves; todos estes Officiaes de 
Nautica fordo escolhidos entre os mais habeis. 

Bartholomeu Dias, sahindo de Lisboa pelo meado 
de Julho de 1486, dirigio a sua derrota ao Rio Zaire, 
e seguindo dalli para o Sul a Costa i reconhecida por. 
Diogo Cam, chegou a Angra do Salto (ignoro a posi-. 
¢do-desta Bahia), nome que the ficou por haver nella 
colhido este Descobridor dous Negros, que ElRei en- 
tregou a Bartholomeu Dias, para os desembarcar naquel-, 


(1) .Parecem-me estas embarcacdes de porte demasiadamente peque= 
no, se as toneladas naquelle tempo ero do mesmo peso, que sa0 hoje, 
© gue no pude averiguar. . 

26° 


202 


Je lugar , como fez; e€ para o mesmo fim Ievava elle 
quatro Negras de Guiné, das quaes deixou” huma (1) 
na Angra dos IIheos (3), onde parece que tambem dei- 
xou o Transporte dos mantimentos; e hum pouco ao 
Sul delle assentou em Serra Parda o primeiro Padrao 
chamado S. Tiago, e foi depois surgir na Bahia das 
Voltas (3), denominagdo que lhe dco, porque fazendo 


(1) O fim politico, por que ElRei mandava introduzir nos Paizes 
ainda mecognitos estes Negros, e Negras, todos bem vestidos, e com 
amostras de ouro, prata, e especiarias , era para dare idea da riquer 
de Portugal, ¢ das suas Armadas , e espallrarem fama de que trabalh2- 
va por descobrir a India, e os Estados de hum Principe chamado Preste 
Jodo, que se dizia occuparem o centro da Africa; pois que desta ma 
nefra talvez Iheechegasse 14 a noticia destas cousas,; e mandasse alguns 
rutnsageiros 4 Costa do mar, onde os navios Pertuguezes, que por ella 
tracavdo , teria communicacao com elles. Estes Negros hido bem in- 
struidos no que havido de perguntar, e dizer, e ccm promessa de os 
irem depois buscar dz Portugal , por sereim estrangeiros naquella Regiio. 
Vede Barros no lugar citado. 

(2) Esta: Bahia estd Insm pouco ao Norte da Serra Parda, ou Rosto 
@® Pedra (como os Portuguezes ihe chamavio) , onde Bartholomeu Dias 
ceHecou o Radrao S. Tiago, Seira Parda fica na latitude S. 23° 37’, € 
longitude 32° 10’. Barros identifica a Bahia dos Ilheos com a Sema, 
sendd Jugares mui distinctos ; porque talvez se cria no seu tempo, que 
a Serra Patda era a ponta do Sul daquella Bahia, de que dista mais de 
tts legous. 

Ha outra equivocacao neste judicioso Escritor. Diz eHe , que Serra 
Paeda (Cap. 4. pag. 185) estava situada em 24° de latitude e cento e 
vinte legoas distante do ultimo Padréo, que deixou Diogo Cam ne 
Manga das Aréas, a qual pos em 22” de latitude (Cap. 3. pag. 175)5 
dé modo que a differznca entre estes dous Padrées seria de dous gros 
em: latitude , ou trinta e seis legoas daquelle tempo. Persuado»me be- 
vet agui-erro de impressao, 

No anno de 1786 Sir Home Popham, e o Capitio Thompsom , 
arfdando examinando a Costa Occidental da Africa, acharéo huma Craz 
d& matmerée em hum rochedo junto & Angra: Pequene, ne latitude S. 
26° 37’, a qual tinha as Armas dz Portugal, e huma inscripgio , que 
ji se no podia ler; € mostrava ser hum dos antigos Padrées. Clarke , 
fomo 1. Cas. 2. So 

- &3). A sua latitude S. 29? 20’, e longitude 34° 10%. Ha por aqui' 
recifes ao longo da Costa, que tem sido pouco examinada; . 


263 


muitos: hordos para montar:a ponta mais Austral da 
Bihia (que se chama ainda o Cabo das Voltas), ¢ nao 
eo pndendo conseguir, foi obrigado a entrar na Bahia, 
em que largou outra Negra., ¢ se demorou cinco dias. - 
_Sahindo dalli, deo-lhe hum N.O. rijo, com a 
qual correo 20 Sul ‘treze dias com as vergas arreadas a 
meio mastro, levando. grande receio dos mares, que 
the parecido orais soberbos que: os das Costas de Por 
tugal , e quasi affogavdo os. navios , que erd0 pequenos, 
e<azos. Abonancado ao tcarpo, nayegou com 2 prés 4 
Leste a buscar.a terra, cuidando que: ainda cerria de 
Norsre ao Sul, mas passados alguns dias sem. haver vise 
ta deite, tomou-o rumo do Norte , nao suspeitande 
ter j4-dabrado. o grande Cabo, qte procurava, e fou 
dar com buma Bahia, a que chamsou Angra dos Va- 
queires, e boje se chama das Waccas (1), pelo muite 
gado vaccum que apascentaydo alguns pastares. Negros, 
como os de.Guiné, os quaes fugirao levando o. pase 
apdés de si; ¢ como: ninguem entendia a sua linguagem, 
n4o se pdde tirar delles noticia algama. 
Continuando Bartholomeu Dias a. navegar paralle- 
Jamente a Costa, vio huma terrs alta, que fazza. dugs 
tap de aréa tathadas a-pique sobre o mar, © proxi-~ 
mo 3 ella hum Iiheo pequeno, e parecendo-lhe o lugar arc- 
commedado a0 seu. intento, assentou nelle o Padsip 
chamado.da Cruz (2), de que resultou ficar-se-lhe cha- 


{3 


(1) Esta Bahia das Vaccas fica da banda de Leste do Cabo do meee 
mome , situado em latitude S. 34° 30’, e longitude 39° 55.2 “A 
tem heme legoa de seio, com 8 e nove bracas de fundo, e abriga dos 
Ronentes. . | 

(2) ©O Iiheo -da Cruz, situado na latitude 33° 39, ¢ longitude 
4$°2', he onde Bartholomeu Dias levantou o Padrio chamado da Cruz, 
ainda que Manoel de Mesquita Perestrello Ihe chama de S. Gregorio, As 
das pontas de anda, gue lhe ficdo. fronteiras na terra tirme, chamdo-se 
ainda Poatas da Padrdo. : 


626 


205 


ra-se em que lugar), e seguio em demanda do Porto 
em gue deixdra o Transporte, a que c hegou nove mezes 
depois que delle se separdra. De nove individuos, que 
compunhao a sua equipagem, havido morrido seis, ¢ 
‘dos tres que restavado vivos, falleceo de gosto, 4 chega- 
da dos dous navios, o Escrivao Joao Colasso, que se 
achava em muita debilidade. As mortes dos outros fo- 
rZo causadas pela imprudencia de se confiarem dos Ne- 
gros da terra, com quem faziao algum commercio , os 
quaes se aproveitdrdo d’ huma occasiao opportuna para 
Os assassinarem. 

Bartholomeu Dias , recolhidos os mantimentos ; 
queimou o Transporte, que estava comido do gusano (1), 
e continuando a sua derrota, ancorou na Ilha do Prin- 
cipe , onde achou doente a Duarte Pacheco, Cavalleiro 
da Casa d’ ElRei,. que tendo sido mandado por Com- 
mandante de hum navio a descobrir os Rios da Costa, 
ficdra naquella Ilha por nao se sentir em estado de ir 
executar a sua Commissdo;; e enviando entre tanto 0 na~ 
vio a fazer algum trafico, naufragou este, salyando-se 

rte da gente, que tambem alli se achava. Bartho- 
omeu Dias, recebendo todos a seu bordo, passou pelo 
‘Rio do Resgate, e Castello da Mina, cujo Governador 
Joao Fogaga lhe entregou o ouro que tinha negociado; 
e seguindo seu caminho para Portugal, entrou em Lis- 
boa em Dezembro de 1487, havendo dezeseis mezes e 
dezesete dias que daqui partira (2). 


(1) Os navios Portuguezes nao ergo forrados naquelles tempos, e s6 
© fordo depois da descoberta da China, onde ackdcdo acuella invencio; 
e a outra do sahimento da pdpa, que nas Ndos se chama Jardim. 

(2): Deve sentir-se , que nao exista o Diario desta celebre Viagem 
t4o superior a todas as antecedentes ! E que Jodo de Barros, cue pare- 
-€e 0 teve presente, nao fiasse delle ham mais extenso, e mais bem or- 
denado extracto! Com effeito custa a acreditar (e he com tudo verda- 
de), gue devendo Portugal 4 sua-Marinha a melhor parte da gloria, ca 
xiqueza, © da grande consideracio a que chegou ,desde este Reirado 


206 


1487 — Em Agesto deste anne sahie de Lishes 
‘,huma Armada de trinta navies, Jcvande mil hamens 
‘de Infanteria, ¢ cento e cincoenta de Cavallaria , alguns 
destes ultimos Criados d’ Hiei, e os outras hous Fee 
dalgos,e Cavaliciros. Estas embarcagdes armaraowe 
‘em Povos, e Villa Fraaca, por caysa da peste ear que 
ardia a Capital. Foi vor General da expedicie o Mon- 
teire Mor D. Dicgo de Almeida; e por seu successor 
no commando, em caso de vagar, D. Joaa de Ataide, 
flbo do Conde da Atouguia. Ipnora-se © fan seerete 
deste armamento (1), porque o Chronista -94 diz, que 
era para bum certo ardtl na Casta da Barbaria ; e 
gue este ardil se desacertou. 
Chegando a armada defronte de Anafe (3), man- 
dou D. Diogo espiar a terra, e sabendo que a duas le 
s de distancia estavdo alguns Aduares de Mouwros da 
nxovia. fez desembarcar de noite hum forte destace- 
mento de todas as Armas, que surprehendee on Adua- 
res por tal maneira, que quasi sem perda sua, catives 
quatrocentos individuos, entre homens, ¢ mulberes , mar 
tow novecentos , e tomou muitos cavallos, e outros de> 
pojos, com que D. Diogo se recolheo a Portugal. 
1488 — Andava EJRei com intentos de passar em 
ssoa 4 Africa (ou assim o dava a entender), e para 
iss@ fazia grandes preparativos ; e querendo enviar pri- 
meiro huma Esquadra forte, que levasse mil homens de 
Infanteria , e quinhentos de Cavallaria, todos Nobres, 
e escolhidos , para a qual havia nomeado por Generaes 
ao Capitio dos Ginetes Fernao Martins Mascarenhas, e 
ao Camareiro Mor Aires da Silva, estando a Esquadra 
prompta a partir, veio-lhe aviso da Barbaria, que esta- 


até ao de D, SebastiZo, seja a Historia da Meriaha a parte que se sche 
escrita con. menos conhecimentos professiqnaes ! 

(1) Vede Ruy de Pina, Cap. 27. 

(2) Jad fiz mencio em outro iugar desta Cidade , hoje agruinada. 


| 207 

v%0 08 Mouros sabedores da expedi ¢io. Mandou logo 
desatmar a maior parte dos navios, e fez sahir Fernae 
Martins com trinta Caravelas, é€ cento e cincoenta Ca- 
valleiros, Fidalgos da sua Guarda, com os quaes desem- 
barcon em Arzilla neste anno de 1488; e unido com 
_as tropas da sua Guarnic’0, e as de Tanger, fez huma 
entrada até além da ponte de Alcacer-Quibir, onde os 
Portuguezes ainda nao tinh4o penetrado, de que se ret 
colheo coh muitos cativos, e despojos (1). 

Esta pequena expedic¢io parece que foi emprehens 
dida com o fim de esconder o verdadeito objecto do 
prande Arthamento, que se prepardra. 

1488 -— Por este tempo corria mui prospero o Com- 
mercio, que os Portuguezes conservavao com os Negros 
Jalofos , que povodo o espaco comprehendido entre os 
dous Rios Senegal, e Gambia, cujo Soberano era Be« 
moy (2) homem prudente, e sagaz, que conhétendo ag 
vantagems que poderia colher do auxilio de Portugal, 
para realizar alguns projectos politicos, deo-se a cultis 
var a sua amizade. Para este fim abandonando o seftao, 
-veio estabelécer-se na Costa maritima, onde concorriad 
4s embarcagd¢s Portuguezas com cavallos, e outros pe- 
neros de muito valor; e tratava os Officiaes, e Feitores 
¢om o favor, e verdade, principalmente se erZo de na- 
vios d’ EJRei, a qiem mandava alguns presentes dé 
gousas curiosas , que este Monarcha acceitava, e retri- 
buiz com outros. E como ouvio dizer, que Bemoy ti- 
nha hum juizo claro, efiviava-lhe mensageiros pata o 
petsnadiresn 4 deixar o Mahometismo, e abragar a Re- 
igido Catholica, de que elle até alli se escusdra, posto 
que dando sempre algumas esperangas de mudanga. 


G1) Ruy de Pina, Cap. 36, 
(2) Ruy de Pina, Cap, 37. — Barros, Decada 1., Liv, 1. Cap. 6, 
~ Paria, Asia-tomo'1. Pater 


208 


Tal era o estado das cousas, quando Bemoy se 
achou enyolvido em huma perigosa guerra civil, em que 
a fortuna lhe foi contraria; e querendo valerese do fa- 
vor d’E]Rei, mandou hum sobrinho 4 Lisboa, a pedir- 
Ihe auxilio de armas, e soldados, a cuja proposta re- 
spondeok Rei, que nZo o podia ajudar, senao no caso 
de fazer-se Christao ; e ao mesmd tempo lhe remetteo 
hum presente de cavallos por Gongalo Coelho, Com- 
mandante de hum navio da Coroa, com o qual se reti- 
rou 0 Embaixador. 

Passado mais de hum anno, voltou Goncalo Coe- 
Iho a Portugal, trazendo comsigo o mesmo Embaixa- 
dor, que Bemoy tornava a mandar com hum presente 
de cem escravos escolhidos (Ruy de Pina diz, que tam- 
bem trouxe muito ouro), instando novaimente pelo soc- 
corro, € prorogando a sua mudanga de Religigo para 
depois da ruina dcs seus inimigos. Mas perdendo ago- 
ra huma nova batalha, ficou tao derrotado, que tomou 
por ultimo expediente fugir ao longo do mar para o 
Castello de Arguim, onde se embarcou em hum navio 
mercante coin alguns seus parentes, e sequazes; e neste 
anno de 1488 entrou em Lisboa, estando a Corte em 
Setubal. 

ElRei, avisado desta inesperada vinda, o mandou 
hospedar em Palmella, c a toda a sua comitiva com a 
maior magnificencia ; ¢ no dia que entrou em Setubal, 
o sahio a receber, e acompanhar o Conde de Marial- 
va, com os Fidalgos, e pessoas Nobres da Corte, ves- 
tidos de gala. Estavao ricamente armadas as casas da 
Alfandega, em que ElRei pousava, e as da Rainha, 

ue erdo junto a estas. Achava-se com ElRei o Duque 
e Béja, e muitos Titulares, Fidalgos, e Prelados; e 
com a Rainha estava o Principe D. Affonso. 

Entrando na Sala Bemoy, que parecia de quarenta 
annos , alto, e bem apessoado, a barba mui comprida, 


209 


e'a presenca agradavel, sahio EfRei dous ou tres pass 
0S OT hrono, com o barrete hum pouco fore , fae 
sim o levou ao estrado, em que havia huma cadeira , 
na qual se encostou em pe para o ouvir. Bemoy, e to- 
dos os seus se lhe langdrag aos pés, fazendo accao de 
tomar a terra debaixo delles, e de a lancar por cima 
das cabecas. ElRei o levantou, e por meio de Negros 
interpretes lhe disse, que fallasse. O Principe Jalofo, 
com muita discrigao, e gravidade, fez hum longo dis- 
curso, em que lhe perio soccorro, e justica , usando de 
termos, e sentengas tao apropriadas, que nao parecido 
de hum barbaro ; concluindo a final , que se a esta sua 
pertencio era obstaculo ser Mahometano , como Sua 
Alceza por vezes lhe insinudra, elle, e todos os seus que 
estavao presentes, vinhdo a Portugal receber o Baptis- 
mo. 
Respondeo-lhe EiRei em termos breves, mas de 
tanta satisfagdo, que Bemoy bem a mostrou no sem- 
blante ;.e despedindo-se , passou a visitar a Rainha, eo 
Principe D. Affonso , aos quaes em poucas palavras pe- 
dio a sua intercessdo para com ElRei; e dalli o acome 
panhdrdo todos os Grandes até 4 casa em que estava 
aposentado. 
Sepuirdo-se a esta recepcao festas de touros, e Ca- 
nas, e no Paco sardos de momos ,e dangas, a que as- 
sistio Bemoy sentado em cadeira defronte d’ EJRei; e 
depois de instruido na Fé Catholica, foi baptizado a 3 
de Novembro na camara da Rainha, e recebeo o nome 
de D. Jodo, por ser ElRei seu padrinho. No dia 7 o 
armou ElRei Cavalleiro, e lhe deo por Armas huma 
Cruz de ouro em campo vermelho, e o escudo orlade 
com 2s Quinas de Portugal; com elle se baptizarao ou- 
tros yinte e quatro dos seus. Neste mesmo dia, em acro 

solemne , fez homenagem a ElRei dos seus Estados. 
Nas conversag6es particulares, que este Monarcha 

27 


210 


teve com elle, [he deo Bemoy muitas noticias do in- 
terior da Africa, que attrahirao a sua attengio, como 
dizer-lhe, que para o Oriente dos Jalofos se estendido os 
Poves Mozes, cujo Principe nem era Pagazo, nem Maho- 
metano, e em algumas cousas se conformava com os 
costumes dos Christéos; o que deo a EiRei fundamen- 
to para crer, que seria o Preste Joao. Além desta ra- 
zao, desejava ElRei construir huma Fortaleza no Se- 
négal, para proteger o Commercio que os seus Vassal- 
Jos fazido, e para o futuro poderi4o ampliar muito 
Mais, servindo-se daquelle grande Rio para penetrarem 
Ro centro do Paiz, principalmente conseguindo-se a con- 
versio dos Jalofos ; em cujo caso seria facil aos Portu- 
guczes apoderarem-se de todo o trafico do ouro, que 
do vasto Reino de Mandinga concorria ds feiras de Time 
bouctore , e Guenna , onde o vinhao buscar as Carava- 
nas do Cairo, de Tunes, e de outros Estados da Ma 
vitania. - 

+ Para deliberar sobre esta materia com a madure- 
va, que cumpria, fez ElRei varios Conselhos , em que 
ee acsentou, que mandaese huma Esquadra de vinte Ga- 
kée bem armadas, para transportar, e restabelecer o Prin- 
cipe Jalofo nos seus Estados, para promover logo a 
convers4o ‘daquelles Povos ao Christianismo, e fazer a 
Fortaleza na bocca do Senegal. 

Em consequencia armardo-se a toda a pressa vinte 
€aravelas, guarnecidas de muita e bem luzida gente, e 
foi nomeado por General Pedro Vaz da Cunha, e se 
embarcou muita cantaria, e madeira lavrada, e os Ar- 
tifices necessarios para a construc¢4o da Fortaleza. Hido 
nesta expedi¢ao, além de Bemoy com todos og seus, 
alguns Religiosos debaixo da direcgdo do Mestre Alva~ 
so, Dominicano , Prégador Regio , encarregades da 
conversao dos Negros. 


Chegado Pedro Vaz da Cunha ao Senegal com to- 


2tt 


da a Esquadra , que pdz espanto naquelles Povos, co- 
-mesou a trabalhar na Fortaleza (de que havia de ficae 
Governador ), cujo terreno escolheo mal, por ser sub- 
-mettido 4s inundaches periodicas do Rio, e the come- 
-gou a adoecer a gente. Nestes termos, dizendo que Be- 
moy Ihe armava traigao, o matou 4s punhaladas dentro 
do sew proprio navio; mas he provavel que o fez per 
temer as doencas do Paiz, e querer voltar para Portw- 
gal, como logo fez, mal-logrando-se com este horroroso 
atrentado o fim de huma tdo dispendiosa expedicfo, 

Mui ponderosas devido ser as causas, que obrigé- 
rio hum Soberano do caracter de D. Jodo II. a deixig 
impune hum similhante crime. 

1489 — Neste anno (1) determinou ElRei mandar ° 
construir huma Villa, com seu Castello, dentro do Rio 
de Larache, para fazer dalli maior guerra aos Moures 
de Barberia , ¢ obrigar talvez algumas Provincias a su- 
jeitar-se a pagamento de tributo. Preparou-se huma Ex 
quadra, em que se embarcou a gente, que parecco suf. 
ficiente; e os Artifices, artilheria, pedra lavrada, ma- 
deira , € mais materiaes proprios para similhante obra. 
No principio do mez de Junho partio Gaspar Juzarte, 
nomeado General da expedicao, com instrucg6es 
comecar logo a Villa, que teve o nome da Graciosa; e 
n3o levou maiores forcas, porque estava ElRei persuas 
dido, segundo a informacao das pessoas por quem man- — 
dow reconhecer 0 terreno, que em todo 0 tempo do ans 
no podiso entrar, e subir pelo Rio, Caravelas, e nae 
Vios ; O-que nao era exacto. E para remediar qualquer 
incideme imprevisto, foi assistir em Tavira com a-Rai- 
Bha , © Principe D. Affonso, e toda a Corte , onde rece 
bia avisos diarios do que se fazia em Larache. 


G) Ruy de Pina, Cap. 38. — Garcia de Rezende, Capitulos 8% 
© 32. ; | 


27 ii 


212 
_Comegou-se aobra com actividade, sendo parte de 


alvenaria, e parte de madeira, e palissadas, para com 
-Maior brevidade se por em estado de defensa; mas avi- 
sado desta novidade o Rei de Féz, na raia 
Estados se construia a Fortaleza , conyocou os seus 
en lles 9 ormaresen , € enviou adiante seu filho 
a ataca-la com hum Exercito, ainda que tumultuario, 
immenso, pois se diz ser de scam on: de cavallo, 
€ maior numero de gente de pé, com o qual cercon 
as novas fortificagbes, ¢ guarneceo as margens do Rio, 
para evitar Os soccorros por mar. we Mh 
Instruido ElRei deste cerco, e da doenca de Gas- 
oar Juzarte , como tinha prevenido hum grande arma- 
* gmento naval para o que podesse occorrer, expedio lo- 
a D. Jodo de Sousa, valente Cavalleiro, e do seu 
Conselho, com hum reforgo de luzida gente, nomean- 
do-o Governador da Praga sitiada, em que se reunite 
agora mil e quinhentos Fidalgos, e Cavalleiros da Casa 
Real, a flor de toda a Corte. + tonal 
_. Crescendo porém mais o poder dos Mouros, e 
noticioso ElRei das desvantagens do Kio, de que pen- 
dia a conservacio da Fortaleza , mandou, nesta per 
plexidade, a Fernio Martins Mascarenhas , Capi 
dos Ginetes, e da sua Guarda; a D. Martinho de Cas- 
tello Branco, Vedor da Fazenda (depois Conde de 
Villa Nova); ea D. Diogo de Almeida (que passow 
a Prior do Crato), homens de muita representagfo, e 
bravos Cayallciros, que lhe erao muito acceitos, para 
examniCAFOR Be lemlicete ,e soleare a informa-lo da 
yerdade, a fim de resolver se devia largar, ou sustentar 
a ‘Graciosa. Entrados nella estes Fidalgos, chegou o 
.ei de Féz com o resto das suas forcas; e tendo elles 
por deshonra sahir da Praca, em occasiao similhante, 
encorpordrao-se na Guarnicao, e escrevérao a ihe 
bacco 0. Neste tempo adoeceo perigosamente D, Joao 












































213 


de Sotsa, € como era forcoso vir curar-se a Portugal, 
ajustou com os tres Fidalgos mencionados , que deitas- 
sem sortes, para se decidir a qual havia entregar o 
commando; e cahindo a sorte em D. Diogo de Almei- 
da, lha entregou logo, e partio para o Reino. 

Os Mouros, animados 4 vista do pequeno numero 
dos Portuguezes, ¢ do mdo estado das fortificagdes da 
Villa, 2 combatéra0 fortemente por varias partes; mas 
recebendo grande damno da artilheria, e de outros ar- 
tificios de fogo, retirdrdo-se fora d’alcance de canhio, 
e empregdrao todo o esforgo em atalhar a navegac4o do 
Rio. Para obterem este resultado, o atravessdrao de hu- 
ma a outra margem, em hum lugar abaixo da Fortale- 
za, onde dava vdo, com duas boas estacadas parallelas 
entre si, guarnecendo os seus flancos de trincheira, em 
gue cavalgdrdo muita artilheria grossa , que batia o cae 
nal todo, e as proximidades das estacadas, 

Esta obra causou algum susto aos Portuguezes , 
principalmente quando souberao, que o Camareiro Mor 
Aires da Silva, General de huma Esquadra de soccor- 
ro ancorada na foz do Rio, querendo forcar a entrada, 
achou taes obstaculos, e resistencia nos Mouros, que 
n3o conseguio chegar as estacadas, para as destruir, co- 
mo intentava. Porém nada disto fez esfriar os cercados 
da resolucdo em que estavao de se defenderem até & 
ultima. extremidade, ou até chegar hum poderoso soc- 
corro capaz de dar batalha aos Mouros, o qual nao 
duvidavao que ElRei conduziria. De tudo isto foi elle 
avisado em ‘Tavira, e sem perder hum instante, expe- 
dio hum reforgo de nayios a Aires da Silva, com or- 
dem , que commettesse de novo a entrada do Rio, e ao 

menos reurasse a Guarnicao da Villa, que era o que 
maig# desejava; porque pelas ultimas informagdes que 
& este tempo ja tinha das enfermidades endemicas do 
Paiz, e de néo ser o Rio sempre navegavel ,. estava re- 


214 


solvido a mandar desmantelar @ Fortaleza, se nfo esti- 
vesse de tode concluida. Partido este soccorro, fez Con- 
. setho sobre passar psesoalmente 4 Africa; e sendo una- 
nime a opinido contraria, seguio o parecer de D. Jo%o 
de Abranches (1), que chegqu per acaso no fim do Cone 
‘selho, e que lhe disse, n4o confiasse a empreza, sendo 
de si proprio. 

Determinado pois a passar a Larache, © commu- 
nicou logo aos cercados por meio de alguns Mouros 
peitades; e fazendo chamamento de gente por todo Pos- 
togal, se lhe offerecéro todos , velhos, e mocos com a 
melhor vontade. : 

O Rei de Féz, sabedor destas disposicdes, vende 
por hum lado, gue lhe comegava a desertar a gente, 
atormentada, e descontente dos trabalhos do cerco; e 
temcreso pelo outro de ser destruido em huma batalha: 
campal , mandou propor a Aires da Silva, que tinha po- 
deres de Lugar-Tenente d? ElRei, que elle deixaria 
sahir livremente os Portuguezes com as armas, artilhee 
ria, cavallos, e mais effeitos que tivessem , se lhe entre- 
gassem a Villa, e ElRei quizesse confirmar-the o Tra- 
tado, que seu Pai D. Affonso V. com elle fizera no 
tempo da tomada de Arzilla. Aires da Silva, parecen- 
do-ihe isto bem, por ser conforme ds inten d’ Bl. 
Rei, concluio huma Tregua com o Monarcha A frica- 
no, até 4 volea de hum expresso que mandou a Tavira. 

Acceitou E]Rei a proposta, e para a concluszo do 
Tratado enviou a Larache Ruy de Sousa, D. Affonso 
de Monroi, e Diogo da Silva de Menezes, todos do 
seu Conselho, e da sua confianca, os quaes juntamente 
com Aires da Silva confirmarao tudo por hum Tratado 
feito em Xames a 27 de Agosto deste anno: e dados 


(1) Ruy de Pina nfo faz mencio deste Conselho, que refere Gare 
cia de Rezende, que me parece mui verosimil que bowvesse. 


215 


de pafte a parte os necessarios, refens, levantdrzo0 o8 
Mouros © cerco, e os Portuguezes se recolhérao 4 Ex 
quadra com tudo quanto tinhao na Graciosa, e chegd- 
rid 2 salvamento a Tavira, onde forao recebidos @? Kl- 
Rei, e da Corte com grande prazer, e honra. 

1490 — Neste anno determinou ElRei D. Joao man. 
dar huma Esquadra (1) com tropas de desembarque a 
Ceuta, para auxiliar huma surpreza, que se intentava 
fazer ao celebre Alcaide Baraxa, e deo o commando a 
D. Fernando de Menezes, filho do famoso Marquez de 
Villa Real. Constava a Esquadra de cincoenta navios, 
alguns de guerra, € os outros de transporte, com muita 
e boa gente, muni¢6es, e cavallos. 

D. Ferrando ancorou de noite em Gibraltar, e ren« 
do alli aviso de seu irmao D. Antonio de Menezes, que 
governava: interinamente Ceuta, de que eta entio im- 
praticavel a projectada surpreza de Barata, conveio com 
elle em ir atacat a Villa de Targa (2) ; e reforcado 
com algumas embarcagdes de Ceuta, e outras de Hes- 
panba , achou-se com dous mil homens, em que entra- 
vio cento e trinta de cayallo. 4 

Chegado a Targa, desembarcou logo, e tomou 4 
Villa, sem perder hum soldado, porque os moradores 
a desampardrio apenas avistardo a Esquadra. Aprezd« 
Fdo-se no Porto vinte e cinco embarcacées, entre grams 
des, ¢ pequenas, e nos afmazehs muitos canh6es, ara 
mas, polvora, e munigces navaes; e libertérde-se alpuns 
Chriet4os cativos. Destruida por ultimo a Villa, © tae 
Bados of catipes, se recolheo a Esquadra a Ceuta cats 
Fepada de despojox. 

Mas D. Fernando de Menezés, ndo satisfeito dese 


(1) Ruy de Pina, Cap. 41. — Garcia de Rezende , Cap. 111. 

(2) Targa, edificada a cousa de dito levoas ao Sueste de Tetvio, 
@ qual se ebama hoje Tagaza, e Rio dog Alamios ad cue banha o$ sews 
3mhuros. Nos tempos antigos sahido dalli muitos Corsarios. | 


216 


ta victoria , combinou-se com os: Governadores de Tane- 
ger, e de Alcacer para irem assaltar Comice, lugar 
grande, e aberto, situado nas mais asperas, e altas ser- 
ras da Barberia, ao qual os Mouros chamavéo o En- 
cantado, Para esta empreza se reunirao todos em Alca- 
cer, d’onde partirao com quatrocentos homens de caval- 
lo, e mil e duzentos de pe. Chegados a Comice, e ten- 
do occupado os passos mais difficultosos da serra, ata- 
cargo o lugar, e o ganhdrdo com assds resistencia dos 
Mouros, que querendo salvarese pelas brenhas, se acha- 
rao cortados. Morrérao delles quatrocentos , ¢ ficdrao 
cativos cem. Os Portuguezes queimdrao as casas, e cora 
muito gado, cavallos, e outros despojos, se -recolhério 
a Alcacer, perdendo alguns soldados na retirada ; e D. 
Fernando voltou para Portugal. 

1490 — O Embaixador de Congo, que Diogo Cam 
conduzio a Portugal no principio do anno de 1489, re- 
cebeo o Baptismo, e os da sua comitiva, com grande 
solemnidade em Béja, com o nome de D. Jodo de Sou- 
sa. Achando-se agora ja todos bem doutrinados nos 
Mysterios da Fé Catholica, determinou ElRei manda- 
los restituir 4 sua patria, e nomeou Goncalo de Sousa, 
Fidalgo da sua Casa, por seu Embaixador, e a0 mesmo 
tempo Commandante de huma pequena Esquadra de 
tres navios bem armados, nos quaes se embarcdrao, além 
do Embaixador de Congo, muitos Religiosos, de que 
era o principal Fr. Joao, Dominicano , para comegarem 
a instruir aquelles Povos (1), levando todos os Oraa- 
mentos, e mais Cousas necessarias para a fundacao de 
huma Igreja Cathedral; e munidos de huma Instrucgdo 
preparada em hum Conselho de Theologos, e Cano- 


C1) Ruy de Pina, Capitulos 57 até 63. — Barros, Decada 1. Liv. 
3- Capitulos 9 e¢ 10, == Faria he quem traz os nomes dos dous Com- 
mandantes. 


217 
nistas, que ElRei convocou para esse effeito, e cujas 
sessOes:' se faz'do na sua presenca. Conduzia tambem 
Gongalo de Sousa hum rico e magnifico presente ao Rei 
de Congo, e aos Principes da sua Casa. 

-Erao Commandantes dos dous outros navios (na- 
quelles tempos o Chefe, ou General de huma Equadra 
commandava o seu proprio navio) Fernando de Avelar., 
e Affonso de Moura; e Pilatos Pedro de Alemquer, que 
o féra de Bartholomeu Dias, e Pedro de Escobar. 3 

Esta Esquadra partio de Lisboa a 19 de Dezem- 
bro de 1490, e proximo ds Ilhas de Cabo Verde falle- 
cérao de peste (que havizo contrahido naquella Cidade) 
Gongalo de Sousa, o Embaixador de Congo D. Joao ' 
de Sousa, o Escrivao da Esquadra , e outras pessoas, 0 
gue causou grande terror e consternacao; e assim are 
ribdrao 4 Ilha de S. Tiago, onde, por intervengdo do 
scu Governador Fernao de Goes, se elegeo por Com- 
mandante da Esquadra a Ruy de Sousa, primo, ou so- 
brinho de Gongalo de Sousa, que hia por passageiro. «-- 

_ Seguindo dalli viagem, depois de muitos perigos e 
trabalhes, chegira0 a 29 de Marco de 1491 a huma 
Bahia, que fica por detras da ponta do Padrdo, no Rio 
Zaire. Era Senhor desta Provincia hum Principe chas 
mado Mani-Sono, tio e vassallo do Rei de Conpo, 
que assistia a duas legoas de distancia; o qual acompa- © 
nhado de.tres mil frecheiros. veio logo visitar os. Portu- 
guezes ». com grandes festas e contentamento. Ruy .de 

usa o recebeo na praia 4 testa da melhor gente da sua 
Esquadra ; e achou nelle tal desejo de ser Christ@o, antes ° 
gue seu sobrinho'o fosse , que a 3 d’Abril, que era-dia - 
de Pascoa‘, foi baptizado, e hum seu filho ajnda meni- 
no, em huma Igreja de: madeira tosca, que para esse - 
effeito se construio, e adornou do melhor modo possi- 
vel; tomando elle o nome de D. Manoel, e o menina 
© de D. Antonio. : | 
28 


219- 


Concluidas estas cousas, marchou Ruy de Sousa por 
terra para a Corte de Congo, distante cincoenta legoas, 
escoltado por muitos centos de Negros, huns armados, 
e outros para conduzirem a bagagem, achando por toda 
4 parte abundancia de viveres. 

Entrou em Congo a 29 d’Abril, sendo recebide 
com a maior pompa e apparato. Comecou-se a edi- 
ficar a primeira Igreja (depois S¢ Cathedral com Bispo 
natural do Paiz) no dia 3 de Maio, e concluio-se no 1.° 
de Junho. O Rei quiz ser baptizado no mesmo dia 3 
de Maio, com o nome de D. Joao; e com elle se bapti- 
24ra0 OS scis principaes Grandes da sua Corte: a Rainhg 
Q foi no dia 4 de Junho, erecebeo o nome de PD. Leonor. 

Depois destes Baptismos, partio o Rei para ir su- 
jeitar 4 sua obediencia humas Ilhas situadas em hum 
grande Lago, d’onde se diz, que sahe o Zaire, as quaes 
se lhe havido rebellado, para cuja expedicao era fama 
gue levava oitocentos mil homens. Os Portuguezes @ 
auxilidrao nesta campanha, em que houverao combgtes 
sanguinolentos, até que por ultimo o Chefe dos rebel- 
des se entregou 4 discrigazo. Acabada a guerra, voltoy 
@ Esquadra para Portugal , havendo perdido algume 
gente naquella trabalhosa expedigao. 

Esta foi a ultima accao do Reinado memorave] 
de D. Jodo II., que trabalhou constantemente ngo s6 
por explorar as Costas, mas por conhecer as Provinciag 
centraes daquella yasta Regiao, e estabelecer com ellas 
telagdes amigaveis, de que tirasse vantagens o Commer- 
cio de Portugal; talvez com o projecto, se o descobri- 
mento da India nado podesse realizar-se, ou ainda reali- 
zado, se ge encontrassem naquella navegacio obstacu- 
los taes, que tornassem nullos os provcitos do trafico, 
de empregar entdo as suas forgas em occupar Os pontos 
principacs da Africa, de maneira que se fizesse seshor 
de todo o Commercio della. 


219 


A Esquadra mandada ao Senegal, posto que sé 
tornasse inutil ao restabelecimento de Bemoy,, produzio 
ufeis effeitos, dando aos Negros mui diffcrentes idéas 
das que formavao da forga naval de Portugal; porqué 
ndo tendo até alli visto nos seus Portos, senao peques 
has embarcac6es costeiras (1), virao entéo huma Ee 
quadra de vinte navios de gucrra bem guarnecicos de 
gente, e de artilheria, que podi#o em poucas lioras ar- 
razar as suas PovuacSes, e Invadir o Paiz. Assim cos 
mec4rao as varias Nacdés de Negros a procurar a ami-+ 
zade_ dos Portuguezes, tanto pelas utilidades que acha< 
¢40 no seu Commercio, como para obter a sua ptotec- 
¢40 nas guerrds e disputas, que de continuo tinhao hu- 
mas com outras, como acontece entre genres barbaras 
€ confinantes ; servindo de exemplo a cada huma o soc- 
corro enviado a Bemoy. : 

Por estas razdes comecou E!Rei D. Jogo a ser obs 
Sequiado dos Principes Africanios com recados, e presen- 
tes, e com favores aos Portuguezes, que o Comntercid 
tonduzia aos seus Portos; de que clle habilmente se 
Aproveitou para entabolar correspondencias com os Res 

os das Costas maritimas, e por meio deéstes com of 

beranos rhais poderosos do interior , como o dos 
Mandingas, dos Moses, dos Fullos, de Furucol, e Tim- 
boucton, servindo-se para estas mensagens de Portugues 
zes, c de estrangeiros intelligentes nas linguas, e costt- 
mes dos Povos, cujas relac6es de amizade crescérid tar 
to, que jd este Monarcha influia nos nepocios, & contén: 
das particulares daquelles Potentados, e creava Feitorias 
no inferior do Paiz, com erigio Hunra na’ Cidadé de — 
Haadem., setenra legoas go Oriettté do Castello de Ars 
guim. FE to respeitados forgo no seu Reinado, e ainda 
muitos annos. depois os Portuguezes, que mandando o 


(1) Bartos, Devada r. Liv. 3. Cap. 12: _ 
23 


220 


rande Historiador Jodo de Barros no anno de 1934 

Bum mensageiro ao Rei de Mandinga, sobre o Com- 
mercio do Gambia, lhe respondeo, gloriando-se de que 
seu avd recebéra huma similhante mensagem do outro 
Rei D. Joao de Portugal. 
_ 1493 ~— A 6 de Marco deste anno (1) entrou em 
Lisboa Christovao Colombo, vindo do descobrimento 
das Antilhas; e como esta grande novidade obrigou 
ElRei D. Jodo a armar huma Esquadra, cumpre-me dar 
aqui huma breve explicagao deste negocio, posto que o 
seu objecto seja alheio destas .Memorias. 

Colombo, Genovez de Nagao, tendo navegado no 
Mediterraneo, e no Oceano, e muito instruido aa Arte 
Nautica, e na ligao dos antigos Geografos , veio a Pare 
tugal, onde adquirio mais amplos conhecimentos (2) na 
sociedade , e conversacio dos habeis Pilotos daquelle 
tempo, ¢ provavelmente no estudo dos Diarios dos nos- 
sos celebres Descobridores, que deviao ser entde com- 
muns, e hoje por desgraga nao apparecem. 

Comparando pois o que achava escrito nos anti- 
gos, com os descobrimentos modernos dos Portuguezes 
na Africa Oriental e Occidental , e Ilhas do mar Ocea- 
no, créo firmemente que existido terrds consideraveis ao 
Occidente da Africa; e destes principios mui provaveis 
tirou consequencias falsas, capacitando-se, que navegando 
naquella direcgao0, acharia outro caminho para a India 
{porque suppunha os limites desta Regido pouco distan- 
tes das Ilhas situadas a Oeste da Costa d’Africa), sem 


(1) Ruy de Pina, Cap. 66. — Barros, Decada 1. Liv. 3. Cap; ro 
—— Faria, Asia tomo 1. Parte 1. — Clarke, tomo 1, Liv. 1. Cap, s. 

(2) Perece que nesta mesma Escola aprendia seu itmfo Bagtholo- 
meu Colombo, o qual levou de Postugal a Inglatetra o conhecimento 
cas Cartas Geograficas (alli ignoradas); ¢ em 1489 imprimio em Lon 
d@rz3,, dedicanda-o a Henrique VII., 0 primeiro Mappa-Mundi , que ap= 
parveco naguelic Palz, Vece Clagke no lugar citado a pag, 197. 


221 


continuar os descobrimentos além do Cabo de Boa Es- 
peranga, cujas tormentas tinh3o assustado hum dos mais 
ousados Navegantes, Bartholomcu Dias. 

Armado destas hypotheses, importunou a ElRei 
D. Jodo para que Ihe confiasse navios, em que tentasse 
o descobrimento da India pelo caminho do Occidente, 
Mandou-o ElRei conferir com a sua Junta de Mathe- 
maticos, que reprovou © projecto, por ser fundado em 
meras conjecturas, € na existencia quimerica da Uha de 
Cipange de Marco Paulo. | 

Escandalizado desta decisé0, passou Colombo a Cas- 
tella, .ande obteve o commando de tres embarcac@es , 
com que se fez 4 véla a 3 de Agosto de 1492, € a 12 
de Outubro descobrio a primeira das Antilhas, e depois 
algumas outras,-d’onde regressou 4 Europa, ainda per- 
suadido de que estas IIhas estavao proximas a hum gran- 
de Continente, que cria ser a India; de cujo erro sé o 
desengandrao ulteriores descobrimentos , passados annos, 

Entrou elle em Lisboa jactando-se de haver acha- 
do a-Ilha-de €ipango, e mostrando ouro, e alguns na- 
turaes do Paiz, que tinhao a cor, o aspecto, e 0 cabel- 
lo nao 4 maneira dos Negros, mas como sc dizia que 
os tinhdo os PovosIndjanos; € ao mesmo passo exagge- 
rava a grandeza, e riqueza das novas terras; 0 que poz 
ElRei em grande cuidado; e chamando Colombo sua 
presenga, Ouvio dasua bocca a relagao da viagem. Esta 
narrativa, e © estranho aspecto dos homens qué trazia , 
Ihe derao suspeitas de que seria aquelle descobrimento 
huma usurpacio dos seus direitos 4 conquista do Orien- 
te. Mas por nao descobrir 0 seu pensamento, nem se 
mostrar sentido de haver engeitado. os. seus servicos 
quando elle lhos offerecéra, o recebeo. praciosamente, 
e com algumas mercés o despedio.. mo | 

Convocou muitas vezes E]Rei o seu Conselho,, no 
qual prevaleceo a opiniao, sobre tudo entre os Geogra- 


222 


fos que assistirao a ellc, de que as Ilhas descobertas por 
Colombo pertencido 4s Conquistas de Portugal. Em con- 
sequencia deste parecer, mandou armar huma Esqua- 
dra, de que nomeou Commandante em Chefe a D. Fran- 
cisco de Almeida, filho do Conde de Abrantes, para ir 
explorar, € tomar posse daquelles novos Paizes, o que 
nao chegou a ter effeito pelos requerimentos, e€ protestos 
da Corte de Hespanha,; até que depois de varias Em- 
baixadas, se concluio o famoso, e conhecido Tratado da 
divisio do Globo entre os dous Monarchas; Tratado 
Fundado em bases arbitrarias , e abusivas, que produzio 
os resultados que deviao esperar-se , porém que naquelle 
momento evitou huma guerra. a 


Falleceo ElRei D. Joao II. a 25 d’Outubro de rags. 





Retwapo D’ EtRet D. Manos. 


O Governo deste feliz Monarcha foi a verdadeira 
Idade de Ouro de Portugal: a sua Marinha descobrio 
a India, conquistou as melhores pcagas maritimas da- 

uella vasta Regiao, e langou os fundamentos do gran- 

e Imperio da Asia, que durou até 4 epoca em que a - 
forga , e a traigao unirao 4 Coroa de Castella a Coroa —s 
de Portugal , suffocando os inalienaveis Direitos da 
Casa Real de Braganga; catdstrofe, que attrahio sobre 
esta segunda Monarchia (que gozava das docguras da 
paz desde mais de hum seculo) a furiosa tempestade , «x 


228 


que comegava a.alagar a Hespanha, e acabou destruin- 
do a sua preponderancia na Europa. 

Navegantes celebres, guerreiros afamados , homens 
de Letras, e de Estado foro communs neste Reinado; 
e mostrdrao bem ter aprendido na Escola d’ ElRei D. 
Jo%o II., filho do Infante D. Henrique (1), 

Como ElRei conhecia que a prosperidade actual , 
e futura da Nagao Portugueza dependeria sempre das 
suas forcas navaes, p6z todos os seus cuidados em au- 

mentar a Marinha. A experiencia das viagens ante- 
cedentes ensinou a construir melhores navios de Guer- 
ra, ede Commercio. Forao animadas em v-rias par- 
tes do Reino as plantagdes do linho canhamo, que nao 
erdo insignificantes, pois havido Feitores em Santarem , 
Coimbra, e Moncorvo; e delle se fabricavio amarras de 
qualidade superior 4s de todos os outros Paizes (2), o 
que durou até ao Governo dos Hespanhoes , em que se 
aniquilou este ramo importante da Agricultura Nacio- 
nal. Tambem se estabclecérao Fabricas particulares de 
armas brancas, e de fogo de toda a qualidade; e huma 
por conta da Fazenda Real na Ribeira de Barcarena, 
cujos Mestres vierao de Biscaia, trabalhava por enge- 
nhos movidos por agua; e em Lisboa creou-se huma 
Fabrica Real de polvora (3). Os navios de Guerra erdo 
construidos nesta Capital (que continha.dous Arsenaes 
de Marinha), v0 Porto, e em S. Martinho; e os de 
Commercio faziao-se nos estalciros particulares destes 
gmesmos Portos, e nos de Aveiro, e Vianna (4). To- 
da a artilheria de bronze (quasi a unica usada naquel- 


(1) Bruce diz nas suas Viagens (p30 me recordo em que lugar’), 
que os Exercitos Portuguezes na Asia erfo iguaes, ou superiores a tudo 
uanto a antiguidade nos apresenta, 

(2) Severim de Faria, Noticias de Portugal, Discurso 1. §. 14, 

C3) O mesmo, Discurso 2. §. 11, 

€4) Couto, Memorias Militares tomo 3. pag. 287, 


224 


Jes tempos, e nos seguintes) era construida em Fundi- 
gdes Reaes e particulares (1).. 

Os Arsenaes da Marinha, e do Exercito estav%o 
ta0 providos de tudo, e era tal a copia de embarcagées 
em Portugal, que quando ElRei no anno de 1508 foi 
a Tavira, qucrendo passar em pessoa a soccorrer o Cas- 
tello de Arzilla, reunio em cinco dias hum Exercito de 
vinte mil homens, e os navios sufficientes para transpor- 
ta-los 4 Africa (2). 

No tempo deste Monarcha houverio sempre tres 
Esquadras empregadas em fazer guerra a Piratas, e Cor- 
sarios , que infestavao o Commercio: huma Esquadra, 
chamada do Estreito, cruzava pelas Costas do Alpar- 
ve, ¢ Barberia , ¢ compunha-se ordinariamente de Fus- 
tas, ec Caravelas; outra de navios maiores corria as Cos- 
tas do Norte de Portugal; e¢ outra (que se augmentou 
depois) cruzava sobre as Ilhas dos Agores (3). Para 
promover, e vulgarizar os conhecimentos Mathemati- 
cos, creou E!Rei na Universidade de Coimbra em 1518 
huma Cadeira de Astronomia, de gue foi o primeiro 
Lente Filippe, seu Medico (4); e com o Raby Abraham 
Zacuto, seu Astronomo, consultava elle as cousas rela- 
tivas a Navegacio (5). 

No seu Reinado teve o Officio de Capitao Mor da 
Frota D. Antao de Abranches, por Carta passada em 
Monte Mor o Novo, no 1.” de Margo de 1466. 


(1) Assim consta de hum Manuscrito anonymo, que examinei, e 
parece ser redigido pelos annos de 1635, no qual se encontrio varies: 
Certidses authenticas , extrahidas dos Livros dé Receita, e Despeza dosmamll 
Armazens Reaes, o qual hei de citar algumas vezes nestas Memorias. 

(2) Goes na Chronica deste Rei, Parte 2. Cap. 29; ¢ Severim dex 
Fxja, Discurso 2. §. 15. 

(3) O mesmo no lugar acima citado. 

(4) Ensaio Historico sobre a origem das Mathematicas em Portugal o 
@tc., pag. 26. 

(5) O mesmo, pag. 27. 


225 


A fim de animar, erecompensar os homens, gue 
ge dedicavao ao servigo da Marinha, deo ElRei amplos 
Privilegios aos Pilotos , Carpinteiros de machado , e Ca- 
Jafates, de que fallarei quando tratar da Legislagio 
Maritima: e para melhor defensa do Tejo, construio 
a Torre de Belem, que era para aquelle seculo de res- 
peitavel forca. . : 

O augmento ra pido da Marinha em numero, e gran- 
deza de navios de Guerra, que se seguio ao descobri- 
amento da. India (consequencia forgosa do alto véo, que 
aomou o Commercio) ‘produzido pela necessidade de 
‘mandar alli todos os annos muitos navios, huns para 
voltarem com carga, a que por esta sazao se dava o 
‘nome de Ndos da carreira, outros para ficarem servin- 
do naqueiles Estados ,, onde se conservavao Esquadras 
‘permanentes , de que por ultimo se formou hum Depar. 
tamento separado; tornou -indispensavel a organizagao 
das lJoragées , € vencimentos das equipagens dos na- 
vios (s) Porém a Disciplina Militur, ainda que nao 


_ U1) Eis-aqui.o. que achei (36 nelle 0 achei) no citado Manuscri- 
to. A guarnic’o determinada para as Nios da carreira da India foi pri- 
-meiro de 120 pracas, classificadas deste modo: dezeseis Officiaes; qua- 
zenta e dous marinheiros, inclusos dous Estrinqueiros, que servido de Ca- 
-bos de. marinheisos, ¢ de Patrées de lanchas, e escaleres; cincoenta Gru- 
-Metes; quatro pazens; ¢ ofte Artilheiros, Os criados do Commandan- 
-e nZo erdo incluides na lotacio. Tinhio o nome de Officines, além 
do Gommandante , 0 Escrivdo , 0 Capellio, o Mestre, o Contra-Mestre, _ 
o Guardido , o Primeiro, e o Segundo Piloto, o Carpintziro, o Cala- 
-fate., o T'anoeiro, o Barbeiro (que servia de Cirurgiio ), o Conde.ta- 
- vel, o Meisinho (que pertencia ao Corpo dos Artilbeiros , ¢ tinha a 
seu cargo a guarda des prezos, a policia dos fogdes , e as armas, ¢ mu- 
micdes ) , 0 Cosinheiso, ¢ o Marinheiro-Dispenseiro, Acrescentoyese 
«lepois esta lotacio com hum segundo Carpinteiro, e hum segundo Ca- 
hafate , e dezojto Artilhziros , completando o numero de 140 pracas: e 
fPassados annos teve novo augmento, com dezoito marinheiros, e dez 
@cumetes, sommando 168 pracas; e assim se conservava em 1634. 
fQuando as Naos levavio Commandante em Chefe (Capitic Mor), em- 
29 


226 


menos indispbensavel, caminhou cam passos mui vapa- 
rosos, talvez por se lhe dpporem alguns prejuizos da- 
quelle scculo; ¢ so muitos annos depois chegou a hum 


barcav4d a seu bordo seis Trombeteiros , ou Charameleiros, que ne se 
incluigo na lotacio. 

A racio diaria consistia em arratel e wes quartas de biscouto, hum 
arratel de vacca, ou meio arratel de porco, e meia canada de v inho , 
sto em dia de carne; © em dia de abstinencia, o mesmo biscouto, e 
vinho , ¢ meio arratel de arroz, ou de bacallrio, ou d= quedja. Agua 
-huma canada para beber, ¢ cozirthar ,. mas cozinhavasse. liuma ed. vez nbd 
dia. Davaese huma ca:vada de azeite. para 60 pracas, e bump de ving 
gre para trinta. Além destes mantimentos , levava cada Nio hum maio 
de farinha, sal, vinte alqueites de lesumés , oito de amendoas , outros 
tantos de amzixas, e huma certa porcio de mostarda , astucar > © mel, 
tudo entregue 20 Gommandante .para o distribufr come quissse. Para 
es doentes erubarcavao-se conservas ; -¢ outras dictas, © humsz .ow dins 
boticas. As luzes fixas em huma Nio era sé tres de azeite. Os viveres 
calculavdo-se para quatro mezes de dias de carne, e outros tantos do 
abstinenzia, e 0 biscowto para dez mezec. 

Os vencimentos erdo regulados da maneira seguinte: © Capitke- 
Mor vencia 6oogjooo rs. de viagem redonda, e concediiaselhe dove 
criados (nio inclusos na guarnicdo), tendo cada hum mensalmente dez 
tostées. O Commandante de huma Nao vencia 200gj000 rs. de via- 
gem redonda; e tinha seis criados a dez tostées por mez, O Escrivio 
403000 ts de viagem redonda, e 12Q@cO0 fs. de emolumentas. O Ce 
pellio 2gscco rs. mensaes. O Mestre 120Qj000 rs. de-viagem. © Con- 
tra-Mestre s0q@)000rs. O Guardiio 1400 1s. por mez, e 2g§800 re. de 
gttintalada, que era certa gratificacio que s¢ pagava em Licboa odian- 
tada, O Primeiro Piloto 120@j000 rs, de viagem. O Segundo Piloto 
1@200 rs. por mez, e 2@)800 rs. de guintelada. Os Carpinteiros , e 
Calafates 1@)690 rs. por mez cada hum, e 3q@})900 1s. de guntaleda. 
O T'anoeiro 1@200 rs. mensaes, e igual guiutalede. O Meirinho dex 
tosthes mensacs, O Barbeiro o mesmo. Os Estrinqueiros o mesmo, e© 
2@)8c0 r<. de guintalada, Os matinheiros os mesmos soldos, e gauinte- 
dadat. Os grumetes 666 rs. por mez, e€ 1@)800 rs. do grintalada. Os 
pagens 400 1s. por mez, e¢ 1209 rs. de quiatalade. O Condestavel 
1600 rs. mensazs. Os Arrilheiros dez tostées ror mez. 

Além destes vencimentos , concediio-se aos que andavfo nas Néos 
da Incia ¢ rtas sratificacses , e liberdades, Ao Capitéo-Mor quime cai- 
xoes -1o valor de 300.Hc00 rs, cada hun, de cujos direitos se the pes- 
doavio quinze por cento, e de Obra Pia 3020 ¢s., € ma'‘s doas escu> 


227 


gr4o de perfeicao tokeravel , como mostrarei com bag- 

tantes exemplos nestas Memorias. , 

"Nem. podia deixar de ser assim , em quanto se nfo 
“N . . 


‘vos livres: de frete , e direitos. A cada hum das seus doze criados hn. 
_ ama caixa do valer de iz0@joco rs., perdoando-se dez por cento, e de 
Obsa Pia 1@209 6s, Ao Commandante de huma Nao seis caixdes de 
valor de 250gjcco rs., abatendo-se-lie quinze por cento de direitos; e 
de Obs Pia 2g)500 rs. A cada hum dos seus criados, cue lhe pertens 
viko, hirma caixa de’120gjoco rs., ‘perdoando-lhe dez pcr centd, e 
4 200'rs:, do Obra-Pia. Ao Escrivia duas caixas de 200g}<co 1. }cade 
haya , abatendé-se-Ihe quinze pos cento de direitns, © 2gyoon rs. de 
Obra Pia; .e mais dous escravos livres de frete. Aa Capellio huma 
caixa’ de 120q000 rs., perdoando-lhe dez for certo de direitos, e 
1200 rs. de Obra Pia, e mais hum escrave livre de direitos, Ao Bar- 
beiro: 0 mesmo, excepto escravo,, que 30 se the concedia. Ao Prinei- 
ro Piloto duas: caixas de 2c0gj000 rs. cada huma, com o abatimento 
de quinzs por cento, ¢ de Obra Pia 2gs000 rs. , @ mate dous escravos 
livres. de dinsitos. . Ao Segundo Piloto,dmima ‘caixa‘de 2c0gjoco ‘8. 
com o-abatimento :de vinte. por o¢nte:de direitos, ¢ de Obra Pia 
2qj000 m., &. mais ( por hums. Provisso: de:‘Sua Magéstade ) dous escrae 
vos livees-de frete,.e de dircitos. An Mestae duas caisay de: 200g)c00 Ts, 
cada buma, com a abatimente de gitioze. par conta, e de Obra Pia 
2q@000 rs., © mais dous escravos liyres de direitos, Ao Contra-Mestre. 
harma éaixa de 200000 13... com O-abatimento de cuime pot cento » 
@ 2qj00a-rs. de Obra Pia. .AO Guardiéo- huma caina.de 120g)000 19., 
abatendo-se-lhe dez por conto, ¢ tinhe mais de Qbra.Pia rgjaco mm 
Acs Carpinteiros, Calafates , “Tatiociros ,° Marinheitos-Despensetos , € 
Retrinquesros o mem que. a0 Guardiso. . Aos Matiabeiros -o mesmo, 
gue a estes. Aos Grumetes, assim dos que pertencido aos Ofticiaes, 
como eos do-servico da Néo, huma caixa a ceda hum de 80gjooa 1s: , 
de que se the perdoaviio dez por cento, ¢ de abré-Pia 8a0 rs, Avs Pa 
gens hutn fardo a cads hum do valor de 5.39533 reis, de que se the. 
aliatizo der por-ceato. A cada Arcilbeiro huma- caixa de 120g)000 3s. 5 
de. que se the abatiio quinze por cento ,-¢ 1.g)200 rs, de Obra Pia. 
. Estes réguhamentos soffrério alteracio pelo decurso dos tempas, co- 
mo se colhe da narracio de Linschat , que no anno de 1583 passou 4: 
India na Néo Portacueza S. Salvador (Vede a Historia da Navegacio de 
Jofo Hugues de Linschot, Hollandez, ds Indias Qrientaes , Amsttrdam 
1638), aggregada 4 familia do Arcebispo de Goa D. Ir. Vicente da 
» e-apsistio naguelle Estado até o anna de 1588, em que -re- 
gressou a Europa; o qual relata por extenso todos os vencimentos” Gos 
2” i 


cad 


Ihdé (7); €m que te derZo différentes votos, sendo 0 
maior nomero, de que a India se no devia descobrir’, 
fundando esta opiniao em que, além de trazer comsigo 
muitos encargos, por ser Paiz mui remoto para se pc- 
der conquistar , ¢ conservar, enfraqueceria tanto as fore 
gas de Portugal, que ficaria este sem as necessarias pa- 
raa sua conservagao. Em segundo lugar, que desco- 
berta a India, cobraria este Reino novos competido- 
res, de que jd tinhZo experiencia as contestacdes entre 
ElRei D. Jodo II. e EtRe: D. Fernande de Castella 
pelo descobrimento das Antilhas; chegando ao ponte 
de repartirem entre si o Mundo em duas partes iguaes, 
para o poderem descobrir , e conquistar.. & por ultimo, 
se esta ambiczo de Paizes incognitos preduzira aquella 
reparti¢zo sd 4 vista de algumas amostras dos generos, 
gue se tiravao de Guiné, 0 que seria, se viesse a Por- 
tugal quanto se dizia das Regiécs Orientaes 2 
A estas razGes se oppozerao outras mais acceitas z 
ElRei, por serem conformes a seu desejo; e as princi- 
paes , que o movérdo, forio: ter herdado a obrigacdo 
aquella Conquista com a heranga do Reine, e o [n- 
fante D. Fcsnaade seu Pat haver concorrido: para este 
descobrimento quando mandou descobrir as Llhas de Ca- 
bo Verde, e mais pela singular affeicdo que conservava- 
a memoria do Infante D. Henrique seu Tio, que fdéra 
© autlior do novo Titulo do Semherio de Guind, resu- 
mindo-se a final na esperanca de que Deos facilitaria os: 
mesos, que convinhao a bem do Reino. 
Determinado ultimamente em continuar neste des- 
cobrimento , declarou , passado tempo, em Estremés a 


- (1) Damifo de Goes (Parte: 2. Cap. 23 da.sua Chronica d’ElRei: 
B. Manoel) diz, que estes Canselhos forio feitos no mez de Dezembro: 
de 1495 5; e-que determinado ElRei a continuar o desccbrimento dax 
Iadia, mandou. logo preparar os navios, no que se gastou mais. de buns 
anna. 


231 
embareagdes , que de ordinario hido a S. Jorge da Mi- 


2. . a 
Entrado- j4 no anno de 1497, em que a Esquadra 
se achava pronrpta, mandou EdRei chamar a Monte Mor 
o Novo a Vasco da Gasha, e a0s outros Commandan- 
aes, que erao Paulo da Gama seu irmao, e Nicoldo 
Coelho (1); ¢ ainda que lhe tinha ja explicado a sua 
antengia, e€ lhe havia mandado fazer as suas Instruc- 
gdes , quiz. agora praticar isto com maior solemnidade, 
fazendo-lhe huma falla publica na presenga de algumas 
pessoas. notaveis, para isso chamadas; na qual expoz as 
razOes.que tivera para emprehender o descobrimente 
da India , deduzidas dos beneficios resultantes da propa- 
gacao.da Ké Catholica no Oriente, e do augmento de 
gloria, e de riqueza, que esperava de tamanha-empreza, 
sendo esta confiada a hum homem de tanto merecimene 
to como. elje. | Do, | 
Acabada a pratica, todos os assistentes beijarao a 
amgo a. ElRei ;-e posto Vasco da Gama de joelhos, apre- 
gentou's Escrivao da Puridade huma bandeira de seda 
branca, tendo no aicio aCruz da Ordem de Christo (2), 
(1) ‘Goes (ab lugar. citado) diz, que isto foi no mez.de Janeiro 
i sO eee 
mr, batideiras da Esquadra de Vasco da Gama erfo como esta; 
e quando, passados annos, houverio na India Esquadras pertencentes 
“guelle Estado, as suas bandeiras tinbio no meio as Armas Reaes, e por 
dbaixo deilas a Cruz da Orden de Christo ; costume, que durou até ads 
principigs-do secujo-passado, Couto, Memorias Militares, tomo 1. 
. pag. 253. Tambem parece, que gs Naos da India trazido pintadas nas 
gavias humas grandes Cruzes vermelhas , pois , segundo Castanheda, por 
este signal conheceo Affonso de Albuquerque a Esquadra de Diogo Men- 
ties de Vasconce}los, gue hia.de Portugal s mas ignoro quando se intro- 
shuzio este costume. Castanheda, Liv, 3. Cap. 34. : 

Devo advertir aqui, que o Capitéo Mor, ou Commandante em Che- 
fe de huma Esquadra, ou Divisio de Nios da Carreira da India, trazia 
bandeira no tope grande, como Generals e ainda que se encontrasse 
com outra Esquadra qualquer, nao recebia ordens do seu Chefe. Esta 


233 


todos os Commandantes na Ermida de Nossa Senho- 
ra, que o Infante D. Henrique funddra naquelle sitio, 
em que estavdo alguns Freires do Convento de Thomar 
para administrarem os Sacramentos aos navegantes. No 
dia seguinte 8 deJulho concorreo alli muita gente, huns 
por devogao, outros para se despedirem dos que par- 
tio; e Vasco da Gama embarcou-se acom anhado de 
huma devota Procissio, que os Freires ordendrao, se- 
guida de toda a gente da Cidade, entoando a Ladainha, 
até chegarem 4 praia, onde estavdo os escaleres da Es- 
quadra; e ajoclhados todos, o Vigario da Casa os ab- 
solveo na forma das Bullas, que o Infante D. Henrique 
obtivera para os que fallecessem nestes descobrimentos , 
€ conquistas; acto que se concluio com lagrimas, como 
era natural acontecer em tal occasiao. , 

Constava a Esquadra de tres navios de Guerra (1), 


(1) Castanheda affirma, que ElRei, aproveitando-se das Instruccées 
e Regimentos feitos pelo seu antecessor, mandou construir dous navios 
das madeiras ja cortadas, hum de cento e vinte toneladas, por nome 
S. Gabriel , e outro de cem toneladas , chamado S. Rafael; e comprou 
huma Caravela de cincoenta toneladas a hum Piloto chamado Pérrio, de 
guem ella conservou o nome. E que como nos navios da Esquadra nao 
cabigZo mantimentos para tres annos, comprou mais outra embarcacao 
de duzentas toneladas , pe. ir catrregada de mantimentos até 4 Aguada 
de S, Braz, e ser alli despejada, e queimada. A guarnicado da Esqua- , 
dra , segundo o mesmo Historiador, era de cento e quarenta e oito pese , 
sons; © Batholomeu Dias sé a devia acompanhar at¢ ds Ilhas de Cabo 
Verde. 

Pedro Barreto de Rezende no seu Epilogo manuscrito dos Vices, 
Reis da India, escrito em 1635 CObra de que Barbosa nio teve noti-., 
cia), diz, que a guarnicio dos tres navios de Guerra era de cento e. 
seswnta homens, entre soldados e marinheiros. 

Faria e Sousa (Asia Portugueza, Tomo. Parte 1. Cap. 14.) diz, , 
que a guarnicfo da Esquadra se compunha de cento ¢ sessenta pessoas, , 
de mar e guerra, ¢ parece excluir a equipagem do navio dos manti- , 
inentos, a que chama hum Barco: que Vasco da Gama levava por Con- 
fessor a Fr. Pedro de Cobilh6es, Religioso da Santissima Trindade, o 
primeizo Sacerdote que passou ao Oriente: que Ferndo Martins, e Mars 

30 


234 


é hum Transporte de mantimentos: no primeiro, cha- 
mado §. Gabtiei, hia Vasco da Gama , le’ando por Pi- 
loto a Pedro de Alemquer, que se achdra no descobri- 
mento do Cabo da Boa Esteranca, e por Escrivao Dio- 
go Dias, irmao de Bartholomeu Dias: do segundo na- 
vio, por nome S. Rafael, era Commandante Paulo da 
Gama, Piloto Jodo de Coimbra, e Escrivio Joao de 
$4: commandava o Bérrio Nicoléo Coelho, era seu Pi- 
loto Pedro Escolar, ou Escobar, e Escrivio Alvaro de 
Braga; o Transportes levava sé alguns marinheiros, e 
¢commandava-o Gongalo Nunes. O total da guarnizdo 
destes navios era de cento é setenta homens, entre ma- 
yinheiros, e homens de armas (soldados armados offen- 
siva ¢ defensivamente ); e 0 porte de cem até cento € 
vinte toneladas (1). 


tim Affonso ergo Pilotos, e¢ servigo de interpretes; e que entre os 
sdidadés se distingutio Fernio Veloso, Alvaro Velho, e os dous i 
Pedro de Faria e Figueiredo, ¢ Francisco de Faria e Figueiredo, que 
fallecér3o no Cabo das Cortentes, o ultimo dos quaes era hirin ‘ilbastre 
Poeta Latino. . 

He preciso saber, que Vasco da Gama ‘levava dez ou doze degra- 
dades para deixar nos Portos, que bem Ihe parecesse , os quaés nfo erfo 
ificluidos na guarnicio da Esquadra. , 

€1) O celebre Historiador Robertson achou que os tres navios, de 
que se compunha a Esquadra de Vasco da Gama, ero em demasia pee 
qtrenos , ¢ sem a forca necessaria para aquella commissio. (Clarke , To- 
mio 1. Cap. 2.) 

Eu creio, pelo contrario, que estes navios, relativamente d¢ cir- 
cOnstancias do tempo, ero mui adequados para preencherem os fins, 
qae ElRei D. Manoel s¢ propunha nesta primeira expedicio, os quaes_ 
se reduziao a marcar a linha da navegacdo para o Oriente; a examinsr_ 
a estado Commercial e Politico daquella vasta Regido, quasi desconbe= 
cida , sem espantar os seus Reis com hum apparato de forca, que os. 
obrigasse a lizarem-se desde logo para mal-lograr qualquer tentativa, que 
os Portuguezes depois arriscassem para se firmar no Paiz; e 2 explorer, 
e reconhecer os Portos mais opportunos para arribadas, e estabelecimen- 
805 mercantis, 

Accresce a estes motivos a facilidade, que dava'a Vasco da Game * 


235 


No mesmo dia 8 de Julho de 1497 sahio Vasco da 

ama com a Esquadra, e 0 navio da Mina de Bartho- 
lomen Dias, dando aos Commandantes por ponto de 
reuniao a Ilha de S. Tiago, no caso de occorrer alguma 
separacdo. Aos oito dias de viagem avistou as Canarias, 
@ com a cerracgao e mdo.tempe que sobrevcio, se apar- 
tdrZ0 de noite os navios, reunindo-se no fim de oito. 
dias , menos o de Vasco da Gama, que enconirdrfo na. 
tarde. de 27, e o salvdrdo com tiros de artilheria, e to~ 
ques de trombeta (costume daquelle tempo); e no dia. 
seguinte (1) seguio toda a Esquadra na ha de Sado 


a@ mesma pequenez dos seus navios, para evitar os riscos de. huma na- 
vegacdo, que além do ponto a que chegou o famoso Bartholomeu Dias, 
esa desconhecida; ¢ até se ignorava. se os navios grandes de quilha acha- 
rido Portos, R.ios, e. Bahias em que se abrigassem - das tempestades , e: 
podessem refazer-se de viveres, ¢ aguada, E da experiencia do passado. 
se deduzia, que se devido encontrar naquelles mares virgens muitas. 
_ Abhas, e baixos, huns occultos, outros descobertos; circunstancias em 
que as embarcagdes pequenas tem toda a vantagema sobre as grandes, 
ngo s6. pela rapidez com que virfo., e manobréia ,. mas for passarem 
a salvo por cima de bancos, e parceis, em que os grandes naufragios ; 
e achareys tambem guarida em Portos, ¢ Rios, onde estes nio tem 
fyndo sufficiente para ancorar. 

De resto. a observacio. critica de Robertson convertesse em louvor.’ 
de Vasco da Gama, porque. sendo certo, que merece mais Jouvor quem? 
com, poucos meios obtem grandes resultados, s¢ se compararem os- ese! 
cassos auxilios que as Artes, e as Sciencias, ainda infantis naquelle -se-: 
culo, derfo a Vasco da Gama para completar a sua viagem; com os: 
immensos socgorros de toda a especie , que as mesmas Artes, e Scien- 
cigs .em;todo. 0 seu vigor no seculo passado fornectrio a Cook, Van- 
cower, e La Peyrouse, persnado-me, que todo-.o homem intelligeme,- 
e desapaixonado escolheria ser antes hum Vasco da Gama, do que qual. 

destes illustres Navegantes. 

Porém esta materia pedia huma Dissertacio, que por nao caber 
nos.estpe¥tas limites de-.huma Nota, deixo para outro tempo. 

(3):, Segunda, Basras, Vasco .da Gama -chegou..com treze dias de 
viagem 4 Iha de S, Tiago, isto he, a 21 de Juiho;. mas. Castanheda, 
e Damjag. de. Goes ( Parte 1. Cap. 35 ) dizem que foi a 28, opiniao 
gug.eu segui.fundado na particular individuacdo, que faz Castanheda 
desta viagem. 

30 


237 


Astrolabio de madeira de tres palmos de diametro, 
0 qual , posto que mais exacto do que os outros Astro- 
labios pequenos de metal que levavao, nao podia ter 
uso a bordo de embarcacdes tdo pequenas, que arfavao 
muito com o mar, por ser necessario suspende-lo em 
huma especie de cabrilha.. Além disso desejava colher 
alguma lingua de terra, ¢ saber a distancia a que lhe 
ficava o Cabo de Boa Esperancga, de que o Piloto Mor 
Pedro de Alemquer se fazia trinta Icgoas (1), ain- 
da que ngo conhecia a terra, por haver passado de 
largo quando foi ao descobrimento do Cabo com Bar- 
tholomeu Dias. 

Enere tanto alguns Portuguezes, que andavdo espa- 
lhados pelas praias e matos, derfo com dous Negros, 
que estavdo apanhando mel aos pes das moutas com ti- 
gdes de fogo na m4o, dos quaes segurarao hum. Vasco 
da Gama, porque nao havia quem o entendesse, e celle 
de assombrado nao acodia aos acenos, mandou vir dous. 
grumetes, de que hum era negro, e estes o@fovocdrio 
a comer e beber; e a final mostrou por acenés humas 
serras, que scrido duas legoas, dando a entender que 
junto dellas estava a sua Povoacio. Vasco da Gama o 
mandou soltar, dando-lhe cascaveis, contas de vidro,. 
e hum barrete vermelho, acenando-lhe que se fosse, e 
tornasse com seus companheiros, para lhes dar outro 
tanto; o que clic fez logo, trazendo aquella tarde dez. 
ou doze, que recebérao iguaes presentes; e apresentan- 
do-Ihes amostras de ouro, prata, e especiaria, de ne- 
nhuma dero noticia. | 

No outro dia j4 com estes vierao mais de quaren- 
ta tao familiares, que hum soldado chamado Ferniao Ve- ' 


€1) Este calculo de Pedro de Alemquer,, hum dos melhotes Pilotos. 
daquelle tempo, era sufficientemente exacto, e por isso mesmo deve | 
Rarecer hoje extraordinario, | 





239 | . 

¢o da Gama 4 yéla a 16 de Novembro (1), com vento 
S.S.E., sem Jevar informagao da terra, como deseja- 
va, porque Fernio Veloso nao vio cousa que contar, 
sendo O perigo que dizia_passar entre os Negros; os 
quaes tanto que se apartarao da praia, o fizerao tornag 
somo querendo-o ter por negaca, para quando o fossem 
recolher commetterem alguma maldade, como intentd- 

Na tarde do dia 18 vio Vasco da Gama o Cabo 
de Boa Esperanga, € como o vento lhe era contrario 
para o dobrar, foi de dia no borda do mar, e de noite 
na terra até ao dia 20 (2), que cam menos perigo do 
que se esperava, 0 dobrou, indo ao langa da Costa com 
vento em pépa,:com grandes folias, e tanger de trom-. 
betas; e dia de Santa Catharina (25 de Novembro) che- 
gou 4 Aguada de S. Braz (3), sessenta legoas além do 
Cabo, ,E pasto que.achou Negros decabello revolto, co- 
mo os passados, estes sem receio algum chegardo aos 
escaleres a receber as cousas, que lhes langavdo na praia, 
¢ por acenos comecarag logo a eptender-se.com os Por- 
tuguezes, e derdo carneiros em troca de outras cousas ; 


. a) . Segundo Castanheda, e Goes (Cap. 36), que trazem esta pre- 
cisa data da sahida de Vasco da Gama da Bahia de Santa Helena. © -\° 
(2) OCabo de Boa Esperanca he o mais famoso, e conhecido de 
toda a Africa, por isso julgo inutil a sua desctipeios 36 advertirei; que’ 
a.Bahia da. Meza be. a verdadeira Aguada .de Saldanha, ‘onde os Cafres: 
anatdra0 20.V.ice-Rei D, Francisco de Almeida, com a flat dos Officises- 
da India, que o acpmpanhdrio_na imprudente correria, que fez naquelle 
P3iz, entio selvagem. A ignorancia dos Navegantes Hollandezes deo o 
mome de Bahia de Saldanha a outra grande Bahia ,: cuja penta do Norte’ 
esté em 33° 5’ de latitude Sul, nat 10! $f cone: - A situacdo: 
Cabq de, Boa Esperanca, no ancoradouro da Cidade , he a seguinte : 
tavinade Syt 33° 54’ 24’, @ longitude 36° 34! a5”, a 
(3) A Aguada, ou Bahia de S. Braz, tem na ponta de Oeste 34° 
32! de katitude Sul, ¢ 40°10’ de longitude. Esta Bahia tem tres le 
goas de boca , cam fundo limpo, e ha nella hum IJlhote: abriga muito 
dos ventos Ponentes. Chamfo-lhe os Inglezes Flesh-Fay. 


241 


em que se faziao, de que erdo causa as grandes corren- 
tes; mas crescendo muito o Ponente, vencério a cor- 
rente da agua, e dia de Naral avistarao a Cesta, a que 
,chamdrao (1) deste mesmo nome. 

A 10 de Janeiro de 1498 (2) indo a gente a quar- 
tilho d’agua, cosinhando-se j4 com agua salgada, anco- 
rarao defronte do Rio, a gue derao o nome de Rio de 
Cobre, onde comprdrdo acs Negros muitas manilhas. 
deste metal, e marfim, €-mantimentos, tenco tanta com=_ 
munica¢gdo com elles, por ‘Wasco da Gama os satisfazer 
com dadivas, que Martim Affonso, pratico em muitas 
linguas de Negros, e que entendia a destes, foi 4 sua 
Aldea, cujo Chefe nao so o recebeo com grande festa , 
mas quando tornou ao navio, pelo honrar mandou com 
elle mais de duzentos homens. Depois elle e outros 
yierdo visitaf Os navios, e em seu tratamento mostravao 
habitar em terra fria, por virem alguns vestidos de pel- 
les; € por causa da muita familiaridade, que tiverio 
com os.Portuguezes em cinco dias que a Esquadra se 
deteve neste ancoradouro, lhe péz Vasco da Gama o 
nome de Aguada da Boa Paz. E sahindo a 15 de Ja- 
neiro (3), cOomegou a afastar-se da terra, com que de 


(1) A terra do Natal comeca em latitude Sul 32° 17/, e 47° 27 de 
longitude, e acaba na latitude de 30°, e longitude 48° 58’. O Rio 
do Natal entra no Oceano Indico em 30° de latitude, e he o maior 

Ne Paiz: tem na boca huma barra com dez ou onze pés d'agua, 
e dentro mais fundo, . 
(2) Barros diz, que foi a 6 de Janeiro,.dia de Reis, e por isso de 
ario este nome ao Rio. Castanheda, e Goes (Cap. 36) dizem , que fora 
mo dia 10, cuja data cambina com as circunstancias, que relata o pri- 
smmneiro destes dous ultimos Escritores. Este Rio dos Reis, ou do Co- 
Boe he o mesmo, que a Aguada da Boa Paz: he hum Rio pequeno, em 
«Jue nio podem entrar navios, os quaes sao obrigados a dar fundo por 
<5ra dos recifes. Esti na laticude Sul 24° 454, e longitude 51° 43’. 
Em todas as Cartas tem o nome de Rio do Cobre. 
(3) Basros nfo traz as epocas da sahida de Vasco da Gana da Aguae 


vl 


242 


noite passou 0 Cabo das Correntes (1), porque comecdé 
va a Costa a encurvar-se para Oeste, e sentindo que as 
aguas 0 apanhayao para dentro; temeo ser alenma Em 
seada penetrante, d’onde ndo podesse sahir. 

Este temor Ihe fez dar tanto resguardo, por fugie 
da terra, que passou sem haver vista de Sofalla (2), Gi. 
dade tao celebrada naquellas partes por causa do muito 
ouro, que os Mouros alli recebem dos Negros da tere 
ra por via do Commercio, segundo depois soube: e @ 
24 chegou a boca de hum Rio mui grandé, além delle 
eincoenta legoas, vendo sahir delle alguns barcos com 
vélss de palma, equipados de Negros de boa estatura, 
cingidos de pannos de algodio azul , que sem medo ak 
gum entrdrdo nos navios. Entre estes € outros que con~ 
corrérao depois , havido alguns fulos, que pareci#o mes- 
tigos de Negros, e de Mouros. Muitos trazifo turban- 
tes brancos, e de seda de varias cores, e alguns tame 
bem entendiio palavras do Arabe, que \hes fallava Fere 
nao Martins , marinheiro, ainda que 0 seu idioma pro« 
prio ninguem o entendeo. Por estas palavras, e por ace 
nos disserio, que para o Nascente havia gente branca, 
que navegava em navios como aquelles, os quaes yiio- 
passar por aquella Costa em differentes direccdes. 

Todas estas circunstancias derfo grande animo aos 
Navegantes , com a certeza de se irem aproximando 4 
India, e por esta causa-chameu Vasco da Gama a este 
Rio dos Bons. Signaes (3). E vendo a seguranga, e boa 


da da Boa Paz, aem da sua chegada ao Rio dos Bons Signaes; porm 
achio-se em Castanheda , e Damiiv de Goes, d’onde as copiei; porque 
as datas das sahidas, e entradas de Portos sido essencizes na Historia do 
huma Viagem. 

(1) Situado na Costa da Africa Oriental, latitude Sul 23° 40’, 
Jongitude 5 4® 50’. 

(2) Cidade mui rica pelo seu Commercio do ouro, situada na Costs 
Oriental da Africa, na latitude Sul 20° 22’, e longitude 5 3° a14 

(3) Este Rio he o Zambese, que penetra cento ¢ oitents legoas pe 


243 


fé dos Negros no trafico que tinhdo com os seus, ven- 
dendo-lhes mantimentos da terra, carenou, e concertou 
os navios, por virén) ja rmu gujos, e comidos do gusa-. 
no (1), em que gastou trinta e dous dias; e neste meio 
tempo, com aurilio dos naturaes, poz hum Padr%o pot 
nome S. Rafael, dos que levava para este descobrimenta 

_Mas para nao ficar sem desconto de trabalhos. este 
prazer das boas novas, adoeceo aqui muita gente, de 
que morreo alguma; a maior parte de ‘inchac6es de pers 
nas, 4 maneisa de eris{polas, e de-lhes crescer tanto a 
carne: das gengivas, que quasi ndo cabia na boca aos hex 
mens; (era: o. escorbuto, ainda :ent4o mal ‘conhecido), e 
assinx Como crescia, apadrecia, e cortavao nella como em 


carne.morta(z). A qual doenga vierdo depois a perceber ; 


lo Imperia de Monomotapa, ¢ entra no mar por varias bocas, a mais 
conhecida das quaes he a de Quilimane , cuja ponta do Norte esti em 
latitudde- S. 17° 47', © longitude 56° 30’. Chama-se-fhe vulgarmente 
Rio de Sena. oo 
(1}> QO gusano (supposto que este seja o mesma que @ do Brazil ¥, 
roe, © comsome todas as madciras, excepto as mui amargosas, como a 
Tapinhoan , ou as que tem alguns succos em certa grd0 verenosos, co= 
mo o féo de Arco do Pari, cuja serradura mata alguns insectos. As madei= 
tas. qne nfo tem estas propriedades , ¢ sd tent a de serem mui compat 
ctas, resistem nmis ou menos tempo, mas por uicimo séo destruias, 
O pioho he de todas:as madeiras a que elle desfaz mais dz prossa, Eu 
vi no Rio de Janeiro o forro do fundo da Néo S, Sebastido (que era de 
pinho) ficar em menos de um anno em estado, Gue muitas tabnas s¢ 
achavio reduzidas a poucos filamentos , que formavio como htrma tene 
da; ¢ mesta occasiéo he que se colheo hun gusano, qus tina duas pols 
Becadas, ¢ alguroas livhas de conyprido, a cor esbrunquicada, e emtas 
«Jo similhante 4: minhoca, excepto a cabeca, que era mais grossa, do que 
axeveria ser, segundo a grandeza do cotpo, e terminava em hunia boca 
mmedonds , e atrombetada. Morren logo que sé expoz d accio do ar. 
Alsumas pessoas tem-lhe dado o nome de Cupim do Mar, posém . 
asdile nfo tems a. menor similhanca cam o Cupim, que he bem bichinho 
ae cir fusca, do tamanho, e feitio dos bichos das fructas, . 
(2) Refere Castanheda, cue Pai:lo da Gama visitava os deentes de 
<A ta, de noite, consolando-os, ¢ répartindo com elles da: sua matalo- 
@ asm, . . | 
31 i 


24% 


que procedia das carnes, pescado saleado, e biscouto 
corrompido de tanto tempo. ‘Tiveraio mais dous gran- 
des perigos: hum foi, que estando Vasco da Gama 4 
borda do navio de seu irm3o em hum bote pequeno, sd 
com dous remeiros, e tendo as mios pegadas nas ca- 
déas da batocadura, em quanto fallava com elle, descia 
a apua tao teza, que lhe furtou o bote por baixo, e 
elle, e os marinheiros ficarao pendurados nas cadéas 
até que lhes acodirio, O outro perigo accnteceo a este 
mesmo navio o dia da sua partida, que foi a 24 de Fee 
vereiro: sahindo do Rio, foi encalhar em hum banco 
de aréa, onde esteve em termos de ficar; mas vindo 
a maré de cheio, sahio do perigo, com que Vasco da 
Gama seguio seu caminho, indo na volta do mar aquel- 
le dia e noite (1), por se afastar da Costa; e no dia 
sccuinte 4 tarde descobrio tres pequenas Ilhas (2), nao 
mui distantes humas das outras, duas com arvoredo, ec 
huma escalvada. Vasco da Gama continuou por cinco 
dias a sua derrota, navegando de dia, e pairando de 
noite; ena tarde do 1." de Marco vio huma Ilha pe- 

uena perto da Costa, e tres Ilhéos mais féra. Receoso 
de topar de noite com elles, virou no mar; e como 
amanheceo, tornou a buscar as Ilhas, desejoso de pas- 
sar entre ellas; e mandou diante Nicol4o Coelho para 
ir sondando, por ser 0 secu navio o mais pequeno da 
Esquadra; mas Nicoldo Coelho crrou o canal, e achan- 
do pouco fundo, virou, a tempo que sahido da Hi 
mais chegada 4 terra alguns barcos com yvélas de estei- 
ra, que lhe ficav4o em distancia de mais de huma le 
goa; ¢ chegando 4 falla de Vasco da Gama, the disse : 


(1) Barros nio individua circunstancia alguma da viagem de Vasco 
da Gama, desde o Rio dos Bons Signaes até Mocambique; as que eu 
mfirn sao tiradas de Castanheda. 

(3) Frio as Ihas do Fogo, das Arvores, e a Rasa, chamadas as 
tliat Primeisay Vasco da Gama passou sem ver as de Angoxa. 


245 


Que vos parece, Senbor? Fa esta be outra gente. E el- 
le lhe respondeo mui contente, que seguissem o bordo 
do mar, para poderem tomar aquella Ilha, d’onde sahi- 
rdo os barcos; € que surgiriao para saberem que terra 
era, ¢ se acharido noticias da India. 

Entre tanto os barcos os seguido sempre, capean- 
do-lhes que esperassem; e nisto deo fundo a Esquadra 
junto a dous Ilheos, apartados mais de huma legoa da 
Ilha, a hum dos quaes deo Vasco da Gama o nome de 
S. Jorge, -por ser este o de hum Padrao, que alli met- 
‘teo. Os barcos chegario logo cantando, e tocando seus 
instrumentos, em signal de festa: os homens, que nelles 
vinhao, erao bagos, e alguns brancos, de boa estatura , 
vestidos de algodao Hstrado de varias cores, com turban- 
tes, alfanges, e adagas, e fallavao Arabe. 

Entrados nos navios, hum dos mais bem vestidos 
perguntou o que buscavao? Vasco da Gama respondeo, 
por meio de Fernao Martins, que erao Portuguezes, e 
elle queria saber, que Ilha cra aquella? Ao que o Mou- 
ro (que depois se soube ser natural do Reino de Féz) 
satisfez dizendo , que se chamava Mogambique (1), de 
que era Xeque Cacoeja , que mandava por costume visi- 
tar os navios , que chegavao, para saber se vinhZo com- 
merciar na I|ha, ou sdmente prover-se para continuarem. 
a viagem. Vasco da Gama entao the disse, que elle vi-. 
nha aquelle Porto a buscar hum Piloto, que o levasse 
4 Iadia, para onde era o seu destino, e nao trazia gene- 
ros pafa negociar , excepto os précisos para a troce del- 
les comprar o que lhe fosse necessario. Com isto o- des- 
pedio, dando-lhe hum presente para o Xeque, assegu- 
rando-lhe o astuto Mouro, que havia na I]ha quantida- 
de de Pilotos, que sabiao a Navegacao da India. 


C1) Esta Ilha he bem conhecida, estd na latitude Sul 15° 3’, e lon 
Bitude 58° 27’, : 


246 


Pouco depois volrou com algum refresco da terra, 
@ hum recado do Xeque, que moveo Vasco da Gama, 
com parecer dos Commandantes, a entrar no Porto de 
Mogambique, o que fez, indo Nicoldo Coelho diante 
sondando, cujo navio tocou da pOpa em huma restings 
da Ilha, onde deitou o leme fora; porém dando logo 
em maior fundo, foi surgir junto da Povoagio; e apos 
elle toda a Esquadra. Feta Povoacao era de casas pa- 
Ihacgas, excepto a Mesquita, e as do Xeque. Os habi- 
tantas erio Mouros estrangciros, que alli se estabelecés 
F240, @ commerciavao com Quiléa, e Sofalla; e os nae 
turaes do Paiz erao Negros, que moravao na terra fire 
me, 

Nas Memorias relativas 4 Asia, e Africa Oriental 
exporci o resto desta interessante Viagem; e agora por 
antecipacio direi a conclusdo que teve. 

_ Vasco da Gama na sua torna-viagem para Portus 

1 perdeo o navio S. Rafael no mesmo baixo, entre 
Guilds e Mombaga, em que tocdra 4 ida; e por entia 
lhe ficou o nome do Baixo de S. Rafael, salvando-se 
toda a gente, que se repartio pelos outros daus navios, 
A 20 de Marso de 1499 dabrou o Cabo de Boa Espe. 
rancga. Proximo ds Ilhas de Cabo Verde se epartou del- 
le com tempo Nicoldo Coelho, que a 10 de Julho che~ 
gou 4 barra de Lisboa; e sabendo que o seu General 
ainda nao era chegado, quiz tornar a busca-lo, o que 
ElRei nio consentio. 

Vasco da Gama ancorou na Ilha de S. Tiago, -e 
entregando o navio a Jodo de Sa, seu Escrivao, afrevon 
huma Caravela, e foi 4 Ilha ‘Terceira, na qual falleceo 
secu irmio- Paulo da Gama, que vinha mui doente, e fi- 
cou sepultado no Mosteiro de S$. Francisco. Desta Ilha 
partio Vasco da Gama para Lisboa, onde chegou a 29 
de Agosto, sendo recebido d’ ElRei, e de toda a Corte 
com as maiores hoaras, festas puolicas, c demonstragdes 


247 


de alegria. As mercés que entao, e depois lhe fez ElRei, 
forio dar-lhe o Dom pata.clle, e seus irmaos, o Offi- 
cio de Almirante dos Mares da India, € trezentos mil 
réis de renda, o Titulo de Conde da Vidigueira, ea 
faculdade de empregar cada anno na India duzentos 
cruzados em mercadorias, livres de direitos, 0 que no 
tempo de Joao de Barros produzia em Lisboa sete mil 
cruzadgs, tudo isto de juro, e herdade. E ordenou 
‘ mais ElRei, que ao escudo das Armas da sua familia 
acrescentasse buma pega das Armas Reaes do Reino 
(Barros, Cap. rr.). | 
1g00 — Com a volta de Vasco da Gama a Portu- 
gal muddrao os discursos, que os homens até alli fazizo 
sobre as vantagens da descoberta, e conquista do Orien- 
te. vendo em Lisboa espectaria, aljofar, e pedraria, 
produces daquelles ricos Paizes, que antes olhavao 
eom admiracio quando os Venezianos as trazido a este 
Reino. E como pela viagem de D. Vasco da Gama.,. 
ge conhécee,, que o tempo proprio para sahir de Lisboa: 
era em Marco, e 0 espago de tempo que restava da 
epoca da chegada de D. Vasco da Gama até Marco 
do anno seguinte de rgo0, era mui curto, fez ElRel: 
Consellio sobre o modo que teria no proseguimento da- 
quella conquista, attentas as informag6es. que dava D.. 
Vasco da Gama, e assentou-se em se mandar huma 
rande forca naval, que désse dquelles Povos huma alta 
Téa de Portugal ; e igualmente foi logo determinado a 
numero de Ndos,.e de soldados, ec o Chefe da expedi- 
ga0, para que foi escolhido Pedro.Alvares Cabral..  ~ 
A 8 de Marco de 1500 foi: ElRei com. toda a Cor- 
fe ouvir Missa 4 Ermida de Nossa Senhora de Belem, 
defronte da qual. ancorou naquelle dia a Esquadra. Es- 
teve arvorada no Altar, em quanto se disse a Missa, 
huma bandeira da Ordem de Christo, que o Bispo de- 
€enra D. Diogo Ortiz (que prégou. nesta occasiao) beii= 


248 


zeo no fim da Missa, e E]Rei a entregou da sua mao 2 
Pedro Alvares Cabral com grande solemnidade de pa- 
Javras, tendo-o com sigo dentro da cortina, por honra 
do Cargo que levava, em quanto durério os Officios 
Divinos. Concluido este acto, foi levada a bandeira 
com solemne Tiucissio, que Elikci acompanhou até 4 
praia, onde Pedro Alvares, e todos os outros Com- 
mandantes Ihe beijirao a mao, e se despedirao delle. 
A maior parte do Povo de Lisboa cobria neste momen- 
to as praias, e campos de Belem; e muitos em batreis 
embandeirados rodeavao os navios , augmentando esta 
festividade o som de toda a qualidade de-instrumentos 
musicos (1). | 

Constava a Esquadra de doze navios de Guerra, 
entre Ndos, e navios menores, e hum ‘Transperte car- 
regado de mantimentos (2), todos bem aparelhados , 


C1) A narracio desta famosa Viagem foi feita 4 vista dos seguintes 
Escritores : Barros , Decada 1. Liv. 5. Capitules 1. e 2. -— Castanheda , 
Liv. 1. Cap. 30 e seguintes. —- Goes, Pate 1. Capitulos 54, 55, € 
$7. —— Colleccdo de Noticias para a Historia das Nacoes Ultramarinas , 
etc. Tomo 3. N. 3, que contém a Navegugdo do Cupitéo Pedre Alve- 
res Cabral, escrita por hum Piloto Portuguex, que hia na sua Armada, 
Capitulos 1., 2., ¢ 3. —- A mesma Colleccio, Tomo 3. N. 1, onde 
se acha a Noticia do Brazil, Cap. 34. — Corografia Frazilica do Padre 
Manoe] Alvares Cabral, impressa no Rio de Janeiro em 1817, na In- 
troduccio da qual (pag. 12 e seguintes) vem huma Carta escrita a 
ElRei D. Manoel, datada de Porto Seguro no 1.¥ de Maio de 1590, 
por Pedro Vaz Caminha, que hia embarcado na Nio de Pedro Alvaes 
Cabral. —- Epilogo Manuscrito dos Vice-Reis, e Governadores da In- 
dia, etc. , por Pedro Barreto de Rezende , Secretario do Vice-Rei Conde 
de Linhares. — O Padre Fr. Manoel Homem na sua Memoria da De- 
scripcio das Armas Castelhanas , etc., Cap. 29, —- Além de cutros va 
rios Escritores, que foi necessatio consultar, pela diversidade de opi- 
niGes, gue se encontra em alguns factos, e datas. 

(2) Os nossos Escritores sio unanimes em comporem esta Esquadra 
de treze navios de Guerra, sem fazerem mencio do T'ransporte de 
mantimentos; porcm Pedro Vaz Caminha, e o Piloto Portuguez da 
anesma Esquadra , cujas Relacdes vio citadas, dize, que s¢ compunha 


249 


armados, e providos para dezoito mezes de viapem. Erto 
Commandantes dos navios de Guerra (além do Chefe’) 
Sancho de ‘Tovar, que hia nomeado por segundo Com- 
mandante da Esquadra, Simao de Miranda, Aires Gomes 
da Silva, Vasco de Ataide, Pedro de Ataide, Nicolao Coe- 
lho, Bartholomeu Dias, Diogo Dias seu irmao, Nuno — 
Leitao, Luiz Pires, e Simao de Pina. Commandava o 
‘Transporte Gaspar de Lemos. A Guarnicdo desta Es- 
quadra era de mil e duzentos homens (1), entre Solda- 
dos, e marinheiros, toda gente escolhida. Hia por Fei- 
tor da Esquadra Aircs Correa, e por Escrivaes do seu 
Cargo Gongalo Gil Barbosa, e Pedro Vaz Caminha. 
Embaredtio tambem nella oito Religiosos de S, Fran- 
cisco, e por seu Guardiao Fr. Henrique, que depois fot 
Bispo de Ceuta; e mais hum Vigario, e oito Capellaes 
para ficarem na Fortaleza, que ElRei mandava fazer. 
Por hum dos artigos do scu Regimento mandava 
ElRei a Pedro Alvares Cabral, que procurasse ganhar 
a boa vontade de ElRei de Calecut, e persuadi-lo a 
dar-the licenca pata construir huma Fortaleza na sua 
Capital; e em caso de a negar, lhe declarasse a guerra, 
Por outro artigo lhe ordenava, que tocasse em Melinde , 
ara entregar ao Rei o presente, que conduzia, e o seu 
‘Embaixador;.e que lhe offerecesse 4 sua amizade pard 
tudo o que precisasse. Levava tambem ordem para en-+ 
viar a:-Sofala Bartholomeu Dias, e seu irmao Diogo 
Dias, a fim de negociarem as mercadorias,‘.de que hiad 
carregados, a troco de ouro, de que havia alli mbicd 


de doze navios, e outra embarcacdéo carregada de mantimentos, opis 
nido que me parecco mais segura, por ser apoiada com o testemunhd. 
de dow homens, que hido naquella Esquadra, 

(1) Castanheda, Goes, e Fr. Manoel Homem dizem mil e quichen- 
tos hom:ns; Barros, Faria, e Pedro Barreto mil e duzentos. He mais 
provavel , que este fosse o numero da gente, attendendo a que Os nae 
vios ainda nao erio mui grandes, 

32 


250 


‘quantidade , de cujo Commercio estavdo entao sehhores 
os Mouros. 

No dia seguinte 9 de Margo sahio Cabral de Lis- 
boa com toda a Esquadra. A 14 vio a Grao Canaria a 
tres ou quatro legoas de distancia, e¢ passou o dia em 
calma. A 22 dobrou Cabo Verdc, e¢ nessa noite se se- 
parou onavio, de que era Commandante Luiz Pires (1), 
gue arribou a Lisboa maltratado. Pedro Alvares o espe- 
rou pairando por espago de dous dias, e como nao ap- 
pareceo, continuou a sua derrota. E querendo esquivar-se 
4s calmarias de Guiné, empenhou-se tanto no bordo do 
S.O., que a 24 de Abril descobrio terra para Oeste 
por 16° 30’ de latitude Sul, suppondo-se a 450 legoas 
ao Occidente da Africa (2). 

O primeiro ponto que se descobrio foi hum mon- 


C1) Pedro Vaz Caminha, na sua Carta a E]Rei D. Manoel, jd cita- 
da, diz que Vasco de Ataide foi quem se apartou da Esquadra; mas he 
equivoca< do. 

(2) Esta he a opiniao geral dos nossos Historiadores, contando nesse 
numero o Piloto da Esquadra de Cabral (jé citado) , testemunha ocue- 
Yar; ainda que Pedro Vaz Caminha, outra testemunha ocular, diz que 
@ terra se vio na tarde de 22 de Abril, quarta feira depois da Pascoa , 
com as circunstaicias de encontrarem na vesp2ra muitas hervas, e naquelb- 
Ja manhi de 22 muitos passaros , como era bem natural que succedesse : 
concorda porém com o Piloto, em que a Missa foi celebrada em Por- 
to Seguro no dia 26, acrescentando, que era Domingo de Pascoela; e 
© Piloto-diz ser no Oitavario da Pascoa. 

Barros affirma, que a terra foi descoberta na latitude de 10°, e que 
Cabral a costeou.dalli- para o Sul até achar Porto Seguro, aride se cale- 
brou a Missa no.Domingo de Pascoela, o qual, pela sua-narracio , cahio 
a 29 daquelle mez. A viagem costeira de Cabral até Porto Seguro he 
mais gue inverosimil, tanto porque n:ste longo caminho de cento e 
cincoenta legoas havia de descobrir a Bahia, e outras aba mais ao Sul, 
em que procuratia ab-igar-se ; como porque sendo o vento S.E., ( assim 
o dizem as duas testemunhas oculares), e estando cfle proximo ¢ terra, 
Jo podia costear aguella parte do Brasil, que desde 10° aré 5 3° corre a0 
S.O., e depois ao Sul, com pouca differenga. 

Francisco de Brito Freire copiou cegamente este lugar de Basros,. 
na sua Historia da Guerra Brasilica, Paste 1. pag. 12. 


251 


te alto, e redondo, a que deo Cabral o nome de Mon- 
te Pascoal (1), por ser entio 0 Oitavario da Pascoa, 
e depois forio apparecendo terras mais baixas para o 
Sul com ‘grandes a4rvoredos. De tarde, aproximando-se 
a Esquadra a meia legoa da Costa , deo fundo de- 
fronte de hum pequeno Rio; e Pedro Alvares mane 
dou o Mestre da sua Ndo em hum escaler, para ver que 
gente era a que andava pela praia: achdrao alguns natu- 
raes de cér parda, bem dispo.tos, os cabellos pretos, e 
compridos, armados de arcos, e frechas, e todos absoe 
Jucamente nus, homens, e mulheres; Como ninguem os 
entendia, e'as vagas rebentavao nas praias, nao podérae 
desembarcar, e apenas |hes podérao dar dous barretes 
vermelhos, e receber delles algumas obras de pennas 
de varias cores; e feito isto, recolheo-se o Mestre a 
bordo. : 

De noite ventou S.E. rijo de aguaceiros, com que 
garrarao os navios, e pela manha se fez Pedro Alvares 
Cabral 4 véla ao longo da Costa para o Norte, em bus- 
«a de algum Porto, em que fizesse agua, ¢ lenha, e po- 
desse ter melhor communicagio com os habitantes, indo 
os navios com as lanchas por popa; e ordenou, que as 
embarcacdes pequenas nayegassem mais 4 terra, e que 
#e achassem bom ancoradouro para as Ndos, surgissem. 
{om effeito, tendo navegado cousa de dez legoas desde 
© ponto da partida, acharao huma aberta no fim. dos 
recifes, pela qual entrario, e virio que dentro se fazia 
hum Porto grande, e mui seguro (2), por cuja: causa 
derao fundo. _ 

_Affonso Lopes, Piloto da Capitania, que Cabral 


(1) Este monte ainda conserva o mesmo nome, e esta situado em 
12° 22° de latitude. E nao faca divida ser differente a que Ihe deréio 
os Pilotos da Esquadra, attendendo aos instrumentos, e ‘l'aboas daquel- 
}e tempo, . 

(2) .O Rio de Santa Cruz, em que ancorou Cabral, € a que deo 9 
32 


252 


-mandira a bordo' de hum dos navios pequenos, por ser 
homem mui habil, sahio logo em hum escaler a sondar 
© Porto, e nesta occasifo tomou dcus indigenas, que 
‘estavdo pescando, e ja de noite os cohduzio a Pedro Al- 
vares, que havia entrado com o resto da Esquadra em 
seguimento dos primeiros navios, vendo que estes davao 
fundo. Os dous prisioneiros passirao a noite a bordo, 
sem quererem comer, e sem responderem aos acenos, que 
se lhes fazido. Pela manha, vindo a bordo da Capitania 
todos os Commandantes , ordenou Cabral a Nicolfo 
Coelho, Bartholomeu Dias, e Pedro Vaz Caminha, que 
os levassem para terra, jd providos de camizas, barre- 
tes, campainhas, cascaveis, e Outras quinquilharias, com 
que forgo mui contentes. Na praia cstavao mais de du- 
zentos naturaes, todos nus, com o beico inferior fura- 
do, eno buraco mettido hum osso, ou huma pedra 
azul; em fim era4o em tudo iguaes aos que antecedente- 
mente tinhao visto. 

Estes Selvagens recebérao os Portuguezes com gran- 
des festas , o que observando Pedro Alvares Cabral, de- 
cerminou que naquelle dia 26 de Abril se celebrasse Mie 
$a, para a qual sc armou huma barraca em huma coroa 
de aréa, que na vasante ficava em seco (chama-se hoje 
Coroa Vermelha), e Fr. Henrique disse a Missa, e pré 
Zou, assistindo o General com a bandeira Real, e todos 
os Commandantes, ¢ pessoas principaes da Esquadrsa. 
Os naturaes, que estavao pela praia, consideravao mui 
attentos as ceremonias Religiosas, e acabadas ellas, can- 


nome de Poito Seguro, fica coberto com os recifes, que o abrio¥o do 
mar, e cabem dentro muitos navios con toda a seguranca, tendo no- 
ve e dez bracas de fundo; mas a Povoacio antiga, que se havia erigi- 
do neste local , foi depois abandonada pelcs seus moradores , por se: 0 
sitio doentio, ¢ se acha estabelecida onde hoje se chama Porto Seguro, 
mais para o Sul; e por corsequencia este Poito Seguro moderno niio be 
© mesino, em que Cabral ancorou, e a que deo este nome. Esta Coste 
do Brasil era habitada naquelle temoo pelos Indios Tupiniquins. 


2638 


taro, ¢ baildrao.com grande alegria, ¢ viero acorhpa- 
nhando o General até sc embarcar, mettendc-se alguns 
pela agua, ¢. outros nadando atraz dos escaleres. . 
. Na’ mesma tarde voltou Pedro Alvares a terra, e 
achando-st tum Rio de agua doce, se comecou a fazer 
apnada, e lenha, ajudando os naturaes nestes trabalhoas 
gos marinheiros; e tao familiares se mostravdo, que al- 
guns Portuguezes forao 4 sua Aldea, situada dalli huma 
legoa, d’onde trouxerao papagaios, inhames, e arroz 
em treca-de guinquilharias, que lhes der#o. -As casas 
destes Selvagens erdo de madeira , cobertas de ramos de 
arvores ; € em todas se virao redes de algodio, em que 
dormido. N&o se. Jhes vio ferro, nem outro algum me- 
tal, e servido-se de machados de pedra para cortarem 
as madeiras. Todo o Paiz era abundante de aguas, e 
arvoredo; de milho,.inhames, e algodao; e as aves im- 
mensas, e de mui;vistosas Cores, - 

Deteve-se Cabral cinco, ou seis-dias neste Porto, e 
por conselho dos Commandantes expedio para Portugal 
o Transporte ja descarregado dos mantimentos, que re- 
partio pela Esquadra; e escreveo a ElRei D;:-Manoel 
os acontecimentos da sua viagem, e lhe mandou -dous 
Naturaes, que quizerao tr por sua vontade; esta embar- 
cagio sahio de Porto Seguro a 2 de Maio, e.a sua che- 
gada a Lisboa causou grande prazer a ElRei,; e a todo 
o Reino. Pedro Alvares deo a este Porto o- nome: de 
Porto Seguro , onde deixou dous degradados ‘(hum das 
quaes veio depois a Portugal ), e mandando levantar. sa 
praia huma grande Cruz de madeira (1), como-em si- 


- (1) Barros diz, que mandou arvorar buma Cruz mni grande no cj- 
mo da arvore, ao pé da cual se celebrou a Missa. Pedro Vaz Caminha 
diz, que mandou Jevantar na praia huma grande Ciuz de pdo com as 
Armas Reaes. O Piloto da Esquadra (a quem segui) nio falla das Ar- 
smas Reaes. Castanheda diz, que era hum Padrao com huma Cruz; e 
Goes , que foi huma Cruz de pedra, como por Padrio. 


255 


te em sentido opposto, e no momento em que se hido 
abordar, para se fazerem em pedagos, outra ondulagio 
inversa do mar milagrosamente as separou. O vento pas- 
sou depois com furia ag S, O., e assim podérdo os na- 
vios seguir caminho a arvore seca, apartados huns dos 
outros, cada qual comomelhor se aguentava. Cabral, 
e outros. dous navios (em hum dos quaes hia o Piloto, 
ue escreveo esta viagem) tomarao hum rumo; a Nido 
Rei. e outros dous seguirao outro; e o- de Diogo Dias 
outro: logo tratarei deste. 
© mao tempo durou por vinte dias, com poucos in-- 
tervallos, e scm avistar terra alguma, se achou Cabral 
com os seus tres navios a 16 de Julho no parcel de So- 
fala , onde com effeito descobrio a terra, sem a conhe- 
cer, ¢ correo ao longo della com bom vento, e aprazi- 
vel rempo , distipguindo grandes arvoredos, e muito ga- 
do. Chegando ds Ilhas Primeiras, vio deus navios de 
Mouros,, que intentario: fugir, mas forio tomados sem 
resistencia ,, dcitande-se a0 mara maior parte da gente 
(de que alguma: se affogou.) para: salvar-se nas Ilhas, 
Destas embarcagGes era dono, e Capitéo Xeque Fotci- 
ma, tio do Rei de Melinde, que vinha de Sofala com 
yauito ouro. Pedro Alvares, sabendo quem elle era, pe- 
zou-lhe muito deste acontecimento, e fazendo-lhe mui- 
tas honras, Jhe mandou entregar os navios com tudo 
quanto tinhao. Xeque Foteima o informou. das minas 
de Sofala , e de que pertencido ao Rei-de Quiloa (1) , 
e Ihe advertio, que o parcel. de Sofala ja lhe ficava mui-- 
to longe. 
Continuando Pedro Alvares a sua: viagem, ancorou: 
em Mogambique a 20 deste mez de Julho; e passando 
poucos dias depois a Quiloa, como direi na segunda 


Cv) Pequena Wha situada em huma Bahia na Costa da Africé Orien- 
tal, na latitude S. 8° 37’, e longitude 58° 57’. 


256 


narte destas Memorias, se Ihe reunio alli a Ndo Rei 
com as outras duas da sua conserva, que se havido se- 
parado- no temporal, Lo 

Diogo Dias, correndo com.a tormenta, foi ter a0 
Estreito da Arabia, e Cidade de Magadaxo (1), e aqui 
perdeo a lancha com toda a sua eqdipagent, em conse. 
quencia de huma traig¢fo dos: Mouros; e ficando sé com 
sete homens, e sem Piloto, voltou para Portugal, e em 
Cabo Verde se veio encontrar com Pedro Alvares Ca- 
bral na sua torna-viagem, o qual tendo dobrado o Ca- 
bo de Boa Esperanga a 22 de Maio de 1501, surgio 
por acaso na Bahia de Bezeneguc, onde estava fazendo 
aguada a Esquadra commandada por Amicrico Vespu- 
cio (2), ¢ entrou depois em Lisboa a 31 de Julho, ha- 
vendo-se-lhe perdido o navio de Sancho de Tovar (de 
duzengas toneladas} em hum baixo na Costa de Melin- 
de, de que se salvou unicamente a Guarnicio.. 

1500 — Nocomceyo do Verio deste anno de 1500 (3) 
partio de Lisboa Gaspar Corre Real, homem valoroso, 
e amigo de ganhar honra, em hum navio armado, par- 
te 4 sua propria custa, parte 4 custa-d? ElRei D. Ma- 
nocl, com o projecto de fazer descobrimentos ao No- 
roeste de Portugal, e ver se achava por alli passagem 
para os mares Orientaes: projecto atrevido, e quasi in= 
crivel para aquelle seculo! 

Desta viagem niio se sabe mais nada, sen#o_o que 
consta dos dous citados Escritores, isto he, que Corre 


(1) Cidade da Africa Oriental, situada na latitude 2210 N., 6 
longitude 63° 50% 

(2) O facto he extraordinario, porém assim 0 relata o proprio Pilo- 
to da Esquadra de Cabral; ¢ ow aqui estava tambem Diogo Dias, ou tie 
nha partido poco antes para Lisboa. Barros falla do encontro de Cabral 
com Diogo Dias com acontecido na Ilha de Cabo Verde. 

C3) Dainiio de Goes, Parte 1. Cap. 66.— Vede a excellenre Me- 
moria do Sir. ‘Trigeso no ‘Tomo &. das Memorias dz Litesatura Porte- 
EucZa, pag. 395. , : 


267 


Real descobrio hum Paiz, cuja face do N.E. costeou 
r duzentas legoas (1), sem poder passar mais para o 
orte, por causa dos gelos, e neves, e regressou a Por- 

tugal com quasi hum anno de viagem, deixando 0 no- 

‘me de Terra Verde aquelle Paiz, que era mui fresco, 

e de grandes arvoredos, e os seus habitantes (de que 

trouxe alguns ) de estatura mediana, alvos, mui barba- 

ros , ligeiros na carreira ,-e habeis frecheiros. 

4501 — Neste anno mandou EiRei aprestar tres 
Naos, e huma Caravela grande (2), para. cujo com- 
mando em Chefe nomeou a Jo#0 da Nova, Nobre Gal- 
lego, a quem havia dado a Alcaidaria de Lisboa, que 


C1) Se Corte Real vio a terra da America por 50° de latitude N., 
como diz Galvio , era forcosamente a Nha da Terra Nova, mas parece 
que nfo chegou ao seu extremo do Norte, situado em 52° de latitude, 
alias veria o Estreito chamado hoje de BelleeIsle , que dd passagem para 
@ Goifo de §. Lourenco, eo grande Rio do mesmo nome , por entre.a 
Costa do Lavrador, © a mesma-Ilba da Terra Nova; e era natural que 
elle commettesse o exame daquelle Estreito, segundo o plano da sua 
vidgem ; ou, s¢ Cio © Estreito, a falta de viveres, e 0 receio dos frios 
do Inverio o petsuadiréo-a regresear a Portugal, para no anno seguinte’ 
proseguir .o seu descobrimento.. 

A Tiba da Terra Nova tinha jd sido descoberta por Sebastifo Ca« 
bore, Veneziano, que achando-se em Inglaterra, se offereceo a Henri- 
que YII. ‘para ir fazer descobrimentos de novos Paizes para a parte de 
Oecste; e sahindo de Bristol com dous navios no Verio de 1697, chee 
gou a.ver terra por 56° de latitude ; e observando que corria para o Nore 
te, temeo os frios daquella Regiio, e voltou para o Sul. Nesta derrota 
descabrio a Wha da Terra Nova, de cujos agrestes habitantes metteo tres. 
a bordo, Seguio depois o tumo do Sul até 38° de latitude; e achando- 
se 74 mui falto de viveres, voltou para Inglaterra, onde os Selvagens 
vivério muito tempo. Os Inglezes néo torndfio a emprehender esta na= 
vegacdo, senio passados muitos annos.. Vede Clark , Tomo 1. Appen- 
dix B. : 


(2) Vede Faria, Asia Portugueza Tomo 1. Parte 1. Cap. 6. — 
© mesmo ro Tomo 3. .no fim. — Fr. Manoel Homem, na sua Obra 
jé citada, Cap, 29. — Galvio, Tratado dos Descobrimentos. — Pedro 
Barreto de Rezende , j4 citado. — Goes, Parte 1. Cap. 63. —- Barros, 
Decada 1. Liv. 5. Cap. 10. . 

a3 ot . 


259 

Na sua torna-viagem para Portugal descobrio a 
Iiha de Santa Helena (1), em que fez aguada, de ma- 
peira que nesta viagem deixou descobertas tres Ilhag, 
as duas ja mencionadas, e outra no Canal de Mocam- 
pique, que conserva o seu nome (2). A 11 de Setem- 
bro de 1502 ancorou em Lisboa, e foi recebido d’ E]- 
Rei com grande honra. : : 

15091 — Movido EjRei D. Manoel pela reputacdo 
de habil Navegante, que tinha adquirido Americo Ves- 
pucio, natural de Florenga (onde nascera em 1451, © 
que acabava de fazer duas viagens ds Indias Occiden- 
taes), lhe escreveo a Sevilha convidando-o para vir a 
Portugal , a fim de ser empregado no seu Real Servico, 
© que elle acceitou; e chegando apressadamente a Lis- 
boa, achou jd tres navios promptos, ea que se embar- 
Gu, ¢ sahio deste Porto a 10 de Maio-de 1501 (3). . 

Ignora-se 0 nome do Chefe desta pequena Esqua- 
ara ,.cuja Commissao era examinar, e reconhecer as Cos- 
tas do Brasil (4). Seguio elle .o rumo para as Canarias; 
avistou-as , e atravessou para a Africa, que foi costean- 
Ao, demorando-se por alli ‘dous ou tres dias em fazer 
pescaria de pargos, até chegar a Bahia de Bezenegue, 

uc situou na latitude N. de 14° 30’.com. bastante exacti- 
‘dio; e nella se encontrou com Pedre Alvares Cabral, 
gue volrava da India. Gastdrfo onze dias em fazer 
agua,e¢ienha, c partirdo em demanda do Brasil, nave- 


gando ao S.0. 4 


C1) Esta ha tornou-se tao celebre, que he inutil dizer della cousa 
alguma. . 

(2) <A Ilha de Jodo da Nova, situada no mar da India, esta na la 
tude 16° 58’S , ¢ lonzitude 61° 9% 

(3) Vede a Collecc%o de Noticias para a Historia das Nacdes Ultra- 
marinas, ji citada, ‘lomo 2. N. 4 pag. 1q4t. . 

(4) O Author da Corogratia Frasilicz, na Introduccio do Tomo 1, 
-pag, 37, duvida da verdade destas Viagens, que me patecem somente 
cheias de exaceracées. . 

33 i 


260 


No fim de sessenta e sete dias de navegacao, sem- 
pre com grande trabalho, e ventos contrarios, soffrendo 
por espaco de quarenta e seis dias trovoadas , chuvas, e 
“Cerrac6es , virdo terra no 1.° de Agosto pela latitude S. 
de 5° (1), e julgérado que distaria setecentas legoas do 
‘ultimo ponto da sua partida (2). Surgirao a meia le- 
goa da Costa, e desembarcando, achdrao o Paiz alegre 
‘e vicoso, onde sé virao vestigios de gente, e tomario 
‘posse delle por ElRei de Portugal. No dia seguinte 
‘tornardo para fazer agoa e lenha, eentao virao no cume 
‘de hum monte alguns naturaes todos nus, que nao qui- 
‘zerao descer , por mais diligencias que se fizerde. Estes 
homens erZo fe mesma cér, e feigdes dos que Vespucio 
tinha visto nas Indias Occidentaes ; e sendo ja no fim 
‘da tarde, se recolhérao para bordo, deixando-lhes na 
praia alguns cascaveis, espelhos, e outras quinquilha- 
rias; o que tudo elles vierdo buscar logo que as lan- 
‘Chas se alargdrao da terra, mostrando-se maravilhados 
4 vista daquetles objectos tao novos. 

Na manha seguinte, observando-se dos navios, que 
©s naturaes fazido muitos fumos, julgou-se que era. pa 
ra os chamar, e desembarcando, virao muitos reunidos 
‘a certa distancia, que Ihes acenavao para que entras- 
sem pela terra dentro, 0 que ousdrao fazer dous: Portu- 
guezes, obtida primeiro huma repugnante licenga do 
Chefe da Esquadra; e assim partirao com intento de 
examinarem, se aquella gente possuia alguma riqueza, 
especiaria, ou drogas, e levdrdo iogo comsigo alguns 

(1) Parece que seria o Cabo de S. Roque, que estd em latitude S. 
$° 75 © mais provavelmente algum ponto da Costa ao Sul delle; ali 


se perderijo nos baixos do mesmo nome, que correm desde o Cabo pe 
ra o Norte. 


(2) Esta distancia he excessiva, e@ 0 sio todas as de Americo Veo 
Pucio, por isso ndo copiarei mais nenhuma; e advirto, que os Jtalir 


nos contavso quatro milhas por cada legoa; e assim.o grdo tinha oer 
ta milhas, | 


261 


generos de trafico, tendo porém ordem. de se no ‘dila- 
tarem mais de cinco dias, porque outros tantos se es- 
perdria por elles. . . 3 
‘.  Partides estes dous homens, recolheo-se a gente a 
bordo, e dalli: :vido todos os dias virem os naturaes a 
praia, mas sem quererem deixar-se communicar. Ao se- 
timo dia desembarcarao os Portuguezes, e observarzo 
que os Selvagens tinh#o trazido comsigo as mulheres, 
e as manddrao para elles apenas os escaleres se aproxi- 
marado da terra; e vendo-os tao desconfiados, envidrio- 
thes hum moco mui gentil, e galhardo, ficando elles 
nos escaleres para thes mostrar maior confianga. O mo- 
¢o foi sem suspeita alguma ter com as mulheres, que 
formérao hum circulo 4 roda delle, e apalpando-o, e 
examinando-o attentamente, se espantavao sobre maneira. 
Entretanto desceo do monte huma mulher com hum gran- 
de pdo na mio, e chegando-se por detrds aelle, Ihe deo 
tao forte pancada na cabega, que o estendeo morte: 
as outras o tomarao logo pelos pés, e 0 arrastardo pa- 
ra 0 montc, e os homens corréraéo 4 praia, e comecé- 
rao a atiras com as suas settas, © que poz a gente dos 
escaleres em tal confusdo, que estando surtos sobre os 
bancos de aréa junto a terra, nenhum atinow a tomar 
as armas, por causa das muitas frechadas que sobre el- 
Ies choviao. Dispardra4o-se quatro tiros de canhao- con- 
tra os Selvagens, que nado acertario; mas ao ruide del- 
les, fugirdo para o monte, onde as mulheres estavdo 
fazendo o cadaver em pedacos, e assando-os em huma 
grande fogueira, os mostravao aos Portuguezes, e os 
comiao; € os homens lhes dizigo por acenos, que o 
mesmo havido feito aos outros seus dous eompanhei- 
ros. Mais de quarenta homens querido desembarcar, 
para vingarem similhante barbaridade; porém o Chefe 
nao oO quiz consentir, e se fez a véla. 

Seguindo a sua derrota entre o Leéte e o Sueste,,., 


262 


que he como corre a Costa, fizerao varias escalas, sem 
acharem gente com quem podessem tratar; e¢ assim nae 
vezirgo até verem que a terra voltava para .o S.O,; e 
em dobrando hum Cabo, a que pozerdo nome de San- 
to Agostinho (1), que suppozerao na latitude S, de 8° 
principidrio a seguir a direcgio da terra, e virdo 
hum dia muita gente, que corria pela praia a ver 
Os naviOs , Os quaes por isso se aproximardo, e mane 
d4rio alguns escaleres a reconhece-la. Achando bom 
ancoradouro , e homens de melhor condi¢gao , derao 
fundo , e se detiverio cinco dias commercizndo com 
os naturaes, que tinhao muita canafistula ; e tres 
delles se embarcarao voluntariamente para Portugal. 


(1) O Cabo de Santo Agostinho estd na jatitude S. 8° 22°, e lon- 
gitude 342° 45’. 

Bernardo Pereira de berredo na sua Historéa do Maranhdo, Liv. 1., 
diz, que Vicente Annes Pincon , sahindo de Palos em 13 de Novembro 
de 1499 com cuatro navios armados ¢ sua custa, e de outro seu pasen- 
te, tendo licenca dos Reis Catholicos D, Fernando, e Dona Isabel para 
ir fazer descobertas, tocou na Jha de S. ‘Tiago, d’onde sahio em Janei- 
so de 1500; sendo o primeiro Hespanhol que passou a Linha, descobtio 
em altura de 2° S. o Cabo de Santo Agostinho, a que chamou da Con 
solacio , onde desembarcou , e escreveo nos troncos das arvores os no- 
mes daguelles dous Nonarchas, ¢€ 0 seu proprio, com a data da sus 
chegada. Voltando dalli para o Norte, foi correndo a Casta, entrou no 
Ama.onas, que appzllidou Mar Doce; e cortando a Linha, descobrio 
hum Cabo, a que poz nome de Cabo do Norte, em 2° 40’ de latitu- 
ce. Dalli seguindo para Oeste cousa de quarerta legoas, entrou em hum 
Rio, a cue deo o seu proprio nome, Gue ainda conserva, e-que as 
Fiancezes chamio Wiapoc. Em hum alto junta a sua f6z2 mandau de 
pois o Imperator Carlos V. levantar hum Padrio, para marcar os limites 
entre as Possessdes de Portugal e de Hespanha, cujo Padrao {oi desco- 
heito no anno de 1723 por Joio Paes do Amaral, Capitio de huma das 
Companhias da Guarnicio do Pard. 

Galvao concorda com Perredo no descobrimento do Cabo de Saate 
Agostinho, e Rio das Amazenas por Pingon, Porém o Author da Ceres 
graha Erasilica (em a Nota da pag. 34, Tomo 1. da Introduccio} sue 
tenta, gue Pincon nio vio o Cabo de Santo Agestinho antes de Pedro 
Alvares Cabral o descobric, mas sim o Cabo do Norte. 


Sahindo deste Porto, tomdra0 o rumo do S.O., 
fazendo tuitas escalas, e fallando com muitas gentes, 
os recebiao benignamente , por cuja causa se demo- 
ravZo alguns dias por aquelles Portos. Assim forao até 
chegarem 4 altura de 32° S. Todo o Paiz era muito 
voado, e€ os naturaes mui domesticos; tinhdo a cér 
avermelhada, os cabellos negros, e corredios, andavdo 
todos nus, erdo bem feitos de corpo, e€ o aspecto seria 
gentil , mas tornavao-se feios, porque tinhao as faces, 
© nariz, as orelhas, e os beicos chetos de furos, em que 
mettido pedacos de varias pedras, e de cristal, e ossos 
lavrados com primor. Nao virio entre elles ouro, ain- 
da que tiverao noticia de que o havia no Paiz, bem co- 
mo perolas, e pedras preciosas. - 
Dez mezes tinha consumido a Esquadra neste re- 
conhecimento, quando o Chefe encarregou Vespucio 
de. dirigir 4 derrota:' em consequencia mandou este fas 
#ér agtta ,e lenha para seis mezes, tempo que os Offi- 
ciaes dos navios dizizo que elles poderiao navegar ain« 
da. : Aos 2$ ‘de‘Fevereiro de 1502 tomou a Esquadra 
o rumo do S.O. (1) , e por elle navegou até se 
achar ra Tatitade Sul de 52°. Neste dia lhe deo huma 
tormenta’ de $.S.0..com muito mar, e cerracio, e 
eerreo.-cony-ella ‘em arvore seca por. quatro dias, em 
ue vio huma terra desconhecida, a qual costeon cousa 
viste lepoas.,e achou tudo costa brava, sem Por» 

to, nem Povoacio; o frio era ineupporrarel, © mar mui- 
to grosso., e a cerragao grande. Nestes termos, sendo 
impossivel aguentar-se mais, conveio Vespucio com o 
Ghefe em regressar.a Portugal, e feiso signal de reunido 
4Esquadra, deitdrao a pépa; e a noite, e dia seguinte 
cresceo. tanto a tempestade, que estiverao em riscos de 


(1) O original tem.o rumo de E.S,E., mas he hum erro palpavel 
© por isso substitui o rumo do §.O., que he a direccdo da Costa. 


266 


~ 


que convocando © concelho, pareceo a tadoe se envias- 
se huma Esquadra de trinta navios em auxilio de Ve- 
neza, por screm mui grandes os males gie se poderido 
seguir, se os ‘Turcos realizassem a invasio que projecta- 
vao. : , 

Na conformidade deste voto, partio de Lisboa a 
1g de Junho deste anno o Conde de Varouca D. Joao 
de Menezes, com trinta navios de Guerra, entre pran- . 
des ¢ pequenos, escolhidos dos melhores de toda a Ar- 

mada, guarnecidos com tres mil e quirhentos soldados: 

era segundo.no commando geral Ruy Telles de Mene- 

zes. “Encorporada com esta, e debaixo das suas ordens, 

sahio.outra Eisquadra, em que hia muita gente Nobre, 

para ficar de guarnicao no Castello de Mazalquivir, no 

caso.de se poder ganhar de passagem, objecto que El- 

Rei tinha em vista; e em segredo encarregou o Conde 

de Tarouca. de 0 tentar; por quanto, tomado este Cas- 

tello, Ihe seria facil apoderar-se de Oriao. 

-As duas Esquadras dirigirao-se ao Cabo de Sane 
ta. Maria no Algarve, onde se lhe reunirio algumas 
embarcagSes armadas nos Portos daguelle Reino, que 
alli as esperavao. ; 

Seguindo a sua‘ derrota, chegdrao as Esquadras 4 
vista -de Mazalquivir a 19 de Jutho, e por ser ja tarde, 
se fez o Conde.na volta do mar, com intengio de come 
metter o desembarque no dia sepuinte; porém os ventos 
contraries lhe embaracdrao tomar o Porto antes de 23, 
© que.deo tempo avs Mouros de se reforgarem. 2 
- .  DeeembarcérZo a final as tropas, ficando o Conde 
no, scu escaler a requerimento dos-Fidalgos, que o acom- 
panhav3o; .e€ sem opposi¢ao chegdrao as muralhas do 
Castello, e.comegavao a arrumar-lhe as escadas, quan- 
do de repente sahirao de dentro quatrocentos cavalios, ' 
e alguma gente de pé¢, e carregdr40 os Porruguezes com 
tanto vigor, que estes ¢heios de terror. panico , fugiraa 

34 


266 


pm derordem, e se secolhésdo as lanchzs, detxaado aly 
guns mortos -no campo. . 
_ Pescontenre deste desastre, fructo da pouca Discie 
plina daquelles tempos , deo o Conde de ‘Tarouca, com 
@ parecer dos seus Officiaes, por acabada a empreza, e 
espedio para Portugal a Esquadra auxilier; e proseguin- 
do a sua derrota, fez escala em Alicante, e nas Uhas 
_ Baleares; e por ultimo entrou em Calheri, Capital da 
Sardenha, para refazer-se de viveres, ema que se demo 
sou pouco; e tornando a secu caminho, encontroy 
travéz de Tunes huma Carraca, e dous Galedes Genor 
vezgs , que hiZo para Orfo carregados de mergadorias, 
entre as quacs haviao muitas pertencentes a Turcos, 
Mouros, e Judeos. Com estas prezas volton o Cande s 
Calheri, e tomou por perdidas todas as fazendas, que 
niio erfio de Genovezes, ou de outros proprietarios Chris- 
t3os, carregando-as nos navies da sua Esquadra ; largou 
orém a Carraca, e deo liberdade a sessenta Moures, ¢ 
Frurcos , @ alguns Judeos, que achou abordo das prezas , 
Was quaes levou os Galedes, por ter necessidade delfes 
para a sua commissao. 

Navegando de Cdlheri para a Costa da Grecia, ene 
gontrou tres Galés Venegianas, que o acompanhdario 2 
Ilha de Corfu, onde © veio reccber tres legaas ao mar 
oq General da Armada de Veneza, com vinte ¢ cinco 
grandes Galés , e cinco Galedes. Dilatou-se algum teme 
po o Conde de Tarouca em Corfu, e sabende-se que 
os Turcos havido abandonado © projecto, que tinkio 
contra a Grecia, e rccolhido j4 o seu Armamento, vol- 
tou para Portugal, seguindy quasi a mesma derreta, qua 
fzera 4 ida, e chegou a Sagres dia de Natal, d’onde 
passou a Lisbua, havendo-se perdido no caminho com 
rormenta os dois Galedes Genovezes. Os generos apreza- 
ays repartirao-se pela gente da Esquadra; e du quinto, 
que Ihe tocava, fez El]Rei mercé ao Conde. 


267 
1502 — Com a chegada de Pedro Atvares’ Cabral 
foi EtRei D. Manoel informado do estado de guerra, 
em que. ficavao. os Portuguezes na India com ‘6 Ret de 
Calecur.,.c assim determinou mandar hume grande fot- 
‘naval, capaz de fazer respeitar a sua Bandeira nos 
mares Orientaes (1). bm consequencia fez trabalhar com 
tanta actividade nos Arsenaes, e era tat a abundaficia de 
munigées, e: petrechos, que nos firis de Janeiro deste an- 
no de 1502 se. achav30 promptos quinze nayios, dos. 
¥inte.destinados para aquetla viagem. Dividio-os ElRei 
em deas: Bequadras: a primera das maiores dez Nos, 
© a segunda de cinco, Scundo. o resto-para se formar 
tums, tevecira: Esquadra , que devia partir loge que es= 
tivesse completamente armada : 
Offereceo ElRei o Commando emChefe a-Cabral, 
mras sabendo este, que Vicente-Sodré-estava noméado 
a €Commandante da segunde. Esquadra, com ham 
egimento, qué quasi o isestaria da: sda jurisdiccio, 
porque hia ficar estacionario na- India, para fazer a 
gueréa: aoe inimigos do Estado, como era bomém de’ 
maites primores dceerca do ponto de bonra, teve sobre’ 
este. nigotio. diguus requerimentos, a-que ElRei lhe 
nO setisfix, de que résultou- ser nomeado em seu li} 
gae Ls. Vasco da Gama. 4 
_  Exdo Commandantes dos navios da primeira Es-' 
quadra D. Luiz Coutinho, Francisco da Cunha, Jofo’ 
Lopes Perestrello, Pedro Affonso de Aguiar, Gil’ Mia-' 
toso:, Ruy: de: Castanheda, Gil Fernandes, Diogo Per>: 
nandes Correa, e Antonio do Campo. Commandava a 
segunda: Ksquadra Viceate Sedré, tio de D. Vascoi da. 
Gane, e of outros Commandantes erao Braz Sodr¢, seu 
irm4o, Alvaro.de Ataide, Fern4o Radiigues Bardagas, . 
(1) Vede Barros, Decada 1. Liv, 6. Cap, 2, ++ Faria, Eutopa Pot- 
teywezs, — Castanheda’, Liv. 1. Cap. 14. — Goes, Parte 1. Cap. 68, 
—— Rezende no Epilogo jd citade: 


34 i 


263 
gne alguinas pessoas‘da familia do Embaixador de Ve- 
weza em Lishog (que viera pedir auxilio contra os Tur- 
cos) hes canfidrao em segredo , que este Ministro tinha 
dado soccorros em dinheiro, e municgdes para se prepa- 
sar aquella Esquadra, por ser a Senhoria de Veneza a 
maior Potencia da Christandade, e Portugal hum Reino 
mui pequeno, ¢ pobre, que nao podia sustentar sé o‘tra- 
fico: das especiarias; acrescentando outras muitas razdes 
para os persuadir, que lhes seria 2 elles mais vantajoso 
o Commercio com Veneza, do que com Portugal. Porém 
a vista daquelle oura, que, por ser em obra, ria maior 
vulto, capaciton estes Embaixadores Indianos da gran- 
de riqueza de Portugal. | 
© Almirante avicou de tudo a ElRei pela mesma 
Caravela; e a 7 de Marco proseguio a sua viagem, na 
qual, até aa parcel de Sofala, teve alguns temporaes , 
que the desaparelhdr3o alguns navios. Dalli expedia Vicen- 
te Sodré com a maior parte da Rsquadra para Mocambi- 
que , e elle foi a Sofala , onde fez o que direi na segun 
a parte destas Memorias ; e desta Cidade passou a Mo- 
gambique, em cujoPorto ancorou a 4 de Junho de r503, 
e achou Vicente Sodré, que ‘chegdra quinze dias antes. 
No 1.° de Abril partio de Lisboa Estevio da Ga- 
ma com. a sua Esquadra de-cinco navios (1). A 4 virao 
a Kiba de Porto Santo, e¢ no mesmo dia as Desertas:: 
no seguinte passdrdo as Ihas da Palma, e Ferro, ea 15 - 
as de Cabe Verde. - . so 


(1) As unicas noticias circunstanciadas , que temos desta Viagem, 
so as que nos deixou Thome Lopes, Escrivio do navio, cue comman- 
davz Joio de Ponagracia. A sua relacio he muito interessante na parte 
hist orica, pela minueiosa singelezz com que narra muitos factos curios _ 
sos , © interessantes; mas ne cue respeita 4 Nautica, nZo tem igual me- 
recimento,, por ser desta mui alkeia a sua profiss30, de que se seguio 
seferir sinceramente 0 cue ousia 2 pessoas peuca instruicas naquella Ar- 
te. Vede o Temo 2. N. 5 pag. 259 da Colleccéo de Noticias para 2 
Historia cas Nacdes U)tramarinas, 


270 


A 18 de Maio , estando ainda distantes da Linkay 
virgo (1) huma Ilha alta, e frondosa., que thes parecee 
da grandeza da: Madeira ,-e julgdrao nfo ter sido. ainda 
descoberta ; 4 qual tentarao, chegar-se, e nao tho permite 
tio o Vento, Parece que a derrota desta Esouadpa foi 
muito a Oeste, porque a quatrocentas legoas do Cabe 
de Boa Esperanga comecdrao a sentir grandes frios, que 
forio augmentando 4 proporgao que se aproximavdo. do 
Cabo, por estarem. na estagao do Inaverno do. Hemish- 
rio Abstral. ° 7 

A 7 de Junho. os assaltou: huma furioss. tormenta 
de Ocste, que nessa noite espalliou o3 navies, de soste 
que pela manha se achou sd a Nao, de que era Com 
mandante: Joao de Bonagracia, com a Nao Julia, No | 
guarto das oito para o meio dia, indo os ravios em pa- 
pafigos arriados , cresceo tanto o vento, que se quebrou 
a verga grande do de Bonagracia, e rendeo hum mastro 
da. Julia; e assim. corrérao em arvore seca aquelle dia, 
@ noite com grande susto, ¢ trabalho, pelo muito map 
que entrava nas Ndos, sobre tudo na Julia, que aguen- 
tava menos. No dia 9 abonancou a tempestade, e tor? 
nou a reverdecer a 11, seguindo sempre os navios o ru= 
mo de Leste. Nos dias 12 e 13, em que julgavdo ter 
ja vavegado quatrocentas e cincoenta legoas naquette 
rumo, virgo pas aguas alguns limos, taninhas, loboe 
marinhos, ¢ muitas aves de varias especies, que sfo si-~ 
gnaes de terra; e como estavao mui longe-do Continen« 


C1) Aexistencia desta grande Hha he fabujoca; eu suspeo, que: 
Thome Lopes vio talvez o Penedo de S. Redso, que esta quasi 
grgo ao Norte da Linha, e lhe paseceo de, longe muito. maior de que 
sealmente he; ou que algum curioso ignorante. adulterou no Original 
de Thomé Lopes. a descripcio, que fazia. daquelle Hbote, acrescentens: 
do-lhe , para fazer o caso mais verosiini!, a sua rosicdo relative 3 Mike 
dos Papagajos Vesmelbos, ¢ outros absurdcs, que supprimi, por serene: 
até itrisorios. 


27f 


te Afficam, pareceo-thes que se dchavio nas visinhan 
cas dealguma Ilha nao descoberta. . 

A 7 de Julho; sendo o vento ainda mui forte, cor 
mecirio a navegar para o Norte, e depois ao N.O. uté 
ao. dia‘ 10, em que virio terra distante algumas legoas, 
€ por ser j4 no fim -da tarde, atravessirao, e 4s onze ho- 
res derdo fundo.- Ao amanhecer fordo reconhecér a ter- 
¥a, endo podende tomar lingua, voltdrao a ella no ou- - 
tro dia, e souberao que estav2o no Cabo Primeiro, do 
qual sahe huma ponta mui aguda pelo mar dentro, e he 
por alli algumas Lhotas, e restingas de aréa. Deste lu- 
gar nay cincoenta legoas ao N.E. e N.N.E., e 
chegér0 defronte da Alagoa, afastados della vinte e 
cinco legoas. Continuando no rumo de N.E. 4 N., acha- 
rio-se guinze legoas ao mar do Cabo das Correntes; e 
navegarao depois ao Norte sessenta e cinco legoas , com 
grandissima falta de viveres. , 

A rg deJulho achardo-se na boca do Rio de So- 
fala, e pers ser calmaria, surgirio em onze bragas, e 
assim se conservdrdo por espaco de dous dias, em que 
negociarao algum ouro com os habitantes , que para 
i6m0 08 rao. Neste ancoradouro concertarae 0 mas 
tro da Julia, e continuando a sua derrota, entrdr3o a 
28 em huma Babia de pouco fundo, e muitos parceis , 

ue tisha sete ou oito legoas de extensao. Sahirio 
lla, e corréedo ao N.E. 4 N , mais hum dia, e huma 
noite, e virzo o Rio dos Bons Signaes, e depois as I}has 
Primeiras, das quaes no dia 21 estavao ja cinco ou seis 
Jegoas distantes. Vinte legoas antes de Mocambique 
encontrérao hum baixo mui comprido, que seguia a di- 
reggae da Casta por sete ou oito legoas, e entrava duas 
pelo mar. No dia seguinte ancordrio ambas as néos 
em Mocambique. | 
1502 — Miguel Corte Real, Portciro Mor d’ ElRei 
D. Manoel, partio de Lisboa a.10 de Maio de 1502, 


272 


com tres navios (1), para procurar @ seu irmao Gaspar 
Corte Real. Chegado 4 Costa ja descoberta , e queren- 
do examinar os Rios, Canaes ; ¢ Bahias que se lhe of- 
ferecifo, entrou por lum delles,e mandou entrar os 
dous navios ‘restantes por outros dous Canaes, determi- 
nando-lhes hum ponto, ent que deverigo reunir-se até 
20 de Agosto; porém n4o. appareceo mais, e os Com: 
mandantes das duas embarcag6es, havendo-o aguardado 

or mais.tempo que o praso assignado, voltardo para 
Portugal. Desde entao se ficou chamando dquelle Paiz a 
Terra dos Cortes Reaes. 

1502 — Neste anno mandou ElRei huma Arma- 
da (2) composta de Ndos, Caravelas, e Galés, dividida 
em duas Esquadras, de que crao Commandantes Jorge 
de Mello, e Jorge de Aguiar; para atacarem a Villa de 
Targa, d’onde voltirao com perda de gente, e sem fa- 
zerem cousa alguina. 

1503 — Vasco Annes Corte Real, irmao de Gas- 
ar, e de Miguel Corte Real, Vedor da Casa d’EIRei 
. Manvel, e do seu Conselho, Capiréo , e Governador 

das Ilhas Terceira, e S. Jorge, e Alcaide Mor de Ta- 
vira , intimamente lastimado do desapparecimento de 
scus dous irm4os (3), pedio licenca a ElRei para ir em 
pessoa procura-los, a qual lhe nao concedeo; porém 4 
custa da sua Real Fazenda mandou neste anno dous na- 
vios a essa diligencia, de que voltdrao sem noticia al- 
guma daguclles dous Navegantes (4). 


(1) Vede a Memoria jd citada acerca destas Viagens dos Costes 
Reaes , e tambem Goes no mesmo lugar citado. 

(2) Goes, Parte 1. Cap. 62. 

C3) Vede a Memoria j4 citada na Colleccio das Memorias de Litte- 
ratura da Acadeinia das Sciencias, Tomo 3. — Goes, parte.1. Cap. 66, 
ditiere em algumas circunstancias, 

(4) Estas frequentes Viagens i Terra Nova derio a conhecer aos Par- 
tuguezes, de que vantacem Jhes seria a pescaria do Pacalhio , e¢ assim 
gteseco tanto a Navegacio pera aquelic Puiz, gue Pimentel affirma no 


278 


1503 — Confiado ElRei D. Manoel, que o Almi- 
rante ‘D. Vasco da-Gama, com a forte Esquadra que 
levou d India, teria restabelecido a paz, e boa harmo- 
nia entre os Portuguezes e.as Potencias Asiaticas, man- 
‘dou aprestar este anno tres E'squadras (12). 

Compunha-se a primeira dos Navios S. Tiago de 
300 toneladas, Espirito Santo de 350, S. Christovao 
de 150, e Catharina Dias de 100: era seu Chefe Affon- 
so de Albuquerque, e Commandantes de navios Duarte 
Pacheco Pereira, Ferndo Martins de. Almada, e -outre 
de que se ignora o nome. Hum-destes navios era armae 
do por conta da Casa Marchioni, e relle hia embare 
cado por Feitor Joao de Empoli, Florentino (2); Fran- 
cisco de Albuquerque, primo de Affonso de Albuquer- 
que, commandava a segunda Esquadra de tres navios, 
€ os outros dous Commiandantes erao0 Nicoléo Coelho, 
e Pedro Vaz da Veiga. Estas. duas Esquadras deviao ir 
4 India carregar de especiarias, e voltar logo para Pore 
tugal, sem ficarem alli servindo. . 

Commandava a terceira Esquadra Antonio de Sale 
danha, Fidalgo Castelhano, e os outros Commandantes 
forio Ruy Lourengo Ravasco, e Diogo Fernandes Peo 
feira', que servia tambem de Mestre da mesma Nao. 


seu Roteiro (pag. 376), que anrigamente hijo todos os annos dos Pore 
tos de Aveiro, Vianna, e outros, mais de cem Caravelas dquella pesca, 
© ainda no seu tempo (elle nasceo em 1650, ¢ falleceo em 1719) se 
Jido nas Cartas Francezes , ¢ Inglezas os nomes Pertuguezes de quasi to« 
dos os Cabos, Portos, e Pahias da ‘Terra Nova, de que hoje restéo ale 
guns, posto que alterados; como v. gr. as Pahias da Trepessa, e da 
Grio Presenga, convertidas em EBahias de Trepassas , e de Pleisande. 

(1) Barros, Decada 1, Liv. 7. Capituios 2., e 4. — Castanheda ; 
Liv. 1. Cap. 55., € 64. — Goes, Parte 1. Capitulos 77., e 8c. 

(2) Author da unica Historia conhecida desta Viagem, a quem se« 
cuirei, por ser testemunta ccular dos factos que narra. Vede a Collece 
<30 de Noticias para a Historia das Nacdes Ultramarinas, Tomo 2. 


N.° 6. 
35 


276 
vio a 6 de Julho 0 Cabo de Boa Esperanca , que do~ 


brou, e seguindo a Costa, foi ancorar na Aguada de 
S. Braz, onde fez agua, e se proveo de vaccas a troco 
de huma campainha por cabega, por ser este o artigo 
que os Nepros estimavao mais; andavio elles vestidos 
de pelles, erfo mui brutos, e ninguem entendeo a sua 
linguagem. Sahindo desta Aguada , continuou a correr & 
Costa, e tendo soffrido algumas tormentas, chegou a 
Sofala, e d’agui seguio para Melinde, onde devia esperar 
por Affonso de Albuquerque, segundo as instrucgdes 
que levava, mas nao’ pode ferrar o Porto, ainda que 
nisso trabalhou muito; a fim de tomar hum Piloto, que 
o levasse 4 India; porém as correntes o arrastd4t40 até 
Pate. Aqui foi obrigado‘a dar fundo em quatro bragas 
entre parceis; e vendo a estagdo avancada, deliberou-se 
o Commandante a atravessar para a India; e tendo na~ 
vegado quinze dias, encontrou Affonso de Albuquerque 
com os outros dous navios da sua Esquadra, com prane 
de alegria de todos; e navegando de conserva, for’e 
avistar Monte Deli, e chegarao a Cananor a 11 de Se- 
tembro. 

Francisco de Albuquerque sahio no dia 14, e fez 
mais breve jornada, porque ancorou em Anchediva no 
mez de Agosto; mas perdeo-se-lhe no caminho, sem sa- 
ber-se como, o navio de Pedro’ Vaz da Veiga. 

Apoz estas duas Esquadras partio Antonio de Sal- 
danha, e o secu Piloto dirigio tao mal a derrota, que o- 
fevou 4 Ilha de S. Thomé, havendo-se ja separado da 
sua conserva oO navic de Diogo Fernandes Pereira, 

Desta Ilha o conduzio a huma Bahia ao Norte da 
Cabo de Boa Esperanca , assegurande-lhe que jd o tir 
nha passade. Aqui ancorou. Antonio de Saldanha, que 
se achava sé com o scu navio, por se ter igualmente 
apartado delle Ruy Lourencgo: e na incerteza do lugar 
em que estava, subio a huma montanha mui alta, acha- - 


35 U 


277 


depois a sua‘ derrota com a préa a E.S.E., porque co- 
mo o Chefe era homem presumptuoso, e obstinado, 
quiz reconhecer Serra Leda, sem ter necessidade disso, 
e contra vontade de todos os Commandantes. Quando 
porém se aproximdrao a ella, forao taes as tormentas, ¢ 
ventos contrarios, que em quatro dias que estiverio a 
sua. vista, nao podérao tomar Porto, e forgo obrigados 
a sepuir a sua verdadcira navegacao. 

Desta paragem navegdrdo ao §.O., e tendo cami- 
nhado trezentas legoas, estando ja na latitude S. de 3°, 
virao huma Ilha extremamente alta, de que poderido es- 
tar distantes vinte e duas legoas, e nao tinha mais de 
duas de. comprido, e huma de largo (1). 

Este descobrimento foi fatal 4 Esquadra, porque 
se perdeo aqui a Capitania, que era de trezentas tonela- 
das, por mao governo do Chefe, que deo com ella. em 
hum baixo, onde se abrio na noire de to de Agosto, e 
foi ao fundo, salvando-se a gente; e nella hidgo todos 
os mantimentos de sobreselente da Esquadra. O Chefe 
mandou o navio de Vespucio 4 Ilha em busea de .anco- 
radouro, em que surgissem todos , e ficou-lhe com o es- 
caler guarnecido de nove homens, que tinha ido acu- 
dir ao naufragio da Capitania. Partto Vespucio, Jevan- 
do sé metade da sua guarnigio em demanda da Ilha, 
que lhe ficava em distancia de quatro legoas, e achow 
hum Porto, em que podiao ancorar os navios.. Nelle es- 
perow oito dias sem apparecer embarcacao alpuma: ao 
oitavo descobrio hum navio, e receoso de que este o 


(1) Eu inclino-me a que esta Hha era a de Fernando de Noronha, 
situada na latitude S. 3° 56’, e longitude 345° 31’, tanto porque a de- 
sctipcéo de Americo Vespucio se parece bem com a que outros fazem 
daquella Ilha, como porque 0 rumo que seguio d’alli para a Pahia de 
Todos os Santos, e a distancia que navegeu, nao concordio mal com — 
o verdadeiro rumo, e distancia entre a Bahia e a Ilha de Fernando, at- 
tendendo a que Vespucio conta por legoas mais pequenas , Gue as Noss as 
Jegoas maritimas. : 


278 


nfo visse, fez-se logo 4 véla a encontra-lo,, pensando 
que lhe traria o escaler ¢ a gente; mas chegando 4 fal- 
la, e perguntando-lhe as novidades, sd lhe respondeo, 
que a Capitania fora a pique, salvando-se apenas a guar- 
ni¢ao, e que a sua gente, eo escaler havilo ido na Es 
quadra. Neste aperto voltdrao os navios para a Ilha, e 
‘se provérao de agua e Ienha, servindo-se do batel do 
ultimo que veio. Esta Ilha era despovoada, tinha mui- 
tas apuas doces e correntes, infinitas arvores, e innu- 
Meraveis aves maritimas e terrestres, que se deixav4o 
apanhar 4 mao, e nenhuns outros animaes virao, senio 
ratos mui grandes, lagartos de duas caudas, e algumas 
cobras. 

Partirao dalli navegando ao S.4.S.O., porque tra- 
ziZo rcgimento para que, em caso de separacao, se di- 
rigisse o navio extraviado 4 terra descoberta na viegem 
antecedente. Continuando a navegar com bom tempo, 
vos dezesete dias de viagem descobrirao hum Porto, a 
que pozerio o nome de Bahia de Todos os Santos (1°, 
que distaria da tal Ilha trezentas legoas. No achando 
alli o seu Chefe, nem outro alpum navio da Esquadra , 
€sperarao os dous Commandantes dous mezes e qua- 
tro dias; e vendo que nao havia noticia delles, determi- 
ndrao correr a Costa para 0 Sul; e sahindo da Bahia , 
navegarado mais duzentas e sessenta legoas, e entrarao em 
hum Porto, em que Ievantérao hum Forte, onde deixd- 
rao vinte e quatro homens dos que vinhao no outro na- 
vio, e pertenciao 4 Capitania. Neste Porto, que Vespu- 
cio situou na latitude S. de 18° (2), e longitude Oeste de 


(1) A Puohia esta situada na latitude S. 13°, e longitude 339° av. 

(2) Esta laticude he a de Caravelas, porém a distancia da Bahia a 
este Porto he de cem legoas a0 rumo de Sul, com pouca differenca, @ 
nio de duzentas e sessenta, come diz Vespucio; a sua longitude tam- 
bem esti errada, porque Caravelas fica 31° a Oeste «de Lisboa pouce 
nisis Ou menos; mas este erro nado admira naquelle tempo, 


279 


Lisboa 37°, segundo os scus instrumentos ; estiverio 
cinco mezes construindo o Forte, que guarnecérao de 
doze canhées, muitas armas, e viveres para seis mezes. 
E despedindo-se dos companheiros, e dos naturaes do 
Paiz, que erdo téo pacificos, que Vespucio penetrou 
quarenta legoas pela terra dentro, acompanhado sé de 
trinta homens, se fizerao a véla ao rumo de N.N..E.., 
e em setenta e sete dias chegdrao a Lisboa a 18 de Ju- 
nho de 15a4, e€ forao muito festejados pelos supporem 
j& perdidos. As outras Naos da Esquadra nunca_ mais 
apparecérao, | | 
1504 — Nesre anno mandou EIRei 4 India Lopo 
Soares de Alvarenga (1), com huma bella Esquadra de 
treze navios, OS maiores que até aquelle tempo 14: tinhSo 
ido, guarnecidos de mil e duzentos Soldados, em 
entravao muitos Fidalgos e Cavalleiros, e abundanté- 
mente providos de munigées de gyerra. Erao.Comman- 
dantes Leonel Coutinho, Pedro de Mendonca, Lopb 
Mendes de Vasconcellos, Manoel Telles Barreto, Pe- 
dro Affonso de Aguiar, Affonso Lopes da Costa, Filip- 
de Castro, Tristio da Silva, Vasco da Silveira, - 
Vasco de Carvalho, Lopo de Abreu, e Pedro Diag.. . 
Sahio a Esquadra de Lisboa a 22 de Abril, e a2 
de Maio chegou a Cabo Verde. Chamou Lopo Soares 
a seu bordo todos os Commandantes, Mestres, e Pilo- 
tos, e lhes advertio, que havendo partido tao tarde de 
Portugal , nao devifio fazer os desmanchos, que até alli 
fizerfo, e sempre por descuidos , como foi abalroareta 
humas Nédos com outras, em que corrérao grande peri- 
go; como tambem nfo seguirem alguns navios de noite 
o seu farol,e huns irem pela sua proa, outros pela pos 
pa, e alguns a seu barlavento. Para evitar estas desor= 


(1) Vede Barros, Decada 3. Liv. 7. Cap. 9. — Castankeda, Liv, 2, 
Cap. 90. — Goes, Parte 1. Cap. 96. — Faria, Asia. Portugueza, 


280 


dens , mandou lavrar hum Termo pelo Escrivio, as- 
Signado por elle, e por todos os Commandantes, no 
qual ordcnava: s« Que todos os navios seguissem de noite 
oO farol da sua Ndo, e navegassem nas suas aguas. Que 
em nenhum navio houvesse de noite outra luz, sen%o a 
da bitacula, ea dacamara do Commandante. Que os Mes- 
tres, ¢ Pilotos tivessem muito cuidado em que os navios 
se nao abordassem; e que respondessem aos signaes, 
que elle Ihes fizesse. Que os navios o salvassem de dia, 
e nao lhe passassem adiante de noite. E que quem fi- 
zesse o contrario, pagasse dez cruzados, e fosse prezo 
até 4 India, sem vencer soldo. »» Como alguns Mestres, 
e Pilotos erio negligentes, e por 'sua culpa se abalroa- 
‘VAO Os navios, contentou-se Lopo Soares com os mudar 
de humas embarcacgdes para outras (1). Deste dia em 
‘diante navegou a Esquadra em boa ordem. 

No mez de Junho, indo a Esquadra na volta do 
Cabo de Boa Esperanga, teve hum temporal, com que 
correo dous dias e huma noite em arvore seca, com 
tanta cerragdo, que passados dous dias, virao-se signaes 
de terra proxima, que se nao pdde descobrir ; e Lopo Saa- 
res ordenou, que a cada ampulheta se dessem dous ti- 
ros de canhao na sua Nao, e todos os navios respondes- 
sem com outros tantos. Abonangando o tempo, achou- 
se de menos a Nao de Lopo Mendes de Vasconcellos; e 


C1) Este breve Regimento de Disciplina Naval, que o bom juizo 
dictou a Lopo Soares, prova que até alli nio havia nenhum, gover- 
nando-se cada Chefe de huma Esquadra pzlo su proprio discurso, ou -pee 
los conselhos dos seus Officiaes’ de Nautica; e os Commandantes dés 
Navios pelo mesmo modo. Nestas Memorias se ver’, que as Esquadras 
Portuzuezas navegavio quasi sempre espalhadas desde que partifo do 
Reino , separando-se voluntarizmente os navios huns dos outros; porque 
cada Commandante 4 ida trabalhava por chegar primeiro 4 India; e na 
volta a Lisboa; d'onde se seguiio immensas perdas ao Estado, e 20 
Commercin; conseguencias inevitaveis da falta de hum bom Regula- 


mento para 0 servico Naval. 


. 283 


pequenss ficasse servindo na India ;.que se construissem 
ortalezas nos Portos mais. vantajosos 4 seguranca das 
Esquadras, e concentragao do Commercio; e que se es- 
tabelecesse hum Governo permanente naquelle Paiz, pa- 
ra dirigir ‘os negocios Civis, e Militares, segundo ag 
Instrucgdes , e Regimentos. que se Ihe dessem. __ 

Para preencher estes diversos fins elegeo ElRei a 
Trist@o da Cunha, que estando. prompto a partir, teve 
huma molestia, de que por entdo cegou, e em seu lugar 
foi nonieado D. Francisco de Almeida, filho do Conde 
de Abrantes, que acceitou facilmente o Cargo, e ElRel 
dhe assignou hum grande ordenado, a contar do dia qué 
sahisse de Portugal até regressar a elle; e Ihe conceded 
mais ter na India huma Guarda de cem Alabardeiros, 
Capella ; e¢ outras preeminencias, para que representas- 
se a sia Real: Pessoa; ¢ a seu filho D. Lourenco de Al- 
meida‘, mancebo das .matofes esperancds , que o acoms 
panhava., fez tambem varias mercés, D. Francisco de 
Almeida deyia ter titulo de Governador, e Capitéo Ge- 
 neral, e tomar ode Vice-Rei logo que construisse.For- 
talezas.em Cochim, Cananor, e Coul4o; por quanto 
ElRei mandava fazer nfio. sé estas, e.a de Anchediva 
na India, mas outras em Sofala , Quiloa , Mombaga, ¢ 
Mogambique:na Africa Oriental , onde 08 Moujos con- 
tinuavdo o trafico do ouro, que era.da maior importdn- 
Cia veddr-lhes, Estes, e otros artigos se continhao em 
bum amplo Regimento, que lhe deo para governo, o 
gual copiarei por extenso em outra parte. 

Compunha-se a Esquadra de dezeseis Ndos € seis 
Caravelas (1), com mil e quinhentos soldados de guarni- 


C1) Barros conta vinte e dous navios, e s6 nomea dezenove Com- 
mandantes. Faria diz que a Esquadra constava de dezeseis Ndos , e quas 
tro Carzvelas, e tran os names de dezenove Commandantes, Castanheda 
conta quinze Ndos, e¢ seis Caravelas,.c namea outros tantos Comman- 

36 il 


286 


sahindo este da Sé com os Commandantes, e Fidalgos 
da sua Esquadra, toda a Nobreza da Corte o acompa- 
phou até ao Caes da Ribeira, onde embarcou. 

A 25 de Marco de 1509 se fez 4 véla a Esquadra 
com quinze Nios e seis Carayelas, indo ElRei ao mar 
para a ver sahir , e navegande com bom tempo, avistou 
a 30 a Ilha da Madeira, e depois a da Palma; e se- 
guindo a sua derrota para Cabo Verde, a 6 de Abril 
ancorou no Porto de Ale, em que se. achava fazendo 
escravatura huma Caravela Portugueza, e sendo por es- 
ta' via sabedor-o Regulo do Paiz da chegada do Gover- 
nador, mudou-se com a sua familia- para huma Aldea 
fronteira ao ancoradouro,, 4 qual D. Francisco de Al-- 
meida © mandou visitar com hum presente, e elle The 
correspondeo com outro de refrescos da terra. Aqui 
completatdo a sua aguada os navios’, huns nesta Bahia, 
outros na de Besenegue, que fica _pouco distante, em 
que consumirdo nove dias. : 

A 19 de Abril continuou o Governador a swa via- 

m, soffrendo antes da passagem da Linha alguns dias 
Fe calmaria: e como havi%o navios ronceiros, que fazize 
atrazar Os Outros, convocou os Commandanees, e Pile- 
tos, € com o seu parecer organizou duas Esquadras (1): 
hama, que tomou para si, de treze Ndes, e a Caravela 
de Gongalo de Paiva, para navegar de noite com farel 
na sua proa; e a outra composta das Ndos de Sebastiao 
de Sousa, e Lopo Sanches, e das cinco Caravelas restan- 
tes, entregue a Manoel Pacanha, que hia embarcado 
de passageiro na Ndo Conceicfo com seu genro Sebas- 
ti20 de Sousa. Os motivos, que teve o Governador pa- 
va |he fazer semelhante honra, forao ter ElRei nomea- 


(1) Barros faz esta divisio de Esquadras-no Porto de Ale; mas Cas- 
tanheda diz, que foi na occasiio da passagem da Linha, o cue me pac 
receo mais provavel, pelo receio que devido causar as calmarias de ser 
prolengada.a viagem. : 


286 


do Manoel .Pacanha por Governador da Fortaleza de 
Anchediva, e suspeita que tambem hia nomeado em se- 
gredo seu successor no Govetno da India. 

Passada a Linha no dia 5 de Maio, achando-se a 
outra Esquadra fdéra da vista do Governador, e haven- 
do calma podre, e mar muito banzeiro, a Ndo Bella, 
Commandante Pedro Ferreira, que era velha, abrio pe- 
la segunda vez huma agua tao grossa, que foi a pique: 
salyou-se unicamente a gente, e¢ hum caixote de prata 
da Capella do Governador, nos escaleres da Esquadra, 
sendo Pedro Ferreira o ultimo individuo, que sahio da 
Nd4o, como devia fazer. 

Os Pilotos por segurarem: a passagem do Cabo, 
empenharao-se tanto no bordo do Sul , que chegdrao a 
40° de latitude, onde o frio era intoleravel , e achdrao 
ventos mui fortes, ¢ trovoadas. A 26 de Junho dobrd- 
yao finalmente o Cabo, julgando-se distantes delle cen- 
to e setenta e cinco legoas. 

A 2 de Julho sobreveio huma trovoada com tanto 
vento, que fez em pedacos as vélas das Ndos do Gover 
nador, e de Diogo Correa, e levou desta tres homens 
ao mar, de que ainda podérao colher hum, apezar do 
grosso mar, por ser grande nadador. Abonangando oe 
tempo, e dissipada a cerrac4o, achou-se de menos a Néo 
de Joao Serrao , pela qual esperou o Governador , e naa 
apparecendo, seguio seu camiinho. Arg de Julho vie 
as Ilhas Primeiras, e expedindo a Caravela de Gongalo 
de Paiva para Mogambique, a saber as novidades da 
India, foi surgir em Quiloa no dia 22. O resto para a 
segunda parte das Memorias. 

1505 — Desejande ElRei que fosse quanto antes 
construida a Fortaleza de Sofala, de que ja tinha encar- 
regado Pedro de Anaia, que nao pdde sahir com D., 
Francisco de Almeida, pelo desastre acontecido 4 sua 
Nao, fez armar a toda a pressa tres boas Ndos, e ou- 


287 


) 

tros tanto$ navios menores, de que lhe deo o comman- 
do em Chefe para ir cumprir equella commissao, deven- 
do ficar por Governador da Fortaleza, que fizesse, com 
Os tres navios para sua guarda; e remetter para a India 
as tres Ndos, a fim de tornarem a Portugal com carga 
de especiaria. Os Commandantes que hiao debaixo das 
suas ordens erfo Pedro Barreto de Magalhdes na Ndo 
Santo Espirito ; Joao Leite na Ndo Santo Antonio ; 
Francisco de Anaia, filho de Pedro de Anaia, no navio 
S. Jo#o0; Manoel Fernandes em outro, e Jodo de Quei- 

rés no navia S, Paulo. 

A 18 de Maio de 1509 sahio a Esquadra de Lis- 
Boa, e seguindo sua viagem, sendo pela altura de Ser- 
ra Leda , querendo Joao Leite fisgar do gorupés hum 
dourado, cahio ao mar, e afogou-se. Os Pilotos, que 

rece se havigo combinado com os da Esquadra de D, 
Francisco de Almeida, forao buscar 45° de latitude, 
onde o frio era t%o intenso, que se gelava a agua, co 
vinho, e a gente nao podia trabalhar por falta de bom 
vestuario proprio de similhante temperatura. 

Virando depois né bordo do N.E., tiverio ventos 
furiosos, € témpos escuros , com que os navios se espa- 
tharao, ficandeé Pedro de Anaia com o de Francisco de 
Anaia, e Manoel Fernandes; e a 4 de Setembro do- 
brow o Cabo das Correntes (1), ¢ fot ancorar na barra 
de Sofala. 

Aqui veio ter a Nao Santo Antonio, e o navio Sdo | 
Paulo, cujo Commandante, chegando ao Rio da Alagoa 
€om necessidade de agua , desembarcou acompanhado 
de vinte homens, tendo o desacordo: de levar comsigo 
o Piloto,e o Mestre; ¢ mettendo-se meia legoa. pela ter- 


(1) O Cabo das Correntes est? situado na Costa Oriental da Afris 
ea, no Canal de Mocambique, na latitude S. 23° 40’, ¢ longitude 
54° 55% 


288 


ra dentro movido da cubica de colher algum gado, foi 
assaltado dos naturaes, de cujas mJos apenas escapou o 
Escrivio Jojo de Ga, e mais quatro homens, todos fe- 
ridos. © navio ficando sem Official aigum, que enten- 
desse da Navegacao, hia perder-se , quando o acaso 
trouxe Jogo Vaz de Almada, a quem Pedro de Anaia 
dera o commando da Nao Santo Antonio, ¢ provendo 
© navio do necessario, o levou em sua conserva; bem 
como a lancha de Pedro Barreto de Magalhaes, que en- 
controu perto de Sofala, em que este enviava seu irmifo 
Antonio de Magalhaes a participar a Pedro de Anaia, 
que ficava com a Nao Santo Espirito no Cabo de S. Se- 
bastiio (1), ¢ pedia hum Piloto, que o levasse a Sofa-- 
Ja, por quanto o seu nao se atrevia a isso, por ser no- 
vo naquella carreira. . 

Antonio de Magalhiaes trazia comsigo na lancha 
cinco Portuguezes, que achou no Rio de Quilimane, 
que os Mouros ihe entregirae quasi mortos, e ergo da 
companhia de outros, que tinhao passado adianre, todos 
da Nao de Lopo Sanches, perrencente 4 Esquadra de 
D, Francisco de Almcida. Pela confissdo destes homens 
constou, que julgando-se quarenta legoas do Cabo das 
Correntes, hia a Ndo jd fazendo tanta agua, que foi 
forcoso encalhar, onde se salvou a gente, os mantimene 
tos, muita madeira que levava, pregadura, e aparelhos, 
com que construirio hum Caravelao para passarem a 
Sofala. Porém como Lopo Sanches era Hespanhol, a 
guarnicao nao quiz mais obedecer-lhe (2), e dividida em 


C1) O Cabo de S. SebastiZo esti vinte e oito legoas 20 Norte do 
Cabo das Correntes, na latitude S. 22° 6’, e longitude 54? 50% - 

(2) Parece que naquelles tempos quasi todos os individuos a bordo 
de hum navio estavao persuadidos que perdido elle, ficavéo desligados 
da obediencia do seu Commandante ,,e podiio eleger outro a seu arbi- 
trie ; a0 menos ma pratica succedeo isto muitas vezes , como mostrarei 
com exemplos nestas Aleinorias, Tao perniciosa desordem era a coie- 


| 289 3 
bandos ; huns embarc4ra0 com Lopo Sanches no Cara- 
veldo, outros resolvérdo ir por terra. Estes cinco, que 
escapardo , erd4o do numero de huns sessenta , que segui~ 
ro seu caminho ao longo do mar, assim como outros 
vinte , que o Rei de Sofala entregou a Pedro de Anaia, 
o resto acabou na jornada, e o Caravelao nunca mais 
appareceo. | 
1505 — Neste mesmo anno (1) mandou ElRei dous 
navios, de que forde por Commandantes Cide Barbudo, 
e Pedro Quaresma , para examinarem a Costa d’Africa 
Oriental desde o Cabo de Boa Esperanca até Sofala, e 
algumas daquellas Ilhas, a fim de obterem noticias de 
Francisco de Albuquerque, e Pedro de Mendonca, que 
se sabia terem desapparecido naquella paragem. 

Estes dous navios partirio de Lisboa no mez de 
Setembro , e seguindo sua viagem, quando cuidavao ter | 
dobrado o Cabo de Boa Esperanga , achdérado-se na An- 

a das Areas, situada na Costa d’Africa Occidental, 

quem do Cabo cento e cincoenta legoas; e bordejando 
trabalhosamente, chegarao 4 Aguada de Saldanha, onde 
comprérdo alguns mantimentos aos Cafres, e aqui pas- 
sou Cide Barbudo para o navio de Pedro Quaresma, 
por ser elle quem hia encarregado da commissd0, e Pe- 
dro Quaresma passou para o seu. 

Dobrado o Cabo, porque os tempos o nao deixd- 
r4o reconhecer a Costa 4 sua vontade, principalmente 
no lugar da suspeita, que era na Aguada de S. Braz, 
estando a este tempo ja separado de Pedro Quaresma , 
tornarao-se a ajuntar na paragem em que o Piloto affir- 
mava ter visto encalhada a Ndo de Pedro de Mendon- 


guencia de no haver hum Corpo fixo de Officiaes da Marinha Real, 
gue tivessem huma authoridade deduzida dos seus Postos, e indepen- 
dente de Commissdes precarias, para se fazerem sempre respcitados, ¢ 
obedecidos dos que Ihes fossem inferiores em graduacio. : 
Ci) Bartos, Decada 1. Liv. 10, Cap. 6. — Goes, Parte 2. Cap. 9, 

: 37 


' gem fomar aquella Fortaleza, ¢ @ déixassets ‘guaractida, 
no caso de set capaz disso; e€ neo sendo, construleecsn 
eatra.de ‘novo: ‘E para que os: Portaguezes em. en 
incitente podessem fortificar-se logo ow naquelle ! oa 
ew em outro mais vantajoso ,. fez embarcar kuna For 
taleza de madeira, que se guardava no Arsenal desde 0 
trppo em. que intentou passar em pessoa 4 Africa; 

rque EJRei dava grande importancia a possuir ert 
Crcotort hom Porto, em. que podessem irivernar, € p#o« 
wer-se @& seus. navios de guerra, para sahirem dali a 
crazar nes Estreitos da Arabia , e da Persia , e embara- 
orm assim a: navegacao doe Mouros para a Costa de 

ar. : 

. A. peste'em: gue entdo ardia Lisboa, onde morride 
Cento e vinte pessoas por dia:, abstou ao recrutamente 
necessatio,, por nao ousar ninguem vir das Provincias 4 
Capital, e foi Forgoso mandar embarcar alguns présos 
j@ condemnados.a degredo. para outras partes. Em fim 2 
6 de Abril de rg06 sahirao de Lisboa as duas Esqua~ 
dras (1). A de Tristao da Cunha compunha-se de cite 
Ndos , € tres navies menores, de que erio Commandan- 
tes, elle: na Ndo S. Tiago; Leonel Coutinho na Leitéer 
Velhz; Alvaro Telles Barreto na Garga,; Ruy Dias Pe-- 
reira, Alferes Mor, no S. Jorge; Ruy Pereira no S. Vi- 
cente; Joao Gomes de Abreu na Ajuda; Job Queimado 
em homa Nao sua; Alvaro Fernandes na Ndo de La- 
gos; Joio da Veiga em hum navio; Tristao Roiz enti 
outro navio; e Jristio Alvares no navio Santo Anto- 
nio. Muitos. destes navios erao de particulares , afreta-- 
dos por E]Rei. A segunda Esquadra constava de qua- 
tro Naos; ¢ huma.Taforéa, ou. Setia,, de que erdo: Com- 


(1) Barros diz, que as Esquadras sahirio juntas a 6 de Marco; Cas 
tanbeda.. © Goes: dizem a 6. de. Abril, Faria, que Affonse.d’Albu-: 
querque sahio a 28 de Marco. 7 

37 ii 


293 


" vernar, ou se Fallecesse antes disso; cujo Alvard hia sel- 
Jado,:e no sobrescrito dizia: Este se abrird quando 
Affonso de Albuquerque o requerer, e€ no mesmo s0- 
brescrito estava assignado EJRei. O outro era para que 

esse mandar assentar no Livro das Moradias as pes- 
goas, que bem Ihe parecesse. 7 

Estas Esquadras hido inficionadas de peste , que 
antes da sua sahida morrerdo alguns homens a bordo da 
propria Ndo de Tristfo da Cunha, que seguindo a sua 
derrota.,' foi fazer aguada a huma I!ha, que fica no ros- 
to de Cabo. Verde (1), ent4éo chamada Ilha da Palma; 
e para sepultar as muitas pessoas, que fallecério, se 
construio huma Ermida de pedra e barro, na qual se 
disse Missa, e enterrardo os mortos; porém tanto que 
Trist3o da Cunha chegou 4 Linha, todos os enfermos 
se restabelecérao, De Cabo Verde forao as Esquadras avis- 
tar a terra do Cabo de Santo Agostinho; e atravessan- 
do para o Cabo de Boa Esperanca , metterdo-se em tane 
ta altura, que os homens mal enroupados soffrérdo mui-- 
to do frio, e alguns delles- morrérao. 

‘Nesta -travessia descobrio ‘Tristf?o da Cunha .as 
Ilhas, que se chamao do seu nome (2), e com hum 
temporal se espalhdrao todos os navios, indo elle an- 
corar em Mocambique no mez de Dezembro, onde se 
reunirago quasi todos. 

Alvaro Telles correndo com o tempo, sem saber 


(1) No rosto de Cabo Verde ha tres pequenas Ilhotas insignifican- 
tes, chamadas Ilhas da Magdalena, ou dos Passaros. N&o he possivel que 
Tristao da Cunha aqui ancorasse com a sua Esquadra, e creio que se 
elle com-effeito desembarcou em alguma Ilha, seria na Goréa ( talvez 
naquelle tempo chamada da Palma), que tem agua nativa, e huma ex- 
cellente Bahia. Castanheda diz, que fez aguada na Enseada de Besene- 
gue , e¢ que alli deixou os doentes. 

(2) Estas [thas de Tristao da Cunha sdo tres: a maior he a que estd 
mais ao Norte, cuja latitude S. he de 37° 5’, e a longitude de 5° 48% 


294 


bem por onde hia, passou por féra da Ifha de S. Low 
renge, foi ver a Sumatra, cuidando. ser o Cabo Guag- 

fui; e conhecendo a final o seu erro, voltou para o 
menciorade Cabo, onde se deixou ficar cruzando, e fez 
boas prezas. 

eonel Coutinho foi invernar a Quilaa, e R 
Pereira entrou em huma Enseada da Ihe de XS Lou- 
kengo (1), chamada Matatana (2), onde veio 2 seu bor 
do huma canoa com alguas Negros, cuja linguagem: se 
nao entendia, mas por acenos pareceo dizerem, que: no 
Paiz havia prata, (de que alguns. trazido manithas ). era- 
vo, e gengivre que lhe mostrar4o; por cuja causa Leow 
nel Coutinho tomou. dous delles , que levou a 
bique , ¢ os apresentou a Tristio da Cunha; e aout 
Rasceo a fabula de haver naquella Uha muita prata, e 
€speciaria. 
Job Queimado, que se havia separado hums soite 
das Esquadras antes de sahirem da Costa de Guiné, nao 
dobrar o Cabo de Santo. Agostinho, e virando no 

rdo de Leste, foi avistar a Costa da Africa Occiden- 
tal, e dalli foi ter a Ilha de S. Thomé, d’onde prose- 
guio a sua viagem ao longo da Costa, navegando com 
terraes, e viracdes; dobrou o Cabo de Boa Esperanga, 
e chegou a Mocambique depois de Tristao da Cunha. 

1507 — Este anno mandou ElRei aprestar quatorze: 
Mavios (3), divididos em quatro Esquadras. A primeira 
de duas Ndos, commandada por Jorge de Mello Perei- 
ra, embarcado na Ndo Relem, a maior que até este dia 
tinha passado 4 India , e Commandante da outra Henri- 


‘(1)_ A Tha de S. Lourenco foi descoberta no 1.° de Fevereiro de 
1506 por Ferndo Soares , na sua torna-viagem da India para Portugal. 

(2) Enseada situada na Costa Oriental da Ilha de S. Lourenco ss 
latitude S. de 22° 8’, e longitude 66° 10% 

(3) arros, Decada 2. Liv. 1. Cap. 6. — Goes, Parte a. Cap. 14, 
— Castanheda, Liv. 2. Cap. 72. 


295 


que Nunes de Leo, partio de Lisboa a 12 d’Abril de 
1507, com destino a India, para daili volrar com car- 
ga de especiaria. A segunda de quatro N4os, com iguat 
destino , commandada por Fernao Soares, e Comman- 
dantes das outras tres Ruy da Cunha, Gongalo Carnei- 
ro, e Joao Colago, partio a 13. A terceira de duas 
Nios, tambem da cafreira, commandada por Filippe 
de Castro, e Commandante da segunda Ndo, Jorge de 
Castro, seu irm4o, sahio a 15. 

_ A-ultima Esquadra partio a 20, composta de seis 
navios mais pequenos, commandada por Vasco Gomes 
de Abreu ; nomeado Governador de Sofala, que leva- 
va ordem d’EIRei para construir huma Fortaleza ria 
{tha de Mocambique, a qual devia ficar comprehendida 
no sea Governo: os Commandantes erao Lopo Cabral 
no navio S. Romdo, em que hia embarcado Vasco Go- 
mes de Abreu, Ruy Goncalves de Valladares no S. Si« 
mo; Pedro Lourenco' no S. Joféo, e Lopo Chanoca ent 
huma Caravela; Martim Coelho, e Diogo de Mello ent 
outros dovs navios, os quaes erdo destinados a servir na . 
India por tres annos. 

_ Vasco Gomes de Abreu achando-se na Costa dé 
Guiné.a 3 de Maio, mandou navegar de noite com fa- 
rol pela préa da Esquadra a Jodo Chanoca, por ser a 
sua Caravela pequena, e mai veleira, mas por falta de 
ir sondando , encalhou em hum parcel da Costa ao Nor- 
te do Rio Senegal, salvando-se em terra toda a gente. 
Os outros navios, que seguifo a sua pdpa, nado vendo o 
farol , cuiddrao que a Caravela se teria adiantado, pois 
nao fizera signal aleum, e continudfdo a derrota, estan~ 
do a noite de cerracdo, até que sentindo # arrebentacio 
do mar, derao fundo, e pela manha souberfo da perdi- 
ga0 da Caravela. Vasco Gomes nao se quiz arriscar a 
enviar hum escaler a terra, tanto pot ser a Costa peri- 
gosa , cemo porque receou que os Negros o aprisionas- 


297 


Diogo de Ataide , Pedro Correa, e Diogo Correa, set 
irmao (1). " 

Fez ElRei tambem aprestar oito Ndvus grandes para 
carga de especiarias, e determinou que Jorge de Aguiar. 
as lewasse debaixo das suas ordéns até Mocambique, on- 
de se devido apartar para seguirem a derrota da India, 
e elle a de Socotora ; e para mais o authorizar, quiz que 
entre tanto fosse embarcado na Nao S. Jodo, que era 
a maior de todas, da qual passaria depois em M m- 
bique para hum dos navios da sua Esquadra: erao Com- 
mandantes das outras sete Ndos Tristao da Silva , na 
Magdalena; Francisco Pereira Pestana, na Leonarda; 
Vasco de Carvalho, no Castello; Alvaro Barreto, na 
Santa Martha; Joéo Rodrigues Pereira , no Bota Fogo; 
Jo%o Colago, na Judia; e Gongalo Mendes de Brito em 
outra. 

Além destas duas Esquadras, preparou-se outra de 
quatro navios medianos, de que E]Rei nomeou Come. 
mandante a Diogo Lopes de Siqueira, Almotacé Mor; 
e os outros forao Jeronymo Teixeira, Gongalo de Sou- 
sa,e Joio Nunes. A commissao de Diogo Lopes era 
para descobrir Malaca, de que se fallava muito em toe. 
do o Oriente (2), ¢ da qual ElRei queria ter noticias 
individuaes; e na sua passagem devia entrar em alguns 
Portos da Ilha de S. Lourengo (3), e certificar-se se 


(1) Vede Castanheda, Liv. 2. Cap, 92.— Goes, Parte 2. Cap. 205 
€ Parte 3. Cap. 1. —— Earros, Decada 2. Liv. 1. Cap. 6.5 e Liv. 4, 

. je 

(2) Bairos diz, que as navios erio desesete, ¢ nomea deseseis Com- 
mendantes, Faria concorda no numero dos navios, ¢ traz os nomes de 
outros tantos Commandantes. Castanheda, numerando sé treze Commans- 
dantes,, nio declara quantos erfo os navios. Goes conforma-se com Fas 
tia na quantidade dos navios , e dos Commandantes., 

(3) A Ilha de Madagascar , ou S. Lourenco , tem trezentas legoas de 
comprido, e cem na sua maior largura; e he habitada por varias Nacées, 
cu Tribus de Negros: tem mwuitas Portos, e Pahias espacosas , ¢ em gee 


298 

com effeito tinha minas de prata, ou produzia especiaria; 
e se era conveniente fazer-se nella huma Fortaleza. 

Esta ultima Esquadra partio de Lisboa a5 de Abril 
de 1508, e seguindo sua viagem, a primeira terra que 
vio, foi Cabo Talliado (1), onde fez agua, e lenha; e 
estando na altura dos Medaos do Ouro (2) a 20 de Ju- 
lho, se encontrou com Duarte de‘Lemos; e sobrevindo 
hum tempo, este seguio para Mogambique, e Diogo 
Lopes de Siqueira correo com elle até huma Enseada na 
Iha de S, Lourengo, em que entrou a 4 de Agosto com 
a sua Esquadra , menos 0 navio de Jeronymo Teixeira, 
que se apartou. Sahindo desta Bahia, chegou a 10 do 
mesmo a hum Cabo -pela parte de Leste da Ilha, ao 
qual chamou Cabo de S. Lourengo, por ser o dia des- 
te Santo. Avante deste Cabo achou humas Ilhas, on- 
de vierjo ter com elle dous grumetes, hum Portuguez, 
e outro Genovez, da cquipagem de Jodo Gomes de Abreu, 
que por alli se perdéra. Entrou depois na Porto de Tu- 
rubaia (3), no qual communicou com o Rei, e recolheo 
outro Portugucz da mesma equipagem. 

Daqui passou a humas Ilhas, a que péz nome de 
Santa Clara (4), pelas descobrir no seu dia; e desem- 
barcando em huma dellas, negociou com os Negros al- 


ral he mui fertil, e productiva. A sua ponta mais do Sul he o Cabo de 
Santa Maria, situado na latitude S. de 25° 40’, e longitude 63° 10’. 
O Cabo de Ambre férma a ponta mais do Norte, situado na latitude 
sa° 5’, e lonzitude 67° 50’. 

C1) Situado oitenta legoas além do Cabo de Boa Esperanca, naCos- 
ta Oriental da Africa. Latitude S. 34° 16’, e longitude 41° 14’ 

(a) Di-se este nome a hum Rio na Costa Oriental da Africa. Lati- 
tude S. 27° 45’, longitude 50° 58% 

(3) Nome de hum Reino, que naquelle tempo, segundo parece , 
Occupava a face do Sul da Ilha de S$, Lourenco: talvez serd Oo mesmo a 
gue se chama hoje Porto Delfim. 

(4) Sie duas Hhas sobre a Costa Oriental ca Ilha de S, Lourenco: 
a do Sul esta na latitude 24° 59’ S. e longitude 65° 36’. 


299 


gum gado ,‘e outros mantimentos , e se demorou até 12 
e Outubro, que proseguio a sua viagem, e foi ancorar 
em huma Povoac4o do Reino de Matatana, onde che 
Barfio os Gous homens, que por serem praticos na lin- 
gua Arabe, tinha desembarcado no Cabo de S. Lou- 
renco, para virem por terra examinando o Paiz, e in- 
formando-se das suas producgGes. Estes lhe contardo, 
que em toda a sua jornada nao virdo, senao algum gent 
givre nascido espontaneamente ; e que achdra0 dous Mou- 
ros de Cambaia, que alli naufragarao havia trinta an- 
nos, os quaes lhe affirmdrao nao aver na Ilha outra al- 
puma especiaria. — 

Deste lugar foi Diogo Lopes ao Rio de Matatana, 
em que recolheo mais tres Portuguezes do navio de Joaa 
Gomes de Abreu; e continuando a sua navegacao ao lon- 
go da Costa, vio muitas Povoagdes, e chegou a huma 
grande Bahia, que chamou de S. Sebastiao, por ser dese 
coberta a 20 de Janciro de 1505. Sahindo desta Bahia. 
se pdz a caminho para Malaca, mas pelo tempo lhe 
nio. servir arribou a Cochim, onde ancorou a 12 de 
Abril’, sendo bem recebido pelo Vice-Rei D. Francisca 
de Almeida. 

A-9 de Abril sahio de Lisboa Jorge de Aguiar 
com as duas Esquadras ; e a poucos dias de viagem te- 
ve hum tempo, por cuja causa Francisco Pereira Pesta- 
na arribou a Lisboa com o mastro grande rendido; e 
tornando a partir a 18 de Maio, dobrou o Cabo de Boa 
Esperanca, e¢ foi invernar nas Ilhas Primeiras. Jorge de 
Aguiar arribou 4 Ilha da Madeira, por se Ihe quebrar! 
o mastaréo de gavia, e com elle. outros navios; e repa-" 
rados das avarias, pozerao-se em derrota, porém na 
Costa de Guiné se dispersdr3o todos com as trovoadas; . 
e Jorge de Aguiar, indo depois na volta do Cabo de 
Boa Esperanca, so com a Nio de Alvaro Barreto, e 
achando-se huma ncite muito escura na altura das Ilhas 

38 i 


301 


hou Sebastiao Rodrigues Berrio, hum dos maiores Pilo- 
tos, € mais valentes homens do seu tempo, com outros 
habeis Marinheiros, e Duarte Darmas, grande Pintor, 
que desenhou as vistas da terra, e as plantas que se le- 
vantdrao : sobre cujos documentos, e as informacdes que 
derfo, resolveo-se ElRei ao ataque de Azamor, confiado 
nas promessas que lhe fizera em Lisboa Moley Zeyao, 
Rei que fora de Mequinez, e ainda posssuta alguns Es- 
tados, com cujas forcas promettia auxiliar a empreza , 
© que ndo cumprio. 

Nomeou E|]Rei ao mesmo D. Joao de Menezes por 
General deste Armamento, que constava de cincoenta 
navios, huns de guerra, e os mais de transporte (1) , 
em que se embarcdr4o quatrocentos homens de cavallo, 
e dous mil de gente de Ordenanga (a primeira que se vio 
em Portugal) dividida em dous corpos, de que erdo 
Commandantes Christovao Leitao,e Gaspar Vaz. Accom- 

nhavao a D. Joao de Menezes o Conde de Tentugal , 

. Pedro de Noronha, Luiz da Silveira , depois Conde 
‘da Sortelha, D. Joao Mascarenhas, Capitdo dos Ginetes , 
D. Nuno Mascarenhas, seu irmao, Jogo Rodrigues de 
S4 e Menezes, D. Luiz de Menezes, D. Antonio de 
Almeida , Pedro Mascarenhas, D. Henrique de Mene- 
zes, Simao Correa, Simao de Sousa Ribeiro, D. Tris- 
tao de Menezes, Francisco de Mendonca, Joao Ho- 
mem , Simao de Sousa Docem, Joao Brandao, e outros 
muitos Filalgos, e Cavalleiros. Era Piloto Mor da Es- 
quadra Sebastiao Rodrigues Berrio. 


A 26 de Julho de 1508 sahio D. Jodo de Menezes 


ao. Sudoeste do Cabo de Espartel, e cinco de Mamora: pode-se ancorat 
defronte delle desde 30 até 16 bracas de fundo limpo; o Rio he de dif- 
ficil entrada. 

C1) Vede Barros, Parte 2. Capitulos de 27 até 29. —- Fr. Manoel 
Homem, na sua Obra jd citada diz, que fordo perto de tres mil he~ 
Mens, ¢ cincoepta navios 


- 


302 


de Lisboa, e demorando-se em Lagos alguns dias pare 
recolher a gente, e navios do Algarve, foi dalli com 
bom tempo surgir diante do Rio ge Azamor, pelo qual 
entrou com enchente de aguas vivas ja sobre a noite a 
12 de Agosto, e no dia seguinte comecdrao os navio’s 
de guerra a bater a Cidade, a que os Mouros respondé- 
rao vigorosamente com a sua artilheria, e pelo Rio abai- 
xo langardo balsas de fogo, que pozerdo as embarcacdes 
em perigo, por ser o Canal estreito, e estarem apinhoa- 
as. 

Neste meio-tempo Moley Zeydo enviou hum emis- 
sario a D. Joao de Menezes com offerecimento dos seus 
Servicos; mas soube-se logo, que na Praca havia mais 
de oito mil homens , e que o mesmo Moley andava no 
campo em seu auxilio com outros deseseis mil. Apezat 
de tudo, D. Jodo de Menezes determinou desembarcar , 
e assaltar a Cidade da banda da terra, d’onde se deve 
inferir, que o fogo da Esquadra produzia pouco, ou 
nenhuin effeito. : 

Os Mouros, nao ousando disputar o desembarque , 
Jispozerao tres ciladas de mil e duzentos cavallos entre 
a Cidade e a praia, na csperanca de cercarem os Portu- 
guezes, e cortar-lhes a retirada. Desembarcou D. Joao 
de “Menezes sem opposicao, e formando a sua Infante- 
ria em columna, poz-se na sua frente com cento e cin- 
coenta cavallos, e do resto formou dous esquadrdes: hum 
de cem cavallos, que entregou ao Conde de Tentugal, 
e outro de cento e cincoenta a D. Joao Mascarenhas, 
para cobrirem a retaguarda. Nesta ordem marchou di- 
reito a Cidade, d’onde sahio grande numero de gente 
ao seu encontro, que elle rechzcou, e persepuio até ds 
portas, as quaes os Mouros fechdrao, deixando os seus 
de tora. 

Travou-se aqui huma furiosa peleja, que nio du- 
rou muito, porque os Mouros das ciladas vierao atacar 


303 


as dous esquadrdes, que cobrido a retaguarda da cofumna 
da Infanteria, a que acodio logo D. odo de Menezes ; 
e vendo que os inimigos erdo muitos, e se reforcavao 
com as tropas de Moley que tinhaa chegado, marchou 
para o lugar do desembarque , rompendo pela multidao 
dos inimigos, e conseguio recolher-se as suas embarca- 
ges sem mais perda, que deseseis Cavalleiros, em que 
entrdérao D. Pedro de Noronha, Simao Fogaca , Diogo 
Barreto, D. Jodo Henriques, Henrique Rodrigues Alco- 
forado , e Christovio Marques; ¢€ seis soldados de pé, 
Os Mouros perdérao mais de mil e trezentos homens, 
Nesta perigosa retirada hum Alcaide Mouro matou o 
cavallo a Joao Rodrigues de S4, e o mataria a elle, se 
nao lhe acudira Jodo Homem, e Diogo Fernandes de 
Faria, que matando o Alcaide, deo occasiéo ao Sd de 
montar no cavallo deste. : 

No dia seguinte sahio do Rio a Esquadra, com 
perda de algumas embarcac6es, pela desordem que hou- 
ve na occasido de fazer-se 4 véla. 7 

D. Jodo de Menezes foi cruzar no Estreito, segun- 
do as ordens d’ElRei, e em poucos dias tomou treg 
Fustas de Tetuam ; e mandando para Alcacer a maior 
parte dos seus navios, ancorou em Tanger, que gover- 
nava D. Duarte de Menezes, e avisou o Conde de Bor- 
ba, Governador de Arzilla, para vir conferir com elfe, 
e D. Duarte sobre objectos importantes ao Real Servi- 
go. Chegado o Conde, consultavao todos tres. 0 moda 
com que atacariao Larache, quando veio noticia de que 
a Rei de Féz marchava a sitiar Arzilla, por cuja causa 
o Conde de Borba se recolheo logo. Com effeito a 19 
de Outubro appareceo aquelle Monarcha com hum Exer- 
eito de mais de cento e vinte mil homens, muita arti- 
Sheria, munigdes, e petrechos de guerra para atacar a 
Praga, 0 que comecou a fazer no mesmo dia, e conti- 
muou no seguinte , em que tendo picado, e derribado 


308 


ma maneira hum Cavalleiro por nome Pedro da Costa, 
fameso nadador, que o informow:do modo com qué 
poderia -desembarcar com. menos: risco , e. introduzir no 
Castello ‘gente, ¢ mantimentos, que lhe faltavao, 

Com estas nacdes se preparou D. Joaa de Menezes 
a soccorrér a Praca, escolhendo. para iss as embarca- 
gdes que.demandavao mengs fuado; e publicou, que per- 
doava em:nome:d’ ElRei a-todos os homisiados a bordo 
dos navios, que no dia stguinte .desembarcassem , e da- 
ria quinhentos ¢ruzados ‘ao prime¢iro homem, que pozes- 
se os pés em:terra, Prompto tudo, fez-se 4 véla para 
o recife, e quando. vio hum signal convencionado, que 
Ihe fez o Conde de Eorba:s: de que hia fazer huma sor- 
tida , mandou desembarcar as tropas, que j4 estavdo nas 
lanchas, e escaleres, e rompeo huma furiosa canhonada 
contra a multidao de Mourps, que inundavdo a praia, 
e a despejérao em breve. _ 

D, Joio Mascarenhas foi o primeira que desem- 
barcou o Corpo do seu. commando, mas D. ‘TristZo’ de 
Menezes ganhou 0. premio, porque a embarcacdo ent 
que hia abordou primeiro a terra. Os Mouros vende 

uc os Portuguezes desembarcavado, corrérdo 4 praia, ons 
de fordo tratados de maneira pelos que sahido das. lan- 
chas, e os da sortida, que recudrdo por todas as par- 
tes, ¢ abandonirao huma hateria de seis canhdes, 4 cuse 
ta das vidas de muitos delles, e de alguns dos nossos , 
hum dos quaes foi Manoet Coutinho. 

No maior ardor do conflicto introduzio-se no Gas- 
tello D. Joao Mascarenhas com duzentos homens, e al- 
gumas imunicdes de guerra, e boca; e no dia seguinte 
entrarao outros duzentos , posto que com muito perigo. ; 

Com este soccorro ficou o Castello capaz de defer-, 
der-se, 0 que nao faria se tardasse o soccorro mais hum 
dia, por se achar todo minado, ¢ a gente ser tdo pouca, 
© to cangada, que jd nao podia resistir ao trabalho. * 

39 


TT 


ee -Sermio. Ech quette ella s¢:celebrava fer, antomptar, 
o seu gdntar, ¢ sellar hima faca mui .andadeira, ¢ de 
pois del.comer 4 preesa, ¢.se.despedie da Rainha, parkio 
8d coms Be, OL Aid: pessadg, GoM: tanta pressa, que na 
aerra: do:Alearve the. rebeaton A faca,,..¢ alli soube ser 
o Chatelib:jd soccerrida., prio que foi com maia vagar 
até Eavira. E resolato a passar em pessoa 4 Africa ,-s¢ 
ajuotérte em‘‘Tavira ,¢ extras: Portas do Algarve maig 
ee vime ail‘homens com-:artilheria, mynich¢s, @ vives 
‘ e¢s,,’e. haviod. qi vierda' de Lishog para trangpoxtar fer 
dno'b HarercitO. 220 ce ett, 
-. Hétanda: EiRei’ prenupte a. fager-ge, a véla, ,sonbe 
hhayerca Rei de Féz-levantade o sitio, e par parecer de 
seu: Concelito desistio.da jorhada, remettcndo cqnmmde 
a Arma alguns navios carregedes de tropas, nwaie 
, ¢. Artifices para repararem. as fertificagdes, Ao 
Conde D. Pedro. Navarro mandou. seie mi} crpzadgs , que 
elie..s4o’ acriwu: an Corregedor, ide Geren (que pere 
deo: aitdnta: homens namuella expedicio),.e.4 outros Car 
vatieives:da Anfaluzia deo Habitos com tengas.em quag | 
vidas ,.£m reconhecimenta da presteza com que’ acadi« 
s40 a secoorrer Arzilla.  . tA. - 
D. Jado de Menezes conservquese diante desta Pras 

ga até chegar todo o so¢cerra, que lhe. foi do Algarve, 
€ voltbu depois a Portugal, sendo recebido d’ E/Rei 
com mevecia@n os seus relevantes servicos, °. |. 4°, 
1509 — ..Pelas. noticias que EIRei teve. da guerra. 
que khe fazia o Camorim (1), e da Armada que. Sul- 
tZ0 xlp proparava em Sugz pata invadir a Ipdia, 
e unir-se Aquelle Principe, e a outros seus confederados, 
Gererminon: mandar huma forte Esquadra a destrujc.a 
Cidade de Calecar; ¢ para esta expedicgao escolheo a, 


1) “Vede Farros , Decada 2. Liv. 3. Cap. 9. — Damiio de Gor.’ 
Parte 2. Cap. go. — Castanheda, Liv. 2. Cap. 122. coe 
39 ib | 


309 


mandante dé hum navio Portuguez, que vinha da India 

-no anno de 1508, sobre a restituigao de cuja preza fez 
EIRei D. Manoel inuteis representac6es 4 Corte de Fran- 
¢a; soube-se. que o mesmo Mondragon armava de novo 
quatro navios para vir esperar as Naos da India na sua 
torna-viagem a Portugal, e em consequencia mandou 
EJRei sabir de Lisboa a Duarte Pacheco Pereira com 
‘algumas embarcag6es, para o interceptar na passagem 
para os Agores,; o que com effeito conseguio, encon- 
‘trando-o a 18 de Janeiro de 1509 sobre o Cabo de Fi- 
nisterrz# ; e depois de huma furiosa peleja, o tomou com 
tres dos seus naviOs, metteo outro a pique, e os condu- 
_-zio a Lisboa. 

1510 — Este anno partirao de Portugal duas Esqua- 
dras (1) para a Asia, e huma para a Ilha de S, Lou- 
renco. , . 

A 12 de Marco sahio a primeira com destino a 
Malaca , composta de quatro navios 4s ordens de Dio- 
go Mendes de Vasconcellos; e os outros Commandan- 
tes Balthazar da Silva , Pedro Quaresma , e Diniz Car- 
niche, Armador do mesmo navio. Todos chegdrio a 
Goa a salvamento. 

A segunda Esquadra sahio quatro dias depois des- 
ta, e constava de sete Ndos da Carreira, que devido vol- 
tar com carga de especiaria. Era seu Commandante 
Gongalo de Siqueira; e os dos outros seis Navios Ma- 
- noel da Cunha, Diogo Lobo de Alvalade, Jorge Nu- 
nes de Leto, Lourenco Lopes, Lourenco Moreno, e 
Joao de Aveiro, que servia tambem de Piloto. Perdeo- 
se na viagem perto de Mocambique a Ndo de Manoel 
da Cunha, salvando-se toda a gente: os outros navios 
forfo 4 India a salyamento. 


(1) Castanheda, Liv. 3. Cap, 34. — Rarros, Decada 2, Liv. 5. 
8., ¢ Liv. 6. Cap. 10, — Goes, Parte 3. Cap. 10. 


$10 

A 8 de Agosto patti Jozo Serrfo, Cavateleo de 
Casa d’ ElRei, com outra Esquadra de tres navios, sen- 
do os outros dois Commandantes Paio de Sousa, e Fer- 
ndo Cavalleiro. Levava Jodo Serrd4o instrucgdes para ic 
4 Ilha de S. Loutenco estabelecer pazes, e trato mer- 
cantil com os Reis de Turvbata , e Maracana. 

Forcado dos ventds, ou por m4 navegacio, foi ter 
4 Iiha de S. Thomé com os navies destrocsdos, onde 
se reparou; e seguindo a sua viagem, chegow ao Porto 
de Antepdra (parece ser a Bahia chamada dos Galetdes, 
na-face do Sul da Ilha), s6 com dois navios, por se ha- 
ver separado o de Fernio Cavalleiro, em que com 
viveres, e algum gengivre. Dalli passou ds Idnas de 
ta Clara, e a outros Portos, pelos quaes perdee dois es- 
calcres; e depois de gastar 0 Inverno correndo 4 Cosre, 
sem achar mais gengivre, Ou Outra espeCiaria, partie pa- 
ra Goa, onde chegou; e Paio de Sousa foi asribado a 
Moca mbique. : St 

Neste mesmo anno mandou ElRei para Goversa- 
dor de Cafim ao fatroso Nuno Fernandes de Ateide , 
com ham Comboi de trinta navios carregades de tro- 
pas, e municdes, e muita gente nobre, para ficar de 
guarnic#o naquella Praca. 

151r — Neste anno mandou ElRei 4 India huma 

Esquadra de seis Ndos (1), de que deo o commando a 
D. Garcia de Noronha, sobrinho do Grande Affonse de 
Albuquerque, o qual embarcou na Néo Ajuda (2); e es 
outros Commandantes erio Pedro Mascarenhas na Senhe- 
ra da Luz; Manoel de Castro Alcofofado na Santa En- 
femia; Jorge de Brito no S. Pedro; Christovéo de Brie 


(1) Catanheda, Liv. 3. Capitulos 71 e 80. — Bartos, Decadla e. 
Liv. 6. Cap, 10, e Liv. 7. Cap. 2. —- Goes nio faz mengio desta Es- 
cuadra. 

(2) Nio achei o numero de Soldados que levava esta Esquarta , 
nias cond Parros nos diz, que a Ndo.Belem conduzia quatrucentos, po- 


$it 


te na Belem, hima das melhores Néos daquelle tempo; 
e D. Aires da Gama na Piedade. | | 
Por algnm incidente que ignoro, sahio primeira 
D. Garcia de Noronha a 12 de Abril de 1511 com as 
uatro primeiras Ndos, e a 20 D. Aires da Gama, e 
Cheistavdo de Brito. Estes dois ultimos Commandantes 
navepaésao unidos at¢é.4 altura do Cabo de Santo Agosti- 
pho, onde hum tempo os apartou, Christovao de Brito 
dobrou o Cabo de Boa Eaperanca a 2 3 de Julho, che- 
u a-Mogambique nos principios osto, ed India 
om Serembro. D. Aires da Gama chegow pouco depois. 
D. Garcia de Noronha seguindo sua viagem, so- 
tavenecomse tanto, que ne pode montar o Braeil (1); 
e virando no bordo de Lesre, foi huma noite topar cons 
hum Dhore, que sendo primeira visto por Jorge de Bri- 
to, Commandante da Nao 8. Pedro, que. hia na van- 
da, fez signal aos outros navios, que assim escapa- 
rGo dle se perder (2). Deo-se a cste penkasco o nome 
de Pesedp de S. Pedro. Por wtimo ancoron D. Garcia 
an Hhe de S. Thomé, onde 9 seu Governador Fernan- 
do de Mello © provéo do necessario; e daqui esereveo 
a ElRei os acontecimentos da sua viagem. 
Pastindo de S. Thomé no 1.° de Agosto, o seu 


demos avaljar o total em mil e seiscentos homens pougo mais ou me- 
hos. 

{1} Nf&e havia ainda naquelles tempos hum systema fixo, e conhe- 
cido das derrotas que se deviio fazer de Lisboa para o Cabo de Boa Ee« 
peranice, segundo as-estacdes do anno; ¢€ por isso muitos Pilotos, por 
fugirem das calmarias de Guiné, onde algyns voluntariamente se bido 
Metter, corrjio tanto para Oeste, que nio podiio mantar o Cabo de 
Sante Agostinho, e erio forcados a virar no bordo de Leste em mui 
poquens latitude, o que os levava ¢ mesma Costa de Guiné , que gue- 
FiZ0 evitar, farendo assim hum radeie immensp, até se metterem ap- 
vamente em caminho. Mas he preciso tambem confessar, que os navios 
daquelle tempo nao andavao, nem bolinavio como os de hoje. 

€2.) © Benedo de S. Pedso esra na latitude N. de 55’, e longitude 
35° 55" 


312 


Piloto, por seguranga , foi buscar a latitude de 46°, on- 
de as equipagens soffrérao terriveis frics,; ¢ vindo. de- 
pois demandar a terra, e cuidando (nao sei porque) le 
var dobrado o Cabo de Boa Esperanga, veio embetes- 
gar a Esquadra em huma Enseada muito ao Norte do 
Cabo, cheia de bsixos, e correntes, que arrastav%0 os 
navios para dentro; e milagrosamente sahio a salvo pa- 
ra continuar a navegar bordejando ao longo da Costa, 
em que gastou mez e melo antes que montasse o Ca- 
bo. Tantos trabalhos, e tantas mudangas de climas ti- 
nhao ralado as guarnicg?es de maneira, que todos os dias 
se lancavdo quatro, e Cinco mortos ao mar; € os doen- 
tes erao tantos, que nao chegavao Os saos para marear 
Os navios; e assim andou D. Garcia a téa meio perdi- 
do, até que vio a Costa da Africa, a qual os Pilotos 
atarantados n3o conhecérao. 

Partio entao Pedro Mascarenhas na sua Jancha para 
tomar lingua em terra, e saber onde se achavao; e co- 
mo o mar quebrava muito, enviava elle hum Negro, e 
hum marinheiro a nado, que voltdrao com resposta de 
que estavao trinta legoas distantes dquem de Mocam- 
bique; mas infelizmente nao. pédde Pedro Mascarenhas 
recolhe-los a bordo da lancha, e mandou-lhes que fos- 
sem adiante a huma ponta de terra, que mostrava fazer 
abrigo, e ahi os tomaria, como tentcu fazer, porém 
n30 apparecérao , e depois se soube que os Mouros os 
matardo. 

A tr de Margo de 1512 entrou finalmente a Es- 
quadra em Mogaimbique (1). 

1512 — Sabendo EJRei, pelas Cartas que da Ilha de 
S. Thome lhe escreveo D. Garcia de Noronha, que nia 
Ihe era possivel passar aquelle anno 4 India, mandou 


(1) O inesmo diz Faria e Sousa, porém Castanheda da a sua che- 


zida no me. de Fevereiro. 


313 


‘immediatamente aprestar doze Ndos com dois mil sol- 
dados de guarnic&o (tanta era a abundancia de navios, 
© municbes navaes naquelles tempos felizes!), de que 
formou duas Esquadras, huma de oito, outra de qua- 
tro Néos (1). 
Commandava a primeira Jorge de Mello Pereira 
na Ndo Senhora da Serra; e erfo os outros Comman- 
dantes Jorge de Albuquerque na Nazareth; Jorge da 
‘Silveira no Bota-Fogo; D. Joda de Eca na Magdale- 
na; Lopo Vaz de S. Paio na Santa Cruz; Gongalo Pe- 
reira na Conceicg4o; Simao de Miranda na Virtudes; e 
Francisco Nogueira no Santo Antonio. Da segunda Es- 
uadsa era Commandante Garcia de Sousa na Ndo Sao 
Joao ; e os outros Pedro de Albuquerque na Sebastia- 
na; Gaspar Pereira, que hia servir de Secretario com 
Affonso de Albuquerque, no Santo Espirito; e Roque 
Raposo de Béja’ cm outra Nao. | 
Tinba ElRei ordenado, que os navios partissem a 
dois e dois logo que estivessem promptos, e se fossem 
reunir em Mogambique, onde esperariao pelos seus re- 
spectivos Chefes até hum certo tempo, passado o qual 
deverido seguir para a India debaixo das ordens do pri- 
meiro delles, que chegasse; mas a 25 de Marco de 1512 
sahirdo de Lisboa quasi todos os navios. 
‘Estas duas Esquadras surgirdo em Mocambique 
pelo mez de: Junho, excepto Jorge da Silveira , que 
assando por fdéra da Ilha de S. Lourengo, chegou 4. 
arra de Goa a 8 de Julio; e nao ousando entrar por 
serem Os tempos mui verdes, foi. ancorar em Anchedi- 
va; e Francisco Nogueira, que se perdco nos baixos das- 
Ilhas de Angoxa (2), em que morreo quasi toda a gene 


(1) Earros; Decada 2. Liv. 7. Cap. 2, —— Faria, Asia Portugueza 
Tomo 1. Parte 1. Cap. 2. — Goes nao faz mencao desta Esquadra. — 
Castanheda falla com assis confnsio no Liv. 3. Cap. 88. 

(2) Sio quatro pequenas Ihas situadus sobre a Costa Oriental da 

| 40 


314 
te, e elle, por ndo saber nadar , ficou na parte su- 
fior do casco da Ndo com dois filhos sens; © quatt- 

) a maré vasou, destobtindd-se o pattel , passdt#d 
a pe ehxurd para htitha daquelias thas, oltide ficdr#o 
patdise dos Mouros, mas pouco tempo depois se rts- 

tdrao. ° 

1513. — Neste anno partio para a India hima Es- 
Quadra de tres Ndos, commarndada por Joio de Sousa 
de Lima na Ndo Piedade; e os outras dois er4o Hen- 
riqué Nunes de Le%o no S. Christovio, e Franciscd 
Correa no Santo Antonio (1). 

A 14. de Margo de 1513 sahio de Lisboa esta Ee 
quddra, e sobre o Cabo de Boa Esperanga se disper 
rf os navios com hum temporal. Joao de Sousa de Li- 
ima chegou a Mocambique a 22 deJunho; e nos prihcl 
pies de Julho Hetrrique Nunes de Leao. Francisto Cor- 
rea tomou por féra da Ilha de S. Lourengo, caidando 
gue entrava pelo Canal; mas conhecendo depois a terra, 
seguio a sua viagem, e dobrando a Ilha pela cahege do 
Norte, atravessou a Costa da Africa para vir Buscai 
Mogambique, e perdeo-se no baixo de S. Lazaro ses- 
senta legoas ao Norte desta Ilha. Teve porém occasifo 
de fazer jangadas, ¢ com estas, e a lancha, ¢ © escalet 
salvou toda a gente, e foi ter a Melinde, onde achou 
felizmente as duas Naos da sua conserva. 

1513. — Agastado E]Rei D. Manoel do quebranta- 
mento das pazes que fizera , e renovdra com Moley 
Zeya4o , Senhor da Cidade de Azamor, determinou con- 
quista-la, e€ para esta commissao nomeou ao Duque de 


Africa, pouco distantes de Mocamlbique, e fronteiras a hum Rio, de 
que ellas tomdrao onome.. A Ilha mais do Sul est situada na: latitude S. 
16° 33’; e longitude 58° 10’, 

(1) Barros, Decada 2. Liv. 8. Cap. 6. — Faria, Asia Postuguera — 
Castanheda, Liv. 3. Cap. 115. — Esta Esquadra falta em Damiio de 
Goes , e na Memoria ce Fr, Manoel Homem. 


S16 


Bragunea TD. Jaime , seu sobrinho, por seu Capitdo Mor 
Gemeral, com poderes mui amplor (1). ? 
Constava a Armada de mais de quatrocentas e trin- 
ta embarcacgdes, entre navios de guerra, e de transpor- 
te, na qual,embarcar4o (2), além da Marinhagem ne- 
cessaria, dois mil e duzentos homens de cavallo, tude 
gente nobre, de que duzentos erZ0 acobertados, ¢ quite 
ze mil homens de Infanteria, pagos 4 custa d’ ElRei; e 
© Duque alistou nas suas terras quatro mil homens ese 
cothides, a seu soldo; e dos seus’ Vaseallos, e creados 
quishentes ¢ cincoenta de cavallo, em que ‘entravdo cem 
a¢obertados.. Destes quatro mil Infantes formou o Due 
que quatro Corpos, de que nomeou Coroneis Gaspar 
Vez, Pedro de Moraes , Christovao Leitia, e Jozo Ro- 
drigues, os quaés tinhZo servido na Italia com boa ree 
putagad;.€ tanto og Officiaes, como os Soldados , forda 
fardadne.d sua custa, com g#bdo0, e gorrea de panno bran- 
co, ‘tons huma Cruz vermelha no peito, e otra nas cos- 
tas; @ fardamento dos Coroneis, Alferes, Sargentos, e 
Cabos. era de teda da mesma cdr. Estes quatro Regi-~ 
mentos (fallando na frase moderna) estavao bem disci- 
pliaados , e instraides em todas as evalugdes militares. 
Nemeou KiRet a D. Joio de Menezes por Capitaa 


@)_ Por huma Carta Regia datada de Lisboa a 3 d’Agosto de 1513, 
dirigida 2 codos ‘os Fidalgos, Officiaes , e pessoas de que se coipurth¥a 
we Forcas de Mar, ¢ ‘Terra, empregadas na expedicio; em cuja Carta 
dizia EMRei estas formacs palavras; ‘© Com a qual Capitania the dure 
2» (#0 Bugue) rode o nosso camprido poder, ¢ alcada sobre toda a geiv 
ap te da dita Armada, ¢ Exercito, de qualquer estado, e condicso que 
yn Stja, para delle usar, coma Nés pessoalmente o fariamos, se precen- 
>> te fossemes , -assim no Give], como no Crime, até morte natural in- 
>» clusive, sem d'elle em caso algum haves outra mais appellarZo, nem 
n VO, porque tudo quesemos, ¢ nas praz que faca nelle fim. ,, 

ca Vede Goes, Parte 3. Capitulos 46 e 47. — Historia Genealo« 
gica da Casa Real Portugueza, ‘lomio 5. Liv. 6. pag. 503 € seguintes ; 
é a Carea do Duque de Praganca 2 ElRe: D, Manoel tio Tomo 4. das 
Provas i snesmia Historia, a fiig. 32. - 
40 li 


$19 

@ou ho capo com todas as Forgas que pode teunir, p2- 
ra_dar batalha aos Portugwezes, sepundo dizia. Tinha 
o Durie ordendto a Pedio ‘Affonsd dé Aguiar, que com 
bs navios dé guerra entrasse no Rio de Azamor, ¢ quel- 
fhaske us bulsas iticendiarias, que os Mouros haviio fa- 
bricado para deirarem fogo 4os navios; o que elle cums. 
prio, a pezar da opposicao da artilheria da Cidade. 

O Exercito foi assaltado na marcha pelos Mov- 
fos, que intentardo embaraga-la, mas sendo rechaca- 
dos , se ‘alojou o Duque aquella noite ao longo do 
Rio , eri. que a Armada estava ja ancorada. No dia 
seguinte se comegou a desembarcar a artilheria, e mu 
higdes para bater as muralhas, e os Mouros totndrio 
& apparecer, e a retirar-se. Alguns Generaes erao de 
dpinido de os atacar , porém o Duque de Braganca 
Pegeirou este parecer , Julgando mais prudente tomar 
primero a Cidade, para depois obrar segundo as cir- 
Cunstancias. 

Desembarcada a aftilheria, e posta alguma della 
em bateria, thandou entretanto o Duque encostar man= 
tas 4 muralha para a picar, visto que a Cidade nio ti- 
nha fosso, nem obra alguma exterior, que o embaracas- 
se, e assim se fez debaixo da direccio de D. Joto de 

es, que provia em tudo. Este ataque durou até 
ao fim da tarde, defendendo-se os cercados o imelhot 
jue podiao, com tiros, e armas missivas, langando sobre 
as mantas quantidade de fogo, quando huma bala de 
artilheria matou Cide Mangor, de cuja vida parece que 
dependia a defesa da Praga; porque nessa noite a des- 
ampardrao os Moures com tanta precipitagao , que mor- 
rérao mais de oitenta affogades no meio da multidfo, 
que se vasava pclas portas. 

Antes de amanhecer veio hum Judeo Portuguez dar 
esta noticia ao Duque, que tomou posse da Cidade, na 
gual sé achou alguma artilheria, e¢ mantimentos. A fa- 


320 


ma desta conquista fez.despovoar as Cidades de Tite, e 
Almedina , de que os Portuguezes se apoderdrdo. 
Fez depois o Duque huma entrada na Provincia, 
para castigar os Arabes, que havendo assentado comelle 
pazes , as quebrdrao logo; mas nao achou mais que hum 
_ pobre Aduar com duzentas individuos, a que.deo liber- 
dade. E comegando a adoecer de hum tumor, que lhe 
vedava andar a cavallo, deixou em Azamor toda a sua 
casa, e tropas, e partio pira Portugal a 21 de Novem- 
bro com dois unicos navios; desembarcou em Tavira, 
e€ apresentou-se em Almeirim a ElRei, que o recebeo 
com grandes honras. 
_ 1914. — A 20 de Margo de 1514 partio para a In- 
dia Christovio de Brito, commandando huma Esquadra 
de cinco Ndaos; sendo os outros Commandantes (1) Ma- 
no:l de Mello, Joao Serrao, Francisco Pereira Couti- 
nho, e Luiz Dantas: este chegou primeiro a Goa, e de- 
pois delle em Setembro o resto da Esquadra. 
Em Juiho do mesmo anno sahio de Lisboa Luiz 

igucira por Commandante de dois navios, e © outro 
era Pedro Annes Francez. Levava Luiz Figueira ordem 
para ir ao Porto de Matatana, na Ilha de 3 Lourenco, 
estabelecer huma Feitoria, para negociar o gengivre, 

ue produzisse o Paiz;, o que nao teve effeito, porque 
depois de estar alli seis mezes recolhido em hum Redu- 
cto, que construio, na falsa esperanga que lhe dayao os 
habitanres da colheita do gengivre, se levantarao contra 
elle, por cuja causa se retirou a Mocgambique; onde ja 
achou Pedro Annes, que manddra naquelle meio tempo 
a reconhecer a Costa de Leste da Ilha, e com effecito 
cntrou em alguns Portos, e no ultimo comprou muita 


(1) Barros, Decada 2. Liv. 10. Cap. 2., e Decada 3. Liv. t. Car. 1. 
— Goes, Parte 3. Capitu'os 66 € 67. -- Castanheda, Liv. 3. Cop. 153, 
cota so quatro Naos nesta bs guadia. 


321 


quantidade de ambar; e como © vento era contrario 
para voltar a Matatana, foi-se para Mocambique, 
1515. — Affonso de Albuquerque , depois de con 
quistar Goa’, Ormuz, e Malaca , tres das principaes 
chaves do Commercio da India, pedio a ElRe! D. Ma- 
noel o Titulo de Duque de Goa ,’e licenca para acabar 
nella a sua vida, mais gasta de trabalhos, que de annos; 
mas O$ seus inimigos: tiverdo a arte de insinuar no ani- 
mo sincero.d’ E]Rei algumas suspeitas contra a sua fides 
lidade, exagerando a affeicao que lhe tinhao os Portu- 
puczes que serviao na Asia, ¢ os Reis, e Povos daquel- 
es ricos Paizes, que todos folgariao de o ter por scu 
Governador, ou seu alliado; d’onde concluido , que per- 
tendia por aquelle meio tornar-se independente de Por- 
tugal. a A , 
- e Estas perlidas suggestdes, attribuidas naturalmente 
pelo Monarcha ao zelo do Real .servico, o fizerZo re- 
solver 'a ‘mandar por Governador da India (1) Lopo. 
Soares de‘ Alvarenga, que nZo sendo amigo de Affonsa 
de Albuquerque, parecia por isso mesmo mais capaz de 
© fazer embarcar para o Reino, a pezar de qualquer 
obstacula que occorresse (2). Levava elle Instrucgées 
sobre dous artigos da maior importancia: o primeiro 
para arrazar a Cidade de Goa, e abandonar a Ilha, se 
assim parecesse bem «ts principaes pessoas, que serviao 
na India (3); e.0 segundo para nao occupar a Cidade 
de Adem (4) quando fosse ao Mar Roxo (5). Esté’ pro= 
jecto era talvez o resultado das intrigas dos inimigos de 


(1) Barros, Decada 3. Liv. 1. Cap, 1, —- Goes, Parte 3. Cap. 77. 
— Castanheda, Liv, 3. Cap. 152. 

(2) ‘Damido de Goes o diz positivamerte no lugar citado. 
* (3) Goes, Parte 4. Cup. 2. ce 

(4) Esta Cidade esta situada na. Costa do Estreito da Arabia, e era. 
ssaquelles tempos mui celebrada ems todo o Oriente. , 

(5) Goes, Paste 4. Cap. 12, 

41 


42:3 


etn Mogambique, e seguindo d’ali a sua viagem, che- 
geu a Goa nos principios de Setembro. 

: Affonso Lopes da Costa levava Cartas d' ElRei 
para Affonso de Albuquerque, concedendo-lhe licenga 
para ficar.na India (1) em qualquer Fortaleza que es 
golhesse, isento da jurisdicg¢ao do Governador Lopo Soa- 
res; € que na sua vagan<ia tomaria o Govcrno com @ 
Titulo de Vice-Rei. He certo, que ElRei sentio a mor- 
te de tao grande homem, e fez muitas mercés a seu fi- 
lho, como elle Ihe tinha requerido na hora da ‘morte. 
_:1915. — Determinado ElRei D. Manoel a fazer 
construir huma Fortaleza em Mamora , nomeou por. 
Capirao-General desta expedigao a D, Antonio de No- 
ronha, depois Conde de Linhares, seu Escrivio da Pus. 
ridade; e para lhe succeder no commando, se falleces- 
se, a D. Nuno Mascarenhas. Constava o Armamento 
de mais de duzentos navios de todas as prandezas, ¢ 
gito mil homens de tropas, divididos em tres corpos, 
de que crao Coroneis Tristéo da Silva, Ruy de Mello, 
e Christovao Leitao (2). : : 
: Qs Officiaes, e pessoas mais notaveis desta expe- 
dicdo erao D. Affonso de Ataide, D. Alvaro de Noro- 
pha, D. Bernardo Manoel, Camareiro Mor, D. Gas- 
per, e D. Jodo de Noronha, da tha da Madeira, Gare 
cia de Mello, Anadel Mor dos Besteiros, Pedro da 
Fonceca, Langarote de Mello, Antonio de Saldanha, 
D. Rodrigo de Noronha, D. Pedro de Azevedo, D. An+ 
tonio de Azevedo, seu irmao, Duarre de Lemos, Pedra 
Moniz, D. Antonio de Sousa, Tristao da Silva, Ruy 
de Mello, Simao Gelez, Senhor da Torre de Chamor ,. 
Francisco Lopes Gir4o, Jorge Correa; Christovao Lei-. 
ta20, Fernao Vaz Ccrte Real, Vicente de Mello, An- 


; C13 Assim o affirma Damido de Goes na Parte 3. Cap. 80. 
(2) Damiado de Goes, Parte 3. Cap. 76. 
4i il 


325 


No dia segninte armou-se o Forte de madeira, e 
comegou-se a construcc3o da Fortaleza, em que todos 
trabalhavio, sem excepcio, e com tal actividade, que 
em breves dias se abrio hum fosso de vinte palmos de 
largo , e-quatorze de fundo, em que entrava a mar¢, e 
se fechava 4 vontade para 0 conservar cheio d’agua. 

Entre tanto os Reis de Féz, e Maquinez acudirio 
a estoryar. a obra com hum numeroso Exercito, que co- 
bria duas. legoas de terreno, e sitiar4o o campo dos Por- 
tuguezes, que sem descontinuarem os seus trabalhos, fae 
zia0 frequentes sartidas, com perda de muita gente de 
parte a parte; e huma dellas tornou-se tdo sanguinosa, 
que posto os Mouros fossem rechagados, tiverdo os Por- 
tuguezes mil e duzentos homens fora de combate. A pezar 
destes obstaculus, a Fortaleza estava quasi concluida n 
fins de Julho. | 

Como os Mouros recebizo muita damno dos na- 
vios Portuguezes, que além de cconduzirem mantimen- 
tos, e municdes para o Exercito, batiao os seus quar- 
teis com artilheria , construirio logo no principio do si- 
tio 4 entrada do Rio huma bateria mui forte, em que. 
montdrao muitos canhdes, para lhes vedar a passagem, 
€ cortarem assim tedos os soccorros aos sitiados; que a 
final devido achar-se reduzidos a capitular, ou a fazer 
huma retirada desastrosa, pois que nao tinhdo forcas suf- 
ficientes para arriscar huma batalha. 7 

D. Antonio de Noronha, vendo que a bateria dogs 
Mouros 0 punha em perigo eminente de se perder, man- 
dou ancorar diante della hum navio grande, cujo cos- 
tado se reforcou com hum forro de vigas, coberto de 
sacas de J4, estopa, e algodio., para resistir as balas de 
srtilheria, e com a sua destruir a bateria, do qual na- 
vio deo o commando a Gaspar de Paiva; mas no fim de 
trinta dias o mettérao os Mouros no fundo; e D. Ante- 
nio perdeo de todo a esperancga de conservar-se ali mais- 
tempo. 


327 


a+ «Este Official chegou 4 India hum mez antes dos 
navios da Esquadra de Joao da Silveira. 

_ 1947. — Querendo ElRei D,. Manoel aproveitar-sé 
dos talentos de Antonio de Saldanha, o mandou este ane 
no de 1517 a fazer hum rigoroso cruzeiro no mar da 
Arabia contra os Mouros,, que por ali passavio 4 Cos- 
ta do Malabar; e como similhante servico exigia algu- 
mas embarcacdes Latinas, que nao podiao ir de Portu- 
gal, ordenou ao Governador da India lhe désse as que 

em -necessarias. 

Aprestou-se em Lisboa huma Esquadra (1) de oite 
dNaos, de que elle tomou o commando, embarcado na 
Ndo Senhora da Serra ; os outros Commandantes erao J). 
‘Tristéo de Menezes, Manoel de Lacerda, no S. Tiago, 
Pedro Quaresma , Rafael Catanho, Fernao de Alcaco- 
va, noemeado Vedor da Fazenda da India, com pode- 
res que o izentavao do Governador, os quaes nfo pode 
executar, Affonso Henriques de Sepulveda, e outro. An- 
tonio de Saldanha sahio primciro com cinco navios, e 
peuco depois partirao os outros tres, que se Lhe reunirio 
em Mogambique, e chegardo todos 4 India em Setem- 
bro. 

1517. — Em Junho de 1517 (2) mandou ElRei D. 
Manoel huma Armada de setenta navios de guerra, e 
de transporte , com muita gente de pé, e cem de caval- 
Io, commandada por Diogo Lopes de Siqueira, com 
ordem de embarecar cincoenta Cavalleiros em Arzilla, e 
‘outros tantos em Tanger, e d’ali passar a Ceuta, cujo 
Governador D, Pedro de Menezes, Conde de Alcoutim, 
deyia reunir-se a efle com toda a sua Guarnigdo, para 
-marcharem de commum accordo sobre Targa. O genio 
altivo de Cende, e a desconfianca em que fico por se 


cf? Vede Barros , Decada 9. Liv. 1. Cap. 10. — Castanhieda , Liv. 4 
. 26, . 
(2) Goes, Parte 4. Cap, 22, 


329 


- Diogo Lopes demorou-se pouco em Mocambique , 

e chegou'd India a .8 de Setembro. oe 
istg. — Neste anno se armou (7) huma Esquadra 
de quatorze Ndos (2), commandada por Jorge de Albu- 
querque, embarcado na Ndo Guadalupe; os outros Com- 
dandantes eréo Lopo de Brito, Pedro da Silva, Jodo . 
Rodrigues de Almada, Francisco da Cunha, Christo- 
' yao de Mendonca na Nao Graga , Rafael Perestrello aa 
Rosa, Rafael Catanho, Diogo Fernandes de Beja, Gon- 
galo Rodrigues Corréa na Ndo Santo Antonio, D. Dio- 
go de Lima, o Doutor Pedro Nunes (3), Manoel de 
Sousa em hum Gale%o (4), e D. Luiz de Gusmao, Fi-. 


mova, até que andando o Carpinteiro por féra examinando as costuras ,. 
vio acousa de meia braca abaixo do lume da agua, hum pedaco de 
ponta como de boi cravada no costado, O Bergantim chegou a Lisboa 
tocando sempre i bomba, e o Constructor do Arsenal cortou hnm pe- 
daco da taboa, em que estava mettida a ponta, que tinha mais de dous 
palmos de comprido, de cor escura, mui rija, e a superficie escamosa: 
persuado-me que foi.conduzida para o Real Museo. | 

(1) Vede Barros, Decada 3. Liv. 3. Cap. 9. —~ Goes, Parte 4. 
Cap. 36. — Castaneda, Liv. 5. Capitulos de 15 até 18. | 

(2) Assim o diz Barros no lugar citado, Faria na Asia Portugueza, 
e o Nobiliario manuscrito das Familias Portuguezas, no Tomo 3. pag. 
612. Damiio de Goes conta desaseis Ndos , e Castanheda desasete. Eu 
creio, que a differenca consiste nos dous navios destinados para a Chie 
na, que huns excluirio, e outros incluirio na Esquadra. 

(3) Pedro Nunes hia com o Cargo de Vedor da Fazenda nos Estados 
da India, vencendo 400g)000 réis annuaes, e outras muitas vantagens , 
além de ElRei lhe pagar vinte homens para o acompanharem., Levava 
elle hum Regimento, que 0 isentava da jurisdicgio dos Governadores 
nos casos Civeis, e Crimes, e lhe conferia toda a administracdo da Fae 
zenda, que elles até ali tinhdo, segundo refere Castaneda no lugar 
acima citado. Succedeo o que era bem natural, hum conflicto de ju- 
sisdicgGes entre os dois Chefes do Estado, cuja consequencia foi voltae 
Pedso Nunes para Portugal. 

(4) Daqui por diante comeca a nossa Historia a fallar em Galedes, 
e assim cumpre dizer, que ds vezes os Escritores chamio com indifferen- 
&a aos navios grandes, GaleGes, ou Ndos; mas na realidade os GaleGes 
comecario a ser naquelles tempos os navios propriamente de guerra, ¢ 

42 


330 


dalgo Hespanhotl ,. ent outro, que era o’ mais formoso ; 
e bem armado navio de toda a Esquadra. 

Partir4o’ este mesm@' afino mais: dois navios com 
destino para a China , de que ero Commandatites Dio~ 
_ go Calvo, e Garcia Cainho. 

A 23 de Abril de 1519 sahio a Esquadra de Lise 
boa, menos Francisco da Cunha, que, por algum inci- 
dente, partio a 7 de Junho, e com tal fortuna » que ene 
trou em Cochim a 10 de Outubro. 

A Esquadra navegou derramada: Diogo de Lima 
4rribou a Portugal, e nado péde tornar a sahir. Jorge 
de Albuquerque: invernou em Mocambique com. oito 
Ndos; Lopo de Brito, Pedro da Silva, e Jodo Rodri- 

ues de Almada forao a India a salvamento. Manoet 
Se Sousa, separado da Esquadra, soffreo mdos tempos, 
e chegando 4 altura de Mocambique nos fins de Serem« 
bro, nao quiz entrar no Porto, a pezar deter muita fal- 
ta de agua; e na esperanca de poder passar 4 India, 
proseguio a sua derrota, em que achou levantes rijos, 
que Ihe nfo deixavdo adiantar caminho. A final gqais 
huscar o Cabo Guardafui, para fazer agua, que jd por 
alta. della levava muitos doentes , ¢ hia deitando mor- 
tos ao mar. N4o podendo ferrar o Cabo, foi avistar a 
Illia de Socotoré, que tambem nao romou, por ser o 
vento por sima della. Nesta extremidade arribou a bus- 
Gar a terra da Africa mais proxima, e navegou 30 lon- 


isso se BonstruiZo mais fortes da linha d’agua para sima, e monte 
v0 mais artilhesia As Ndos erio de mais toneladsas, com grande ; 
e menos fortes de costado, Na torna-viagem da India os GaleSes vinhSo 
carregados como as Naos, de que se seguirdo alguns naufragios , porque 
soffriiio mais dos golpes de mar, e dos balancos, em razio da nimiz ak 
tura dos Castellos de popa, ¢ proa, representando cada Galefio o perfil 
exacto de huma cortina flanqueada por duas ‘Torres. Houverfo depos 
alteracdes neste systema, e constriirio-se GaleGes mui grandes , aindé 
gue o numero de carhdes, que montavdo, era inferior ao que hoje st 
Pratica. 


331 


go della, caminho de Melinde, determinado a ancorat 
em qualquer Jugar , onde achasse agua. Assim chegou a 
Matoa, e dando fundo , desembarcou na lancha com o 
Piloto, e quarenta homens armados, para fazer aguada 
por forga, ou por vontade. 3 
Achou-se com effeito huma fonte afastada hum 
pouco do desembarque , em que se comegarao a encher 
os barris; e.os naturaes, longe de se opporem, acudirao 
em som de paz a vender gallinhas, e outros comestiveis, 
© gne infundio tao desleixada confianga nos Portugue- 
wes, que na vasante da maré ficou a lancha em secco a 
grande distancia da praia. Manoel de Sousa , conhecen- 
do tarde o erro que commettéra em nfo deixar o seu Pi- 
Joto na lancha com alguns marinheiros, cahio em outro 
snaior; porque devendo reunir logo toda a gente em 
dhum corpo, para resistir a -qualquer assalto dos Mou- 
0s, e ganhar algum tempo até a maré.tornar a encher, 
anetteo-se pela -vasa com todos os seus, para 4 forcga de 
dbracgos pér a lancha em nado. Os Mouros, que escon- 
didos espreitavao alguma boa occasido de mostrarem o 
odio que tinhdo aos Portuguezes, vendo-os atolados.na 
wasa, sem se poderem formar, nem mesmo usar das ar- 
anas, corrério sobre elles em grande numero, matdrao 
todos, e tomdrao a lancha. . 
A gente do Galedo , estupefacta de se ver sem 
Comnmandante, nem Piloto, deo a direcco da derrota 
ao ‘Contra-Mestre, que mui pouco entendia de Nave- 
gacao; e fazendo-se 4 véla, seguio a Costa, e foi sur- 
ir em Oja, Cidade dezoito legoas ao Norte de Melin- 
die. Os habirantes recebérao bem os Portuguezes, -que 
se detiverao aqui seis dias, fazendo viveres, e aguada; 
amas como Os desastres nunca ‘vem s6s, aconteceo que O 
Regulo do Paiz deteve o Mestre, e¢ seis homens que 
estavgo.com elle cm terra para os festejar; e os do.Ga- 
leZo, cuidando que erao mastos,. au .cativos,.e vendarse 
42 ii " 


$32 


geduzidos a seis homens sdos, e alguns enfermgs, de 
duzentas pessoas que compunhZo a guarnicao, cortdér#o 
as amarras, e seguirdo a sua derrota para Melinde, 

o Contra-Mestre varou por ignorancia, e foi dar 4 costa 
em huma coroa junto a Quiléa, onde os Mouros os mar 
tdrao a todos, excepto hum rapaz, que cativdrdo. 

Dos acontecimentos desta Esquadra resta-me cone 
tar o facto: extraordinario, e unico de hum navio de guer 
fa convertido em Pirata (1). 

Era Commandante de hum Galeao BD. Luiz de Gus- 
mo, casado:em Portugal, que separando-se do sev Che- 
fe, navegou sd, e ao Sul das Canarias encontrou huma 
Caravela Portugueza ; ¢ sabendo: pela pratica , que. com 
ella teve, que vinha da Costa da Mina, e trazia ouro, 
disse em particular: ao Piloto do seu Galeao, a fim de 
sondar: Para que queriao: mais India, do que tomalla, 
e passando: o Estreito de Gibraltar, irem para o Levaw 
te, onde se fariao mais ricos? Or Piloto, que era Por- 
tuguez, nao se deo por entendido, e sd the respondeo, 
que nao tomasse a Caravela.. Parecendo-lhe porém iste 
muito mal, o communicou. a quatro irmaos: do appelli- 
do de Galvao, que hi3o com elle embarcados, naturaes 
de. Evora, homens de muito espirito, e valor, os quaes 
lhe promettérao oppor-se a qualquer attentado, que D. 
Luiz ousasse commetter. Em consequencia affastarao-se 
desde logo da sua conversa¢zo , e nao comérao, nem jo 
garao mais com elle, como costumavao, D. Luiz, per 
cebendo que se penetravao as suas intemcdes sinistras, 
tratou de ganhar partidistas., e examinando o numere 
de Hespanhoes. que: tinha no Galedo , achou cincoenta, 


(1). Na-relacie -do caso de D. Luiz de Gusmio eegui a Castanbeds, 
com preferencia a Jodo de Parros-, parque a miudeza com que o refese 
Mostra que estava bem informado de tudo; e talvez que Barros tivesse 
algumas razdes de circunstancia para nado dizer quanto sabia na materis, 
camo de si confessa Damida de Goes... 


333 


¢ Fhes mandou distribuir do vinho, e agua’ que: bebia ; 
dizendo que o fazia por serem homens Fidaleos; € GO- 
‘mecou a tratar com altivez os Portuguezes. Quiz. tomar 
huma pipa d’agua, e outra de vinho a Francisco, Fer- 
nandes, Ourives, de quem féra hospede em Lisboa, e 
a quem devia singulares favores, e para lhos remunerar, 
segundo dizia,o Jevava cemsigo- para a India: e como. 
elle se queixou: de lhe tomar a agua, e vinho. que em- 
barcdra para algum caso de necessidade, @ metteo na’ 
arca da bomba, a que'se oppéz o Piloto, e os- Galvées , 
protestando que nao podiao consentir. similhante violen- 
cia; e D. Luiz, receando alguma sublevagao , .deixou: 
solto o Ourives, sem /he apprehender as pipas. Obser- 
vando entdo que o Piléto trazia’ sempre hum punhal 
(desde o: dia em que The fallou em tomar a Caravela da 
Mina), quiz saber a causa, e respondendo elle, que o 
seu punhal nao causava prejuizo a ninguem ,. ficdréo 
d’ahi por diante poueo amigos. 
| hegados 4 altura do Cabo de Boa Esperanca, ti- 
verdo hum temporal, em que se quebrou a cabeca do 
leme, e ainda gue se tentou em certo modo remediar o: 
-damno, o Galeao goyesnava tio mal, ave 0 Piloto de- 
clarou, que nao se atrevia a dobrar ©’ Cabo com aquel- 
le leme ;. ¢ fazendo sobre ‘isso D. Luiz concelho, con- 
cordou-se em arribar ao Brasil. para fazer hum leme 
NOvO. °: 
Em consequencia dirigio-se a derrota para o Brasil,. 
e depois de trinta dias de navepagae vio-se a terra. To- 
eou D. Luiz em alguns Portos, sem achar madeira de 
que se podesse fazer o leme,e por ultimo-entrou em: 
huma grande Bahia (talvez a de Todos os Santos), on- 
de desembarcando com o: Piloto, o Carpinteiro, e trin- 
ta homens achdrio muitas arvores capazes para a obra: 
que se pertendia. Aqui, parecendo a D. Luiz occasiao:. 
@pportuna de se yingar do Piloto, -Ihe disse algumas par 


(334 


Javras mas, lembrando-lhe as differencas passadas; ¢ 
Piloto, ainda que sé tinha da sua parte hum -primo seu, 
e o Carpinteiro, enrestou a langa contra elle. D. Luiz 
metteo mao 4 espada, e todos os da sua parcialidade, 
fazendo o mesmo os outros dois. ‘Travou-se entre .elles 
hum bravo jogo de cutiladas; eo Piloto, que era va- 
lente, fazia praca com a langa, em quanto o primo, ¢ 
o Carpinteiro lhe guardavao as costas. Vendo o Hespa- 
nhol que nao acabava o negocio téo azinha , como 
cuiddra , offereceo a sua amizade ao Piloto, chamaado- 
Jhe irmao, o que elle aceitou; e feitas as pazes , juri- 
40 todos guardar segredo, o que nao foi possivel, por 
estar ferido o Carpinteiro. 

Passado isto, mandou D. Luiz a terra o ‘Mestre, 
o Carpinteiro para se fazer o leme, e com elles dox 
Artilheiros, com duas pecas de artilheria pequenas, que 
montérao em huma trincheira, a fimyde se premunirem 
contra os assaltos dos Indios, que j4 sabiao serem an- 
_thropofagos. Comegada a obra, concorrérao muites del- 
Jes com mantimentos do Paiz, que trocavfo por ammoes, 
alfinetes, e outras bagatellas, entendendo-se por acenos. 
Esta concorrencia sendo cada vez maior, e sempre de 
hum modo pacifico, animou alguns Portuguezes a irem 
a huma Aldea, quasi huma legoa distante, na qual fo- 
‘rao bem recebidos. Oito dias depois levou o Piloto a 
terra o Jeme velho, para lhe tirar as ferragens, que ha- 
vido servir para 0 novo; e nao podendo os marinhei- 
ros arrastallo pela praia, que atolava muito, os ajuda- 
rao no trabalho duzentos Brasileiros. 

Recolhido o leme ao abrigo da trincheira, partio o 
Piloto com alguns homens para a Aldea, e levou comsigo 
huma mulher, em torno da qual se ajuntdrao os Indios, 
que a contemplavdo maravilhados, quando chegou hum, 
que parecia ser o Chefe da Aldea, e os fez assentar em 
silencio, tafyez para evitar as consequencias des senti- 


336 


loto ,:e dos outros -que com elles acabdrdo, todos Portu- 
guezes , vendo-se agora desabafado para o que determi- 
nava, e‘foi a terra com quarenta homens bem armados 
a'buscar os lemes, j4 que nao o fez a soccorrer os seus. 
‘Tres dias se gastarao em acabar o leme a bordo, e em 
o calar, e neste mcio tempo repartio o fato do Piloto 
los Hespanhoes , tomando para si huma vestia escar- 
ate, de que mandou fazer outra pela feicéo da que via 
no retrato de Amadiz pintado em hum livro, dizendo 
que no Mundo houverao dous Amadizes, hum que-esta- 
va jd morto, ¢ elle o segundo; e outras muitas fanfar- 
ronadas. Calado o lemc, e dizendo-lhe o marinheiro 
Joio Velho, aque o levaria a Mocambique, deo-lhe a 
pilotagem do Galeao, e se fez 4 véla. Aos cinco dias 
de viagem nomeou Meirinho a San-Torreno, Hespa- 
nhol , havendo morrido no Brasil o do Galeo; e no 
mesmo dia o novo Meirinho deo busca a todas as cai- 
xas, com o pretexto de descobrir alguma fazenda perten- 
cente aos fallecidos, porém sé para tomar todas as armas 
aos Portuguezes, como fez, deixando-as aos Hespanhoes. 
Ao amanhecer do dia seguinte appareceo D. Luiz 

na tolda armado com a espada na mio, cercado de cine 
cocnta Hespanhoes, ¢ de outros estrangeiros, todos ar- 
mados, e mandou ali vir o Qurives Francisco Fernaa- 
‘des , a quem se deitdrao grilhdes, e disse-lhe que se con- 
fessasse, que o hia matar, por assim © ter determinado 
fazer, ¢ mais ao Piloto, e aos Galvdes, pelas dispuras 
que com elles tivera. E desprezadas as humildes suppli- 
cas do Ourives, o confesson hum Clerigo, passeando 
elle entretanto pela tolda, e dizendo a miudo ao Pa- 
dre, que acabasse a confissio. Os Portuguezes vido do 
convez este especraculo, mas como nao tinhao armas, 
nio se lhe podiio oppor. Concluida a confissfo, correo 
D. Luiz para o Ourives, que estava de joeclhus com as 
miaos leyantadas pedindo o nfo matasse, ¢ deo-lhe huma 


337 


cutilada, com que lhe cortou huma das mos, e logo 
huma estocada, de que cahio morto; e foi deitado ao 
mar. | 
Feito isto., chamou toda a guarnic#o, e fez-lhe 
buma longa pratica, querendo justificar o assassinio do 
Ourives com o fundamento de que este projectava ma- 
tallo, ainda que disso nao tinha prova sufficiente, e cone 
Cluio dizendo: Que como ElRei de. Portugal nao per- 
doava ao homem, que matava a outro, elle nao ousava 
tornar 4 sua presenga, nem menos apparecer na India 
diante do seu Governador, e queria ir a outra India 
mais segura, que era o mar do Levante, onde andariao 
a toda a roupa, e ficari20 todos ricos no espaco de hum 
aono,..Jevando ao mesmo tempo boa vida; e quem nfo 
uizesse acompanhallo, o dissesse, porque Ihe dava a 
fe de Fidalgo de nao Ihe ter por isso md vontade, e o 
desembarcaria na primeira‘terra que tomasse. Desaseis 
Portuguezes recusdrao dar o juramento exigido dos que 
haviao servir com elle, a pezar das grandes diligencias 
ue. para isso fez, por Cuja causa fordo postos em gri- 
Ses, e dormiao no convez ao sereno; e mesmo nos 
eutros Portuguezes, que se alistario para ser Piratas, ti- 
pha elle t40 pouca confianga, que publicou hum edital, 
para que qualquer Portuguez, que fosse ao fogao em 
uanto lhe fizessem de comer, seria agoutado, e a mao 
ireita pregada no mastro grande: tanto era o receio 
que tinha de ser envenenado! | 
- Depois disse ao Mestre Fernao Affonso, que o levas- 
se ao Estreito de Gibraltar, porque d’ali bem sabia pa- 
ra onde havia de ir, ameacando-o de lhe cortar a cae 
bega , se nao 0 fizesse; e pedindo-lhe o Mestre hum at- 
testado d’isso, para sua resalva, lho. deo logo. Seguio- 
se orumo para a Europa,.e D. Luiz disse hum dia, 
que estava informado de que os prezos o intentavao ma- 
tar,.e por.isso deviio ser enforcados, e os fez confes- 
43 


338 


ear. E para achar alpuma prova, deo tratos de polé a 
hum delles, o qual obrigado da dor, disse era verdae 
de, e que os conjurados erao trinta; mas como os Por- 
¢uguezes presos nao cxcedid4o a dezaseis, e ninguem ti- 
nha communicacao com elles, créo que entrarizo no 
conloio alguns dos seus parciaes, e mandou chamar 
hum Joao Esteves, Portuguez, que cuidando ser para 
Ihe darem tratos, se deitou ao mar, e affogon-se; o 

ue o confirmou nas suas idéas, e quiz enforcar cinco 

Os presos, ¢ mais o Carpinteiro, porém rogando por 
este os Hespanhoes, em attengao a ter feito o leme, 
perdoou a todos. 

Chegado 4 aleura dos Acores, disse o Mestre a D. 
Luiz, que em certa Povoagao daquetlas Ilhas pederigo 
fazer aguada, e carnagem, de que tinh’o necessidade, 
em que elle conveio; e entretanto foi surgir na Ilha das 
Flores, e¢ antes de communicar com a terra, chegoe 
huma Caravela Portugueza, em que vinha hum Nego- 
ciante da Terceira, que era seu dono, a comprar tri- 
go. Logo que D. Luiz a vio, metteo-se no escaler com 
alguns homens armados, deixando o Gale&o entregue a 
hum Hespanhol chamado Bezerril , e abordande a Ca- 
sayela, disse ao Negociante, que D. Luiz de Gusmio, 
Commandante daquelle Galedo d’ ElRei de Portugal, 
Khe mandava aquella carta, a qual lhe deo, e nella rela- 
tava, que hindo para a India, arribara ao Brasil para 
fazer hum leme em lugar do seu, que se quebrara com 
hum temporal, e que os Brasileiros lhe matarao o Pi- 
loto, e otitra muita gente, e por isso voltava para Por- 
tugal mui destrogado , e Ihe pedia da parte d’ ElRei, 
que viesse com elle a bordo. O Negociante, acreditan- 
do tudo, foi logo a bordo do Galeao com o seu Pilo- 
to, e alguns marinheiros, a todos os quaes prendeo D. 
Luiz, e tomou a9 Negociante o dinheiro, que levava; 
e passando a equipagem da Caravela para o Galeao, 


339 


deo o commando daquella a Bezerril, e Ihe metteo ar- 
tilheria, e a gente necessaria, e por Mestre e Pilota 
hum Portuguez, que fugira de Portugal, por ser casado 
tres vezes, por cuja razao se conflava muito delle. 
Perguotando depois ao Mestre do Galeao pela Po- 
yoacao , que lhe dissera , este o leyou a Ponta Delgada 
na Ilha de S. Miguel , onde determinava fugir, ja que 
nao o podéra fazer nas Flores. D. Luiz mandou hum 
Hespanhol a terra para dizer aos habitantes, que quem 
Juizesse trocar carnes por azeite, e vinho., fosse a bor- 
do do GaleZo; e com effeito vierZo logo tres dos prin- 
cipaes moradores com hum grande presente de refres- 
coz, e elle os prendeo, declarando-lhes, que nao os sol- 
taria, sem que cada hum lhe désse dez, ou doze bois. 
Neste tempo appareceo outra Caravela , e querendo D. 
Luiz tomalla, mandou o seu escaler, mas estando den- 
tro delle sete marinheiros todos Portuguezes, fugirao 4 
voga arrancada para terra, dando aviso 4 Caravela no- 
vamente chegada, que tambem se pdz em salvo. 
Chegados os marinheiros 4 Povoagdo, requeréra4o 
se prendesse o Hespanhol , que 14 andava, como se fez, 
rque D. Luiz estava levantado com o GaleZo. Apda 
isto appareceo huma Naveta, que vinha de S. Thomé, 
e D. Puiz mandou a ella Bezerril na Caravela, com or- 
dem de a metter no fundo, se nfo amainasse; porém 
amainou logo, e o Mestre, o Piloto, e o Contra-Mestre _ 
fordo trazidos a D, Luiz, que os ameacgou com tratos, 
se nao declarassem o que trazido. Constou do seu de- 
poimento trazerem escravos, algalia, marfim, ¢ pao ver- 
melho, e pertencer a cdrga a Duarte Bello, Commer- 
ciante de Lisboa. Por ordem de D. Luiz se baldedrao 
no GaleZo os mantimentos , e mercadorias da Naveta, 
e se mettérdo a seu bordo todos os presos. | | 
Em quanto se andava nesta faina, pedio-Ihe o Mes- 
tre licenga para ir a terra yer huma irma, que ali ti- 
43 il 


341 


huma ‘illustre familia, dotado de grande valor, e con- 
stancia ,e bem instruido na Arte Nautica, segundo os 
confecimeéntos ‘do teu tempo, depois de militar na In- 
dia , passou a servir em Azamor, onde sobre a reparti- 
g40 do déspojo ganhado em huma entrada, se lhe suscte 
térdo taes accusacgdes, que foi obrigado a justificar-se 
judicialmente , sem conseguir por isso ficar na gra¢a 
d? ElfRei D. Manoel, que ihe negou o augmento de du- 
wzentos réis mensaes na sua Moradia. : 

- Descentente deste mdo successo, passou a Hespa- 
nha em1517, desnaturalizando-se de Portugal, e levou 
comsigo ao Bacharel Ruy Faleiro, habil Astronomo., 
© a outros Officiaes de mar. Em Sevilha achou estabele- 
cido o seu parente Diogo Barbosa, em cuja casa se re- 
colheo, e casou com sua filha D. Beatriz Barbosa; e 
igualmente encontrou outros Portuguezes aventuretros,-e 
descontentes todos, ou: quasi todos de profissdo mari- 


. bi : ; 
37, que publicou o summario do Contrato passado entre o Imperador 
Carlos V: Fernio de Magalbies, e o Astronomo Ruy Faleiro.’ 3.° O 
Resumo Historico do Doutor D. Casimiro de Ortega, impresso em Ma- 
drid em 1769; que examinou todas as Historias, que tratéo de Maga- 
ihfes , ainda que 4s vezes nfo escolheo o melhor; e nos deixou (co- 
piada de Herrera) a Jist2 nominal de todos os individuos , que yoltario 
Gaquella celebre expedicio 4 Europa; na qual se deve notar,. que se 
nZo echa o nome de Pigafetta, sendo o de hum Antonio Lombardo, que 
se diz ser elle. 4.° A Viagem 4 roda do Mundo, do Cavalheiro Anto- 
nio Pigafetta; e a Carta de Maximiliano ‘Transilvano, seu copista, ju- 
blicadas no Tomo 1. daColleccio de Ramusio. P'gafetta misturou com 
& narracio dos acontecismentos nauticos muitas fabulas absurdas, e¢ risi- 
weis de sua invencio. Nao obstante isso, tem servido de texto aos 
Escritores estrangeiros, qué fallirfo daquella Viagem  e he digno de 
attencao, por ser testemunha ocular dos successes , ainda que ignorante 
em Navregacio. 5.° A Noticia das Expedic6es ao Estreito de Magalhaes, 
incluida na Relacdo da Viagem da Fragata Hespanhola Senta Maria da 
Cabeca, impressa em Madrid em 1788. O Anonymo, cue por Ordem 
a’ ElRei Catholico a escreveo, he hum Critico judicioso, cue reveo, e 
analysou quanto achou em Obras impressas, e manuscritas naquella ma- 
teria; posto que alguma yez se enganou. em citacdes, como mostrarei. 


343 


imento a Magalh3es para a sua viagem, datado de 8 
Se Margo deste anno, nomeando-o Capitao General da 
uadra, com authoridade de nomear, e depor Com- 
mandantes, e Officiaes, como lhe parecesse mais van- 
tajoso ao Real Servica, e para execntar gusti¢a ci- 
vil , e criminalmente em todos os individuos embar- 
cados na Esquadra, de qualquer classe que fossem. 
Constava esta Esquadra de cinco navios: no pri- 
meiro , chamado a Trindade , embarcou Fernao de Ma- 
alhdes (1), com seu cunhado Duarte Barbosa, e seu. so- 
brinho Alvaro de Mesquita, levando por Piloto Este- 
vio Gomes, e por Contra-Mestre Francisco Alvo, am- 
bos Portuguezes, e o total da equipagem sessenta e dois 
homens. Commandava o‘segundo, chamado Santo An- 
tofiio , Joao de Carthagena; e os seus Pilotos o Astro 
nomo André de S. Martin, e Jodo Rodrigues Mafra , 
Portuguez; e de equipagem cincoenta e cinco homens. 
Gaspar de Quezada era Commandante do terceiro na- 
vio, appellidado a Conceigao; Piloto Jodo Lopes de 
Carvalho, Portuguez, e Mestre Jodo Sebastido de EI- 
cano; e-o total quarenta e quatro pessoas. Do quarto, 
chamado a Victoria, era Commandante Luiz de Men- 
donga, Piloto Vasco Gallego, e total quarenta e cinco 
homens. Do ultimo navio, per nome S. Tiago, era 
Commandante , e Piloto Mor da Esquadra Jodo Serra- 
no, Com 31 pessoas ; sendo o total dos individuos em- 
barcados duzentos e trinta e sete homens, em que en- 
travao outros muitos Portuguezes. Destes cinco navios 
erZo dois de cento e trinta toneladas, gois de noventa, 
e hum de sessenta, com viveres para cois annos. 
No 1.° de Agosto de 519 sahio a Esquadra de 
Sevilha, e a 21 de Setembro de S. Lucar de Barrame- 


(3) Ruy Faleiro nio embarcou, por ficar doente de accessos de 
cya. 


344 


da; com rumo a Canarias. Deo fundo ety Tenerife, e 
demorou-se quatro dias fazendo agua, c lenha: ali che 
gou de Hespanha huma Caravela, que lhe levava diffe- 
rentes effeitos; por ella recebco Magalhaes avisos par- 
ticulares, segundo se disse, de que os Commandantes dos 
navios hido com proposito de lhe nio obedecer. 

Partio de Tenerife a 3 de Outubro, dirigindo-se 4 
Costa de Guing, que avistou, onde soffreo muitas cal- 
marias , e trovoadas; e tomando a volta do S.O. dege 
cobrio tcrra do Brasil a 8 de Dezembro, julgando-se 
em 19° 59! de latitude S,. e a 13 entrou no Rio de Ja- 
neiro, a que deo nome de Bahia de Santa Luzia, e se 
deteve até 27. Neste intervallo determinou o Astrono- 
mo S. Martin a latitude do Porto em 23° 45’ (1); e fez 
outra observacdo para achar a longitude, que ainda que 
delicada para aquelle tempo, deo hum grande erro, que 
elle percebeo, mas nig soube a que o attribuir. | 

Os Indios recebérao bem os Hespanhoes, trocavio 
os seus mantimentos por bagatellas da Europa, e offere- 
cido hum escravo por hum machado; Magalhaes probi- 
bio este ultimo trafico, por nao augmentar bocas, que 
lhe gastassem os viveres. 

A Esquadra sahindo do Rio de Janeiro, navegou 
para o Sul, e a 10 de Janeiro de 1520 chegou ao Cabo 
de Santa Maria, ja descoberto por Soliz (2), além do 
gual virio hum monte fazendo em cima a figura de 
hum chapeo, a que derio o nome de Monte Vidi (ho- 
je Monte Video), que ficava na entrada do Rio da Pra- 
ta. Surgirao em cinco bragas, e Magalhaes destacou 0 


(1) A posicio do Rio de Janeiro, no Observatorio de S, Bento, 
deduzida de muitas Observacdes, he a seguinte : Latitude S, aa° $3 
g0/'s Longitude 334° 51’. 

(2) Joo Dias de Soliz, habil Piloto Portuguez, refuziado na Her 
panha, foi o descobridor do Rio da Prata, que por muitos annos co 
servou O seu nome. Ali foi morto, ¢ devorado pelos Indios em 1515- 


8456 


navio §, Tiago, para examinar -se o Rio dava algunia 
passagem para o mar do Sul, estando persuadido, que 
a Natureza abriria algum canal de communicag4o en- 
tre ambos os mares; ¢ bem resoluto, em caso de nao 
descobrir nenhum , a rodear todo aquelle vasto Conti- 
nente, de que se nao conheciao os limites, até dobrar o 
ultimo. Cabo. Regressou o S. Tiago passados quinze 
dias, tendo sé corrido vinte e cinco lepoas, com a no- 
ticia de que o Rio se dirigia para o Norte. Magalhdes 
foi entZo pessoalmente a bordo do navio Santo Anto- 
nio examinar a largura do Rio na sua boca, € tornan- 
do ao ancoradouro, se fez 4 véla a 3 de Fevereiro. No 
dia seguinte surgio para tomar huma agua que fazia o 
Santo Antonio. Seguindo a sua viagem ao longo da 
terra, de dia a huma legoa de distancia, e de noite a 
cinco , ow seis, tocou em hum baixo a Victoria, ainda 
que sem receber damno. Chegados q 40’ de latitude, 
comecdrdo a achar muitos frios, e mdos tempos; ¢ a 24 
de Fevereiro , f@zendo-se por 42° 30’, descobrirao huma 
grande Bahia, a que chamarao de S. Mathias (1). Re- 
gistow-a Magalhdes, para se certificar se dava passa- 
gem ao mar do Sul; e nao achando Canal, seguio a 
Costa, e por ultimo ancorou a 2 de Abril na Bahia 
de S. Juligo, que suppéds em 50° de latitude (2); achan- 
flo-se a estagio tao avancgada, que os marioheiros nao 
podizo marear as vélas com frio. oe 

Ja nesta época tinha havido violentas disputas 
entre elle e alguns dos Commandantes , por cuja causa - 
tirou © commando do Santo Antonio a-Joio de, Car- 


Ci) Esta Bahia tem de abertura vinte e cinco legoas, e quasi outras 
tantas de scsio: a sua ponta do Norte estd na latitude 41° 3‘, ea do 
Sul em 42° 4’. ve, 

(2) <A ponta do Sul desta Bahia esta na latitude 49°. 25’, ¢ Jonge 
tude 310° 50%, 

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348 


Trindade. Restava a Conceicao, cujo Mestre Jo%o Se 
bastiao de Elcano, honrado Biscainho, quando Maga- 
ihdes Ihe mandou perguntar por quem estava aquelle ne- 
vio? Respondeo, entregando preso Joao de Cartha 
Assim se restabeleceo o socego, e obediencia em toda 
a Esquadra.. Restava punir os principaes culpados, a%o 
sendo prudente castigar todos. 

Gaspar de Quesada foi esquartejado vivo, e Luiz 
de Mendonga ja morto. E porque na Esquadra nfo ha- 
via algdz, deo Magalhaes a vida a hum creado de 
Quesada, cumplice na traigao do amo, para exercer 
este officio. Perdoou-se a Joao de Carthagena a. morte 
natural, commutando-a em outra civil de perpetuo de- 
gredo. naquella terra; ¢ com elle ficou tambem hum 
Clerigo’, que tinha a mesma culpa (1), com aigum bis 
couto para seu sustento. | 

Durante a invernada neste Porto de S. Julido pas- 
sara0 as equipagens grandes incommodos, empregadas, 
a despeito dos frios, em reparar os navios dos 
‘de tao comprida navegacgao. Aqui tratdrao a primeira 
vez com Os naturaes, porque mandando Magalhdes entrar 
pela ‘terra dentro alguns homens a descobrir, e obser- 


(1) O Author da Noticia das Expediqdes a0 Estreito de Magalhies, 
ji citado, diz na nota 3.7 a pag. 189, que com JoSo de Carthagens 
ficou abandonado em terra hum Clerigo Portuguex chameade Pedre Sax 
ches de Reyna: e cita os testemunhos de Pigafetta, e de Joio de Bar- 
ros. Eis-aqui as palavras de Pigafetta no ‘T'omo t. de Ramausio, pag. 
391: 5, Ma Giouanni di Cartazenia Jo fecero smontare in terra, ¢ i» 
35 sieme con un prete Jo lasciarono in quella terra di Patagoni, ,, Joéo 
de Farros, no lugar citado por aquelle Authos, explica-se deste modo: 
>, & a Joio de Catthagena foi perdoada aquella morte natural, e hov- 
»» Ve Outra civel de perpetuo degredo naquella erma terta; e com elk 
3 ficon tambem hum Clerizo, que tinha a mesma culpa, com trina 
5). atrates de pio a cada hum para se manter.,, T'ansilvano, relatend 
© acto de justica, que fez Magalhies, nao falla da ultima circunstenc® 
particularisa fa pelo Author Hespanhol. O Doutor Ortega, na sua Oba 
)* Mencionada, pag. 13, diz que o Clerigo era Francez: mras pasec? 
cue © seu appellido he Hespanhal. 







































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eS. so8 19 Vor tntens rT} - : oa 








4 








381 


2. sondo ie paseats seis mandou outro navio a buscalfe ; 
e voltando este dahi a tres dias sem noticia alguma del- 
Je, disse Magath3es ao Astronomo §S, Martin, que pr¢ 
gmosticasse pela hora da partida,e @ sua interroga- 
¢4o; o qual respondeo., que achava ser 0 navio tornado 
ra Hespanha, e que o Commandante hia preso (1). 
sto que Magalhaes néo désse muito credito a isto, 
sodavia assim aconteceo ; porque o Piloto Estevio:-Go- 
ames, Portuguez, € 0 T hesoureiro Jeronymo Guerra, com 
@ favor da gente j4 enfadada de to trabalhosa viagem, 
malhtratarfo, ¢ Prendérdo o Commandante em ferros, e 
erigindo-se o Guerra em Commandante, navepdrao pa- 
za a Europa: passdrao de caminho onde havido dei- 
mado Jodo de Carthagena, e o Clerigo, e nos fins de 
Marco de 1521 chegdrao a Hespanha estes fracos deser- 
tores, inimigos da gloria do seu Soberano, e da sua 


Magalhies vendo-se sem aquelle navio, em qne 
hia seu sobrinho com outros Portuguezes, e que sé tinha 
agora a seu favor Duarte Barbosa, e alguns poucos de 
que se poderia ajudar, pois toda a gente Hespanhola es- 
tava delle escandalizada, além do aborrecimento que lhe 
ceausava aquella viagem, ficou tao confuso, que se n4o 
sabia determinar; e para justificar-se com estes de que 
ee receava, passou dois mandados de hum theor para 
os dois navios, sem querer que as pessoas principaes 
delles.viessem a seu bordo, como homem que nio fol+ 
gava de ver ajuotamentos no seu navio; e a copia do 


C1) Naguelle seculo confundiase a Astronomia com a Astrologia Ju- 
iciatia; mas no caso presente era facil conjecturar o que stccedeo, 
porque sendo Alvaro de Mesquita sobrinbo do General , e por isso inte- 
ressado na gloria deste, ¢ na sua propria, néo podia abangonallo, senio 
forcado pelos seus Officiaes, e guatnicgio, cujo descontentamento, e 
pouco zelo do servico do Imperador erio bem sabidos, e provades pelos 
antecedentes. 


.352 


ue foi 4 Victoria, de que era entZo Comandante 
uarte Barbosa , e a resposta de André de S, Martin, 
que alli se achava embarcado, so da maneira seguinte: 


w 
w 


we 
w 


Mandado. 


99 Eu Fernao de Magalhiaes, Cavalleiro da Ordem 
de S. Tiago, e Capitao General desta Armada, que 
Sua Magestade enviou ao descubrimento da Especia- 


tia, &c. Faco saber a Vés, Duarte Barbosa , Capi- 


tao da Ndo Victoria, e aos Pilotos, Mestres, e Con- 
tra-Mestres d’ella, como eu tenho sentido, que a to- 
dos vos parece coisa grave estar eu determinado de ir 
adiante, por vos parecer que 0 tempo he pouco para 
fazer esta viagem, em que himos. E por quanto eu 
sou homem, que nunca engeito o parecer, e conselho 
de ninguem, antes todas minhas coisas sao pratica- 
das, e communicadas geralmente com todos, sem que 
pessoa alguma de mim seja affrontada, e por causa 
do que aconteceo no Porto de S. Julido sobre a-mor- 
te de Luiz de Mendonca, e Gaspar de Quesada, e 
desterro de Jodo de Carthagena, e Pedro Sanches, 
Clerigo, vés outros com temor deixais de me dizer, 
e aconsclhar tudo aquillo , que vos parece que he ser- 
vigo de Sua Magestade, e bem, e seguranga da dita 
Armada, e nao mo tendes dito, e aconselhado: errais 
ao servico do Imperador Rei Nosso Senhor , e is con- 
tra o juramento, e pleito, e homenagem que me ten- 
des feito. Pelo qual vos mando da parte do dito S- 
nhor, e da minha rogo, e encommendo, que tudo 
aquillo que sentis, que convem 4 nossa jornada, as 
sim de ir adiantc , como de nos tornar, me deis vor 

sos pareceres por escrito cada hum per si: declarando 

as causas, € razOes porque devemos ir a diante, ou 105 

tornar, nao tendo respeito a coisa alguma, porqué 














[roth Groh arieg taney sty 
T yacht koala why Orne: On 
2h te Respostasendne® sje Syramy 
re ee eT, ah, HU tay hdr " 


™ 


do- 
Cpeph . Lakai 





356 


s% cem amarras, em especial a esta Nao Victoria; e 
»» alem disso a gente he fraca, e desfalecida , e os man- 
»9 timentos nao sao bastantes para ir pela sobredita via 
9» a Maluco, ede ali tornarem a-Hespanha. Taobem 
»» me parece que Vossa mercé nado deve caminhar por 
99 estas costas de noite, assim por a seguridade das Nios, 
99. como porque a gente tenha lugar de repousar algum 
9» pouto: ca tendo de luz clara desanove horas, que 
»» mande surgir por quatro, ou cinco horas que ficdo de 
»» noite. Porque parece coisa concorde 4 razdo surgir 
9» por quatro, ou cinco horas que ficdo de noite, por 
»» dar (como digo) repouso 4 gente, e nao tempestear 
99 com as Naos e aparelhos: e o mais principal por 
9 nos guardar de algum revez, que a contraria fortuna 
99» poderd trazer, de que Deos nos livre. Porque quando 
99 em as COisas vistas, e olhadas sdem acontecer, nao he 
2» muito temellos em o que ainda nao he bem visto, 
sy nem sabido , nem bem olhado, sendo que faca surgir 
9s antes de huma hora de Sol yque duas leguas de ca- 
9» minho adiante, e sobre noite. Eu tenho dito o que 
99 sinto, ¢ 0 que alcanco por cumprir com Deos, e com 
9» Vossa mercé, € com o que me parece servico de Sua 
o> Magestade, e bem da Armada: Vossa mercé faca 
92 © que bem Ihe parecer, e Deos lhe encaminhar: ao 
2» qual praza de lhe prosperar vida, e estado, como 
99 elle deseja. 1» OS Do, 
Magalhies recebendo este parecer, e os dos outros 
Officiaes, como sua intengao nao era tornar atraz por 
cousa alpuma, c sé fizera este cumprimento por sentir 
que a gente andava descontente, e assombrada do cas- 
tigo que dera aos rebeldes, fez huma longa réplica, 
em que deo largas raz6es para irem avante; e que ju- 
tava pelo Habito de S. Tiago, que assim lhe parecia , 
€ que todos o seguissem, porque esperava na pledade 
de Deos, que os trouxera aquelle lugar, ¢ lhes rinha 
48 il 


) 


357 


‘A 6 de Margo em 13° de latitude Norte achou 
muitas Ilhas bem povoadas, cujos habitantes cra0 tao 
inclinados ao roubo , que furtavao quanto podiao al- 
cangar, € por isso ficdrao com o nome de IIhas des 
Ladr6es. Aqui se refizerao de alguns viveres, de que ti- 
nh%o extrema necessidade. _ 

Continuando a navegacao, descobrirao hum Archi- 
pelago de Ilhas, que denominarao de S. Lazaro (sao 
as Filippinas); e em huma dellas chamada Mazagud 
fez Magalhies amizade com o Regulo, entendendo-se 

or meio de huma sua escrava natural da Sumatra. 
Ile recebeo viveres, e praticos , que o levarao 4 Ilha 
de Zebut, situada em 10° de latitude, tendo dez legoas 
de contorno, onde Magalhaes ancorou a 7 de Abril, e 
achou nella ouro, e tanto gazalhado no Regulo, que o 
uiz fazer Christo, o que elle acceitou, baptizando-se 
debaixo do nome de Fernando, com sua mulher, e ft- 
hos, e mais de oitocentas pessoas; perém foi mais por 
artificio, que por devocao. Por quanto asdava em guer- 
ra com o Regulo da Ilha de Matan, visinha da de Ze- 
but, contra o qual lhe pedio auxilio, e Magalhies, pe- 
Jo comprazer, sahia a atacar Matan com tres lanchas, 
em que levava sessenta homens, e desembarcando na 
Ilha, ainda que duas vezes rechagou os inimigos, que 
er4o mais de tres mil, na ultima acgao a 27 de Abril 


‘ado a distancia a que estavio de Malaca. Aiccrescia a esta difficuldade 
outra talvez maior; Serrio. tinha. ido as Malucas partindo de Malaca, 
navegando assim déntro do hemisferio Oriental , ¢ Magalhdes vioha 
buscallas pelo Occidente , atravessando immenso espaco de mar inteira- 
mente desconhecido, que a sua. propria opinido figurava muito menos 
extenso; ¢ em. ium seculo, em que faltavdo os meios para se determi- 
nar a longitude a bordo de hum navio com alguma seguranca, Em con- 
sequencia, passado certo. tempo, e vendo elle sem resultado o plano da 
viagem , que concebéra, créo ter jd despassado as Malucas , ¢ achar-se. 2 
Oeste dellas; e neste embaraco tratou de achar aleuma Hha, em que 
The dessem noticias do rumo, e distancia a que the ficavdo.. 


359 


Finalmente correndo de Ilha em Ilha forio ter 4s 
Malucas, conduzidos por Pilotos praticos, que cbriga- 
r30 a‘isso, e:a.8 de Novembro-entrdrao em Tidore, 
de cujo Rei forao bem recebidos , por estar descontente 
dos Portuguezes. Em hum mez, que se detiverdo ,.carre- 
gardo de cravo, e por intervengao de hum mao Partu- 
guez chamado Jo%o de Lourosa ( degolado depois por 
traidor em Ternate ), pass4rao 4 I]ha de Banda. Daqui 
sahirao para a Europa, mas o navio Trindade arribou 
duas vezes com agua aberta, e da segunda se entregou 
aos Portuguezes, tendo-lhe morrido trinta e sete homens 
de fome, e de doengas; e achando-se os outros em tal 
estado, que nem mover-se podiao, Antonio de Brito, 
Governador das Malucas, e D. Garcia Henriques tratd- 
rao os Hespanhoes com a maior humanidade, e o seu 
Commandante Espinosa passou 4 India com alguns dos 
seus, e veio a Portugal em 1526. 

Elcano levando na Victoria de guarnicéo quarenta 
e seis Hespanhoes, e treze Indios, comegou a sua via- 
gem para a Europa a 21 de Dezembro de 1521: tocou 
nas Ilhas de Malud, e Yimor, e nesta houve hum mo- 
tim a bordo, que custou algumas vidas. Partio daqui 
a 11 de Fevereiro; navegou por grande altura a dobrar 
o Cabo de Boa Esperanca, para evitar o encontro de 
navios Portuguezes, soffrendo mdos tempos, e muita 
falta de viveres. A 8 de Maio vio a Costa d’Africa: a 
30 de Junho estava a vinte e cinco legoas de Cabo Ver- 
de. Fez-se concelho para saber se nas Ilhas, ou na ter- 
ra firme deveriao remediar a penuria de mantimentos, 
em gue se achavao, havendo-lhes morrido desde a pas- 
sagem do Cabo vinte e huma pessoas: decidio-se ir ds 
Ilhas. A 9 de Julho ancoraraio na de S. Tiago, e no- 
tdrao com espanto, que estavio em quinta feira, cui- 
dando estarem na quarta; o que attribuirzo0’.a engane 
seu, nag o senda. + 


361 


dinheiro a Vasco Fernandes Cesar, que havendo reco-, 
lhido quanto péde aproveitar da Galeota, e inutilisado,-. 
© cascO, Continuou o seu cruzeiro. 
1520. — A Esquadra que este anno foi 4 India, 
constava de,dez Naos (1), de que era Chefe Jorge de 
Brito, e os outros Commandantes Pedro Lopes de Sam- 
paio, Pedro Lourengo de Mello, Gaspar ca Silva, Los - 
po de Azevedo, Pedro da Silva, Lopo de Brito, Pedro 
Annes Francez,; Ruy Vaz Pereira, e André Dias, no- 
meado Feitor para dirigir na India a-carga dos navios, 
_ Jorge de Brito levava .commissao secreta para ir 
fazer huma Fortaleza em alguma das Il!has Malucas, e 
a esse fm enviou ElRei ordens particulares ao Gover- 
nador da India, para lhe fornecer navios, e quinhentos 
soldados, com todos os Officiaes necessarios para a sua 
guarnicao.. ; 
Partio a Esquadra de Lisboa a 6 de Abril de 1520, . 
e ainda que navegou hum pouco espalhada, todos os 
navios chegarzo a Goa no mez de Setembro. , 
_ .1§21. — Este anno mandou ElRei huma Esquadra 
composta de dez navios grandes, commandada por Sir - 
mao da.Cunha, a levar dinheiro para pagamento das 
Pragas da Berberia (como costumava fazer todos os an- 
nos), commissdo que cumiprio; e gastando o resto..da 
estaggo favotavel em cruzar no Estreito, e Costas de - 
.Africa:, se recolheo a Lisboa. no comego do Inver- 
mo (2). | a so 
152% — A 5 de Abril de 1521 partio de Lisboa 
para Governador da India D. Duarte de Menezes, .a 
quem ElRei concedeo maior ordenado,, que até ali ha- 
via dado a Governador algum,. pois com, os emolumen- 


C1) Earros, Decada 3. Liv. 4. Cap. 7. —- Couto, Decada 10. Cap. 
_.16. — Faria, Asia Portugueza. Goes nio falla nesta Esquadra, ,g¢ en- 
tre Os outros Escritores ha diversidade nos nomes dos Comandante, 
© (2) , Goes, Parte 4. Cap. 78. —_ Fr. Manoel, Homem , Cap, 29. 

o . ~ . 46 


363 


no caminho encontrou Joao de Faria, que Ihe disse haver 
ancorado antes delle em Matatana, e que por cuidar 
seria perdido, se fora para a India. Reunidas as duas 
Ndos, chegdra0 a Goa, e estando a partir para S. Lou- 
renga, vierdo de Portugal ordens d’ElRei D, Joao III. 
ao Governador da India, para que se nao construisse 
Fortaleza alguma de novo, e somente se concluissem 
as comecadas. | 

1522. — Continuando Vasco Fernandes Cesar (1) a 

ardar o Estreito , teve aviso, que a Leste do Morro 
_de Gibraltar estavao quatro navios artilhados, que no 
dia antecedente tinhao tomado huma Caravela mercante 
Portugueza, a qual a Capitanea trazia a reboque. Vas- 
co Fernandes, que hia de caminho para Ceuta, voltou 
logo a busca-los, e vendo a Capitanea a barlavento, e 
mui afastada dos outros, passou-lhe 4 falla, e pergun- 
tou, que navio era? Ao que responderdo igando ban- 
deira Ingleza, e acenando-lhe gue amainasse. Vasco 
Fernandes prolongou-se entaéo pela sua alheta, e rom- 
pendo os Inglezes o fopo, sem descontinuarem de fazer 
Sipmaes, que amainasse, respondeo vigorosamente com 
a sua artilheria, © que deo occasi#o 4 Caravela met- 
cante de cortar o cabo do rebogue, e¢ fugir. 

Depois de duas horas de combate, achava-se Vasco 
Fernandes com seis, ou sete homens mortos, e mais de 
vinte feridos, quando o seu Condestavel, que era hum 
Alemao chamado Hansfreis, mui corpulento, e valen~ 
te, o qua] a pezar de quinze feridas causadas pelos esti- 
Ihagos da madeira, nao queria curar-se dizendo, que ou 
havia merrer, ou fazer amainir aquelle navio, e fodos 
OS Outros, se viesscm; pegou em hum Falc’o-pedreiro, 
cujo leme assentou no hombro,. e apontando-o ds osta- 
gas do navio Inglez, pedto a oatro Arrilheiro Alemao 


C1) Goes, Parte 4. Cap. 78. | _ 
46 ii 


3885 
tatdo @ntio abordar a Caravela, com o mesmo infeéliz 
successo'; porque Vasco Fernandes, manobranco habil- 
mente, apresentava-lhes sempre a proa, € com tiros de 
coxia destrocou outra Galeota , matando-the a maior par- 
te: dos remeires: @ que causou tal terror nos Mouros, 
e sé cuidario- em fugir, aproveitando o vento para 
a Costa de Barberia fronteira, seguidos algum espago 
por Vasco Fernandes, que por ultimo cntrou em Mala- 
-ga, para enterrar alguns mortos, e curar os feridos, 
que erao poucos. | sg 
' Velrando depois a Lisboa nos fins de Dezembro, . 
‘ElRet D: Joao IE: lhe mandou.aerescentar ao escudo das 
suas. Armas ,.as seis Galeotas-, e por timbre eutra. 
1§2r. — Para transportar a Italia a Fnfanta D. Bri- 
tes, desposada com. o Duque de Sabeia, mandou El- 
Rei preparar huma- Esquadra, de que nomeou General 
(1) a D: Martinlo de Castella Branco, Conde de Vil- 
la Nova de: Portimad, com pederes para tedos os casos 
Civels, e-crimes, até morte‘nattral. Constava de dez 
‘Nados, dous Galedes, quatro Galés Reacs, huma: Cara- 
‘vela, huma Fusra, e hum transporte com objectos da 
Uxaria.. Das quatro maiores N4os era Capitanea a San- 
-ta Catharina, de oitecemtas toneladas, feita: na-India, 
as outras tres erao, ‘Huma de 650 toneladas, outra: de 
350, e outra de 300; e as Seis restantes mais peqne- 
nas. -Os Commandantes- de que achei: es nomes, erdo 
D. Francisco de Castello Branco,, filho primogenito: do 
Conde-General;, Di Francisco: da Gama, primogenito 
do Conde Almirante D. Vasco-da-Gama; oe: Marechal 
 D. Alvaro: Coutinho, Affonso: Peres Pantoja, penro do- 
~ General; €hristovao de Brito; D. Fernande de:Abrane 
' ches, e D.. Luiz Coutinho, Affowso de Albuquergie, 


C1) Vede Goes, Parte 4., Cap. yo. + Resende, Hid da Thfanta. 
D. Prites para Saboia: — Acenhéiro, pag..341.: - an 


367 


vios que elle mandou ao Oriente, de que se perderdo 
vinte e seis; mas eu sd achei duzentos e cincoenta e 
oito, e naufragados dezenove 4 hida, e onze na tornae 
viagem. As arribadas forio tambem raras neste tempo, 
e communs nos subsequentes, em que tanto ellas, co-. 
mo os naufragios. cre-cerao fora de proporc4o com o 
gue antes acontecia. Em lugar competente apontarei as 
causas desta differenca. 


De TERCEIRA MEMORIA, 


*Y 
’ 


COMPREHENDERDO DESDE -O. .ANNO DE 1522 ate’ a*® NORTE 
DO CARDEAL REI PD. HENRIQUE 4° Em: 1580. 


"8s ww 





ADVERTENCIA. 


Ainda que eu tinha promettido abranger em tres 
Memorias a Primeira Parte desta pequena Obra, vendo 
comtudo que ficariao mui desiguaes em volume, fresole 
vi-me a dividi-la em quatro Memorias ; 0 que em nada 
altera o plano geral, que abracci na divisao das ma- 
terias, 





REINADO D’ELREr D. JoXo II. 


N O REINADO deste Sabio Monarcha, nao sd conti- 
nuou a florecer, e¢ prosperar o Commmercio Maritimo 
na Africa, ena Asia, mas ampliou-se muito mais, e 
comegou o do Brasil. As carregagdes das Ndos-da Ja- 
dia, na sua torna-viagem, erao calculadas no valor de 
hum milhio cada huma, e outras vinhao mais impor- 
tantes, como aflirma hum Escritor Hollandez, que vi- 





377 


excepto Antonio de Abreu, e Vicente Gil, que achan- 
do-se a‘sotavento da Costa do Brasil, pela ma navega- 
fo que fizer’o, arribdrao para Lisboa. — | 

‘Filipe de Castro, correndo pela Costa da Africa 
Oriental com intento de ir a Ormuz, por n&o poder to- 
mar Goa, foi encalhar de noite no Cabo de Rosalgate, 
tanto por erro do seu Piloto, como pela falta da boa 
vigia, que devéra ter. A Nao ficou inteira, e mandan- 
do elle afrerar hum navio ao Porto de Calaiate, em- 
barcou-se com a sua guarnigao, e parte da carga, que 
salvou, e foi-se para a India. As outras Ndos chega- 
rao a salvamento. | 

1525. — Neste anno succedeo o caso lastimoso de 

D. Luiz de Menezes (1). Sahio este Fidalgo de Goa 
na Nao Santa Catharina, e seu irmao D. Duarte de 
Menezes na Nao S. Jorge, com destino para Portugal. 
Entraréo ambos em Mocambique, e depois de repara- 
rem osseus navios de algumas cousas, que necessitavao, 
sahirao, e navegarao separados. D. Luiz nunca mais 
apparecco. 7 , 

Passados annos, morreo em Franca hum Piloto 
Portuguez, que !4 residia, deixando ordenado em seu 
testamento, que se entregassem a E-|Rei de Portugal seis 
mil cruzados, que elle lhe devia das fazendas que lhe 
tocarao da Nao de D. Luiz de Menezes, a qual fora 
tomada vindo da India. oo 

No anno de 1536, andando Diogo da Silveira 
com huma Esquadra de guarda costa, aprisionou hum 
Corsario Francez, e huns homens da sua equipagem 
Ihe descobrirao em segredo, que o seu Capitdo era ir- 
mio do Pirata, que tinha tomado a Ndo de D. Luiz de 
Menezes na Custa de Portugal, e assassinado toda a 
gente. Diogo da Silveira fez tratear o Capitéo do Cor- 


(1) Chronica de D, Jodo II. Parte 1, Cap. 67. 
48 


382 

‘estavio ali Christaos perdidos, Antonio de Saldanha, 
entendendo o signal, poz-se 4 capa, e logo que ama- 
fAheceo, foi no bordo da terra, mas nfo ousoa chegar- 
Se, por nfo ser conhecida; e por oito dias repetio a 
‘mesma manobra, indo de noite no mar, e de dia m 
terra, esperando que viesse alguma embarcacdo de avi- 
80. Parece que por fatalidade nao lhe occorreo, que os 
naufragados podido nao ter em que sahir ao mar, pos 
nao © fizerao no primeiro dia da sua chegada; e que 
assim cumpria-lhe a elle mandar a sua lancha ben 
guarnecida a saber que gente era aquella, e a sondar 
juntamente a Bahia. Por ultimo succedeo o que se de 
via ahtever , sobreveio hum mdéo tempo, que 0 obrigou 
a seguir viagem. 

Os miseros naufragados, vendo-se t#o cruelmente 
abandonados, e julgando que nfo tornariao a ver aquel- 
le anno outra Ndo, por nao-ser frequentada aquetta Co 
ta, nem tendo meios de sustentar-se até ao anto sepuiil- 
te, resolvérao, por sua desgraca, atravessar a Ilha me 
sua largura, e irem estabelecer-se na contra-costa , por 
Onde passavao as Ndos, qué por féra da Ilha tomavéd 
© seu caminho para a India. E formando dois corpos 
dos trezentos Portuguezes, que ainda existido, comme- 
tério o erro de marcharem divididos, e mui poucos 
delles apparecérao depois, como em seu lugar notarei. 
Suppoz-se que os Negros do sert#o, conhecidos per 
‘barbaros, os matario, talvez por falta de disciplina, ¢ 
boa ordem, que foi sempre a causa dos desastres acon- 
tecidos 4s guarnicdes dos navios naufragados, de que 
citarei excmplos , assim como do que fizerao alguns 
Commandantes em casos similhantes. 

Mez e meio depois de partidos dali os naufraps 
dos, chegou o Governador Nuno da Cunha com parte 
da sua Esquadra, e sé achou hum grumete, que ficou 
por estar doente no momento em que os seus comp2 




















33ST 


Jonge desse pensamento, aproveiton-se da demora para 
despejar a Cidade, ficando nella sé com a gente de 
erra, recolhendo-se o resto dos moradores com o que 

puderao Jevar, para hum sitio distante huma legoa. 

Desenganado o Governador de que lhe cumpria 
usar das armas para obter quarteis de Inverno seguros, 
tornou a mandar de noite seu irmao a reconhecer os lu- 
gares opportunos para 0 desembarque, 0 que elle fez; e 
ainda que sentido pelos Mouros, que lhe ferirao alguns 
homens de frechadas , correo toda a frontaria da Cida- 
de ,e nella achou huma praia, que lhe pareceo azada 
para o intento, posto que seria necessario desembarcar 
com agua pela cintura. Porém o Governador teve logo 
outra melhor informacgao por hum Mouro, que veio a na- 
do de terra, e indicou hum local abaixo da Cidade, em 
que as lanchas poderiao por a barba em terra: além 
disso notictou-lhe que estavao nella mais de tres mif 
homens com huma unica bateria de seis pecas diante de 
huma das portas, commandada por hum Renegado Por- 
tuguez; e que era tal o terror nos Mouros, que em 
vendo os Portuguezes desembarcados, fugiriao todos. 

Sobre estas noticias resolveo o Governador desem- 
barcar’no dia seguinte onde o Mouro dizia, servindo 
elle de guia; e formando em dois corpos toda a tropa, 
© primeiro de seiscentos Portuguezes, em que entravdo 
duzentos espingardeiros commandados por Fernio Cou- 
tinho, a que se agpregarao trezentos Mouros de Me-- 
Jinde; e o segundo do resto da gente, deo o comman- 
do daquelle a Pedro Vaz da Cunha, acompanhado de 
Manoel de Albuquerque, e dos dois irmaos Mellos, e 
tomou para si a direc¢io do outro, em gue hiao D. Fer- 
nando de Lima, e Diogo Botelho Pereira. 

Ao amanhecer desembarcarao as tropas sem peri- 
go , nem resistencia no ponto que o Mouro marcou, e 
ao som de pifanos, e tambores, e as bandeiras desenros 








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405 


mnandantes erdo Vasco de Paiva, na Santa Barbara; Dio- 
go Brandao, na Santa Clara; e D. Francisco, ou D. 
Diogo de Noronha (que de ambos os modos he nomea- 
do) no S. Joao. : 7 . 

A segunda Esquadra partio em Abril: era seu Che- 
fe D. Gongalo Coutinho, na Ndo Sirne; e os outros 
Commandantes Simao da Veiga, no S. Roque; e Nu- 
no Furtado de Mendonga, no Bom Jesus. Estes tres 
navios chegdrao em Setembro a Goa, 

A Esquadra de D. Joao Pereira teve prospera via- 

vem até 20 Cabo de Boa Esperanca, onde com hum 
F racdo socobrou a Ndo de D. Francisco de Noronha, 
sem escapar ninguem, talvez por ignorancia, ou descui- 
do do Official que naquelle.momento critico: se achava 
mandando; as outras Nags espalhardo-se. 

D. Jodo Pereira, vencido o parcel de Sofala, e 
achando-se com as Ithas, quiz esperar pelos outros na- 
vios: o Piloto, e o Mestre disserao-lhe, que arriasse 
todo.o panno, e Antonio, Galvao, que hia de passagei- 
ro, e entendia melhor a-navegacgdo, oppoz-se a este 
conselho, querendo que se aguentassem velejando, por- 

ue as aguas puxavdo muito para a Costa; e assim se 
fez.nessa noite. Mas ‘rendido o quarto ds quatro ho» 
ras, que o Chefe, e Antonio Galvio se recolhiério , lo- 
go. Pilotro, e o Mestre pozerzo a Ndo em arvore se, 
€a, e fordo-se deitar a dormir nos seus camarotes, A’s 
‘seis horas deo a Ndo duas fortes pancadas com a qui- 
dha ,e deitou o leme fora, em consequencia das corren- 
tes a terem levado para terra. A este ruido acudirio 
todos acima, julgando-se perdidos; o Mestre, e o Pi- 
loto ficario como pasmados; huns querido matallos , 
outros tomavao caixas, capoeiras, e pdos para se bota- 
rem ao mar; e o Chefe, com a espada na mio, reser- 
vava a lancha para si. Nesta’ revolta, e confusao geral, 
“Antonio Galvao com grande accordo mandou largar o 


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“421 


requerimento em que pedia o Governo de Chaul, teve 
Diogo Botelho a imprudencia de soltar algumas pala- 
vras equivocas na presenga de D. Antonio de Noronha , 
Escrivio da Puridade, dando a entender queria mudar 
de Reino; o que sabido por ElRei, lembrando-se do 
caso de Magalhaes, a que Diogo Botelho nao cedia em 
valor, e sobrepujava em conhecimentos, o mandou pren- 
der no Castello de Lisboa, e o conservou a bom reea- 
do até 4 epoca em que foi nomeado Vice-Rei da In- 
dia o Conde Almirante D. Vasco da Gama, que im- 
portunado de algurs Fidalgos, pedio licenga para o Ic- 
var comsigo, e ElRei lha deo debaixo da condicgdo de 
nao tornar mais a Portugal sem expressa ordem sua. 
Chegado Diogo Botelho a Goa, continuo a ser- 
vir, ¢ passava os Invernos em Cochim, por ter ali ami- 
, que lhe faziao pagar com exactiddo o6 seus sol- 
dos. Andava elle espreitando alguma occasido opportu- 
na de vir a Postugal, porém de hum modo tao extraor- 
dinario, que clacamente demonstrasse a ElRei a sua fi- 
delidade, e desmentisse a quem lhe dissera queria dei- 
xar o Real Servico. Com. este intento obteve faculda- 
de do Governador Nuno da Cunha para armar huma 
Fusta, em que servisse o Estado, e a construio em Co- 
chim (1), munindo-a de tudo quanto julgou necessario 
p2ra huma comprida viagem. Era isto no raomento em 
que o Governador negociava com Sultao Badur a cen- 
struccae. de huma Fortaleza em Dio; e devendo tao im- 
portante novidade ses logo communicada a ElRei. por 
expresso , intentava Diogo Botelho ser o mensageirq 
detla. Com estas idéas foi a Bacaim, onde deixou a sua 
Fusta, e passou a Dio em outro navio. 
Comegada a Fortaleza,. sahio. Diogo Botelho occul- 


C1) Castanheda diz, que esta embarcacio tinha 22 palmos dé quik 
Iba, 1:2 de beca, e 6 de pontal; dimensées que me parecem extsaor>. 
dinar igs ¢: - . 














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441 


15949. — Constava de‘cinco Ndos (1) a Esquadra, que 
a 20 de Marco deste anno partio para a India, com- 
mandada por D. Alvaro de Noronha, embarcado no S40 
Boa Ventura; e os outros Commandantes Diogo Bote- 
Jho Pereira, no S. Bento (estas duas Ndos erfo da Co- 
roa, e levavdo oitocentos e cincoenta soldados, as ou- 
tras pertencido a Armadores); Jacomo Tristao, no Sao 
Filippe ; Jodo Figueira de Barros, na Burgaleza (ou Sal- 
vado): e Diogo de Mendonga, no Zambuco. 

Desta Esquadra perdeo-se Jo#o Figueira nas Ilhas 
do Comore: Diogo Botelho Pereira tomou Cochim no 
mez de Outubro; e as outras Ndos chegdrao a Goa em 
Setembro. | : 

1549. — Conhecendo ElRei por experiencia (2), que 
© systema estabelecido para colonisar o Brasil carecia 
de reforma, pelas mudangas accontecidas no estado po- 
litico do Patz, achando-se fundadas varias Colonias, 
mais Ou menos prosperas, em S. Vicente (Santos), Es- 
pirito Santo, Porto Seguro, Ilheos , e Pernambuco , 
além de outras, determinou crear naquelle Continente 
hum Governo central , de que dependessem todos os 
Donatarios, que por si, ou seus Procuradores regiao as 
suas particulares Capitanias. | 

bara obter este importantissimo fim, revogou ElRei 
as authoridades Criminal , e Civil de que gozavao, e ds 
vezes abusavao os Donatarios, e as reunio todas na 
pessoa do Governador Geral, com amplos Regimentos, 
e InstruccSes para a direccdo, e manejo dos negocios 
publicos. Cumpria tambem escolher-se o ponto mais 
vantajoso para formar a nova Capital, e.julgou-se com 


(1) Couto, Decada 6. Liv. 8, Cap. 1, == Faria, na Asia Portu- 
gueza. ——- Barreto de Rezende. —- Chronica de D, Joao III. Parte 4, 
Cap. 44. | 

€2) Chronica de D. Joao III. Parte 4. Cap. 42. — Noticias do 
Brasil pag. 40. — Rocha Pita, Historia da America Liv. 2. 

56 








454 


Teme. Deste modo corrérdo com 0 tempo; mas tornan- 
do o vento a crescer, lhe destruio a guindola, e levow 
o velacho,; e atravessando-se o GaleZo, deitou o leme 
féra , ficando-lhe os machos mettidos nas femeas; des- 
arvorou do gorupés, e comegou a fazer agua. ot 
Neste estado critico , julgando-se os Navegantes a 
vinte legoas de terra, trabalhdrio com actividade em 
armar outra guindola, aproveitando hum intervallo de 
bonanga, e em fazer outro leme, em que gastdrdo dez 
dias, porém o Galedo nao péde governar com elle, por 
sahir curto, e sem porta sufficiente; e ficou por tanto o 
navio anhoto, e 4 mercé das ondas. | | 
Finalmente a 8 de Junho houver%o vista da Cose 
ta: Manoel de Sousa de Sepulveda chamou a_conselho 
os Officiaes, e resolveo-se por voto unanime : encalhar 
no lugar mais azado para salvar as vidas. Mandovu-se 
em consequencia hum escaler a examinar a terra, e ¢r 
tretanto o Galedo hia rolando para ella com quinze pal- 
mos de agua no purdo. Estando a menos de meia le 
goa da Costa, voltou o escaler, e disse, que defronte 
da paragem onde estavao, havia huma boa praia,-e tu 
do o mais era penedia. Assim fordo govérnando coma 
uindola até acharem sete bracas, em que derZo fur 
O, e arriando a amarra, largarao outra ancora a tiro 
de mosquete da praia, tendo o vento abonancado. Dei- 
tou-se a lancha fra , € assentou-se em conselho, que 
fortificassem ali, e das madeiras, e mais coisas do Gs- 
lefo construissem hum Caravelao, em que podessem it 
para Mogambique, ou Sofala, ou mandarem pedir au- 
xilio a qualquer d’aquellas Pragas. 

_ Feito este accordo, e reunidos na tolda, e tombs- 
dilho os mantimentos, armas, polvora, e roupas que #€ 
poderdo tirar das cobertas , embarcou-se primeiro 53 
Jancha Manoel de Sousa com sua mulher, e filhos, e 
trinta pessoas das principaes, ficando a bordo o Mestre 





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pl ae My fit eal 
em a Sree 
4 ee Ai © oh 








467 


pais de aturar 0 combate até pela noite dentro, se achd- 
rao rendidas quatro Galés Turcas, com immensa perda. 
sua, e o resto d’ellas buscou salvacdo na fugida. Huma 
daquellas quatro Galés estava tao furada de balas, que 
no acto de render-se foi subitamente ao fundo com 
quantos tinha a bordo. oo | 
As tres Galés tomadas forao conduzidas a Tavira, 
e Xaramet remettido para Lisboa. Morrérao dos Portu- 
guezes quarenta soldados, em que entrdrao os dois ire 
maos naturaes da Beira, e alguns marinheiros, e remei- 
ros ; € ficdraio feridos cento e scssenta homens. Dos Tur- 
cos pertencentes ds Galés rendidas, morrérdo cento e cin- 
coenta, forao cativos mais de noventa, e libertarao-se 
duzentos e vinte Christios , que elles trazido a remo. 

.. Karamet-Arraes esteve no Limoeiro, onde D. Pe- 
dre da Cunha lhe mandava presentes, e dinheiro para 
seu-sustento,, e no anno de 1561 foi trocado por Pedro 
Paulo, que, sendo Turco, veio a Portugal fazer-se Chri-. 
stio, e commandou huma Galeota Portugueza; e sendo 
tomado no mar, ¢ levado a Argel, conseguio ser trocas 
do por Xaramet. 

1555. — A Esquadra este anno destinada (1) para o. 
Oriente, constava de cinco Ndos, commandada por D. 
Leonardo de Sousa , embarcado em a Nao Senhora -da. 
Barca; e os outros Commandantes Francisco Figueira: 
de Azevedo, em S. Filippe; Vasco Lourengo de Bar- 
buda, em S. Pedro; Jacomo de Mello, na Algarvia Ve- 
[ha (que na torna-viagem se perdeo surta na Tercei- 
ra); e Francisco Nobre, na Algarvia Nova. 

Partio a Esquadra a 10 de Abril: as primeiras. 
uatro Ndos chegdrao a Goa a 1o de Setembro; porém 
rancisco Nobre ensacou-se na Costa de Guiné, e an- 


(2) | Couto, Decada 7. Liv. 2. Cap. 7. e Liv. 3. Cap. 2. — Barreto 
fe Rezende. — Chronica de D. Joio III. Parte 4. Cap, 118. — Histo- 
‘da ‘Tragico-Maritima ‘Tomo 1. pag. 171. _ 
59 i 

















471 

Estando para sahir, abrio a Capitanea huma agua 
t¥o grossa, que esteve em perigo de ir a pique, e foi 
necessario descarregalla: a final.achou-se o furo de hum 
prego, ou cavilha, que na carena tinha ficado tapado 
com breu, e por clle fazia a agua; mas antes desta des- 
coberta mandou ElRei partir as outras quatro Ndos a 
5 de Abril, e a Capitanea sahio a 2 de Maio. 

As Naos Assumpcao0, e Santo Antonio chegdrao a 
Goa nos fins de Setembro. A’Flamenga invernou em 
Melinde , e a 11 de Agosto do anno seguinte partio pa- 
ra Goa, porém fez logo. tanta agua, que foi buscar 
Mombaga, em cuja barra encalhou, e se desfez toda, 
galvando-se.a gente, e a carga. A Aguia invernou em 
Moscambique,.e em Maio passou a India. 
:.:° WD. Luiz Fernandes de Vasconcellos, seguindo sua 
derrota, metteo-se na Costa de Guiné, onde. andou se- 
tenta dias em calmaria, e a final assentdrao os Officiaes 
em irem invernar ao Brasil, como fizerao , ancorando na 
Bahia 2.14-de Agosto. D. Duarte da Costa, Goyerna- 
dor. Geral daquelle Estado, foi receber ao desembarque 
a D. Luiz Fernandes, e a outros Fidalgos que com elle 
hido, as quaes erao Luiz de Mello da Silva, D. Pedro 
de Almeida, D. Filippe de Menezes, D. Pedro de Li- 
ma, Nuno de Mendonga, e seu irmZo Henrique de Men- 
don¢ga, Jeronymo Correa Barreto, e Henrique Moniz 
Barreto, e€ a todos deo casas, e¢ tratou com grande 
magnificencia. . 

. Em tempo proprio sahio D. Luiz Fernandes da 
Bahia, ¢ a 2 de Maio do anno seguinte chegou a Mo- 
ambique , e d’ali passou 4 India em cempanhia do 
Vice Rei D. Constantino de Braganga. 








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514 


para esta expedicdd seistentos soldadee faledudos, '¢ are 
mados 4 sua custa. on’ de re 
norava-se © mativo de tio gratides preparatives 
quande na noite de 13 de Setembro hum rempord de 
Vento Sul destrogou os naviog, e déd con’ quasi. todos 
ém terra. ae ae : 
- 15973. — A Esquadra deste anna (1) for de quatro 
Ndos , commandada por Francisco de Sousa, embareado 
-ém a Néo Santo Espirito; e os ofitros Commiandames 
Antonio Rebello, em -S.: Gregorio; Quintino de Vas- 
boncellos, na Belem; e Luiz de Alter, ‘em Santa Cla 
ta. | : 
__ Partio.a Esquadra de Lisboa a 10 de Abril, es 
D. Francisco de Sousa chegou a Cochim nos ‘fins de Ove 
tubro; as outras Ndos inverndrao em Mocambique. - 
15974, — Commandou este anno (2). a Esquadta:da 
India K mbrosio de Aguiar, emmbarcado em a Nido Cha- 
Bas, € os outros Commandantes D. Diogo Rolim, ts 
é; Pedro Alvares Corréa, na Santa Catharina; Diogo 
Vaz Rodovalho, na Annunciada; e Manoel Pinto, os 
Santa Barbara. | 
"  Sahio de Lisboa a Esquadra a 23 de Margo, e er 
trou em Goa nos fins de Setembro. 

1574. — Ardia ElRei em desejos de passar 4 Afri: 
ca (3), Onde o seu impetuoso valor, que degenerava em 
temeridade, lhe figurava gloriosas, e importantes Com 
quistas ; mas qucrendo esconder as suas intengdes, por 
evitar a opposicdo , que antevia, da Rainha sua Avéd, do 


" (x) Couto, Decada 9. Cap. 14., e Decada 10, Cap, 16, — Redo 
‘Batrero de Rezende. — Faria, Europa Portugueza. 
‘ (a) Couto, Decada 10. Cap. 16. — Discurso sobre los Commexis 
de las Indias, — Faria, Europa Portusueza. 

(3) Memorias d’ElRei D, Sebastifo, tomo 3. Liv. 2. Capitules 36, 
27, ¢ 29. — Chronica manuscrita d’ElRei D, Sebssti£o, por Antic 
Vajyena, Cap. 9. . 


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muitos Grandes ,:e Fidalgos, que coni sumind brevids 
de se apromprd4rao para irem servir na Africa a. ElRei, 
© qual descontente de ndo achar em Ceuta occasito al- 
‘guma de medir as armas com os Mouros, passow:a Tan- 
‘ger com todas as suas tropas,. e .pouco Ssatisfeito da i- 
acc#o.em que estivera o Prior do Crato, lhe tirou 0 
‘Governo ,.e © conferio a D. Duarte de Menezes. 

Sahfrdo finalmente os Mouros ao campo com grax 
de‘numero de gente, e ElRei marchou'em pessoa 4 re- 
cebellos; porém o combate reduzio-se a huma escara- 
-muga,/que acabou com o dia, sem perda consideravel 
‘de parte-a:'parte. co, 

: Conherendo agora, ‘ainda que tarde, que ndo tisha 
‘forcas: para ‘fazer Conquistas' naquelle Paiz, sabio de 
“Tanger nos principios de Outubro -para ‘Portugal , em 
barcado no GaleZo S.. Marrmho; e-em outros navies,.e 
Galés. se accommoddrao as Personagens, e 8 dis- 
tinctas. _Hum rijo Levante, que lhe. deo: 4 -sabida do 
Estreito, espathou toda 4 Esquadra: oGaleio S. “Mam- 
nho correo em. pépa.até-o vento: abonancar, © depos 
veio buscar o Cabo de. Vicente. Desembarcou EIRd 
em Sagres, e buscando fogo outro perigo ; partio em he 
ma Galé com vento Sudoeste, que a péz no risco mais 
eminente; e/a final entrou em Lisboa. a 2 de Novenr 
bro (1) St alr 

1574. — Ainda que os Portuguezes introduzirZo 0 
Christianismo no Reino de Congo (2): desde o tempo 
@ EtRei D. Joao II. , ¢ continud4rao sempre a traficar em 
todos os Rios, e Portos d’aquella Costa , nZo tinhio 
nella Colonia ‘alguma; até que o Rei de Angola, inve- 
joso das vantagens que o de Congo recolhia da comme 


(1) ©O Padre Amador Rebello, na Vida ( manuscrita) deste Princk 
pe, conta 0 caso com alguma differenca . 
" (2) Vede o tomo 3. da Collecc3o de Noticias pera a Historia Gs 
WNacées Ultramarjnas, — Anno Historico, tomo 2. pag. 224. 











52) 


de Lisboa D. Jorge de Almeida benzeo o Estandarte. 
Keal, € dail ait a embarcar-se_ na Galé Real , am 
Gon nO 0 ve met Infante D. Henrique se escusou. 
a Ragencia nomeou ElRei para Goyerna-. 
» 0 Arcebispo D.Jorge de Almeida, Fran- 
). Joao Mascarenhas,’e Pedro de Alcagova 
selho de Estado; e para 
0. Miguel de Moura. 2 5s evn 
lia 35 sahio . raada, de Lisboa, ea 29 ane 
Jix, e se Ihe reunirdo varias ‘embarcaco 
€ outras que conduzido as m WORE do Aen 
= de Medina _ Sidonia obsequiou a 
| 2s festas, e publicos divertimentos. A 7. de 
J julho. sahi ‘a Armada a Cadix, e avistando Tanger 
ess “mesma tarde, se adiantou EIRei com as Galés, e 
s Galedes , ena manha seguinte deo fundo saga 
2em Tanger o Xarife ouiaa do 





















_. 2% 


. = . 
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tulle r Muley > Maluco , com hum filho, ¢ poucos Vas- 
» 4 = , que £10 seguito, Desembarcou IR, e detendo-se 
Be para Arzilla, levando comsigo ao Xa- 
eet overteder D. Duarte, de Menezes. . 
R ker lida em Arzilla toda a Armada, mandou ElRei 
arcar as tropas, que se abarracdrao fdra da Pra- 
i declarou a D, Duarte de Menezes por Mes- 


. 
as 


-o Exercito de pouco mais de yinte mil 
~e me -e quinhentos Cavallos. A Infanteria Por- 
, em numero de quasi doze mil homens, dividia- 
se em > Tergos , de que erio Coroneis D. Mi 
de = Noronha, Francisco de Tavora, Vasco da Silveira, 
4 oe ic Be de Siqueira. Além estes 2 eae havia 
outre mado dos Aventureiros, composto de mil ho- 
solhidos, e enon “ion uerras do Oriente, com- 
do. por Christovd yao de Ta ia 4 Cayallaria, | to- 





§32 


da armada 4 ligeira, ndo tinha General particulat, pot 
haver ElRei tomado o seu commando. A Infanteria es 
trangeira formava tres Tercos: hum de quatro mil Ale- 
macs , de que era Coronel Mr. de Tamberg ; outro de 
tres mil Hespanhoes as ordens do seu Coronel D. Af 
fonso de Aguilar; e o terceiro de seiscentos Italianos 
commandado pelo Coronel Inglez Thomaz Stukeley. 
© Xarife capitaneava quatrocentos Mouros de pé, € 
duzentos e cincoenta de cavallo. Governavao. a Astilbe- 
ria, Composta de trinta pegas de campanha, o Balin de 
Lessa Pedro de Mesquita, e Jeronymo da Cunha. Exio 
Quarteis-Mestres Filippe Estévio, Italiano, e Nicoléo 
de Frias, habeis Engenheiros. Este pequeno Exercito 
hia acompanhsdo de tantos gastadores, criados, e ov 
tra gente inutil, que quasi o igualay4o em numero, ¢ 9) 
Ihe servido de embarago. 

Convocou ElRei por formalidade hum grande Com 
selho de Guerra, e contra o voto das pessoas mais intel- 
ligentes, e zelosas do bem do Estado, determinou or 
char por terra a Larache , em cujas visinhangas se acha 
va Muley Maluco com hum Exercito de mais de cem 
mil homens, a maior parte Cavallaria, e com muita 
artilheria, para lhe disputar a passagem. 

Ordenou ElRei aos Coroneis dos 'Tergos Portugue- 
zes, que escolhendo dois mil homens de cada hum 
delles, remettessem para bordo dos navios os que resta® 
sem; diminuindo assim de perto de quatro mil homens 
© numero do seu Exercito. Tao cegamente se persuadia 

ue lhe sobejavio as forgas para conquistar a Africa! 

. Diogo de Sousa teve ordem para se apresentar com 
toda a Armada defronte de Larache, mas nao entrar 
no Rio até novas ordens, que nunca se lhe expedirao; 
perdendo-se desta maneira a occasiao opportuna de ga 
mhar aquella Praca , verdadeira base de operagées do 
Exercito, e ponto unico para a sua - > porque 











ANNAES 


DA 


MARINHA PORTUGUEZA 


POR 


IGNACIO DA COSTA QUINTELLA, 


Vice-Almirante da Armada Real, Conrselbeiro @Esta- 
de Honorario, Conselbeiro do Real Conselbo da 
Marinba, e Socio Honorario da Academia 
Real das Scieucias. 


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LISBOA 
Wa TypoGrariA DA MESMA ACADEMIA. 


1840. 


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ARTIGO 
EXTRAHIDO DAS ACTAS 
DA 
ACADEMIA REAL DAS SCIENCIAS 


DA 


SESSAO DE 9 DE DEZEMBRO DE 1835. 


Determine a Academia Real das Sciencias, que 
jao impressos d sua custa, e debaixe do seu pri- 
legio, os Annaes da Marinha Portugueza, gue she 
réo apresentados pele sew Secio Hoxorario Ignacio 
1 Casta Quintella. 


Joaquim José da Costa de Macedo, 


Secretario Perpetwo da Academia. 


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a’ pique , safvando-se a puarnicZo nas muitas-embarcas 

de terra ,- que andavao 4 roda d’ella (1). 4 
+ A Nao Salvador, Commandante Miguel de Abreu, 
vindo de volta para Portugal, abrio tanta agua‘antes™ 
de dobrar o Cabo de Boa Esperanca, que arribou, ¢- 
ndo podendo tomar Mocambique, seguio. a Costa ‘comi. 
intengd4o de varar na primeira terra, e por fortuna foi: 
a .Mombaca, onde achou huma_ Esquadra Portugueza « 
vinda de Mocambique, commandada por Martim Af- 
fonso de Mello, o qual vetido o misero estado da Néo 
(que trazia dez pglmos de agua no purao), e a riqueza 
da carga, a comboiou a Ormuz para se concertar ; mas 
achou-se tio arruinada, e podre, que a condemndrdo, e 
Gomprou-se hum navio grande, que trouxe a Portugal 
toda a gente, e a carregacio. ee Co 

15¢7 — A Esquadra da India (2) foi este anno de 
cinco Nios, commandada por Francisco de Mello, em 
barcado na Néo Santo Antonio; e os outros Commane: 
dantes Gaspar de Araujo, no S. Francisco; Heitor Ve~ 
lho Barreto, na Nazareth; Alvaro de Paiva, na Santa 
Maria Imperatriz ; e Francisco de Brito , no S. Tiago, 
com destino a Malaca. 

Sahio a Esquadra de Lisboa a 26 de Marco; e are 
ribando a Nao Santa Maria, as outras entrarao em 
a 12 deSetembro: o S. Tiago foi tambem a salvamen- 
to a Malaca. 

Neste anno se comecdrao a reunir em Lisboa nas 
vios, viveres, e municdes para se organizar huma fore 
midavel Armada, destinada em segredo para conquistar 
a Inglaterra, da qual logo tratarei, 


-€1) Vede Linschot na sua Obra j4 citada, pag. 153. 
-€2) Couto, Decada 10, L. 10, Capitulo 6 — Epilogo de Pedro Pare 
geto. — Faria, Asia Portugueza. -: : : : 


Tomo II 4 


27: 


Gas forgas da sua vadta Monarchia ; ¢ tom muita enite 
cipaggo mandou remetter para elle das sutras Cidaled 
maritimas tado quanto era nécessarid; porem 6 ataque 
de Cadiz pelo Almirante Drake atfazed os prepara’ 
tivos. - .+ 9 
~ Por morté do famoss Marquez de Santa Cruz: no- 
meado Capitdo General da expedi¢g%o, ¢ auttor della; 
_elegeo ElRei para 6 mestiio Cargo a D. Affongo Peres 
de Gusmao, Duque de Medina. Sidonia » qué minca tse 
nha servido no niat. Dividia-se a Armada em deg Ese 
Quadras , das deaominacbes segiintes : 


| Esquadra de Portugal. 


GaleZo S. Martinho, em que embercou o Duqne,: 
dé 1000 toneladas, 600 soldados, 177 marinheiros, e 
48 pegas de artilheria. Dos soldados sé oitenta erdo Pore’ 
-. Galedo S. Jodo, de 110m toneladds, 321 soldados, : 
374 marinheiros , e 50 pegas. 
.+Galedo S. Marcos, de 790 tonelddas, 293. s0lda- 
dos, 117 marinheiros, e 33 pegas. _— 
Galedo S. Filippe, em que hia o Mestre de Cam- 
po D. Francisco de Toledo, de 900 toneladas, 445 sol- 
dados, 417 marinheiros , € 40 peges. 7 
GaledoS. Mattheus, em que embarcou o Mestre dé 
Campo D. Diogo Pimentel, de 750 toneladas, 277 sole 
dados, 120 marinhciros , e 94 pegas. } 
Galeio S. Tiago, de 520 toneladas, 300 soldados 
Portuguezes do Tergo de Antonio Pereira, 93 marinheie ' 
r6S,.€ 24 pecas. | 
Galeao de Florenca , de 961 toneladas, 400 solda~ 
dos Portuguezes do Terco de Gaspar de Sousa, 86 ma- 
sinheiros, e 52 pegas. | : oe 
Galeio S. Christovao, de 352 toneladas, 300 sol- 

















' Patacho Maria, de 70 toneladas, 20 soldados, 23 
marinheiros , e 8 pegas, 
Patacho Santa Isabel , de 71 toneladas , 20 soldae 
dos, 24 marinheiros, e 10 pegas. : 
Patacho N. de 96 toneladas, 20 soldados » 26 mae : 
sinheiros , e 6 pecas. , 
Total da rga desta Esquadra: Nove Nios, e tres 
Patachos, contendo 6189 toneladas, com 1805 solda« 
dos’, 759 " marinheiros, e 21 13 pesas. 


\ 


Esquadra de Castella. | 3 
~ Seu General D. Diogo Flores de Valdez, 


GaleZo S. Christovao, em que hia Valdez, de 70d 
toneladas , 205 soldados , 120 marinheiros, e 36 pegas. 

Gal. 4o S. Joao Baptista, de 560 toneladas, 207 soldae 
dos, 136 marinheiros, e 24 pecas. 

"Galego S. Pedro, de 530 toneladas, 141 soldados, 
331 marinheiros, e 24 pecas. 

GaleZo S. Jodo, ‘de $30 toneladas, 163 soldados 5 
113 marinheiros, € 24 pegas. | 

Gale4o S. Tiago Maior, de 530 toneladas, 210 
soldados , 132 marinheiros, e 24 pecas. . 

Galedo S. Fuippe, eS Tiago, de 530 toneladas, 
351 soldados, 116 marinheires, e 24 pegas. ’ 

Galefe Ascensio, de 530 toneladas, 199 soldados, 
134 marinheiros , e 24 pegas. 

Galedo Senhora do Rosario, de 530 toneladas, 15S 
soldados, 108 marinheiros, € 24 pecas. 

Galeéo S. Miguel, de 530 toneladas, 160 selda« 
dos, 1cz marinheiros, e 24 pegas. - 

Galedo Sanita Anna, de 250 toneladas, 98 soldap 


@os , 80 marinieisos , € 24 pegas. 














com 2458 soldados, 1719 marinheir 
ore's5 sell ¥ wil sag ss" OF ar 
et: 30 Si > , wrist iat 7 oLT a iP 


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soldados, 71 marinheiros, e 48:-pecas. 28 
eluz dq Beridade ;. de 700 ronclidas 5 1307. ‘soldidos 
marinheiros , e 22 Seis + 1 4 ,c008R 
Total da for ~ dena Esqnadra : DezsNaosi,” cone 
tendo Ssosttoneladad, -Com:2780: soldadok 957° Saag 
nheiros, ¢ 280 pegas. SoD pt % 4209 


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pobstior oct Esywatra dc Ureas @. wD 
32! ele £85 20 ei 1 CCG Ss LSeveuta® 
Seu General Joto Lopes Mexia. Srl roe 
Cc. aoe Shoe aay oe : , a 
Gro Grifo, em que hia © General, “de 50 tonee 
ladas , 247 doldadné ,: > 43 arinheiros , e. "selladen 
S. Salvador , de 650 toneladas rath dos:; “Ty 
Warinheiros ,:e°24 pegas... 
Cio Marinho , de 200 ronelades, 70 soldadoe 34 
marinheiros, € 7 pegas. 
Falcdo Branco Maior, de 500 toneladae,, 161 soke 
dados, 36 marinheiros ; e 36 pegas... 
Castello Negro, de 710 toneladas ; i239 soldados, 
_ 34 marinheiros, e 27. pegas. 
Caza de Paz Grande , de 600 toncladas , » +198 sole 


Gados , 27 :marinheiros, e' 26 peas: ae ies 
S. Pedro Maior, de 580 toneladas, 213 soldades 
28 marinhciros,.e 29 pecass re 


Samsio , de 550 toneladas, 200 soldades,-31 marin 
Bhejr03;16 +3 pe as, nyt ese ora ed went. aeeeg ee 


j.-- 
t 22 SacPedra: Menary: de. 500. toneladas , ss7anldadors 


23 marinheiros, e 18 pegas i.) ie GSU.) she Diaid 


& 


(1) As Urcas erio navios grandes, mui bojudos do meio para vane 


te, ¢ esguios do meio para re, de pdépa chata; ,o panno, e mastreacio 
como as Nios, 


Tomo Il, 5 


, Ww. orn 


f - q i 
iy. = - t - se L. 
Racal 
h | , : 


14 homens fodes D. Diogo Pimentel, 3 


sSfyo roe Amrome Perera ty, we “ip 
io i a A ‘aie ipo rt nate ) Bors | ; 
Pe aA i de Une. Sedo como: Volumarios 
Z 














nio-se.a;Armi 
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4 " “ i . —. oe q ial = |} F ‘ v , 
, : - y r ‘ . 7 
° ' 


























e 41 


maiores. navios , mas este respondeo pedindo licencga pas 
ra conservar todos armados, mesmo 4 sua propria cus-. 
ta; € como peras embarcagdes ligeiras, que trazia de 
observagdo, ihe constou nao haver noticias da Armada. 
Hespanhola, rcsolveo-se a ir buscalla 4 Corunha, para. 
a atacar antes que se refizesse das suppostas avarias, que | 
se dizia haver soffrido. Em consequencia, sahio a 8 de 
Junho com vento Norte, e chegando no dia 10 a qua-, 
renta leguas das Costas de Hespanha, foi com certeza 
informado, que os Hespanhoes nio tinhao pddecido gran-. 
de estrago: aproveitando-se entéo de hum vento Sul, 
volrou immediatamente a Plymout , e ancorou a 12. 

Entretanto o Duque de Medina Sidonia largou da 
Corunha , e tomando hum pescador Inglez, este lhe dis- 
se, que a sua Armada tinha andado no mar, e saben- 
do da tempestade, que espalhdra a de Hespanha, se 
recolheo a Plymout, onde os navios se estavao desar- 
mando por se julgar que a invasio ja se nao verificaria. 
aquelle Verao. Sobre esta noticia pouco exacta parece 
que o Duque formou o projecto. de destruir os Inglezes 
naquelle Porto, a fim de ficar senhor do mar, e operar 
depois livremente, posto que as suas Instrucgdes lhe or- 
denavao , que corresse o Canal encostado 4 Costa de 
Franga até chegar ao Passo de Calé, e se ajuntasse ali 
com o Duque de Parma, que devia sahir de Newport 
com o seu Exercito embarcado nos transportes ja prepa- 
Yados; e que evitasse nesta viagem toda a accdo decisi- 
va coma Marinha Ingleza, no caso de a encontrar. 

Os Hespanhoes avistaraio quasi ao pér doSol o Ca- 
bo Lizard, ¢ tomando-o pela ponta de Ram-Head, que 
Ihes ficava quarenta milhas mais a Leste, e he proxima 
a Plymout , affastardo-se de noite para o mar, a fim de 
virem no outro dia atacar os Inglezes. Por¢ém hum Pira- 
ta Escossez, que cruzava no Canal, correo a Plymout a 
avizar Lord Effingham, o qual apezar do tempo contra= 

Tomo Il. a ee 


- 














e'sé achérao ‘al ois cin u 
me 20 mnio de Mog ere *y que'and 





srigarem. A Aqui Reeders com reed" de 
e apinehtaoe: : rac . ym’ 
rem aos Cafres'o que Ihes scomo’ : 
terta firme do Tica "que distra quatro ee carwash 
guas , - morrerigo rodek de "Ge fame sl CE Ilha, victi~« 
ets te 





da Cafes pereatg" 





Athen aro 
leciedinnnte todos é Ale 
er Repale ee estado, e grande ami-| 
, © qual Thes forneceo alguns man-? 
7 sa credito, outros’€m troca ae ferr0s/ ¢: 
de g ‘iditor ‘do na OT, o | 
bu: iy Conmbaliante Estevao da°Veiga, © Sota-Pilo-: 
par Ferreira, ¢ outros onze homens resolverdo-se ° 
“terra. SNeepesad er wee rics coy ke 
© que ‘consegui custa grandes tr 
mes’, esedes; ec de Sofala passirao a Moga ogambique, O- 
mesmo project. seguio, e realizou' Fr. Nicoldo Ro- 
zaria ,, com alguns outros individuos. D. Paulo de Li- 
pe resto dos Portuguezes\escolherao ficar nas ter=— 
mes do inhaca, onde morrerao muitos de , 2) 
essidade ale entre elles © mesmo D, Paulo, de ima, 
I doside maior merecimento e reputagio do seu'tem- 
ro. 0 5H bie crag tapho th no anno dogo 
ique no navio do marfim, entrando n 
eumero as tee Fa idalgas D. Beatriz, D. Joanna, © De 
wi 3 


Tome IL 7 







to 
2! 































‘hag melee DNS ty PANNE Anan | gt 
: Abii bith lari ee ee B itvay be 
arco; ec Satauenanaeian 


Nia’ aly 9 therto, cor a ee nT> 2 HORS Sie 
alg a, By! — feet " ahem restemasie by Tamae 
soi Tagg,’ Jenin mse 8. iis sce Depieme rece thie 
m svccedin a. quae Rn hendieh acco |hae Ae ef be one 
eh ia ton Wallen Sette rancisco. da Silva, 
Joao dc ‘alladares Soutamaior, £ omg 


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i. - Re eRe te Spt oo te age ty atit pa 
ye ‘oye em.27 " nassou..o vento.a0 S a E mace 




















SY 


quilt -weio-A .praiayique Nurio. Velho corrancont pedas 
os Pella'sam jhuma aAengels }.despeginao-s¢ as cobere 
tas superibres de resto do cascp,,:.¢ -carsarag-até encae 
Jharem: perto . da ,terra. -. Deitardorse ; logo 49 mar, os 
que melhor. sabiio gadar, alguas dos. quacs ke-affogirie . 
atropelades da ressaca. do mar, .qué nebeptaya BOs pes 
nhagcos, ¢ da mua madeira que -bojaya,: Estavdo ens 
tretanto ng castelle- de: prea -o Commandarte, ,o; Piloto, 
£:6 Mestre com a maior parte da guarnicag;.e:na pbs 
pa, Nuno Velho cem D. Tsabed » sua filha ,-e outras . 
gressoas distinctas, esperando algiima-occasido opportu- 
Na «para desembarcarem a dalyo, o que nas circumstane 
¢ias-actuaes 20 era -posgivel, js "o> | 
_.:t Chegida a noite, separou-se a pdpa da proa, e foi 
encalhar.aa praia mui direita: era isto na vazante, e 
temendo Nuao Velho, que quando voltasse a maré, 
@srastasse para o.mat aquelle: pedaco da Ndo, mandou 
a- Diego Fernandes seu criade, bom nadador, e animes. 
$0,soldado ; com hum cabo na boca, @ qual fei amar- 
Far a huns penedos; e¢ depois desta: manpbra.saltou sem 
igAy ema. tegra muita geate,-Logo que 2-maré come- 
gow, mencher, alandorsi{ o.cabo, chegou-se a pOpa tan= 
te;:a -terra, que ma outra vazanre, ao amanhecer do dia 
45.) <lesempbarcarao.a pé enxuto Nuno Velho, e.todas 
9% Seahoras , Fidalgas,: e soldados que alli estavao. (1). 
-i..- Reunidos finalmentte em terra os naufragantes, de- 
pois. de darem a Deos as devidas gracas, passou-se mos-, 
ern. 4 guarnicao, a qual constava no memento do naufra-, 
gio.de cent: 6 Cingoenta c-tres Portuguezes, € cento e€ 
moyenta:.¢ quatre escravas: .achdrdo-se cento e vinte e. 
cinco. doa; primeiros, ¢ cento e sessenta dos segundos ; 
ee *, a) ; 1 ot 
- tt) G logar ,. eM. qué naufragou esta‘N4o, ‘he chamado ainda ‘heje 
:Retkklo das Fonres ,situado.em 33° 14’ ce Latitude Sul, e distane. 
te gerte de duigntag jegtas 20 Sudocste da Habig da Alagoa 
Tomo Il t 8 


0° Nessp-‘neite-mandou Nune Velo. dar hum rebate. 
fatso ; €: ficou: satisfeito da presteza, e actividade com 
que todos :acudir3o a occupar os postos que hes: estae 
. vio determinados, No.1.’ de Abril mpdou-se o Campo; 
@ f%i nccupar ham valle, onde. chegou Luspance cons. 
Gu guias, © duas vaccas, e dois carneiros, que vendeo 
por tres. pequepos bocadus de cobre; e Nuno Velho, pae 
ga-impeimir nos-Cafres hum salutifero terror, mandow 
shatar:as,duas vaccas 4. espingarda , o que lhes causow 
za} espanto.j queo mesme stncosse fugiria, se elle lhe 
who 'travasse do braco. A muita: agua, que cahio de 
noite , nao permittio comecar-se a marcha no dia see 
guinte, ‘como estava determinado, porque foi necessario 
enxugar as tendas, e 0 fato. 

'. A 3 de Abril, pelas nove horas da manha se poz 
em movimento o Arraial: hia na vanguarda Juhiao. de 
Faria com o Piloto,-e -hum guia, seguia-se Nuno Vee. 
tho com Luspance , e os outros guias; e apds elle o 
resto da pente. 1D. Isabel Pereira, e sua filha hido em 
eatres aos hembros de escravos, assim como alguns 
Portuguezes: feridos, des quaes era hum Francisco Nu 
Res Marinho ; e deixou-se alli hum Negro pequena 
@eom: huma perna quebrada, dando algum cobre aos Cae 
fres para o recolherem, e curarem, © quc promettérzo 
fazer..O Piloto, marcando a direccao de caminho que 
seguifio,.actou que hia a Nornordeste. Era este cami- 
pho por huma: fresea varzea eheia de fene, ¢ marchane 
do por ete de vagar, chegarao 4s tres horas a hum vab 
le, por. onde corsia huma bella ribeira., que se cont 
maunicava com hum Rio, e este com @ mar, e por cone 
selho do guia fizerae aqui a primeira alte, alojando-se 
ao fongo da ribeira, e das espessas .miatas, que occupas. 
vio @ valle. 

No dia 4, buscando véo para passar aguelle Rio. 
(que cra o do Intante ) encentrarae dois. Negros, aos 


64 


Ihes dera; por euja causa Nuno: Velho o recebeo com 

azalhado, Ao meio dia tomou-a Piloto a alrura do 
Bo e achou estarem na Latitude de 32°, 6’, e terem 
caminhado até alli dez leguas, segundo os rumeos que 
haviio seguido, A’s quatro horas da tarde chegéraod 
Aldeia de Ubabit, que os fez alojar junto 4 sua casa; 
e hes mostrou o seu gado, que consisria em duzentas race 
cas, e duzentos carneiros grandes, e chamou as suas mu 
lheres, que erdo sete, com sres filhas, e alguns filhos, os 
quaes todos baildrao, com outros sessenta Negros que se 
ajuntarao. Acabadaa festa smandou Nuno Velho distribu 
pelos rapazes, e raparigas algumas contas de cristal, e 
outras bagatellas , de que satisfeitos os pais, promerté 
rio quatro vaccas. Proximo a esta Aldeia se acamparie 
&s Portuguezes ao longo de huma ribeira, em cujas mar 
gens abundava a lenha, 

No dia 10, havendo Ubabu faltado 4 promesss, 
pedindo hum prego tal prlas vaccas, que nado convinhs 
dar-lho, se pozerao em marcha, tendo somente obtido 
huma vacca. De tarde fez-se alto junto de huma ribeira 
povoada de basta arvoreda; e querendo o guia, irmde 
de Ubabu, hir 4 sun Aldeia com promessa de volver 
no dia seguinte, nao o consentiv Nuno Velho, sem de 
xar outro Negro em refens, -. 

A 12 passou Nuno Velho para.a vanguarda, por 
que andava de vagar, e€ a outra gente poderia aturar O 
secu passo. Neste caminho passdrao perta de huma Al- 
dcia, em que comprarao huma vacca, e forse acampa 
em hum sitio abundante de agua, e Jenha. Eira cease 
me dos Porruguezes metter de aoite as vaccas no mid 
do alojamento, para que nao as furtassem cs Cafres,¢ 
Ainha-se boa vigia-com os guias, porque costumao fugit 
depois de pagos. Como es soldades hiao cancados do 
MoOsjuctes, por serem nmi pezados, mandou Nuao Ve 
dio, com parecer de todgs ,,dangallus -na ribeira. 


67 
Aqui>celebricio a Festa , como Shes foi »possi+ 


vel. yer Ri Ose p,0) 2 ~~ wu ae ken ag .% anew 

ene) eo chegdrdo pelas:onze: horas a chu 

de haGarbung poucarde agua 

| Serene mn, is mar lojdréo;. 
agns: pelodee Sn, fetes em alojarao ; 

o @-peucd, apr 4G de a 









ee ja ers. 
ezes, j4 quasi 








-_ 














2. EF . Nuno Vel 
"seus ‘com m elles fia sabneeihen lhe 
cs aio @ fe hat da “com: 


. | >, delle: hum 
ewe s de 
mat 0 A 


comeing ined 
-do-Inhaca.a resti- 











08 outros dizendo , que viessem ver homens, que erlo fia-. 
hos do Sol, e 0 hiado buscar. Deixando todos elles as: 
armas entregues a hum dos seus, vierao a correr, @- 
ajuntando-se com os Portupuezes, caminhdrao até que 
estes fizeriio alto 4 sombra de hum bosque para passae- 
rem a forga da calma. Aqui vierdo alguns Negros com . 
milho, que venderao por contas de cristal, e tiras de. 
panno de cores; e veio tambem o seu Ancosse, no qual ; 
nfo achando Nuno Velho o gazalhado que esperava, e 
percebendo nelle desejos de saltear asua gente quando:.a2 
achasse desapercebida, avisou os Soldados que o acome:t 
panhavdo, que preparassem os seus arcabuzes, e cada» 
hum marcasse o Negro a que queria atirar. O Ancose:. 
se, pércebendo esta determinagao , dissimulou a sua, é 
Nuno Velho mandou que continuasse a marcha,-e se nao 
fivesse caso deste Cafre , nem da sua Aldea, pela qual | 
logo adiante passou. Ao Sol posto armou-se o Campo. 
em lugar provido de agua, e leaha, onde vier&o dois - 
Negros de outras Aldeas, que contentes com dois peda- 
gos de cobre, promettéréo voltar. no dia seguinte para 
servirem de puias. or : , 

A 10 amanhecérao os Negros no Arraial, e por sua di- - 
reccao sub{rao huma serra; e ainda que dalli descabririo... 
outras, os Cafres os levdrao por caminhos, que diminuiao 
a aspereza dellas, e alojarao-se 4 noite ao pé da ultima. 

A 11 atravessarfo aquella serra, indo a Leste, ea 
Lessueste, e acabada ella, torndrao ao caminho de Lese 
nordeste por bosques mui espessos de arvores altas, e 
sombrias ; e descendo huma encosta, no fundo della ene - 
tre grandes rochedos estavao humas casas, junto das quaes 
_ se-alojdrio. Estes Cafres erZo pobres ; e sé tinhado algum 

milho, e leite , que vendérao. Aqui ficou entre elles, em - 
hama cabana, que se construio separada das suas, tendo-se 
rimeiro confessado, e recebido as consolac6es da Reli- 
giSo.( unicas consolag6es verdadeiras!) Alvaro Gonsal- 
Tomo II, 12 


91 


A 14 pelas onze ‘horas da manha chegou o--Ancé® 
se, chamado Garnabela, acompanhado de cem Negrée 
‘desarmados: sahio Nuno Velho-a réecebello com quite | 
‘arcabuzeiros , e sentados ambos em huma.alcatifa,,. lhe 
significou Nuno Velho quanto folgava deo ver, e a 
‘ter entrado nas suas terras, pela certeza de achar nellas 
© que necessitava para passar as do Inhaca: Gamabelh 
Ihe offereceo tudo quanto estivesse debaixo do tea dos 
minio. Passados estes ‘cumprimentos , -apréseatous]he 
duas vaccas, e receheo delle humus conta’ de: Mada 
perola, huma peca de prata, huma ‘pedta. de’ estancar 
sangue, e alguns pedacos de cobre, Tratdro depoit dot 
guias, e Gamabela deo pata isso o seu mesmo Capifio, 
e outros dois Negros, e pedid, que lhe déixasse alpuing 
pesa, que lhe servisse dé lembranca da sua pestda;‘e dos 

ortuguezes. Respondeo Nuno Velho, que the daria a 
Mais preciosa que havia no Mundo; e tirando a cruz dé 
humas contas que tinha ao pescoco, com o chapeo na 
mao, a beijou, ¢ assim o fizerao os Portuguezes , que 
com elle estavao; e a entregou ao Ancosse, que: com’ 
igual acatamento a beijou, e o mesmo praticdrao todos 
6s outros Cafres. Vendo Nuno Velfto’a ‘veneragao, que 
élles mostravio 4 Cruz, mandou logo a hum Carpintei.: 
ro, que de huma arvore fizesse huma Cruz de oito pale. 
tos de alto, e a deo a Gamabela, explicando-lhé bre- 
vemente as virtudes daquella Sagrada Insignia, para que 
@ pozesse diante da sua casa; e todas as manhas quan- 
do sahisse, a beijasse, e adorasse de joelhos; e s¢ fal- 
tnasse saude aos seus Vassallos, ou chuva aos seus cam- 
pos, com toda a confianca lha pedisse. O Ancosse, to- 
mando a Cruz 4s costas, e despedindo-se dos Portugue- 
zee, scguido de mais de quinhentos Negros, a levou 4 
sua Aldea, para cumprir o que lhe disserao. 

No dia 15 seguirao seu caminho em companhia de 
Gamabela , que os quiz acompanhar na primeira jorna- 

: 12 ii 


93 


sarem a calma. Acabada esta, subirio hum outeiro, que 
ficava do outro lado, e delle se seguia huma dila 
campina , que toda se regava da mesma ribeira, e nella 
hhavia muita caga; ¢ em huma vasta alagoa, que se com- 
‘municava com a ribeira, nadavao muitos cavallos mari- 
nhos, que com os seus rinchos nao deixdréo dormir os 
Portuguezes , que se alojarao nas suas proximidades, — 

19 sahiréo mais tarde do costumado, pelo income 
modo da noite antecedente, ¢ chegdrao a hum brejo, que 
os guias disserao estar perto do 1 ate el e alojando-se 
ao longo delle, enviou Nuno Velho hum dos guias a 
avisar o Ancosse da sua chegada. 

No dia seguinte 20 0 mandou visitar por Antonio 
Godinho, © qual quando voltou, achou os Portuguezes 
ja da outra banda da ribeira descangando do trabalho, 
gue haviao tido em passar 0 gado, e deo por noticias, 
- que o Ancosse era Capitao do Inhaca, e que lhe fizera 

offerecimento de tudo quanto havia na terra. até cheg: 

rem ao Inhaca, por saber a. amizade que entre e 
existia; e que o navio de Mogambique nao era parti- 
do, por quanto poucos dias antes passdrao por aquella 
Aldea alguns Cafres, que Ihe levavao mar pated 
depois chegou hum Capitao do Ancosse a visitar da sua 
parte Nuno Velho, trazendo-lhe dois cabritos, e duas 
gallinhas, e apds elle chegou © mesmo Ancosse, que fob 
recebido em alcatifa, e confirmou as novidades : dera 
_ Antonio Godinho. Apresentou elle a Nano Velho duas 
vaecas, e recebeo deste huma tampa de hum copo de 
prata, e quatro pedagos de cobre, e hum seu sobrinho 
teve igual presente; e com) isto se retirarao, por estar a 
sua povoacio longe. O Arraial conservou-se naquelle 
sitio, e observando o Piloro a latitude , achou estar em 
27° 20', fazendo-se trinta leguas distante do Porto, ent 
| que se achava 0 navio. 


A 21 pela manha comegirio. a caminhar para a po+ 


94 


voacto do Ancosse, onde esperando achar puias ficis, 
‘achdrao 0 contrario; porque guiando-os 0 proprio Ap 
cosse, os levou por hum tal rodeio, que voltdréo 20 
‘mesmo brejo de que haviao partido. Escandalizado No- 
no Velho desta perfidia, pedio-lhe o que lhe tinha de 
do, porque jd nio queria delle guias: a final o Ancos- 
se, recebendo mais alguns pedagos de cobre, chamou 
tres dos seus Negros, e comecou a dirigir o Campo por 
hum caminho de aréa cheio ie palmeiras bravas, algu 
mas das quaes tinhdo fructo; e sendo ja noite, alojarao- 
fe debaixo de hum arvoredo sem agua. 

A 22 de manh3, chegando a humas casas, lerou 
© Ancosse os donos comsigo , e desviou os Portuguezes 
do caminho, mettendo-os por hum bosque, a fim de ex- 
traviar algumas vaccas, e fugir com ellas. Passado este 
bosque, e huma ribeira, entrérao por outro, mas como 
havia grande vigia nas vaccas, indo o Ancosse adiante 
com o Lingua, e nao podendo fazer o que pertendia, 
sendo o mato mui espesso, que se nao vido Os que tis 
nhdo detraz delles, atirou com huma zapaia ao Lingua, 
e errando-o, fugio. O Lingua, segurando hum dos Ne- 
gros das casas, que estava proximo delle, gritou, e acu 
dindo os Portuguezes, prendérao os companheiros daquel- 
le; e sahindo do bosque, perguntdr4o aos Cafres, quem 
era o Ancosse fugido? A que respondér4o, que era hum 
grande Jadrao chamado Bamba , ao qual por temor 
acompanhavao. E pedindo-lhes Nuno Velho, que o en- 
caminhassem até ao Inhaca, promettério de o farer. 
Postos com tudo a bom recado, forao marchando por 
hum mato, e atravessando hum brejo, achar3o da ontra 
banda bom caminho, que seguirao até 4 noite, e ao lon- 
go de hum ribeiro se acampario, nao Jhes faltando le 
nha. Esta terra he alagadiga, ¢ de muitos brejos, ¢& 
que ja tinhado passado alguns. 

' Na manha de 23 passario outro brejo com grande 


oS 


traballio, porque além de atolar muito, era no meio tio 
fundo, que excedia a altura de hum pique. Atravessou-se 
este espaco Com troncos de arvores , € cobrio-se 0 resto 
com espadana, de que havia muita; e passado elle, des- 
cancé4rao 4 sombra do arvoredo. Aqui mandou Nuno 
Velho soltar hum dos Negros, para que fosse a sua casa 
dar noticia dos outros, satisfazendo-o com hum pedaco 
de cobre, ¢ huma tira de panno encarnado; e passada 
a calma, marchardo até ao Sol posto, que se alojario ao 
de outro brejo. Via-se ao Sudoeste a foz de hum 
io, que tinha na Carta o nome de Santa Luzia, e estae 
va situada em 28° de latitude 1), 0 qual tinhdo passa- 
do o dia antecedente, mas em parte que nao os embara- 
gou, por ser longe da sua boca. Neste Rio he que mors 
reo affogado Fernao Alvares Cabral, Commandante da 
Nao S. Bento. 

No dia 24 pela manha descobrirao de hum alto 
algumas Aldeas, cujas casas er4o similhantes 4s choue 
panas das vinhas em Portugal, porém redondas como 
as que até alli tinhao encontrado; os Negros das quaes, 
em vendo os Portuguezes, se ajuntdrado em numero de 
duzentos. Foi a elles o Lingua, e sabendo serem Por. 
tuguezes, vierio logo a Nuno Velho, e o certificarao 
de que estava nas terras do Inhaca, sendo aquellas Al- 
deas de huma irma sua; e que o navio nao era partido. 
Alvorocarao-se todos com esta boa nova, e chegando 
ds casas, veio a irma do Inhaca com seu marido visitar 
Nuno Velho, que os recebeo como devia, e dando-lhes 
humm panno preto, e dois pedagos de cobre, mostrou-se - 

roso de o tempo lhe nao dar lugar a deter-se com 
elles alguns dias. Desta Aldea, situada onde chamao os 
Medios do Quro, se descobria o mar. Passada a cal~ 


(1) A ponta do Sul da entrada do Rio de Santa Luzia, segunda 
algumas Cartas Inglezas, esta na latitude Sul de 28° 2a’. 














118 


tal a epidemia que assalrou os soldados, e os marinhei-= 
ros, que o Conde de Cumberland se vio forcado a aban- 
donar a Itha, e regressar a Inglaterra, com perda de | 
muita gente, e de immensos cabedaes; porque elle, e 
Outros associados fizerao quasi todas as despezas deste 
Armamento. | - 
_ Em consequencia deste bloqueio, nado passou navio' 
algum 4 India , o que foi grande perda para aquell¢ | 
Estado, que muito necessitava de soccorros abundan# 
tes, e efficazes, pelos armamentos navaes da Hollanda. 
Nem havia o menor obstaculo em que as Néos partisn 
sem juntas, ou separadas, logo que a Esquadra Ingleza: 
desappareceo das Costas de Portugal; ou faltou o zelo,: 
ou sobejou o terror panico (1). _ 


(1)° Neste anno (vede a citada Colleccdo tomo 1.) sahirio de Hol-: 
Janda tres Esquadras armadas pela Companhia. A primeira constava da- 
seis navios grandes, e dois Hiates; os navios erio: O Mauricio, em- 

e bia o Almirante Jaques Cornelisz Van Neck , e por Commandante 

vert Jansz, e Commissario Cornelio Heemskerk : o Amsterdam, com 
o Vice-Almirante Wibrant Van Wanvyk , e Commandante Cornelio 
Jansz Fortuyn ;: a Hollanda, Commandante Simiéo Lambertsz Mau: a: 
Zelandia , Commandante Nicoldo Jansz Melk-nass ; o Gueldres, Come | 
mandante Joao Bruyn: e o Utrecht, Commandante Jodo Martsz, O Hia : 
te grande chamava-se Frizia, Commandante Jodo Cornelitsz; e 0 pee 
queno Overissel , Commandante Jodo Jansz Hoen, Esta Esquadra levas. 
va quinentos e sessenta homens de guarnicao; e sahio do Teixel no pri- 
meico de Maio com destino de ir directamente 4 India, como fez; e 
voltou 4 Hollanda em Junho do anno seguinte. : 

A segunda Esquadra compunha-se de quatro navios, e hum Hiate, - 
cujos nomes erdo: A Esperanca, de 500 toneladas, e 130 homens, no 
gual hia o Almirante Jaques Mahu : o Amor, de 300 toneladas, e 110 
homens, s.u Commandante Simao de Cordes, servindo de Vice-Almis : 
rante: 3 Fé, de 320 toneladas, e 109 homens, seu Commandante Gee - 
rard Van Beuningen: a Fidelidade, de 220 toneladas, e 86 homens, 
Commandante Jurien Van Eockholt: ¢ o Hiate Feliz Mensagem, de 
150 toneladas, e 112 homens, Commandante Sebald de Weert. Levava | 
o Almirante Instrucqdes para pessar o Estreito de Magalhaes, a fim de 
conhecer se seria mais facil este caminho para a India, do que o do Cas. 
be de Boa Esperanca. . . Lo. : 

Tomo LI. 15 


| Vs 
occorrérae de hovo; porque as Marinhas de Inglaterray 


guadra 96 0 navio Fé voltou 4 Hollanda depois de vinte e cinco mezes 
de penosissima viagem , sem ter feito descoberta alguma importante no 
mar Pacifico. 

A terceira Esquadra (vede 0 tomo 2. da citada Colleccio), levatie 
do as mesmas Instruccées da segunda , constava de dois navios: o Mau- . 
ricio, em que hia o Almiraute Olivier de Noort; e o Henrique Frederi- 
co, commandado por Jaques Claasz, servindo de Vice-Almirante; e 
dos Hiates Concordia, Commandante Pedro de Lint; e Esperanca, cone - 
mandado por Joio Huidecooper: o total das equipagens era de 248 
snens, O Piloto Inglez Melis dirigia a derrota. 

Sahirio de Roterdam a 13 de Setembro. A 10 de Dezembro virgo 
a Hha do Principe, onde querendo tomar alguns refrescos, e agua, ds 
Portuguezes matdréo o Piloto Melis , e hum irmdo do Almirante, com 
alguns outros homens. Retirarfoese os Hollandezes , levando muitos fee 
ridos , ¢ doentes: corrério a Costa de Africa; estiverao ancorados nas 
proximidades do Cabo de Lopo Gonsalves, e a 26 de Dezembro se po» 
werio-a camioho para o Brasil. A 9 de Fevereiro de 1599 surgisfio fée 
ga da barra do Rio de Janeiro: pedirio licenca para fazer viveres, e aguae 
da; e nao a obtendo, fordo a Ilha de S. Sebastido, onde fizerdo alguma 
agua. Gastarfio nisto até 20 de Marco, que vendo a estacéo adiantads 
para buscar o Estreito de Magalhaes, tentaraéo ir d Ilha de Santa Hele- 
Wa, que nao poderio tomar até 11 de Maio. Dirigiréo-se entio « Ibs 
da Ascensio; e a 21 descobririo huma I}ha deserta Cera a da Trinda- 
de } em 2° 135/ de latitude Sul, na qual nao achdrao refrescos. A 30 
descobririo a Costa do Prasil. No 1.° de Junho ancordraéo em Rio Do» 
ce (na latitude de 19° 32’), onde nao fori admittidos pelqs Portu- 
quetes. Sahidos dalli, avistdrio no dia seguinte huma Ilha deserta (al> 
guma. das de Santa Anna, ou talvez a que forma o Cabo Frio), que tix 
arha menos .de huma legoa de contorno, e distava outro tanto da terrs 
firme , na gual desembarcdrio os escorbutados, que se restabelectria 
quiasi- todos ¢m quinze dias, Partirio desta Ilha a 21, queimando antes 
© Hiate Concordia, que nao estava em termos de navegar. A 30 em 
¢rarao na mesma Enseada da Ilha de S. Sebastiio, em que primeied 
havido estado, e fizerio aguada. | . 

A 16 de Julho se pozerio em derrota para o Estreito, ¢ nos fins 
de Setembro ancordrio no Cabo das Virgens. Entrdrao depois no Estref- 
to, havendo ja perdido cem homens; nelle encontrdréo 0 navio Fé, 
pertencente 4 Esquadra do Almirante Mahu; e depois de grandes con- 
tratempos , desembocdrio no mar Pacifico. Por ultimo o Almirante 
Woort foi o unico, gue regressou 4 Hollanda com o seu navio a 26 de 
Agosto de 1607. 


15 il 





| 
& 
dividix ice ee 

deny cae canines Sct 
; Reino, ou ’ Provineia,: que corria com as do seu 
_ armamento; © assim se dizia: 
. rab Dlachidlivctien gfitcbadententsiiea’ 
meral, e seu Almirante subordinados a ‘em Che 
t 




















_ fe da Marinha, que: se: intitulava Capitdo Genera) 

Mar Oceano; mas raras vezes os navios 

ape or Seaeeinanlay vicaab amadnasdatvend 
tinhao. as precedencias entre aquellas 

ne Porngl 2 de Cut ea a ec ae ielsde p> 


















139 


‘Antes da greacdo destes Tercos guarnecido-se os naviog 
de guerra Portuguezes com gente collecticia, reunida- 
para aquelle momento, e concluido o embarque, retira~ 
va-se cada hum para sua casa; e desta maneira faltavéo 
Officiaes ,.e soldados veteranos quando se querifo.. Asy 
sim a creacao destes dois Corpos foi huma idéa feliz. | 
As Capitaneas das Ngos da carreira da India, quans 
do.estas faziao Esquadra, estavao no uso de precede 
rem, mesmo nos mares da Europa, 4s Capitaneas dag 
Esquadras de Portugal. Ventilou-se este objecto na Cor- 
te de Madrid, em huma Junta de Ministros Portuguezes 
de Guerra , e de Estado, e resolveo-se conservar-lhe esta 
preferencia, pelo fundamento, além de outros, de que 
a bandeira das Capitaneas da India nao era huma Insie 
gnia Real, mas sim huma Insignia Religiosa, ornada 
@om a Cruz de Christo (a bandeira das Ndos da India. 
tinha a Cruz vermeltha da Ordem de Christo por baixo 
do escudo das Armas Reaes), a cuja Milicia competia. 
todo o dominio util das Conquistas Orientaes; e por con- 
- gequencia, huma Insignia quasi Sagrada, e Ecclesiasti~: 
‘©a, nao podia ceder a outras Insignias, ainda que So- 
beranas, simplesmente Seculares. - 

_ Durante este Reinado sahirao0 de Lisboa para o 
Oriente cento e vinte e quatro Naos, ou Galebes, treze 
Ureas, sete Patachos, e seis Caravelas. Destes naviog 
atribérao para Portugal vinte e quatre Naos, e hum Pa~ 
tacho; e sepguirio viagem cem Naos, treze Urcas, seis 
Patachos, ¢ seis Caravelas. Nauwfragarao na sua ida pae 
ya a India dez Naos, duas Urcas, e hum Paracho; e 
na torna-viagem nove Ndos, e duas Urcas. Forao to~- 
madas, ou. queimadas 4 ida cinco Ndos, e huma Ur" 
€4; ¢ na torna-viagem duas Ndos. ‘“Fotal 32 vasos per~ 
didos; cujo valor nado se pdde calcular em menos de vine 
te e cinco milhdcs. 

Falleceo ElRei Filippe IIL. em 1623. 


131] 


Estas duas Esquadras se reunirfo-em Mocambique; 
e chegdrio a'Goa nos principios de Setembro, excepto: 
a Nido. Castello, que se perdeo no parcel de Sofala, jun-: 
to a Quilimane; e ainda que se salvou quasi toda a gen-: 
te em terra , fallecér4o alli. muitas pessoas de. enfermi~. 
dades, em que entrou o seu Commandante. 

- 1600. + A Esquadra da India -(1) constou de quatro 
Nados, em que foi o Vice-Rei Aires de Saldanha em= 
barcado em a Néo S: Valentim (que 4 vinda a tomdrao. 
os Inglezes ancorada na Ericeira); os outros Comman< _ 
dantes erdo Fernao Rodrigues de Sa, no S, Francisco; 


Gaspar. Palha, no S. Filippe 5 e Gonsalo Caldeira, no 
S. Joao @). 


b 


x0, e forio. tomar o da Ilha de Anno Bom, cujos moradores lhes forne- 
otrdo refrescos. Depois destas extraordinarias escalas , pozerdo-se em dere 
sota para o Cabo de Boa Esperanca. 

A segunda Esquadra constava de oito navios, commandada pelo Ak 
mirante Pedro Both, embarcado em 0 navio Paizes Baixos, Sahio de Hole 
landa a 21 de Dezembro; passou a Linha no 1.° de Fevereiro de 1600, 
© dobrou o Cabo de Boa Esperanca a 27 de Marco. 

Ci) Couto, Decada 12. Liv. 5. Cap. 8. — Epilogo de Pedro Bare 
reto. — Discurso sobre los Commercios, 

(2) Neste anno (vede a Colleccio jd citada, tomo 2.) mandou a 
Companhia de Hollanda huma Esquadra de seis “havios para as Indias 
Orientaes , commandada pelo Almirante Jaques Van Neck , embarcado 
em 0 navio Amsterdam , e os outros erao o Dordreget, o Harlem, o 
Leide, o Delfer, e o Hiate Gouda. 

‘ Sahio a Esquadra a 28 de Junho: a 13 de Agosto vio a Ilha do 
Miaio., e a 24 de Setembro passou a Linha. A 28 virio huima Jlha, que 
onidéeso, ser a,de S. Mattheus ; .mas surgindo nella no 1.° de Outubro, 
achasdo ser a de Anno Eom (0 que fazia hum erro de duzentas e sessen- 
ta Jeguas) , cujos moradores, receosos de algum ataque, consentirao que 

zessem os doentes em terra, e lhes forneccrio agua, e€ reforcos: pate 
girdo dalli no dia 10, havendo-se restabelecido quasi todos os enfermo’, 
e dobririo 0 Cabo de Boa Esperanca a 20 de Dezembro, . 

- Com esta mesma Esquadra partirao de Hollanda, com destino a0 
Achem, os navios Aguia Branca, e Aguia Negra, ambos de 600 tone- 
Jadas , ¢ separando-se della, virao a 11 de Agosto a Ilha da Boa Vista 
AS de Setembro encontririo a Esquadra de Van Neck, ¢ navegdrdo uni- 


Tomo 11. I6 


123 


tar-lhe que se chegasse mais perto , porque ho a ou 
visio; mas os da lancha fizerdo cea-voga, e se retirdrao, 
. Qs Hollandezes comegarao entéo a bater a Nao 
com muita furia, matéréo dois homens, cortéra0o o mas 
tro do traquete, e quasi |he destrufr20 as enxarcias, e hy» 
ma bala passou obliquamente o mastro grande. A equi- 
pagem do S. Simao, vendo similhante destrogo em pou- 
cd tempo, desanimou-se,; e€ muitos homens, desampae | 
rando os postos, corrérao 4 borda da Ndo da parte d’on» 
de estava o Caravel4o, para se passarem a elle, e fazere 
se 4 véla, por ser embarcacao mui ligeira. Porém Dio- 
go de Sousa os fez volver a seus postos, ora affrontan- 
do-os de palavras, ora persuadindo-os a defender-se c6- 
mo verdadeiros Portuguezes, affirmando, que para aquel- 
das-duas Ndos bastava a sua. Com effeito a sua arti- 
heria, sendo bem servida, matou muita gente aos Hol- 
dandezes, e lhes fez taes- avarias, que alando-se pelas re~ 
geiras, ficarao pela sua proa, d’onde o podiao offender 
com menos risco. | 7 
O Mestre do S. Simao, homem experto, e habil 
‘marinheiro, metteo na Jancha hum ancorote, e foi dar 
huma espia, sobre a qual a Nao se atravessou, apresene 
tando o costado aos inimigos, e deste modo se batérao 
©8 tres navios por muitas horas, até que a final os Hol- 
Jandezes largarao as amarras por mao, e fazendo-se 4 
véla, fugirdo. 
-. » Os Portuguezes desembarcarao, e apfoveitarao-se 
para a sua aguada das pipas, que os Hollandezes tinhao 
em terra para o mesmo fim; e na Ermida acharfo hum 
detreirg, que elles alli pozerao para as-outras duas Ndos, 
que ficavdo no Achem carregando, em que lhes faziae 
saber, que os Javos os retiverao seis mezes cativos, até 
chegarem outras duas Ndos, que os fizerao pér em liber- 
dade. A raz4o desta prisao havia procedido de que.estas 
duas Ndos forio carregar a Sunda, e todas as patacas 
16 


14 
que levavo ero falsificadas ; e. tendo comprado com d- 


Jas muitas drogas, vierao os Javos a conhecer a falsida- 
de, e prendérao todas os que achdrao em terra, e os 
conservdrao presps quatro, ou Cinco mezes, até que che- 
ga4rao outros dois navios da sua conserva, e derdo aos Ja- 
vos outra moeda de lei. 

Sahidas de Santa Helena as duas Ndos Hollande 
zas , concertarao os Portuguezes a sua Ndo; e a rrinta, 
cinco dias depois da accao, surgio na Ilha a NioSe 
nhora da Paz; aos 3 de Maio a Conceigdo, e a 16 0 
S. Roque com o Chefe da Esquadra D. Jeronymo Cou 
tinho. Neste mesmo dia apparecérao as outras dus 
Nios Hollandezas, que esperavao do Achem; e indo 
demandar o surgidouro, como virdo a Esquadra Port 

ueza, fordo ancorar na ponta da Ilha, onde ficavao a 

Farlavento; e D. Jeronymo preparou-se para as ir ata- 
car, emo vento lhe dando lugar. A’ baca da noite veo 
a Nao S. Martinho buscar a Ilha, e deacobrindo as dus 
Ndaos Hollandezas, cuidou que erao da sua Esquadra, 
e por ndo perder tempo na Ilha, seguto derrota para 0 
Brasil , onde fez agua, e mantimentos na Bahia, e re 
gressou a Lisboa. 
* QQ Commandante das Nios Hollandezas, veado que 
nao havia agua na ponta da Ilha, onde estava , mando 
huma Carta a D. Jeronymo Coutinho, em que the disia: 
99 Que elles erao Christus, e vassallos de hum Principe 
»» amigo da Hespanha,; que erao mercadores , que bee 
9» cavao sua vida pelo mundo; e como tinh4o necesside 
9 de de agua, lhe pedi#o licenga para a mandae faser 
9» nas suas lanchas.»» Respondeo D. Jeronymo, que pois 
erio Christaos, e amigos dos Pertuguezes , fessem ance 
yar junto. delle, e alli fariao agua a sua vontade. 

Os Hollandezes, percebendo a astucia, nao quizerio 
mover-se, e ficdizo alli mais cinco dias;. mas a 25 de 


Maio chegou D. Vasco da Gama coma No S, Ma- 


126 


theus , e a tiros de canhao fez desamarrar os Hollande- 
zes, que de noite se fizerao 4 véla, e desapparecérao. 
‘-Apressou D. Jeronymo a aguada do S. Mattheus, e sahio 
com a sua Esquadra a ver se ainda podia alcangar os 
Hollandezes; o que nao péde conseguir, e assim nave 
gou para Portugal, onde chegou a salvamento. 
1601. — Neste anno (1) determinou ElRei mandar 
4 India duas Esquadras. A primeira de tres Ndos, come 
“mandada por D. Francisco Tello, embarcado no S. Ja- 
.cintho; e os outros Commandantes Sebastiao da Costa, 
‘ma Senhora da Paz; e Constantino de Mello, no S. Ro- 
que A segunda Esquadra, commandada por Antonio 
e Mello e Castro, constava de seis Galedes: O Sao 
. Tiago , em que elle hia; a S. Jo#a0, Commandante Jor- 
er de Moura; o Salvador, Commandante Francisco de 
iranda Henrique; o S. Mattheus, Commandante Dio- 
‘go Paes Castello; o Santo Antonio, Commandante’ Ma- 
noel Paes Viegas; e a Senhora da Bigonha, de que nao 
achei o nome do Commandante. Esta ultima Esquadra 
Jevava gente, municdes, e dinheiro para remediar as ne- 
cessidades , que padecido os Estados da India (2). _ 


. (1) Epilogo de Pedro Barreto. —- Faria, Asia Portugueza. — His- 
toria ‘Tragico-Maritima, tomo 2. . 
(2) Neste anno (vede a citada Colleccé0, tomo 3.) sahirio de Hol- 
Tanda tres Esquadras para a India. A primeira commandada pelo Almi- 
sante Wolphart Hormansen, constava dos navios Gueldres , em que elle 
embarcou , de 250 toneladas; a Zelandia, em que hia o- Vice-Almirante 
Hans Hendricksz Bouwer, de 400 toneladas, o Utrecht , de 240 tonela- 
,das; e os Hiates Gardien, de 1203 e outro de 50 toneladas, | 
A seguoda Esquadsa compunhase dos navios Amsterdam, Enchuise , 
_ Alckmaar, Ledo Negro, Ledo Branco, Ledo Verde , Leio Vermelho, e 
Pombinha; repartida em duas Divisdes, 4s ordens dos Almirantes Van 
Heemsketk , e Joio. Grenier. 
A tesceira Esquadra era composta dos. navios. a Ovelha, em que lee 
vava a sua bandeixa o Almirante Jorge Spilberg; e¢ o Carneiro, Come 
maandante Guion le Fort ; ¢ do Hiate o Cordeiro, commandado por Guir- 


Meesme Jansz. 


(3126 


Como nao foi possivel apromptar ao mesmo ten 


_  SahirZo as duas primeiras Esquadras a 22 de Abril, e a 20 de Asap 
#0 chegdrdo 4 altura do Cabo de Boa Esperanca, bavendo-se na vagem 
separado a segunda. 

Spilberg partio de Hollanda a 5 de Maio, a 29 vio a Madeira, 2 
31 a Palma, da qual se dirizgio a Cabo Branco, que reconbeceo a 4 @ 
‘Junho, e a 10 ancorou ao Sueste de Cabo Verde. Deixando alli os seus 
dois navios, passou para o Hiate, em consequencia de ordens da Com- 
pavhia, e foi a Porto Dale, entdo aberto ao Commercio de todas as Ne 
G6es. Achou neste Porto tres Caravelas Portuguezas mercantes, com 3 
quaes teve hum combate , de que sahio ferido; e na sua retirada os Ne 
gros da terra assaltirio a lancha do Hiate, em que elle hia, e o firrio 
ptisioneiro,, conduzindo-o a Rufino, onde estavio algumas embarcacies 
Francezas , que o livrdrio das maos dos Negros. Recolhido fiualmente 
a bordo da sua pequena Esquadra, voltou com ella a Porto Dale, faa 
se vingar das Caravelas, de que achou sé huma, que tomou, e toram 
e largar por concerto, que fez com alguns Portuguezes estabelecidas 
maquelle Porto. 

Sahio daqui a 20 de Junbo, e a 11 de Julho achou-se a tres legos 
de Rio de Cestos (*), ¢ determinou ir 4 Ilha de S. Thomé a busi 
alguns refrescos ; mas a 26, avistando a Ilha de Anno Hom, ancos 
nella, Para enganar os moradores, disse-Jhes, que tinha licenca d° ERei 
de Hespanha para ir ao Brasil; porém vendo logo descoberta a sua fal 
dade, tentou desembarcar com cento e vinte homens debaixo da pro 
teccdo dos seus navios ; empreza em que foi rechagado. Partio desta Tihs 
a 29, ea 31 vio ade S. Thomé, na qual lhe succedeo o mesma Em 
consequencia destes acontecimentos , atravessou para o Continente, € 3 
3 de Agosto ancorou na Ilha do Corisco. Sahio a 11 para o Cabo delo 
po Gonsalves, em que deo fundo a17. A 30 fez-se de véla, ¢ & 
nalmente reconheceo o Cabo de Boa Esperanca a 28 de Novembro. 

Seja-me permittido dizer aqui por antecipacio, que tendo Spilberg 
affirmado ao Rei de Candia, Que os Hollandexcs erdo os verdadeires 
Christdos , e os que tinhdo o verdadciro Dees nos scus coragées 5 2a 
teceo pouco depois aprisionar no Porto de Matecald , situado na mesas 
Ilha de Ceilao, tres embarcacies mercantes Portuguezas , cujas ecvipr 





(*) Este Rio esta situado na Costa da Malagueta na Jatieude XN. ¢° 
$7'3 e longitude 9° 8’. He muito estreito, e sh capaz de pequenss em- 

cagdes , mas as suas margens sio povoadas de muitas Aldeas, onde ha 
abundancia de arroz , e outros inantimentos: a Costa be por aqui mm» 
to aparcelada. 


127 


po tantos savios, sahirzo successivamente desde 11 até 
27 de Abril; e arribdrao para Portugal as tres Ndos do 
commundo de D. Francisco Tello, e os Galedes Bigo- 
nha, e S. Mattheus. | . 
Antonio de Mello levava debaixo da sua bandeira 
as Frotas do Commercio destinadas para Africa, e Bra- 
sil, que largou nas paragens convenientes; e seguindo 
Viagem com os quatro Gale6es, que restavao da sua Es- 
quadra se apartou voluntariamente na altura das Ilhas 
e Tristfo da Cunha o Galefo Santo Antonio, que se. 
foi perder em Socotora, onde morreo quasi toda a gen- 
te; e o seu Commandante Manoel Paes Viegas, embare 
cando-se para Goa com os que haviao escapado, nunca 
mais appareceo. Os outros tres Galedes forao a Goa. 
1602. — A Esquadra da India (1) foi este anno de 
seis Ndos (2), commandada por D. Francisco Tello, 


gens chegavioe a cem homens, rela maior parte marinheiros Indios. Des- 
tes recebeo elle a seu bordo alguns, que acceitario o servico Hollandez < 
dos outros mandou huns poucos de presente ao Rei de Candia, inimi- 
go capital dos Portuguezes, ¢ mandou deitar 0 resto ao mar. Tal he 
©-facto narrado no Jornal de Cornelio Jansz Vennip, PHoto do seu pro- 
prio navio. — Vede a mesma Colleccao no tomo 2. jd citado. 
_ €1} Faria, Asia Portugueza, —— Epilogo- de Pedro Barreto, 
- (2) A Companhia Hollandeza mandou este anno 4 India. huma Es 
adta de quatorze navios, e hum Hiate, commandada pelo. Almirante 
W ybrandt Van Waarwik (vede a citada Colleccéo , tomo 21), tendo 
por Vice-Abmirante Sebalde de Weert ; os navios eri0; © Mauricio (ens 
gue hia o Almirante) de 800 toneladas; a Zelandia, de 800 tonela- 
das; @ Hollanda, de 700 toneladas; o: Nassau, de 680 toneladas; o Sal, 
de $00 toneladas; a Lua, de 500 toneladas; o [lessingue, de 500 to- 
meladas; o Erasmo, de 500 toneladss; o Jardim de Hollanda,. d 400 
soneladas ; a Estrella, de 360 toneladas; a Virgen de Enchuwise, de 340 
toneladas; o Ganso ,. de 280 toneladas; a Coneordia, de 240 tonelas 
@as; o Rotterdam, de 260 toneladas 3 e o Hiate Pombinha, ce 50 to» 
neladas. Estas embarcacdes hiao bem artilhadas, e levavao mais de mil 
homens, | 
A 13 de Maio sahio primeiro de Hollanda o Vice-Almirante Wee 
coon tres navios, @.a 17 de Junho o Almirante Waarwik com ¢ reste 


128 


embarcado em a Ndo S. Joo; e os outros Commandan- 
tes Sebastiao da Costa, na Senhora da Paz; Sebastizo 
Macedo de Carvalho, no S. Francisco; Constantino de 
Mello, no S. Roque; Vicente Paes Castello Branco, 9 
S. Mattheus; e Vicente de Sousa, no Galefo Conceicio, 

Sahio a Esquadra de Lisboa'a 25 de Margo, e che 
gou a Goa no mez de Setembro. . 

Determinando-se em Goa (1), que 0 GaledoS. Tia 
go voltasse carregado para Portugal (ainda que consmi- 
do para a guerra), deitarao-lhe hum entrecostado para 
o fortificar, e metterao-lhe no porao quatro mil quit 
taes de pimenta, e nos baileos, coberta, convéz, tol 
da, tombadilho, e até dentro da lancha, e 4 roda doce 
brestante er2o tantos os caixotes, e fardos a cavalete, 
que nao podia passar hum homem entre elles; e ainda 
nao satisfeitos desta espantosa carga, pozerdo fardos, e 
camarotes de vento nas mezas , e em posticas armadas 
por fora do costado , de maneira que o Galeao vinha en- 
terrado no mar, e era impossivel marear oO panno em 
qualquer momento critico. Em recompensa nfo tinha 
partido da India desde muitos annos hum navio tio im 
portante. 

A 25 de Dezembro de 1601 sahio Antonio de Mel- 
lo e Castro no Galedo com perto de trezentos homens, 
entre marinheiros, soldados , e escravos; e além destes, 
vinhdo trinta Fidalgos , e pessoas nobres , como ero D. 


da Esquadra. A 24 de Julho descobrio a Madeira, e€ a 3 de Agosto 3 
Ilha da Boa Vista, A 23 achou-se junto a0 Cabo das Palmas, e a5 de 
Setembro reconheceo a Ilha de S$. Thomé, que néo péde tomar, A1} 
vio o Rio de Gabio, e a 24 ancorou no Cabo de Lopo Gonsalves, pm 
ra fazer agua. Sahio a 28; a 11 de Outubro chegou d Iiha de Ano 
Bom, onde por forca de armas, e com perda de gente, fez seuada, co 
Iheo algumas fructas, € queimou , e saqueou tudo quanto pdde alcapar. 
Largou desta Ilha no dia 21, ¢ a 12 de Dezembro dobrou o Gabo ds 
Boa Esperanca. 

- (1) Vede a Historia Tragico-Maritima, tomo = 






































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‘332 


consequencia expedio logo huma lancha com hum trom 
beta a fallar aos Portuguezes, e foi-se entretanto fazen- 
do 4 véla com a sua Nédo, e mais outra, deixando a ter- 
¢cira no ancoradouro. A lancha fallou de largo, sm 
ge perceber o que dizia, e retirou-se logo, porque isto 
era artificio para entreter 0 Galedo, que foi dar fundo 
no Esparavel , onde ao mesmo tempo surgirao as duss 
Nios Hollandezas, que forgande de véla, baviao ganbs- 
do barlavento, vindo com bandeiras, e famulas, cocan- 
do as trombetas, com a artilheria fora, e morres acce- 
sos. SimZo Peres, Mestre do Galeio, bradonu a Anto- 
nia de Mello, que n4o consentisse os inimigos naquelle 
lugar. Antonio de Mello atirou-lhes bum tiro, a qe 
elles respondérdo com toda a artilheria, e@ assim se nx 
vou huma furiosa batala a tio de arcabuz, arma de 
que os Portuguezes usirao todo o dia, mas com poun 
effeito, porque dos inimigos nao apparecia pessoa algu- 
ma descoberta , pers boas trincheiras que traziaZo. Ver 
do Antonio de Mello, que na posicdo em que estara, 
Ihe nao servia huma parte da sua artidherie , 
dar huma espia em terra pela pops com que @ Galeio 
Se atravessou; e Sentindg os Hollandezes oe damno,; # 
fizerdo 4 véla, e no outro bordo vierao- surgir em tal 
sicio, que hum dos seus navios ficava pela prda do Gz 
lefo. ‘Com esta vanzagem pelejirao todo o. dia, haver 
do de. parte a parte muitos mortos, e feridos, entre os 
uaes foi hum Francisco. de Mello e Castro, que estat- 
@ no. convéz apontando huma pega, cufa guarnigio o 
tinha desamparado, recebeo treze mortaes feridas, e per 
deo hum olho pelos estilhacos que levantow huea bala, 
que atrayessou os costados. E estando cahido sem accor 
do, querendo D. Pedro Manoel encobrir a sew pai este 
triste successo, nado pode, porque como elle acudia 2 to 
das as partes, veio logo alli, e cuidando que o filho o 
taxa morta, leyantou a voz, e disse: Sesbares , abt 











148 


Carrio; e os outros Commandantes D. Luiz de Souss, 
tha Salvacio ; Pedro de Tovar, na Oliveira ; Miguel Cor- 
rea Baharem , na Ajuda; Christov4o de Sequeira Alra- 
renga, na Palma; e D. Pedro Mascarenhas, na Conceicéo. 

Levava o Vice-Rei debaixo da sua bandeira outra 
Esquadra de seis Galedes, e duas Urcas , destinada pera 
ficar servindo na India, a qual era commandada por D. 
Christovio de Noronha , que hia servindo de Almirante 
no Galedo Santo Antonio; e os outros Commandaste 
erfo Diogo de Sousa de Menezes em outro Galeio da 
invocac#o de Santo Antonio; D. Diogo de Almeida, no 
S. Bartholomeu; Francisco Pereira Sodre, no Bom Jess; 
Manoel da Silva da Cunha, no S. Joo Evangelist; ¢ 
D. Constantino de Menezes, no Santo Espirito. Ma- 
foet de Frias commandava a Urca David; e Manoel 
de Matos,-a- Urca S. Marcos. 

Esta Esquadra navegou com pouca ordem, como 
fazido quasi todas. A Ndo Conceicgao, e o Galedo Seno 
Espirito arribarao. O Vice-Rei falleceo de doenca no dia 
15-de Maio, e o seu corpo foi remettido para Porter 
na Urca David. Em consequencia tomouw D. Christorio 
de Noronha o commando em chefe das duas Esquadrs, 
e mudou a sua bandeira para a Nao Monte do Carmo, 
fa qual invernou eth Mogambique, 0 que tambem fne- 
r8o os dois Galedes do nome de Santo Antenio, o Sio 
Bartholomeu, e a Urca S. Marcos; que todos no anno 
seguinte passirdo a Goa. As Naos Salvacdo, e Palms 
naufragarao, a primeira junto a Mocambique, e a sepun- 
da em Angoxa , salvando-se a gente de ambas. A Nio 
Ajuda perdeo-se na Costa da Mina, por ma na vegacao. 
A Néo Oliveira foi incendiada pelos Portuguezes nos 
Ilheos Queimados , para evitar que a tomassem os Hol- 
Jandezes, como tomario o Galeio Bom Jesus deffonte de 
Mocambique. Na torna-viagem foi a pique em Ceiléo 
© Galeao S. Bartholomeu. j 


148 


tres Ndos; commandada por D. Antonio de Atzide, na 
Guadalupe; ¢ os outros Commandantes Antonio de Mes- 
donca, no S. Filippe; e Francisco Correa , na: Piedade, 

Sahio de Lisboa a 20 de Margo: a Ndo Piedade 
chegou 2 Goa a 9 de Setembro, e as outras duas a 12. 

A 3 de Outubro parrirdo de aviso para a India duas 
Caravelas: o Santo Antonio. commandada por Antosio 
‘de Abreu , com destino a Malaca; e a Esperanca, Con 
mandante André Coelho, para Goa, onde chegérao am- 
das em Maio do anno seguinte, havendo invernado em 
Moca mbique. 

. & 17 de Novembro sahio de Lisboa o Galego Sio 

Jo&o Evangelista, Commandante Antonio Pinto da Foa- 
ceca, com o novo cargo de Visitador das Fortalezes da 
India: invernou em Mocgambique, e em Setembro do 
anno seguinte chegou a Goa. 
- 1612. — A Esquadra deste anno (1) -foi de tres Néos, 
commandada por D. Jeronymo de Almeida , embarcads: 
em a Nazareth; e os outros Commandantes Christovio 
de Sequeira Alvarenga, na Senhora do Carmo; e D. Luiz 
da Gama, na Senhora do Cabo. 

Sahio a ro de Abril D. Luz da Gama, invernoe 
em Socotord, onde Ihe morrério de enfermidades qu: 
trocentos homens. As outras duas Ndos chegar3o a Goa 
em Setembro; e na volta para a Europa combatério na 
Ilha de Santa Helena, com quatro navios Hollanderzes, 
de que mettério hum a pique, e vierio a Lisboa a sal- 
_ yamento. 

1613. — A 29 de Janeiro (2) partio de Lisboa com 
avisos para Malaca o Patacho Senhora dos Remedios, 
commandado por Belchior Rodrigues Cardoso, que che- 


(1) Epiloge de Pedro Barreto. — Faria, Asia Portusueza 
(2) Epilogo de Pedro Barreto. — Faria, na Asia Portuguen d+ 
wersifica de Barreto. 





























; 967 


| ‘as 


. Panpenge peouundegeraviva Peis Se SAU Fal 
abt t-emovg sath ss euepmnase ch arteee Natinw: 








r bs gual achou w'aito pe 
ie 





168 


pelo Cavalleiro de Racily, e cem Indios frecheiros, 
com a artilheria necessaria para formar o sitio do For- 
te. : 
Jeronymo de Albuquerque partio logo com o Ea 
genheiro Mor, 0 Capitio Manoel de Sousa d? Ega, se 
tenta e cinco Soldados, gente escolhida , oitenta frechei- 
ros Portuguezes, Soldados velhos costumados ds guer- 
ras do Brasil, ¢ alguns Indios. Ficou no Forte o Capi- 
tio Manoel de Brito Freire com trinta Soldados, e ma- 
rinheiros, e todos os doentes. Dingo de Campos mur- 
chou pela praia com alguns Portuguezes, e cem Indios 
commandados pelo valente Capitio Madeira, ao qua 
ordenou, gue quando o visse accommetter de frente os 
inimigos , atacasse os Indios que !hes cobrido o flanco; 
€ ao mesmo tempo chamou do Forte o Capitgo Grego- 
rio Fragoso com a sua Companhia, de que formou hum 
pequeno corpo de reserva, mandando-lhe, que seguisse a 
retaguarda dos seus Indios, para lhes dar calor, e apoiar 
© ataque do flanco. 

Feitas estas disposic¢6es, esperava Diogo de Cane 
pos que Jeronymo de Albuquerque comecasse o assalto 
do monte, quando vio saltar na praia hum Trombers 
Francez, que trazia huma carta de Mr. de Ravardiere, 
e abrindo-a, achou que era huma intimag4’o a Jeronymo 
de Albuquerque, para se render no espago de quartz ho- 
ras. Chegou logo o Alteres Manoel Vaz de Oliveira, 
enviado pelo General a saber o que buscava o Trombe- 
ta; e Diogo de Campos, mandando-lhe explicar a sub- 
stancia da carta, accrescentou, que principiasse a acsio, 
como estava assentado, que clle hia fazer o mesmo. Je- 
ronymo de Albuquerque marchou aos Francezes com 
grande coragem, e Diogo de Campos assalrou as trin- 
Cheiras da banda da praia cdém tanto vigor, apoiado pé- 
los Indios, do Capitao Madeira, e pelo ataque de flaa- 
co do Capitde Fragoro, que os Indios inimigos que a8 

















- 
1 


i 





. _ 


tures 


| 


176 
ez-3= t2e 2 tio de pistola da N4o’S. Julito, ea salvou 


om tages ce trombeta, a que lhe respondérdo com igual 
witet zi: 2. | 

O Akc:rante Hollandez enviou entZo hum escaler 
z sez ferdo, requerendo que D. Manoel. de Menezes 
ate ‘oss: fallr. Escusou-se elle, e havendo mandado 
cz=tem bem Official a bordo do navio -Carlos , este 
Sz:240 cegressou Ihe disse em publico, que qualquer 
rccriles mavios era capaz dé sé bater com a sua Ndo, 
c2 22 D. Maaoel o reprehendeo asperaimente. O resii- 
acy Jestas mensagens foi travar-se hum furioso comba 
te. re crincpio do qual huma bala de arrilheria partio 
mig meio o Almirante Hollandez. Soccedeo-lthe o su 
smccadizto no commando do navio, que depois de meia 
bee2 de acgio, se retirou do fogo, e fez signal de cha- 
vs2z 2 comviho. AjuntarZo-se a bordo do Carlos os or 


ses Com:-eancantes, e instalarao por Almurante o C2 
riko Hear-eze. 


etreranco continuou D. Manoel a-sua- navegac20; 

© como era ii noite, accendeo farol aos Hollandczes, 
cue o semnrio, ¢ foi dar fundo na Ilha de Mohilia (1'. 
Qs HeNinwezes ancorario proximos delle. No dia se 
sive andre a tande, havendo reparado’ do modo poss 
rer zg avarias da sua Nao, se fez 4 véla, e apds delle 
es Hetusteres; e anoitecendo, accendeo D. Manoel o 
Sr. TAO], COAIO que Os provocava ao sepuirem. Pela 
wr- =i travan-se hum porfiado combate, em que os fa- 
tics Hoaxleres se revezavio huns aos outros. Em bre 
we acusa de rempo o novo Almirante recebeo huma fe 
-cx snoctet; ¢ 0 Master, e alguns marinheiros for 
eoctos Durou esta desigual batalha até ds tres horas 
Sz tance, @R achanio-se a Ndo S. Juligo sem mastros, 








em — 


amar 9. he fi eee ae! a 


a 


et gas CaF ~ =. 


: Para Nt en omar Banc 


doieShei Prwbte 2 ye 
a. hel 1h ales 





¥78 


Dangaips pars: transportar os-naufragantes a Mocambi- 
que ,.e Ihés fea resticuir joias mui vicas das que tinkéo 
salvado; Ensbercou finalmenre D. Manoet noe dois Pan- 
grice, ie@-passou 2» Mocambique, onde ancorou..a 4 de 
tembro ; e dalli foi a Goa emvoutras embareagrées, 
- 36U7.: +i Bsee anno (1) foi pasa Vide-Rei da Iaiis 
o Conde doRedondo -D. Joto- Coutinhe.: Constava a sua 
Esquadra das Néos: Penha de Franca, em que elle em- 
barcou; a Guia, commandada :por Nuno Alvares Bote- 
Iho, que servia de Almirantes a Senhora do Cabo, Com- 
mandanee Lancarote da Franca de Mendonca; e 0 G2- 
leSo::Santo Antonio , Commandante JoZo Pereira Corte 
Real; huma Caravela, commandada por D. Jodo de Al- 
meidas e hum Patacho, de'que era Commandant D. 
Nuno Soutomaior. te , 

Suhio-de Lisboa 0 Vice-Rei a 21 de Abril: save- 

Esquadra -espalhada, mas toda entrou em Goa de- 
ie 20 de Outubro at¢:17 de Novembro , menos o Pate 
cho, que da alrura do Cabo de Santo Agostisho arribor 
para Portugal. 3 oT 

1618. — A uadra da Indra (2) fot este anno de 
tres Ndos, ¢ duas Urcas, commaridada por D. Christo- 
vo de Noronha, embarcado ema Ndo S. Carlos. Qs 
outros Commandantes de Ndos erao Jo#o Rodrigues Ro- 
x6, que servia de Almirante; e Jo#0 Soares Henriques. 
Commandava a Urca S. Francisco, D. Luiz de Menezes; 
e: Manoel Ribeiro a Urca S. Sebastiao. 

Sahio a Esquadra a 16-de Abril, e navepou derra- 
mada. A Urca S. Sebasti&o encontrou sobre a Itha de 
S:. Lowrenco seis navios Inglezes, que a aprisiondrdo; e 
sabendo gue pertencia 4 Esquadra da India, ficdrdo alli 
cmzando até que appareceo D. Christovio de. Noronha. 


(1) Epilogo de Peden Barreto. — Faria, Asia Portugueza, 
(2) Epilogo de Pedro Barreto. — Faria, Asia Portuguesa 











arro 


$- wat a 





180 
" Wedas; forriecidas de viveres. para dez mezes, armada ca: 
Ua hinma’ de quatro canhées , quatro pedreiros , trinta 
Mosquetes;vinte prqtes, cas muni¢Ges hecessarias. Con- 
efava 4 equipagem de cada huma de qtrarenta marinhe- 
ros todos Portuguezes, sem levarem soldado algum, aos 
quaes se pagdrio dez mezes de soldo adiantados, Hiio 
por Pilotos’ ioge Ramires de Arellano , que depois foi 
Cosmografo, ¢ Piloto Mor; e Joio Manco, ambos Hes- 
anhoes. Chamou-se a primeira Caravela , Senhora da 
tocha, ea segunda Senhora do Bom Successo. 

A 27 de Setembro deste anno de 1618 sahio de 
Lisboa o Capitio Bartholomeu Garcia com as duas Ci- 
ravelas , e navegando. ao S.O. com ventos do quadran- 
te do N.E., achou-se no dia seguinte raxado junto a0 
calcez o mastro grande da Caravela Bom Successo, cuja 
' avaria remedidréo enrocando o mastro com vergontess 
de sobrecellenre 

A 30 pela manha avistdr4o a Ilha de Porto Sante, 
havendo sempre seguido o rumo de S.O.- Logo 
montarfo a Ilha, forfo a O.S.O. até passarem a Me. 
deira , que tornio ao S.O. até ao 1.” de Outubro, 
que ao meio dia achdrao 31° 40’ de latitude. A 2 n2- 
vepirfio ao S. 4.S.0., e a0 $.S.0., vento constante 40 
N.E., e tiverao de latitude 30° 40’. . : 

A 3 virdo a Ilha da Palma, e navegdr4o pelo rumo 
de S. 4.8. O. até ao dia 10, que trverao de latitude 13° 
e 40’, e julérao demorar Cabo Verde a E.4.N.E., e 
a Ilha de S. Tiago a O.N.O. Continuérao o mesmo 
rumo a rr com o vento N.E., ¢ achdérao zx° 30) de lz- 
titude. 

A 12, passando a noite ao S.O., navegdrzo 20 
S.S.E., ¢ assim continudr§o até 14, que tiverao 8° 48! 
de latitude. A 15 fordo a0 S. 4.8.0. com vento O. bo 
nanca. A 16 navegario ao S. com vento O.S.0O., ¢ 
observdrao 5°55’ de latitude. Até 20 achdrde venms 








388 


§3° 13’), que-se communica.com o Estreito de Maps- 

Zes.. A 22 entrarfo. -no Estreito de le Maire, a gee 
pozerfo nome de S. Vicente, e por elle continuarao pz 
ra o Sul, desembarcando algumas vezes para commuai- 
ear com os indigenas, aos quaes virao Comer hervas, ¢ 
sardinbas cruas. 

o 1.° de Fevereiro estavao em 56° de latitude, 
tempo muito escuro, e no dia 5 pela manhda virao 0 G- 
bo de Horn (em 55 56’); em distancia de cinco lepus, 
e lhe derao o nome de Santo Ildefonso ; tiverZo a0 meio 
dia de latitude 55° 50’. Continuando a sua derrota 20 
Sul, descobrirao no dia 10 a Ilha de Diogo Ramires 

em 56° 40’). A 138 estavdo por 58 30’ de latitude, 
"onde navegdrao a rodear a Terra do Fogo pela parte 
de Oeste, para entrarem no Estreito de Magalhies pe- 
lo mar do Sul;-e no dia 25 reconhecérao o Cabo Dese 
jado (em 52° 50’), € os quatro Evangelistas (em 53° 
23’), e embocdrdo o Estreito com vento Oeste mui fer- 
te. Dalli forao registando todos os Portos, e Bahias do 
Estreito, ancorando muitas vezes; até que no dia 12 de 
Marco sahirdo pela banda de leste, e derao fundo no 
Cabo das Virgens, collocando-o na latitude de 52° 24. 
A 13 pozerdo-se em derrota para a Europa, ea 
28 de Abril, estando em 9° 17’ de latitude Sul, virao 
de noite a terra, ¢ sondarao em 30 bragas; a 30 derao 
fundo em Pernambuco em 16 bragas, € no outro dia fo- 
rao ancorar no Recife, sem haver fallecido hum sé indi- 
viduo a bordo das Caravelas. Achdrao aqui surtos vinte 
e,oito navios Portuguezes, e poucos dias depois chegé- 
rao da Bahia outros treze: a 14 sahirao todos juatos 
em Frota para Portugal ; e como entre elles vinhao em- 
barcagdes ronceiras, que demoravao a viagem, separa- 
rao-se as Caravelas no dia 28, e seguirao sds sua. der- 
rota. 
A 23 de Junho, estando ja em mais de 38° de Ie 


194. 


mandada por Nuno Alvares Botelho, embarcado na Nio 
Paraiso; os outros Commandantes erao, Diogo de Mello 
e Castro, na Penha de Franga; Pedro dé Moraes Sar- 
mento, no Santo Amaro; e D. Francisco Lobo, em ou- 
tra Nio. | 

Sahio a Esquadra de Lisboa a 21 de Marco, e arm 
ribou D. Francisco Lobo. A Nido Santo Amaro per- 
deo-se em Mombaga, salvando-se a gente: na mesma 
Ilha invernou Nuno Alvares; e sé Diogo de Mello che 
gou a Goa a 15 de Dezembro... 

1621. — Neste anno (1) sahio de Lisboa D. Affonso 
de Noronha, nomeado Vice-Rei da India, com huma 
Esquadra de quatro Naos, e seis Galedes. Erio Com- 
mandantes das Naos D. Francisco Lobo , na Conceigio, 
onde embarcou o Vice-Rei ;.D. Francisco Henriques, 
servindo dé Almirante, no S. Thomé; D. Rodrigo Lo 
bo, no S. Carlos; e Nuno Pereira Freire, no S. Jost. 
Commandavao os Galedes Antonio Telles, na Trinda- 
de; Gonsalo de Siqueira, no S. Salvador ;. Francisco So- 
dré Pereira, no S. Pedro; Francisco Cardoso de Almet- 
da, no Rosario; Luiz de Moura Rolim, no S. Joao; ¢ 
Gonsalo Rodrigues, em outro. . 

Partio a Esquadra nos principios de Abril, e logo 
que sahio a barra, teve hum temporal, que a forgou a 
entrar. Desembarcou o Vice-Rei, e ficarao em Lisboa 
quatro dos scis Galedes da Esquadra; Os outros navios 
sahirdo outra vez a 29 de Abril; e mettendo-se na Cos 
ta da Malagueta, achdrdo tantas calmarias, que depois 
de perderem muito tempo, sem poderem avancar cam 
nho, arribarao a Lisboa. O unico Gale#o de Gonsalo 
Rodrigues, que quando os outros navios sahirao, ficou 
na Trafaria .com os mastros cortados , e sahio depois 
delles, foi o que passou 4 India. | | 


(1) Epilogo de Pedro Barreto, 


596 


quando foi a metter-se dentro, estando o Commandan- 
te ao pé do cabrestante, que virava , rebentou a espia, e 
desandando o cabrestante, huma barra delle matou o 
Commandante, que na vespera se havia confessado, e fe- 
to testamento. 7 
‘Por sua morte foi eleito D. Luiz de Sousa. Gas- 

tarao-se oito dias em fazer aguada; e sahindo com ren- 
to feito, navegarao até aos Agores, onde lhe deo bum 
temporal , com que estiverao quasi perdidos na Ilha do 
Faial. Acalmando o tempo, forio 4 Terccira, e pai 
rando em papafigos, escreveo D. Luiz ao Governador, 
pedindo-lhe mantimentos, Soldados, e Artilhciros, que 
de tudo vinha faltro. Os mantimentos, e refrescos vier20 
em abundancia, mas em lugar de Solfdados, mandarao 
homens inuteis, huns. por muito mogos, e outros 
muito velhos; e nenhum trazia armas. Chegdrdo nesta 
occasiao duas Caravelas de aviso, com Cartas d’ ElRa, 
que dizido: «« Viesse a Nédo em estado de guerra buscar 
99 a altura de 39 go’, pela qual acharia a Esquadra de 
x9 D. Antonio de Atatde, que a estava aguardando; ¢ 
99 que navepasse com cautcla, porque se tinha noticia de 
x9 andar fora huma Esquadra de ‘Turoos. »9 

Partio D. Luiz-da Terceira, e em sere dias yio as 
Berlengas pela meia noite, e quasi rendido o quarto dal- 
va, estava perto da Ericeira, quando se ouwo hum re- 
mor de gente, que fallava; e cuidando todos achar-se 
no meio da Esquadra de D. Antonio,‘e estando-se talio- 
gando as amarras para irem dar fundo em Cascaes, fo- 
rao descobrindo com a luz da manh&a dezesete navios 
grandes, que logo percebér30 nao ser a E:squadra Portu- 
gueza, mas cuiddrio que seriao navios carregados de 
sal, que vinhao de Setubal. 

Estes navios erao ‘Turcos, que havia quatorze diss 
tinh’o sabido de Argel, todos de 34 a 40 pegas, os quacs 
sabendo que aquella Ndo era da India, pela informa 


198 
Fureas abordérao a hum tempo por todas as_ partes, 


disparando primeiro as suas pegas Com assaz damno cas 
Portuguezes, porque matar’o o Condestavel , que dirigia 
habilmente a artilherig, e D. Luiz recebeo duas feridas 
em huma perna, na qual nao: podendo sustentar-se, dei- 
fou-se sobre huma caixa, e dalli dava as suas ardens. 

. °© Os Turtos recebtrio tanto estrago da artilkeris, so- 
bre tudo das balas encadeadas, e de alguns peés de ca- 
bra, com que os Portuguezes thes atiravaa , que se afis- 
tario da Nao ; porém Agan-Arraes ,.rencgado Grego, 
gue commandava hum dos maiores navios, e era conhe- 
cido pelo homem mais valente de Argel , vendo o seu 
navio desarvorado, e em termos de ir a pique, pelos 
muitcs rombos gue tinha, saltou dentro da Ndo com a 
‘sua gente, que erdo quatrocentos Turcos, e Mouros ¢s- 
colhidos, levando na mao a bandeira encarnada, que 
trazia.na pdpa., e ganhando o Castello, péz nelle a sus 
bandeira, e¢ comegou a deitar huma chuva de balas, ¢ 
de frechas sobre os Portuguczes, que defendiao o con- 
vez, e a tolda; e outro renegado, natural de Setubal, 
subindo pela enxarcia do traquete, corrou com huma 
" machadinha todos os cabos da verga, a qual cahindo de 
subito , esmagou quantos Turcos apanhou debairo. En- 
trctanto os mosqueteiros Portuguezes , que atiravao 40 
castello , nao perdido tiro, por estarem os Turcos api- 
nhoados , sem poderem dalli sahir; e dois que o inten- 
taro, forao logo mortos. 

Os Turcos vendo diminuir acada instante o seu nu- 
mero, € que o seu navio ja tinha ido a pique, e os o0- 
tros combatiao de largo, Comegarao a capear-Ihes .que os 
soccorressem , 0 que fizerao , mandsndo escaleres para os 
recolher,. Mas antes que chegassem, os Portuguezes ata 
cirio o Castello com grande vigor; e ainda que deses- 
peradamente rechacados por duas vezes, 4 terceira os rre- 
cipitarao so mar, ficando dentro hum sd, que se rendeo. 


200 


e com as ancoras promptas para dar fundo, quando veio 
de terra hum barco 4 véla, com tres homens do mar, e 
chegando 4 falla, disse hum delles, que trazia ordem 
verbal (nao se sabe de quem), para que se fizessem lo- 
go na volta do mar; porque a Costa naquzlle tempo era 
perigosa, e ao largo acharido a Esquadra de D. Anto- 
nio de Ataide, que os andava esperando. D. Luiz cha- 
mou o barco, para lhe deitar a bordo as mulheres, e me- 
ninos, e alguma pedraria, visto que no bordo do mar 
hia encontrar os inimigos; mas os do barco responde. 
rao, que trazido ordem para nao chegar a bordo, sob 
pena de morte; e logo metteo de 16, e se foi embora. 
Fim consequencia desta intimagao , virardo no mar, 
e pelas oito horas da manha do dia 1r de Outubro avis 
tdrio os inimigos, de que D. Luiz nao julgou acertado 
fugir, tanto..por obedecer 4 ordem,-e ‘na esperanga de 
apparecer a Esquadra Portugueza, como por nao dar 
maior animo aos Turcos, cusos navios, sendo mais ye- 
leiros , os alcangariao em breve. . 

Posta novamente a Nido Conceicdo em som de com- 
bate, porém com visivel falta de gente, sobre tudo de 
Artilheiros, D. Luiz, sem causa alguma., mandou por 
hum Polaco cortar a cabega ao Turco, que ficdra pri- 
sioneiro, dizendo-lhe, que havia pagar o mal, que os 
seus Ihe vinhZo fazer. Os Turces, sabendo depois esta 
acc4o, nao se vingérdo delle, nem do Polaco. 

A Esquadra Turca, composta de dezeseis navios, 
com a sua Capitanea em testa de columna, e formada . 
em linha, veio com forga de véla. buscar a Ndo por bar- 
lavento; e a Capitanea , que trazia huma_ bandeira bran- 
ca, chegando a tiro de canhao, disparou hum tiro sem 
bala , ao qual a Conceigfo respondeo com outro de ba 
la; e logo comegou a fazer fogo. Os Turcos seguirio 
© mesmo bordo, e virando depois sobre ella, arriou a 
sua Capitanea a bandeira branca, e carregou papafiges, 


208 


de tres Nios, e cinco Galedes,, commandada por’ D. An- 
tonio Tello , embarcado em a Naéo S. Francisco Xavier, 
que 4 vinda se perdeo na barra de Lisboa; e das outras 

as Ndgs-er4o Commandantes: D. Diogo de Castello 
Branco, que servia de Almirante, da Santa Isabel; e 
Francisco Correa da Costa, de outra Ndo. Os Comma 
danres dos Galedes erao D. Filippe Mascarenhas, do 
Santo André; Francisco Borges de Castello Branco, da 
Misericordia ; Cosme Cassao de Brito, do S. Braz; An- 
tonio de Freitas Mascarenhas, do S. Simao; e Manoel 
Pessoa de Carvalho, da Guia. 

Sahio a Esquadra de Lisboa a 2 de Marco, ¢ rere 
desgracada viagem. Manoel Pessoa perdeo-se na Costa 
da Arabia. D. Antonio Tello, e Francisco Borges in- 
vernarao em Mogambique, e€ no anno seguintre fordo4 
Goa. D. Diogo de Castello Branco, Cosme Cassio, e 
Antonio de Freitas perderao-se em Mocambique; ¢ 
passirio este anno 4 India D. Filippe Mascarenhas, e 

rancisco Correa. 

1623. — Neste anno se constituio na Hollanda 4 
Companhia Occidental, cujo objecto cra fazer conquistas 
no Brasil, sobre tudo naz Provincias de Pernambuco. e 
Bahia; porque se julgava que cstabelccendo nellas boas 
Colonias, e gdnhando a affeicio dos habitantes, se po- 
deriao dalli fazer expedigces ao Mar do Sul, e ds Indias 
Occidentaes. 

Concorrér30 para o estabelecimento desta celebre 
Companhia, e os planos de invas20 que ella meditou, as 
_ informacées que obtiverao os Commandantes dos navios 
Hollandezes nos doze annos da tregua, que em 1610 
concluirio os Estados Geraes com ElRei Filippe IIL, 
em cujn epoca frequent4rao elles muito as Costas do 
Brasil , como jd observei nestas Memorias; e tambem 3s 
insinuaydes dos Judeos, que a imprudencia do Governo ti- 
nha deixado estabelecer nas Cidades maritimas daquelle 


2k0,¢ 


Caste Reat;.¢ S; Joie, por-Sebastiao’ da Coste Vatente,- 
Sano Antonio , por oe Seaetile tie, Menezes; 0 Sin: 

Jago, por Simao, yenial; a Conceiga r Frea-- 
cisce de Tavord da Cunha; 60S. Pedro por Ferman. 
do da Costa de Lemos. Cincg destes Galedes devido fi- 
Car servinda -na India. | -_ | on 

Sahio de Lisboa a Esquadra a 18 de Margo, e che 

gou. reunida a Goa, nos principios-de Setembro, 

Na rorna-viagem o Galeag Conceigao ancorou na 
Ifha de. Santa Helena tdo aberto,-e arruinado, .que ar- 
mando a lancha em Patacho, a.enviou com. aviso 4 G- 
dade da Bahia, d’onde se mandou buscar a gente, ¢a 
carga, como adiante. direi. a 

1624. — Decerminada a Companhia. Occidental de 
Hollanda (1) a invadir o Brasil ; comegande. pela Cida-- 
de da Bahia, ou S, Salvador, que ‘era. ent&o. a Capital 
daquelles riquissimos . Paizes ;:aprestou. huma Esquada 
de vinte e cinco navigs, dos quaes treze ergo de guerra, 
e.doze afretados, todos bem armados, e guarnecidos com. 
tres mil homens. escolhidas, entre marinheiros , e solda- 
dos, e¢ abundantes munic6es de’guerra. Era General em 
Chefe da Expedigdo Jacob Willekens , Official de muita 
experiencia nas gucrras de Flandos,; Almirante o famoso 


(1) Para o que respeita 4 conquista, e restauracio da Bahia, vede 2 
Historia da Guerra do Brasi] , escrita em Italiano pelo Padre Fr. Jodo 
Jose de Santa Theresa (Portuguez) , imptessa em Roma em 1698, Par 
te-3. Liv. 3. —- Portugal Resaurado,:Tomo 1. Liv. 2, — Historia 
da Guerra Brasilica, por Francisco de Brito Freire, Livros a,, ¢ 3. — 
Historia do Brasil, por Roberto Southey, Inglez, Tom. 1, Cap. 14. — 
Compendio Historico de la Jornada d'el Brasil, manuscrito, feito em 
1626 por D, Jo%o de Valencia e Gusm30, que servio como Volunuatio 
na Restauracdo da Bahia. — Faria © Sousa, Europa Postugueza, Parte 2, 
Cap. 3. — Jornada dos Vassallos da Coroa de Portugal pasa recuperar a 
Cidade de S. Salvador, pelo Padre Bartholomeu Guerreiro, Lishoa, 1625. 
— Relacio verdadeira de tudo © succedido na Restauracio da Bahis, 
mandada pelos Officiaes de Sua Magestade a este Reino, Lisboa, 1625. 
-— Castrioto Lusitano, Paste 1. Liv. 1, 


214 


podito ser alli anniquilados. Era‘ isto-j4 ao anoitecer, ¢ 
os soldados Hollandezes, cangados, e abatidos do calor, 
e quasi todos bebados , -ow'-se deitavao a dormir, ‘ons 
espalhavao a buscar agua; de maneira, que se aquella 
foite os atacassem duzentos homens resolutos, nem hum 
96 escaparia. : 

Os navios Hollandezes, que batizo a Cidade, o fize 
rao com grande furia , e ainda que os Portuguezes respon- 
dido ao seu fogo, este era tio superior, que todas as for- 
tificagdes ficarao desmanteladas , e algumas embarcacées 
tomadas , e outras queimadas. Restava’ o Forte novo, 
que os Hollandezes assaltirao nessa noite, e ganharao fe 
cilmente, morrendo vinte dos defensores : depois encra- 
wd4rdo as pecas, e recolherao-se a borda. Os Portugue- 
zes , vendo-os retirados, torndtio a occupar o Forte, gue 
o Governador mandou abandonar, vendo -impossivel 2 
sua conservagao. 

No dia seguinte 10 occupdrao os Hollandezes todes 
os Fortes da marinha, e os deSanto Antonio, e Tapagr 
‘pe. Os moradores, dando tudo por perdido, tinhio dee 
amparado de noite a Cidade, com o Bispo. Ficou somer 
te no Palacio o Governador, seu filho, o Capitao Lourer 
go de Brito Correa, o Sargento Mor Francisco de Al- 
meida de Brito, o Ouvidor Geral Pedro Casqueiro da 
Rocha, o Alfercs Manoel Gomes,.e sets criados. O ari- 
so desta desergao foi levado naquella manha aos Hollar 
dezes por hum Judeo chamado Liiogo Lopes de Abran- 
tes; e cntrando logo na Cidade as tropas, que occupavie 
§. Bento, chegdrao.ao Palacio, d’onde sahio o Capitio 
Lourenco de Brito a dizer-lhes, que o Governador estt 
va alli com muita gente, e se renderia se Jhe conceder 
sem sahir com todos os seus livremente , alias se defer 
deria, e na ultima extremidade poria fogo 4 polvora. 
Concedério os Hollandezes tudo, c entrando a occupar 
a paste inferior do Palacio, o Governador imprudente 





218 


duas Nios, tres Urcas, e dois navios. Levava mais qua- 
tro Caravelas carregadas de provisOes, e outras quatro 
embarcagdes com viveres, e bagagens. E:ra Alniraore 
D. Francisco de Almeida; e Mestre de Campo -dos dois 
Tergos da Marinha, que se embarcdrao, o Mesmo Al- 
mirante do primeiro, e Antonio Moniz Barreto do se 
gundo, que se creou por esta occasiao. Ejis-aqui 0s n0- 
més dos navios (1): 

Nao Santo Antonio, em que hia o Capitao General 
D. Manoel de Menezes, de 900 toneladas , 460 Solda 
dos de Infanteria, 160 Artilheiros, ¢ mariaoheiros, e 42 


as. : 
Nao Santa Anna Maior, em que embarcou o Almi- 
rante D. Francisco de Almeida, de 500 toneladas, 300 
Soldados, 110 Artilheiros, e-marinheiros, e 24 pecas 

Galedo Conceicao, em que hia o Mestre de Campo ° 
‘Antonio Moniz Barreto, de.430 toneladas, 200 Soldz- 
dos , 1co Artilheiros , e marinheiros, e 24 pegas. 

Galedo S, José, Commandante D. Rodrigo Lobo, de 
‘400 toneladas , 200 Soldados,-100 Artilheiros, e marr 
nheiros , e 24 pegas. 

Urca Caridade , Commandante Lancgarote da Franc, 
de 300 toneladas , 100 Soldados , 80 Artilheiros, ¢ ms 
rinheiros, e 20 pecas. 

_ Naveta Santa Cruz, Commandante Constantino de 
Mello. de 280 toneladas, roo Soldados, 80 Artilhet- 
ros, e marinheiros, e 18 pegas. 

Urca S. Joao Baptista, Commandante Manoel Dias 
de Andrade, de 300 toneladas , 100 Soldados, 60 Ar- 
tilheiros, e marinheiros , e 20 pegas. 

Urca S. Bartholomeu, Commandante Domingos da 


(1) Esta Relacio he tirada do Manuscrito, que mais vezes tent. 
citado nestas Memorias, o qual em substancia concorda com o cue dix 
gem os melhores Escritores. 


219 


Camara, de 230 toneladas, r10 Soldados, 109 Artilhei- 
ros, e marinheiros, e 13 pecas. 

Navio Rosario Maior, Commandante Tristao de Men-. 
donga Furtado, de 350 toneladas, 155 Soldados, 50 Are 
tilheiros , e marinheiros, e 20 pecas. | 

Navio Rosario Menor, Commandante Ruy Barreto 
de Moura, de 300 toneladas, 90 Soldados, 50 Artilhei- 
ros, e marinheiros, e 14 pegas. 

Navio Rosario, Commandante Christovao Cabral, de. 
230 toneladas, 85 Soldados, 45 Artilheiros, e marinhei- 
ros, € II pegas. 

Navio Mercés, Commandante Domingos Gil da Fone. 
ceca , de 220 toneladas, 30 Soldados, 40 Artilheiros, e 
marinheiros, e 10 peas. - | 

Navio S. Joao Evangelista ; Commandante Diogo 
Furtado, de 220 toneladas, 85 Soldados, 45 Artillei- 
ros, ¢ marinheiros, e 14 pegas. 7 

Navio Senhora da Ajuda , Commandante Gregorio 
_ Soares Pereira , de 200 toneladas, 60 Soldados, 50 Ar- 
tilheiros, e marinheiros, e 14 pegas. | 

Navio Penha de Franca , Commandante Diogo Vare- 
j40, de 200 toneladas, 60 Soldados, 50 Artilheiros, e 
marinheiros , e 18 pegas. = ; 

Navio Boa Viagem, Commandante Bento do Rego; 
de 150 toneladas, 50 Soldados, 40 Artilheiros, e ma- 
rinheiros, e 8 pegas. | 

Navio Senhora das Neves Maior, Commandante Gone. 
galo Lobo Barbosa, de 150 toneladas, 50 Soldados, 40 
Artilheiros, e marinheiros, e 90 pecas. 

Caravela Conceicao , Commandante Sebastiio Mar- 
ques, de 139 toncladas, 10 Soldados, e 22 marinhei- 
ros. : 
Carayela Rosario, Commandante Manoel Palhares 
Lobato, de 93 toneladas, 10 Soldados, 22 marinhei- 
TOs. 


e 


28 i 


220 


Caravela Remedios, Comimandante Roque de Mor- 
tearroio, de 120 toneladas, 10 Soldados, 22 marinhe- 
ros. 

Caravela S. Joao, Commandante Cosme do Cont, 
de 90 toneladas, 10 Soldados, 22 marinheiros. 

Embarc4érao nesta Esquadra dois Medicos, e todos 
os navios armados levavao Cirurgido, e Botica. Eno 
total das tropas 2260 Soldados de Infanteria , além dos 
Officiaes, e Aventureiros , que néo recebido soldo: Art- 
Iheiros, e marinheiros 1298, nao contando os Officiacs; 
assim a guarnigéo da Esquadra devia ser de perto de qu- 
tro mil homens. O numero de canhées chegava a 303, 
Iévando munigdes para mais de oitenta tiros por pe 

a (Ir). 
‘ in quanto em Lisboa se trabalhava com a maior 
actividade , reunia-se em Cadix a Armada Hespanhol, 
dividida (segundo o costume daquelle tempo) em cinco 
Esquadras. Nomeou ElRei para commandar em Cte- 
fe as forcas navaes, e terrestres da Expedigdo da Bahia, 
a D. Fradique de Toledo Osorio, Marquez de Villa 
Nova de Valduesa Capitao General da Armada do Mer 
Oceano; 0 qual, quando desembarcassem as tropas, de- 
via tomar o governo supremo destas; assim como tom 
sia neste caso o da Marinha D. Jofo Fajardo de Gue- 


(1) Importou a despeza desta Esquadra em 472g) cruzados; ¢ tub 
quanto para ella se comprou foj pago a vista. Levavado os navios agua 
para 120 dias, a canada por praca, Biscouto. para 238 dias, alibae . 
meia por praca. Arroz para 32 dias, ameia libra, Bacalhgo para $0 
dias , a meia libra. Carne salgada para 25 dias, a libra. Queijo pasa 
26 dias, a meia libra, Cosinhava-se huma vez ao dia. Custou 0 trig 
@ 99 ris o alqueire: 0 biscouto a 275 réis a arroba d’ Hespanhe: 0 at 
te a 996 réis o almude: a carne 389 réis a arroba: o bacalhdo a 366 a 
atoba: a pipa de vinho a 5557 ris; ¢ ade vinagre 4454 rcis. Apo 
Vora a 105 é réis a libra. O breu a.177 r€éis a arroba. He o que cuasia 
do citado Manuscrito, que he hum documento authentico, por sf & 
trahido dos Livros dogs Armazens da Marinha, 


222 


nao ousou desembarcar; e contentarido-se com algumas 
faceis presas nas embarcagées de trafico, voltou dilli 4 
Capitania do Espirito Santo. A 12 de Marco do anno 
seguinte desembarcou alli, com o intento de ganhar a 
Villa da Victoria, Capital da Provincia ; porém foi re 
chagado com perda pelo Donatario Francisco de Aguiar 
Coutinho, auxiliado de Salvador Correa de Sa, que seu 
pai Martim Correa de S4 mandava do Rio de Janeiro 
em soccorro da Bahia com duzentos homens, e por hum 
feliz acaso entrara no Porto do Espirito Santo. Nao foi 
Heyne mais venturoso em huma segunda tentativa, cm 
que perdeo huma lancha com perto de quarenta homens, 
EF fazendo-se 4 véla para a Bahia, chegou 4 ponia de 
Santo Antonio, d’onde descobrio a Armada de Hespa- 
nha surta no Porto; o que o obrigou a seguir derrow 
para a Europa. 

1625. — A Esquadra da India (1) reduzio-se ese 
anno a duas Naos: S. Bartholomeu, em que embarcou 
o Chefe Vicente de Brito e Menezes: e Santa Helem, 
de que era Commandante Joao Henriques, 

Sahirao de Lisboa a 2 de Abril; chegdrio a Goa 
nos principios de Setembro; e na torna-viagem se per- 
dérao na Costa de Franga, como adiante direi. 

1626. — A 14 de Janeiro deste anno (2) sahio de 
Cadix a Armada Hespanhola, que constava de vinte e 
hum navios de guerra, sete navios afretados, e armados, 
e sete transportes; pela maneira seguinte : 


Esquapra Do Mar OckAno. 


Galeio Pilar, em que hia o Capi.2o General D. Fra 


(1) Faria, Asia Portugueza. — Epilogo de Pedro Barreto. 
(2) Vede os Escritores jd citados sobre a Conquista, e¢ restaursdo 
da Bahia; e Castrioto, Parte 1. Liv. 1. 


223 


dique de Toledo, de 1040 toneladas, 330 Soldados de 
Infanteria, 20g Artilheiros, e marinheiros, e 52 pecass 
Galeao Santissima Trindade, de 500 toneladas, 233 
Soldados, 80 Artilheiros, e marinheiros, e 24 pegas. 
Galeao S. Nicoldo Tolentino, de 500 toneladas, 269 
Soldados, 78 Artilheiros, e marinheiros, e 24 pecas. 
Galeao Victoria, de 450 toneladas, 127 Soldados, 70 
Artilheiros, e marinheiros , e 20 pegas. 


Navios afretados, e armados. 


Urca S. Miguel Turquillo, de 294 toneladas, 62 Sol- 
dados, 42 Artilheiros, e marinheiros , e 17 pecas. 

Urca D. Henrique, de 292 toneladas, 67 Soldados, 
49 Artilheiros, e marinheiros, e 16 pegas. 

Urca Salvador, de 530 toneladas, 83 Soldados, 84 
Artilheiros, e marinheiros, ¢ 25 pecas. oo 
_ Urca S. Paulo, de 318 toneladas, 6 Soldados, 44 
Artilheiros, e marinheiros, e 18 pegas. 

Urca Rei David, de 231 toneladas, 50 Soldados, 33 
Artilheiros, e marinheiros , e 12 pegas. 

Urca Porto Christovao, de 292 toneladas, 31 Solda- 
dos, 27 Artilheiros , e marinheiros, e 14 pegas. 

Urca Esperanga, de 319 toneladas, 61 Soldados, 30 
Artilheiros, ¢ marinheiros, e 12 pegas. 


EsquaDRA DO EsTREITO. 


GaleZo S. Tiago, em que embarcou D. Joao Fajardo 
de Guevara, de 900 toneladas, 244 Soldados, 225 Ar- 
tilheiros, e marinheiros, e 44 pegas. | 

GaleZo Rosario, em que hia o Almirante Roque Cen- 
teno, de 652 toneladas, 225 Soldados, 157 Artilheiros , 
€ maripheiros, e 32 pecas. 


224 


GaleZo S. Jodo Baptista, de 400 toneladas, 176 Sol- 
dados, 80 Artilheiros, e marinheiros, e 18 pegas. 

Galeio S. Paulo, de 360 toneladas, 142 Soldados, 77 
Artilheiros , e marinheiros, e 16 pegas. 

Galedo S. Miguel, de 450 toneladas, 190 Soldados, 
gr Artilheiros, e marinheiros, e 16 pegas. 


EsQuaDRA DA BISCAIA. 


Galeio S. Jodo Baptista, onde hia o Capitao General 
Martim de Valccilla, de 600 toneladas , 248 Soldados, 
114 Artilheiros, e marinheiros, e 28 pegas. 

GaleZo S. José, de 400 toneladas, 136 Soldados, 48 
Artilheiros , e marinheiros, e 16 pecgas. 

GaleZo Santa Theresa, de 446 toneladas, 172 Solde- 
dos, 77 Artilheiros, e marinheiros, e 20 pegas. 

Galeijo Senhora da Atalaia, de 446 toneladas, 1% 
Soldados, 66 Arulheiros, ¢ marinheiros, e 16 pees 


EsQuADRA DAS QuATRO VILLAS. 


Galeio Bom Successo , em que hia o CapitZo General 
D. Francisco de Azevedo, de 700 toneladas, 245 Sol- 
dados, 124 Artilheiros, e marinheiros , e 28 pecas. 

Galeao Santa Anna, de 304 toneladas, 189 Soldados, 
88 Artilheiros, e marinheiros, e 24 pegas. 

Galeao S. Francisco, de 379 toneladas, 173 Solda- 
dos, 63 Artilheiros, e marinhciros, e 18 pegas. 

GaleZo S. Jodo da Vera Cruz, de 402 toneladas, 159 
Soldados, 72 Artilheiros, e marinheiros , e 16 pegas 
‘ Galeéo Santa Catharina, de 411 toneladas, 149 Sd- 
dados , 69 Artilheiros, e marinheiros, e 20 pecas, 

Galedo S. Pedro, de 450 toneladas, 13 3 Soldados, 8: 
Artilheiros, e marinheiros, e 24 pegas. 


225 


f 


EsqouApRkA DE Napo.es: 


Galeio Conceig#o, em que hia o Capitfo: General ‘Ds 
Francisco de Rivera, de 1200 toneladas, 398 Soldadosj 
203 Artilheiros , e marinheiros, e 46 pecas. " 

Galedo Annunciada, de 800 toneladas, 344 Soldadosy 
138 Artilheirus, e marinheiros, e 26 pecas. 


Transportes. 
Patacho S. Jorge, de 200 toneladas, 150 Soldados4 
413 Artilheiros, e marinheiros. : 
atacho Senhora do Carmo, de 200 toneladas, 156 
Soldados, e 113 Artilheiros, e marinhciros. 
Caravela S. Joao Baptista, 17 Soldados, e 30 Arti- 
Theiros , e marinheiros. : 
Caravela Remedios, 17 Soldados, e 30 Artilheiros ; 
€ marinheiros. 
Tartana S. Jo%0, 27 Soldados, e 21 Artilheiros, e mas 
Finheiros. — 
- Tartana S. Pedro Maior, 27 Soldados, e 21 Artilhei- 
fds, € marinheiros. | 
Tartana S. Pedro Menor, 27 Soldados, e 21 Artilhei« 
ros, e marinheiros. | 
Os navios de guerra levavZo munig6es para quaren4 
ta’ tiros por peca. 
- '“Yoral das guarnic6es , excluindo Officiaes, Aventu- 
Tits, e Creados; Soldados de Infanteria §232; Artilhei~ 
ros, ‘e marinheiros 1878; Pecas de artilheria 642. 
_ ~A 6 de Fevereiro chegou D. Fradique de Toledo 
a Ilha de S. Tiago de Cabo Verde: arriou D. Manoel 
de’ Menézes'a' bandeira do tope grande, e salvou-o com 
cinco tiros de canh2o, a que D. Fradique respondeo com 
tres tires, arriando igualmente a sua bandeira, que logo 
Tomo LL 29 


33236 


ambos tornd4rado a igar, € a0 mesmo tempo sahira4o nos 

seus escaleres a visitar-se.. -Chegou. primeiro D. Fradi- 

que 4 Capitanea Portugueza , e ahi esperou que D. Ma- 

el voltasse de bordo da sua ,. havendo-se desencontra- 

© no caminho, Passados os primeiros cumprimentos, 

‘Voltarao ambos para a Capitanea de Hespanha , onde 
conferirio sobre as futuras operagdées. 

_ Publicou-se a bordo de todos os navios a ordem de 
successio no Commando geral da Expedigao, que EiRei 
determinava se praticasse em caso de faltar o General 
em Chefe, a qual era a seguinte: Primeiro successor D. 

of0 Fajardo; segundo D. Manoel de Menezes; tercei- 
ro o Marquez de Cropani; quarto Martim de Valecilla; 
f ultimo D. Francisco de Azevedo. 

A 11 de Fevereiro sahio toda a Armada da Ilbe 
sie S. Tiago; passou aLinha a 5 de Marco;.e soffren- 
do algumas calmarias, adoecérao myitas pessoas a boro 
dos navios Hespanhoes, porém fallecérao poucas. 

A 29 avistdrao terra da Bahia, e tomardo lingua 
na Torre de Garcia de Avila, onde soubergo o estado 
das cousas, e que os Hollandezes j4 sabido da. sua vin 
da, por haverem tomado hum Patacho expedido de Lis- 
boa com avisos a D. Francisco de Moura. No mesmo 
Gia derao fundo defronte da Ponta de Santo Antonio, ¢ 
alli veio D. Francisco de Moura a bordo de D Fradi- 
que, e lhe contou que os Hollandezes tinhZo na Gidade 
dois mil e quatrocentos homens, e cento e oitenta cx 
Dh6es nas baterias, e havido feito muitas presas, tanto 
“MO mar, como em navios entrados no Porto, sem sabe 
rem que .estava occupado por elles. Que agora tinkie 
abandonado os atrabaldes do Carmo, e S. Bento; e que 
a sombra de tres Reductos construidos na Marinha, es- 
tavao ancorados os seus navios em numero de vinie ¢ 
seis, sendo seis de guerra de 30 a 40 pecas, e os ourros. 
06 que achdréo no Porto, ou apresdréo depois, ¢ ciahae 


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ara te oT - to da =. anda do Con 7. 

















228 


Marquez de Cropani com dois mil homens, favorecido 
dos Portuguezes sitiados, que alli acudirao logo; e adian- 
tando-se elle com quatro Companhias de Infanteria, pas- - 
sov além da Ermida de S. Pedro, e depois de reconhe- 
eer o terreno, sem ver inimigos, volrou 4 sua primeira 
posicao. 

No 1.° de Abril desembarcou D. Fradique, e unia- 
do-se-lhe algumas tropas escolhidas da Divisao de D. 
Francisco de Moura, comecou a marchar para a Cida- 
de, nao tendo ainda desembarcado artilheria alguma, e 
fez alto na Ermida de S. Pedro, a tiro de canbio da 
Cidade. | - 
' A 2 tomou porto o Marquez de Cropani com.qua 
tracentos homens na Igreja de S. Bento ,. cujo Mosteiro 
estava desmantelado; e alli formou hum alojament  . 
tiro de mosquete das muralhas, comegando. logo a levae 
tar terra para se cobrir do seu fogo de artilheria, ¢ 
mogsqueteria , que n@o cessava de noite, e dia. 

_ A 3 desembarcdrao outros dois. mil homens, cm 
artilheria , e deixando D. Fradique no Quartel de S.Ber- 
to ao Marquez de Cropani, com os: Meseres. de Campo 
D. Pedro Osorio, D. Francisco de Almeida, e o Mur- 
quez de Torrecuco., e dois mil e -trezentos soldados, 
marchou a estabelecer o seu Quartel.General. na Igreja 
do Carmo, a tiro de mosquete -das obras do inimigo, 
tendo ds suas ordens os Mestres de Campo D. Joao de 
Orellana, e Antonio Moniz Barreto, com. a maior par- 
te dos Aventureiros Portuguezes, ¢ Hespanhoes. Aqui 
o reforcdrdo com dez Cempanhias de Infanteria Portu- 
gueza §, Divisio de D. Francisco de Moura, que teriéo 
quinhentos homens; com cujo-reforgo perfez o numero 

e dois mil e quinhentos soldados, e fez occupar o Quar- 
tel das Palmeiras. Os Hollandezes. desamparirdo os. Fore 
tes de Monserrate, e Agua de Meninos, por estarem 
mui. proximos dos postos ayangados dos. Porruguezes, que: 


230 


forfio rechacados cetti-pefdd pelo Tergo de Marquez de - 
Torrecuco, que: estava de puarda. - - 
| A‘G aproximaradse os ndvioe dé’ guerra a tird de 
canhao da Cidadé. Conservavie-se a berdo os Generaes 
de Marinha, excepto D. Francisco de Almeida, por ser 
Commandatité’ de hurtit T'ergo.- Comegou a’ Esquadra a 
batér-as Fortificag6es ,‘@ os navtos Hollandezes , fazen- 
do bastarite damno-‘a hiins ;- € outros ; e ainda que elles 
respondérao' ao fopie ,* nao Catvdu' este aVarias de conse- 
menciag 2 ia 
’ Os Hollandezés; observaifld qiie’ os* havios com in- 
sipnias de'Genétaes , estav#0 fo centro da limha (nio se 
sabe por que) ,’preparardo tres’ Brulotes ; que ‘nessa noi- 
té, sendo a'sharé de vasio,; manddrZ0 cintra elles pelas - 
dez horas: hum encalhou 4 sahida ; e fic6u ‘inuril;. O se. 
ondu aproximou-ee do Gak@o- Rosatio ; do! Almirante - 
Roque Centcno; e sendo vist das sentinelfds , imagici- 
r46 os Hespanfioes , que op ‘havios Hollandezes  fugiio,¢ 
come¢drao a fazer-se 4 véla para-Thes cortar o paso. 
Entre tento o Galefo deo-Ihe' huma:‘descarga’ de palan- 
quetas, de que tinha a sud artilheria’ carregada, com que 
logo d desarvorou , e abrio§ e os marinbreiros , que nelle 
vinhao , der#o fogo a0 Brulote ,” estando 4 perto, queo 
calor derreteo o breu das costuras do Galego. A Jencha 
deste colheo no mar hurt Hollandez, que’ confessou ha- 
verem sahido aquelles tres Bralotes , destinados para as - 
Capitaneas de D. Fradique, D. Joao Fajardo, e D. Ma 
noel de Menezes. ot oe 
O claro do incendio deste Brulote fez distinguir o 
terceiro, que vinha com a préa ao GaleZo de D. Fradi- . 
que; ¢ tanto este, como o de D. Manoel de Menezes, 
que.estaya junto delle, cort4rao as amarras,‘e fizerdo-se 
a véla. Os do Brulote peparad-se foo, e rebentou del- - 
Je- huma grande quantidade- de bombas,-e fopuetes incer 





—-233- 


- de: escolhido em seu lugar o Coronel Quif} e! 
pay oh de capitular, Com tice Schoutens nado ti-» 
nha o ae eta ee necessarios. para o. commando , 
que nelle recah io pelo.acaso da sua antiguidade, Au 
tava mais a sua frouxidao a falsa idéa em que esta de 
ser impossivel 4 Bamavba mandar huma expediga&o 4 
Bahia, antes que a sua Republica Ihe enviasse hum po-) 
deroso soccorro; e to em perrado se conservava nesta opi-' 
nido, que quando entrou a Armada Hespanhola, ainda 
ceria que era a Hollandeza. A guarnigdo era composta em- 
grande parte de mercenarios Francezes, ¢ Inglezes; que: 
nao tinhdo interesses nacionaes que os moyessem a pro- 
as resistencia até 4 ultima extremidade; ¢ por ou- 

escandalizados das mas disposigdes , e conheci 
da pusillanimidade de Schoutens, movério huma sibleva- 
Ee cujo resultado fica referido, Porém o brilhante va- 
ie Quit nao péde restabelecer a disciplina em tropas 
io mal organizadas: além disso, estava jd a todos pa- 
nte, que ao menos de om promptamente de Hollan- 

da huma Esquadra capaz de destruir os Hespanhoes, a 

seria forcada a capitular; e sendo incerta a be 

a da'vinda do soccorro , , poderia ie entretanto ganha= 

assalto ; projecto que D. Fr 1€ muitos dias an- 
cs aha hes ees ender, ¢ nto foi approvado. 

Resolutos a final os Hollandezes-a. capitular, | 

#0 no dia 30:da Cidade o Commandante da Artilheria 

Guilherme Stope, o Commissario Geral Hugo Antonio, 
: ©. Capitéo Francisco Duchs, todos tres do Conselho, 
> yierao ao Quartel de D. Fradique, com bes se acha- 

_ v0 0 Marquez de Cropani, os Mestres de Campo D. 
> Al eida ae ees Quijada d 

ci Fe e Almeida, o mo ae 
solo ano - Auditor Geral do Rercis. , o Tenente de 


a 64 . General Diogo Rodrigues, ite cel ) 
toM Ja ena Conselha 












ncio de S. elice, woios do 


inte ec seis navios, c quatro Patachos, que os Hollande 
zes tinhio no principio do cerco; existido em bom esta- 
do sé dois Patachos, e seis navios: mandarao-se aprestar 
estes ultimos para o transporte da guarnigfo. 

A perda dos sitiantes deitou a duzentos e sessenta 
mortos, e feridos (outros a fazem maior), em que es- 
trdrdo muitos Officiaes distinctos, Portuguezes , e Hespa- 
nhoes. 

Ficou por Governador da Cidade D. Francisco de 
Moura, com mil soldados Portuguezes de guarnicio. 

No dia ro embarcdrao os Hollandezes para borde 
dos navios , que os devido transportar; e a 32 comerdté 
a embarcar as tropas Hespanholas, que no erdo ja ne- 
_ cessarias em terra. A 14 expedio D. Fradique para He 

anha o Patacho Monte do Carmo, com cartas pera 

IRei, e nelle embarcdrao os Capitaes D. Henrique de 
Alagoa, e D. Pedro de Torres e Toledo, ambos ses 
sobrinhos. 

No dia 19, apparecendo na Costa hum Patache 
Hollandez, que fez presa em huma Caravela Portogue- 
za, que vinha de Lisboa, sahio Tristfao0 de Mendong 
no navio Sol Dourado, e represando a Caravela com al- 

uns Hollandezes a bordo, soube-se por elles, que de 
Hollanda havia sahido huma Esquadra de trinta e tres 
mavios, com muitas tropas, e destino 4 Bahia. Este mes- 
mo avisd tinha j4 chegado por duas embarcacées, huma 
expedida de Cabo Verde a D. Manoel de Menezes, ¢ 
outra de Canarias a D. Fradique. A Esquadra sahio de 
Hollanda antes que a Hespanhola de Cadix, mas os tem- 
pos ruins, que encontrou no Canal de Inglaterra, a de- 
mordrdo até aos principios de Margo. Deteve-se pairan- 
do sobre a Ilha do Maio, onde recebeo alguns refrescos 
por meio de dois Patachos; e dalli mandou hum 4 Bahia, 
que foi o que tomou a Caravela; e na Costa de Guiné 
teve muitos enfermos, e lhe morreo alguma gente. Era 


238 


panhola sepguia os Hollandezes, atirando-lhes tiros de ca- 
¢a, a que elles nao respondiao; e o Galedo Santa Anna, 
perrencente 4 Esquadra de Biscaia, encalhou em hum 
daquelles baixos, d’onde sahio cortando o mastro gran- 
de, e com o auxilio das lanchas, e escaleres. Os outros 
Navios seguirao no bordo de Leste, com o fim de virem 
no outro bordo a barlavento dos Hollandezes; porém 
Fradique, estando sotaventeado, fez signal de reuniio, 
temendo que os Hollandezes se mettessem entre os seus _ 
Navios mais avangados e os que estavao a ré delle; e de 
noite continuou a bordejar para melhorar de posicio , 0 
que nio pdde conseguir; porque carregando o vento com 
mais forca, cahio para sotavento. 

O Almirante Hollandez, aproveitando-se de noite 
da vasante da maré, que o deitava para féra, fez-se de 
véla, e sahio da Bahia, havendo ‘antes intentado que- 
tmar o Galeao Santa Anna, enviando a isso algumas lar 
chas munidas de materias incendiarias, as quaes forio 1 
pellidas , e duas tomadas. 

D. Fradique pdz em conselho, se seria conveniente 
seguir os Hollandezes ; e decidio-se que n&o, por se acha- 
rem todos os navios faltos de viveres, e aguada, e ne 
cessitados de reparos; e porque naquella estacao, huma 
vez que sahissem do Porto, talvez nio o podessem oF 
tra vez tomar. Em consequencia desta resolucio, foi a 
Esquadra buscar 0 seu ancoradouro. 

A 29 fez-se novo conselho, e concordou-se em com- 
boiar até aos Acores os navios dos prisioneiros , para 
que nao acontecesse, no caso de partirem sds, irem-st 
ajuntar com a sua Esquadra, e invadirem algum Porto 
do Brasil. 

A Esquadra Hollandeza navegou para o Norte, ¢ 
apparcceo a vista de Pernambuco com vinte e oito n- 
wios, mas ndo pdde ferrar o Porto, porque o escorreo de 
moire com tormenta de yento, e foi ancorar na Babia 


239 
da Traicio, seis leguas ao Norte da Parahiba, onde se 


reunirao trinta e quatro navios, e derdo fundo. Tratdrao 
com os Indios de huma unica Aldea, que alli havia,e 
desembarcarao seiscentos soldados, com que guarnecérdo 
algumas trincheiras, para protegerem mais de duzentos 
enfermos, que pozerao em terra, Logo comecdrao a alim- 
par os navios, e a fazer agua, é lenha, e dirigidos pelos. 
Indios, fizerao algumas entradas pelo Rio Mamangape,. 
e colhérao muito gado vaccuin,. de que abundavao aquel:. 
las planicies. : 

O Governador da Parahiba Affonso da Franca, sa» 
bendo da visinhanga dos Hollandezes, reunio tc:da a gene 
te que pdéde ajuntar para thes defender a campanha; e 
aavisado Mathias de Albuquerque em Pernambuco, fez 

rtir Francisco Coelho de Carvalho, que chegava de 
Lisboa nomeado Governador do Maranhao, com quatro 
Caravelas, e dezoito pegas. de artilheria , nas quaes met- 
teo todos os soldados que podia dispensar em Pername 
buco. Chegado Francisco Coelho 4 Parahiba, marchow, 
com sete Companhias de Infanteria, que trazia de Per- 
rambuco, e a gente da terra, e mais trezentos Indios 
frecheiros conduzidos por dois Jesuitas, e tomou posigao. 
a duas leguas dos Hollandezes, onde se fortificou.. Se- 
-guirao-se alguns pequenos combates, em hum dos quaes 
morrérao quarenta. soldados Hollandezes,, e trinta: dos 
-seus Indios. 

Nesta situag¢ao o General Henrik julgou acertado 
Targar o ancoradouro, e no dia 4 de Agosto se fez 4 vé- 
Ja; e expedindo depois para. Hollanda: os navios afreta- 
dos, dividio os de guerra em duas Esquadras, huma das 
:quaes foi atacar a Ilha de Porto Rico, e com a outra se 
dirigio 4 Costa de Africa, da qual tratarei logo. — 

No 1.° de Agosto sahio da Bahia D. Fradique de 
Toledo com. todos os seus navios, menos os Galedes: 
«Mespanhoes Atalaia, e S. Miguel, que por fazerem mui 


240 


ta agua, necessitavdo carenar. O mdo tempo fez am- 
bar a Esquadra ao Porto da sahida, excepto quatro na- 
vios dos que levavdo tropas Hollandezas, que continud- 
r40 a sua viagem. 

Tornou a sahir D, Fradique a 4 de Agosto, como 
projecto de recolher em Pernambuco os navios de Com- 
mercio, para os comboiar a Portugal. Os ventos con- 
trarios, e violentos espalhdrao a Esquadra: algumas em- 
barcacSes Hespanholas acompanharao D. Manoel de Me- 
nezes, que n4do podendo tomar Pernambuco, seguio pa- 
ra a Europa. D. Fradique ancorou em Pernambuco com 
o resto da Esquadra a 21 de Agosto, e soube que ja ti- 
nhio passado para o Norte alguns navios, entre elles o 
de D. Manoel, e alguns dos que levavao os Hollande 
zes; e que se havia alli perdido huma Urca, de que s 
salvou a gente, e a Carregacao. 

Estavao neste Porto quatro Ureas , que vinhio de 
Cadix carregadas de provisdes para a sua Esquadra, con- 
mandadas pelo Capitao Joao Luiz Camarina , o qual lhe 
entregou duas Cartas d’ ElRei, huma em que Ihe orde 
Nava, que ndo viesse avistar os A¢gores , por “haver s- 
speitas de que o esperava naquella altura huma Armada 
de cento e trinta navios Inglezes, e Hollandezes; e na 
outra Ihe mandava, que enviasse 4 ilha de Santa Hele 
na dois navios da sua Esquadra, acom panhados de tres 
Caravelas que se apresentavao em Pernambuco, para re 
colherem a carga, e gente da Ndo ConceicZo, que se prr- 
déra naquella Ilha. D. Pradique enviou logo ordem aos 
dois Galedes, que deixdra na Bahia, para que, conclui- 
dos os seus reparos, viessem a Pernambuco, e dalli fos 
sem a Santa Helena com as tres Carayelas, o que elles 
cumprirao (1). 


(1) Esta expedicao foi commandada pelo Capito JoZo Martins de 
Arteaga, o mais antigo dos dois Commandaptes dos Galedes, Chegon 


241 


A 29 de Agosto partio D. Fradique de Pernambu- 
co, deixando alli huma das Urcas vindas de Cadix. Pas- 
sou a Linha a 2 de Setembro com bom tempo. No dia 
seguinte, estando o mar mui sereno, mandou repartir 
os mantimentos das Urcas pelps navios de guerra. A 6 
amanheceo o GaleZo S. Nicoléo Tolentino desarvorado. 
de hum aguaceiro, que houvera de noite, em cujo desas- 
tre quebrou huma perna o seu Commandante André Dias 
da Franca, de que falleceo; e como este navio fazia 
muita agua, ordenou D. Fradique, que se lhe tirasse a 
artilheria, gente, munig6es, e aparelho, e se repartisse . 
pelas outras embarcagées. Esta faina durou quatro dias, 
que houverao de calmaria; e no dia 10 se lhe deitou fo- 
go. Assentou-se em Conselho, que se navegasse por me- 
nos altura, pata evitar o encontro da Armada inimiga,; 
e D. Fradique deo ordens selladas a todos os Comman- 
dantes, prescrevendo-lhes o que, deveriao praticar em caso 
de separacio. | 

O resto do mez de Setembro foi de trovoadas, cer- 
racdes, e ds vezes calmarias; e D. Fradique procurava 
sempre encostar-se 4 Costa de Barbaria. Os mantimen- 
tos erdo tdo escassos, que se davdo de raciio diaria a ca- 
da homem quatro ongas de biscouto podre , outras tan- 
tas de farinha de p4o, e meio quartilho de agua, sem ™ 
haver vinho, nem outra alguma cousa. De 5 de Outu- 
bro por diante tiverado bom vento, e a 15 virao o Estrei- 


elle a Santa Helena a 10 de Dezembro, e poucos dias depois ancorow 
tambem na Ilha huma Nio Hollandeza de setenta pecas, que parecia vit 
da India. Comecario-se a bater huns, e oysros, mas o Hollandez fez-se 
logo 4 véla, e os Galedes © fordo seguindo, e por ultimo o abordirdo, 
bum pela alheta, e outro pela amura. Os Hollandezes defenderio-se brae 
vamente , e depois de norto Arteaga, e muitos Officiaes, e soldados , 
se desatracdrio os Galedes, e voltdrio para a Ilha; a Ndo continuou a 
sua derrota. Os Galedes entrdrio em Lisboa com a carga da Conceicao 
a 14 de Maio de 1626. Vede Brito Freire, Liv. 3., ¢ o Compendio 
Historico de la Jornada del Brasil , Cap, 16. 


Tomo Il, 3} 


242. 


to de Gibraltar, porém o vento Ponente era tao violen- 
to, e€ O tempo t4o escuro, que se espalharao os navios 
D. Fradique entrou no mesmo dia o Estreito com alguns 
delles, e amanheceo 4 vista de Malaga: a fome era tal 
a bordo do seu navio, que ja se comiao ratos, e se be- 
bia vinagre em lugar de agua. Deteve-se. aqui D, Fra- 
dique quatro dias para receber algumas provis6es; ¢ so- 
rando Levante, se fez 4 véla com intento de tomar Gi-« 
raltar, ou Cadix; mas saltando logo o vento ao Ponen- 
te, tornou para Malaga, onde desembarcou a artilheria, 
metteo os navios no Molhe, e tratou de se fortificar, 
por saber que estava sobre Cadix a Armada Ingleza, ¢ 
se temia que viesse a Malaga queimar a Esquadra (1). 

Os Galedes Senhora do Rosario, e S. Jodo Vera 
Cruz, e¢ os dois de Napoles entrarao em Cadix seis dias 
antes de chegarem os Inglezes, e servirao de muito pz 
ra a defensa daquella Praga. 

O Galeao Santa Anna do commando do Almira 
te D. Francisco de Almeida, achou mdos tempos em 30° 
de latitude Norte, e logo hum temporal do Sul tio fr 
‘Tiogo, e com tao grosso mar, que forZ0 a pique nove na- 


(1) Este Armamento compunha-se de oijtenta navios ( outros dizem 
que mais), ¢ era commandado pelo Visconde de Wimbleton. As tro- 
pas constavao de dez Regimentos , sommando dez mil homens, com- 
mandados pelos Condes de Essex, e Denbigh. Sahirdo de Plymouth a7 
de Outubro de 1625 3 e tendo soffrido huma tempestade , se reunitio a 
19 em Cabo de S. Vicente, seu ponto de reuniio. O projecto era it 
terceptar a Frota Hespanhola , que se esperava da America -em Novem 
bro. Os Generaes Inglezes resolvérdo entretanto assaltar Cadix , onde se 
bido que estavao muitos navios, O ataque, feito a 22, nado produzio 0 
effeito, que esperavao; ainda que ganhdrio com facilidade o Forte do 
Pontal ; porque os soldados Inglezes, havendo arrombado muitos arma 
zens de vinhos , embebedarao-se , ¢ foi necessario fazellos embascar a to 
da a pressa. Pouco depois espalhou-se a bordo dos navios huma molestia 
contagiosa, em consequencia da qual voltou a Armada para Inglaterra, 
sem fazer cousa alguma , tendo custado enormes despezas, Yede o It 
dente Erigaanico, Tomo 6, Cap. 50. 


243 


s) 

vios, que © acompanhavao, em que entrou o Patacha 
5. Jorge, Hespanhol e o navio Portuguez Senhora da 
Ajuda, armado em guerra, de que era Commandante 
Gregorio Soares Pereira ; os outros ero Transportes. 
O GaleZo abrio doze palmos de agua, e o mar levou- 
lhe as obras mortas da pépa, ea lancha que vinha no cons 
véz: hum rodomoinho arrebatou pelos ares sete homens, 
dois dos quaes metteo huma vaga a salvo dentro do na- 
vio. Alijdrao ao mar a artilheria, e cortd4rdo o mastro 
grande, que estando. ja rendido, ameacgava ruina com 
a sua quéda. Todo o mantimento, e aguada se avaq 
riou.. Como nao existido vélas, pelas ter levado o ven- 
fo, fizerao. huma de varias colchas, com que fordo gn~ 
vernando a demandar os Acores, quasi mortos de fo« 
me , de sede, e de trabalho , havendo fallecido por 
estas differentes causas oitenta e seis pessoas, em que 
entrarao D. Antonio de Castello Branco , Senhor de 
Pombeiro , o Sargento Mor Jorge Mexia Fouto, e o 
Padre Antonio de Sousa, Jesuita. Finalmente avistdrao 
a Iiha de S. Jorge, e apenas tiverao tempo de saltar 
em terra, foi-se o Galedo a pique. Dalli regressdrao de- 
pois todos a Portugal. 

D. Manoel de Menezes, nio podendo tomar Pers 
nambuco, seguio a sua derrota, e a 24 de Setembro, 
na altura da Ilha de S. Miguel, trazendo em sua con- 
serva o GaleZo Hespanhol Santa Anna, em que vinha 
0 Mestre de Campo D. Joao de Orellana , descobrio 
tres navios Hollandezes, que Ihe parecérao de guerra , 
porque hum largou bandeira no tope grande, como Cae 
pitanea, e o outro no tope de proa, figurando de Al- 
mirante. Anoitecendo logo, D. Manoel os foi seguin- 
do; e ao amanhecer, estando mui proximos, arribou 
para elles, que o esperavao com os papafigos estingas 
ios. Travado o combate, o navio Capitanea comegou- 
é¢ a afastar do fogo; ¢ o.seu Almirante ficou tao mal- 

| : 31 





247 


tratou logo de reparar. E neste anno mandou EIRei:as- 
sistir em Lisboa o General Thomaz de Raspur, Biscai- 
nho, para defender as Costas de Portugal, a cujo fim 
reunio alguns navios Hespanhoes, e os Gale3es Portu- 
suezes S. Filippe, e S. Tiago, que se acabavao de con- 
struir. Veio tambem o Marquez de Inojosa nomeado 
Capitio General dos Presidios Hespanhoes, com ordem 
de auxiliar o General Raspur na defensa das Costas do 
Reino. : | 
Aproximava-se o tempo de sahir huma Esquadra a 
esperar as Naos da carreira da India, e a Frota do Bras 
sil , que ordinariamente chegavao 4 altura de Lisboa 
nos fins de Setembro, o que era difficultosa empreza, 
porque os navios de guerra Portuguezes erdo poucos, e 
arruinados , 4 excepcao dos dois Galedes novos, e fal- 
tava tropa experimentada no mar,.por se acharem re« 
duzidos a algumas Companhias desorganizadas os dois 
Tercos da Marinha , que servirao na Expedicao da 
Bahia. } 
- Por ordem da Corte de Madrid entrou D. Manoet 
de Menezes a servir o seu Posto de General da Mari- 
nha Portugueza, que se !he deo agora de propriedade, 
assim como a Antonio Moniz Barreto o Posto de Al- 
mirante, e Mestre de Campo de Infanteria, como féra 
D. Francisco de Almeida. Embarcou D. Manoel nd 
mesmo GaleZo Santo Antonio, em que viera; e o Almi- 
rante Antonio Moniz Barreto no Gatedo S, Joao, de milk 
toneladas, e quarenta pegas; os outros Commandantes 
erdo [). Antonio de Menezes , do Galedo S. José, de 30 
ecas; Gongalo de Sousa, do Gale#o S. Tiago; Manoel 
Biss de Andrade, do Galedo S. Filippe, de 28 pecas; 
e Christovao Cabral , da Urca Santa Isabel, de vinte e 


de.la Perdida de la Armada de Portugal del afio de 1627, escrita pela 
progtio D, Manoel , ¢ impressa em Lisboa no mesmo anno de 1627. 










7 





b ilaw etl oshebiverde odie 


| SEEN? GIES 5 


& sh ma 
¢ 





32 ou 





























284 


Oito légoas ao mar da Bahia virao-se dois navios 
Hollandezes, a que de balde se deo cassa. Como os ver- 
tos erao contrarios,.e a8 aguas corriZo0 ao Sul, no dia 
11 achava-se a Esquadra em 17° de-Latitude, e ao pie 
do Sol foi vista da Esquadra Hollandeza , serfi que esta 
fosse percebida dos Hespanhoes; o que muitas vezes suc- 
cede no mar. No dia seguinte ao amanhecer apparect: 
rao os Hollandezes duas leguas a barlavento. O Conde 
de Banholo passou 4 falla da Capitanea, e disse ao Ge- 
neral, que lhe parecia conveniente tirar a Infanteria das 
Caravelas, para reforgar as guarnicées dos ‘navios; a que 
elle respondeo: Owe os dezeseis mavios inimigos crie 
pouca roupa. ‘Talvez receava elle, que recolhendo a tro- 
pa das Caravelas, poderido depois occorrer circunstat 
cias, que nado lhe permittissem resticuilla, e ficaria in 
utilizado @ soccorro de Pernambuée. Em fim, mando 
as Caravelas, e navios mercantes para gotavento da Es 
quadra; e formando a sua linha de batalha, seguio o 
mesmo bordo. 

-O Almirante Patry fez signal de chamar 4 ordem, 
estando atravessado; e vindo a bordo os escaleres dos 
navios, enviou ordem aos Commandantes de abordarem 
os Hespanhoes, para cujo fim vinhto todos promptos,¢ 
com.as gavias entrincheiradas, guarnecidas de soldados, 
e munidas de artificios de fogo. Expedidas estas ultimas 
instrucg6es , arribou em pdpa sobre os Hespanhoes, diti-. 
gindo © seu proprio navio contra a Capitanea de Oquer 
do; e o seu Vice-Almirante contra a de Valecilla. 

A’s nove horas da manha estava o navio de Paty 
a menos de tiro de mosquete nas aguas da Capitanea, 
quando D. Antonio, que estava ao pe do leme, mettco 
subitamente de 6 , e obedecendo logo a Nao, como Pas 
try nio fez a mesma manobra, antes seguio avante, D. 
Antonio, dando huma arnbada, abordou por barlavenr 
to. Travou-se huma accao matadora, em que de parte 





362 


one nas tinha a sua’ frente. puma peca de campanhz, 
& Esquace Hellandeza- yeio surgir defronte da Ensea- 


‘Antonio de. ‘Albuquesque, que apenas trezia quinhes- 
tos homens, em vez de reticat-s¢ promptamerre , fez al- 
to, € esperou 2. determinagia dos Hollandeges, - Eatéo 
Schoppe o atacou pela frente, e flanco esquerde; e ain- 
da que os Portuguezes.. resistisdo algum. tentpo', fordo ro- 
tos, ¢. forgadps a retirar-se cont perda. de dezoito tice. 
tos, muites feridos, e dez prisioneiros. - 

_ + Antevendo.o- Albuquerque que o$ Hollgnderes is 
Vestiride primeiro 9 Forte do, CabedgHo., que commse- 
dava Jago dg Matos Cardoso, lhe-augmentou a gum 
go até wezeatos homens, ¢.se recolhee. ao Forte de 

anto Antonio, situado da banda do Norte da. berra, pe 
Fa, enviar. dal}: ‘saforges ende. fassem recessaclos, — 
donse ja' comm: aruuita. falta de gente, tanto- pela 
dea-na ultima aggac, camo. por se. haverem returade t a 
guas casas. alguns dos moradores,. que o agempanhavio. 
E avigou de. tudo a Mathias de ‘Albuquerque , que lhe 
enviou. trezentos homens commandados. pelo Conde de 
Banholo. ' 

No outro dia § tomérdo os Hollandezes posicio a 
tira: de- pega do Cabedello, e se fortificdrao, havendo 
recebida algum damno. 

Dentro do Rio da Parahiba, a tiro. de canhio do 
Cabedello, ha huma pequena Ilha chamada dos Padres 
Benras, e sobre huma restinga desta havia huma bateria 
aberta, com quarenta homens, ¢ sete pecas,. cujos tires 
iacommodavio os trabalhos dos Hollandezes, e seria de 
grande vantagem para elles estabelecerem-se naquelle 

to, n30.s6 por esse matiyo, mas porque dalli podito 
Prater o Forte, ¢ evitar os soccorros que descizo: da.Ci- 
dade da Parahiba pelo Rio abaixo. Em consequencia 
‘destas consideragSes no dia 9 de madrugada , tendo bom 








308 


do o traquete, sendo o vento Lewante , fordo encalhor 
em huma praia proxima de hum Rio, que sabia ao mir, 
e pelo qual entrava a maré; porém nZ0 0 enxergario scs- 
$a occasiZo , por ser baixamar, e rebentar muito o a 
nas aréas, que cercdo a sua foz. Abonangon depois o 
tempo, ¢ passardo a noite a bordo. Os Cafres tinbio 
descido 4 praia em numero.de mais de oitocentos; ma 
as asmas de fogo, que o Commandante teve o bom acar- 
do de levar, os contiverao. Desembarcada a salvo toda 
a gente, se alojisdo todos os Portuguezes em terra com 

ordem, e grandes cautelas, por serem os Cafes mui 
ladrdes , que sd os continha © receio das armas, como 
succedeo em hum assalto que na primeira noite derio 
ao campo, no qual forao rechagados com perda s2:,¢ 
ficardo espantados do effeito das balas de mosquete. 

Esta terra era de tao bons ares, que redos os doet- 
tes convalecera4o em breve, 4 excepgao de quatro, oa cin- 
co, e nunca adoeceo pesspa alguma. Os Caftes erio 
grandes, robustos, e de bom aspcecro, e r4o ligeircs, 
que corriZo por cima das serras mais fragosas, como g> 
mos: cobrido-se com capas curtas de couro de boi, cur- 
tidas por tal modo, que ficavao macias como panro: 
as suas armas er4o 2agaias com seus ferros bem feitos; 
e rodelas de couro de elefante; acompanhavio-x de 
muitos cies, que lhes serviao para a caca dos animes 
silvestres; porque havido no Paiz elefantes, bufalos, ti- 
gres, ledes, e porcos montezes; assim como caga vol- 
til, e do matto de toda a especie. Criavao estes Calres 
mui formoso gado vaccum, ¢ laveavao grandes semen- 
teiras de milio. 

Achou José Cabreira acertado mudar o sew campo 
4 outra margem do Rio, e alli formou huma povoagao 
de cabanas com boa policia, e estabeleceo commercio 
com os Cafres , que lhe vendido mantimenro a troco de 
pedacos de cobre, mercadoria a mais estimada daqel 











selhor, “Que ser ae 
2 se eid rio 
—_ ws 











B18 


-: ¥6q6 = Saktrfo de Lisboa eere anne para a Indi 
(1) duae Néos, a pritaeira comnmfrmadude Gorsalo 
de Barros , Chefe da expediclo; € » sepunda pot Amo: 
sio de Ataujo, ‘que atribom O Chefe entrow em Gos 
salvatnento. 
. 1636 — DBD. Laiz de Roxas (2) , querendo entrar ex 
cathpanha , remettto para a Alegoa do norte a srtilie- 
ria, munigdes, e doentes (que io edo pouces), ¢ dei 
xando afli de puarmicse. ao Conde de Banholo com e- 
ts ccntos lovnens, s€ poz em marcha a6 de Jandie 
eom mil, & quatre centus Portupguezes , além des Indios 
de D. Amanio Filippe Camario, sepuitndo hum rer 
da gee mamil4ra abrir pelo meio dos bosques, 1 quit 
se uchou petsima. Tendo aqui noticia, que o General 
Schoppe cetava descuidado ah Porto Calvo com sis 
centos soldados , destacou o Capitao Francisco Revel 
hs com tres Companhias para o entreter “até :4- sua che- 
yada, devendo antes marchar tapidemenre a surprehet- 
lo. Chegado 2 cinco leguas de Porro Calvo, recebeo 
aviso do Capitio Rebello, de que jd se tinhia apodere 
do dos ptincipaes caminhos, e aprissonando o Secte 
tario de Schoppe,; ¢ se levasse maior forca, accontece- 
ria O mesmo a este, que na noite de 14 escapou, sem 
ser:serkido , com toda a sua columna, guiado por hum 
mogo natural de Paiz, que o condwzio por atalhos des- 
mados, ¢€ O poz a salvo na Barra Grande sem outa 
perda, que a de vinte e oito homens mais atrazados, 
gue os Portuguezes matdraio no alcance, 
- >Batrou.D. Luiz de Roxas-em Poftto. Caleo, onde 
athou viveres , ¢ municdes , e scbre ham aviso falso de 


- €1) Faria e Sousa, Asia Portugueza. ; 

(2) Memorias de Duarte de Albuquerque, pag. 218, até peg. 
436 — Brito Freire, Livros 8.°, € 9.°— Southey, tomo 1.°, Gap’ 
16°-— Ft. Jo#o ‘José de Santa Thereza, Part. a. Liv. 6. — Cestsito 
Lusitano, Parte 1. 3 Liv. g.°. Sot ees . ‘: ° ; 


$20 
perdeo hum momento em retirar:se 4 Peripueira, le. 
vando prisioneiro o Sargento Mor Heitor de la Cal- 
cha, e-deixando duzentos mortos no campo. A perda 
‘dos Portuguezes nao excedco a noventa homens este 
elles alguns Officiaes de merecimento. 

Succedeo no Commando a D. Luiz de Roxas, 0 
Conde. de Banholo em consequencia de huma /’1e de 
Wuccessdo , que o primeito levéra de Hespanha. Cont- 
nuou o Conde pelo resto do anno na mesma guerra de 
postos, ¢ assaltos que antoriormenté se fazia com grave 
damno dos Hollandezes, que nfo podido por essa cav- 
sa tirar fructo algum da Campanha ,.por onde de con- 
tinuo andavdo partidas soltas , que incendiavdo os cana- 
veaes, e destruitao as planta¢ées de tabaco, e mandio- 
ca; © que incommodou de tal sorte os Hollandezes, 
qjue largérao a final os Fortes da Peripueira, e Barra 
Grande. pe 
'  Chegardo 4 Bahia Cartas do Conde de Banbolo 
dirigidas ao Capitéo General Pedro da Silva, ¢ a0s 
‘Generaes das duas Esquadras, que ainda alli. se conser 
vavdo, em que lhes partecipava a morte de D. Luiz 
de Roxas, e ped’a que na sua volta avistassem a Costa 
de Pernambuco; porque segundo as poucas tropas, ¢ 
navios com que os Hollandezes se achavdo, quica ha- 
veria occasiao opportuna de tentar alguma faccdo util. 
Chamou Pedro da Silva a Conselho, a que tambem as- 
sistio Mathias de Albuquerque, o qual era da opinido 
do Conde de Banholo, ese offereceo a servir de Vo- 
‘luntario; mas tudo foi inutil, porque D. Lopo se escv- 
sou com as ordens positivas, que tinha para hir a e- 
pedicdo de Curacau com Diogo Luiz de Oliveira, 0 
que nio teve effeito, pois que sahio depois sem elle, 
Jevando sdmente a sua Ndo Capitanea , a Almirante, 
e hum Patacho, e quatorze lcguas ao mar da Bahia en- 
controu huma Esquadra Hollandeza de oito navios, 


S24 


sobre’ o Rio do mesmo nomie, que desagua no mr v- 


to leguas mais abaixo , na qual enrrou no dia 17. Este 
Rio.tem hum quarto de legua de largura, e em partes 
menos, com huma barra capaz de embarcacoes de du- 
zentas toneladas: a sua corrente he grande, e as cheizs 
$40 na estagao do Ver4o. As margens sao abundanusi- 
™as de pastos, em que vaguéa immenso gado vaccum. 


~ Nelle acaba a Provincia de Pernambuco pela band: do 


Sul, ¢ comega o districto de Sergipe d’EIRei, que f 
parte da Provincia da Bahia. 

Nao se dilatou muitas horas o Conde de Banholo, 
eno dia seguinte comecou a passar o Rio, cuja oper 

Zo concluio a 26 com precipitagao , e alguma peria, 
ja quasi com os Hollandeaes 4 vista, os quaes entrisio 
ao Outro dia na Villa; e o Conde de Nassaw, deixando 
nella ao General Schoppe com mil e seiscentos dos me 
thores Soldados, voltou com o resto das tropas para 0 
Recife. 

A 31 de Margo chegou Banhofo 4. Cidade de Ser- 
gipe, vinte e cinco leguas distante da Villa de S. Fran- 
cisco, e mais de sessenta da Bahia, d’onde escreveo 10 
Capitao General Pedro da Silva, offerecendo-se a hit 
soccorrelo., por jugar que Nassau, em. concluindo as 
fortificagdes do Rio de S. Francisco, passaria a atzcat 
aquella Capital. Ndo acceitou Pedro da Silva a cfferta, 
duvidando que o General Hollandez tivesse similhsnte 
proyecto. Em consequencia cesta negativa, ficou o Cot 
de de Banholo em Sergipe, mandando dalli- partidas 
além do Rio.de S. Francisco para devastarem a campr 
nha, na qual causirao grandissimes damnos ; e avisot 
a ElRei-pelo Tenente General Andrade de tudo. quac- 
to havia occorrido. 

A 27 de Junho chegou o- Almicante Lichthart com: 
dezoito navios 4 Villa dos Ilheos, trinta leguas ao Sul 
da Bahia,,e queimando huma embarcagZo mercante, 


$26 


gv munida. de boa artilhera , muitas- munigdes de gnep 
ra. As condig6es fério, que a guarnigao seria transpore 
tada. d Ilha de S. Thomé,y levando . cada individuo s- 
mente 0 que tivesse vestido. Koin , deixando boa gur- 
nigdo no Castello , voltou para o Recife. | 
' A 16 de' Agosto chegou de Lisboa 4 Bahia Lus 
Barbalho'com quatro Caravelas, e¢ duzentos e cincoer- 
ta Soldadds, fazendo parte de hum Terco de oitocer 
tos homens, que se organizava em Portugal, de qe 
elle vinha por Mestre ‘de ‘Campo. | 

Avisado .o Conde de‘Banholo de que Schoppe hz- 
via ‘passado o Rio de §. Francisco com tres mil, e 
quinhentos homens ,. se pdz em retirada para a Bahia, 
sahindo de:Sergipe a 14 de Novembro, e a 29 ¢ 
4 Torre. de Garcia de Avila, quatorze leguas ao Nor 
te da Bahia, onde se alojou. O General Schoppe «- 
trou em Sergipe’ tres dias depois da sua partida, ¢ 
queimando a Cidade (menos as Iprejas) , ¢ oito Enge 
nhos , volrou nos fins de Dezembro para o Rio de 5S. 
Francisco. — 

Outra conquista fizer$o..0s Hollandezes a 20 deste 
mez de Dezembro, porque mandando-se offerecer os 
Indios do Sear4 ao Conde de Nassau para o ajudarem 
a tomar hum Reducto, que os Portuguezes alli cinhio 
guarnecido com vinte homens, e duas pegas de artilhe- 
ria, destacou quatro navios , e duzentos Soldados, que 
unidos aos Indios, facilmente o ganhardo. 

1638 — A Esquadra da India (1) foi este anno de 
duas Ndos; era seu Chefe Joao Soares Vivas, e Com 
mandante da outra Joao Cardoso de Almeida. 


(1) Manoel de Faria e Sousa, na lista das Armadas que poz no 
fim do tomo 3. da Sua Asia Portugueza, nio concorda com o ge 
diz no corpo da sua Historia, relativamente a este anno, e 20 & 


3640. 


S28. 

S. Braz, e alli passdrdo:a hoite. Na madrogada seguin- 
te marclirdrao a octupar him’ monre superior ao Enge 
nho de. Diogo Moniz Telles, no qual hzerao alto; po 
rém o Engenho foi logo guarnecido por algumas tn- 
pas Portupuezas, que segufdo por terra o movimento 
dos navios; e apds estas tropas chegou o Caritio Ge 
fityal Pedro da’ Silva, o Conde de Banholo, e Deare 
de Albuquerque com todas as forgas disponiveis ; ¢ to- 
mdrdo posicio em outro monte a tiro de canhio do itt 
migo. Por espago de “duas horas se observarSo huas 
aos outros, e por conselho de Banholo se recolhéio 
os Portuguezés, parecendo ao Conde imprudencia srris- 
car huma accdo , de cujo mdo successo seria a perda da 
Cidade a necessaria consequencia. Mas os da Camara, 
convocando o Povo a toque de sino , o amotindrio con 
tra: os Generaes querendo por forga que se désse bate 
tha aos Hollarndezes. Tanto receayS0 os trabalhos do 
cerco! Custou muito a6 Bispo, e a Duarte de Albu 
querque socegar 6s animos da multidgo com a promee 
$a, de que se atacariao os Hollandezes. 
Sahio com effeito no dia 20 o Conde de Banholo 

com as tropas de Pernambuco , e os.dcois tergos da f:- 
hia a buscar os Hollandeézes, que jd nfo encontrov, por 
haverem mudado de posicg#o; e retirando-se para a C- 
dade, njo 0 quiz fazcr o Mestre de Campo D. Fer- 
nando de Lodonha, Commandante de hum d’aatelles 
pore Tercos; ainda que pouco depois o obrigario of 
ollandezes a obedecer, expulsando-o d’aquelle posto. 
‘Como as tropas da guarhiggo da Cidade recu-avio 
obedecer ao Conde de Banholo, e as de Pernambuco 
ao Capitio Gencral , 0 que éembaragava a boa ordem do 
servico, tinha este transferido ao Conde toda a sua aus 
thoridade milirar; e desse momento em diante desen- 
volyeo a Banholo tanto zelo, actividade, e¢ ralentos, qué 
fez cmmudecer a inveja, ¢ concorrerem todos para a 


332 


rate o,.cerco: dispardrig contra 9° cidade 1446 balas, e 
perdérdo quasi. mil homens mortos , e feridos. 

+ A 28 enteoy-a salvo hum navio Portuguez vindo 
da Cidade,.do Porto, ¢ nessa mesma noite sahirio os 
Hollandeacs para.Pernambuco.. 

. fh 47.48, Novembro entrou na .Bahia huma Esqux 
dra ‘Hollandeza de “dez nayios, e dois Patachos: su- 
gio defrente de Tapagipe e desembarcando alguma 
penis: saqueou hum Engenho, e a _3 de Dezembro sx 


id do Porto, « | 
,, 1638 — Resolveo-se finalmente no Gabinete de Mx 
drid Beer hum grande esforgo para expulsar os Hollas- 
dezes de Pernambuco; ao menos foi este o motivo 
tensivel das duas Esquadras, que se armdrdo em Lis 
hoa, e Cadix (de que néo achei a relagao) (1), som 
mando mais de. gitenta navios. Nomeou ElRei para Ge 
neral em Chefe ,.¢ Governador do Brasil, ao Conde 
a Torre D. Fernando Mascarenhas. Sahio de Lisboa 
nos fins .de Outubro de 1438, ¢€ foi esperar nas Ilhas 
dé Cabo: Verde pela Esquadra de Cadix, demora que 
Ihe-custou ‘mais de mil homens fallecidos de doencas, 
em que entrou o seu Alnurante Francisco de Mello ¢ 
Cation 1 nn 

Reunidas as Esquadras, seguiraS a sua derrota, ¢ 
a 10 de Janciro do anno seguinte virdo o Recife. O 
Conde da Torre, ou porque levasse para isso ordens 
particulares, ou pela muluiddo de doentes de que hiio 
empachados os seus navios, nao se deteve diante d’a- 
quella Praga, e proscguio.a-sua navegacao para o Sul. 
Enviou o Conde de Nassau duas embarcagées ligeirss 
em seu seguimento, para observarem o Porto que to- 
mava, crendo que surgiria em algum d’aquella Costa, 


(1) Portugal Restaurado , tomo 1., Liv. 2.——Southey, tomo 
?., Cap. 17 —Castrioto Lusitano, Parte i, Lie. 3. — Fr. Joao Jot 


334 
la para huma acgZo geral, avistdrdo os Hollandezes; 
qué conservavao 6 barlavento. Torriou a crescer o tem- 
po furioto , e as Esquadras forgo arrastadas para 0 
orte. No dia seguinte, athando-se entre Goiana ¢ 
Cabo Branco, tivério outro combate parcial. A 14 2 
tacdrao-se de novo defronte da Parahiba; ea 17, nz 
altura do Rio Grande, trav46 a ultima accZ0, em que 
os Hollandezes se retirdrao de todo; e as correntes le 
vaviio cada vez mais para o Norte os Hespanhoes. Nes- 
tes quatro combates nfo foi ‘grande a perda das dus 
Nacdes; e€ posto que a victoria ficasse ao Conde da 
‘Torre , com tudo as consequencies fér&o favoraveis 20s 
Hollandezes, por se mallograr 0 cerco do Recife, que 
nfo podia resistir naquella conjunctura. O Conde de 
Nassau ficou tio escandalizado da conducta de muitos 
Commandantes dos seus navios, que alguns férdo p- 
nidos com pena de morte. | 
Perdidas finalmente as esperancas do desembarque’ 
na Costa de Pernambuco , rogarao os Chefes das tro- 
pas da Bahia ao Conde da Torre, que os desembar- 
casse em qualquer parte, porque se atrevido a hir d’al- 
Ji 4 Bahia, atravessando o serfio , © que elle fez no 
Porto do Touro, quatorze leguas ao Norte do Rio 
Grande, pondo em terra ao Mestre de Campo Luiz 
Barbalho com mil, e trezentos homens, e os Tercos 
de Indios, e Negros de Camarao, e Dias Luiz Bar- 
balho fez huma marcha de trezentas leguas das mais 
trabalhosas , e difficeis; reunio-se no caminho com os 
Officiaes destacados antes da Bahia: entrdrdo0 todos nes 
ta Cidade com pouca perda, deixando arruinadas as 
possess6es dos Hollandezes, e destruidos muitos dos 
sous destacamentos, 
O Conde da Torre seguio viagem para as Indias 
Occidentaes, onde tinha ordens d’EIRei_ para hir de 
pois de concluido o negocio de Pernambuco, a fim de. 


336 


, eiico ,, commandadcs pelos Mestres de Campo D. Je 
ronymo de Aragio, D. Martim Affonso de Sarria, D, 
Antonio de Ulhda (composto de Napolitanos bisonhos) 
e D. Gaspar de Carvalhal, Consclheiro de Guerra, ¢.o 
Sargento Mor D. Francisco Palominas. 

Para conseguir a gente de que necessitava, tratow 
a-Corte de Madrid coin alguns particulares, para apre- 
Sentarem as recrutas em Carthagena, e Corunha, me- 
diante huma gratificag3o de vinte e tres cruzados por 
homem. Seguio-se deste systema, que os Contractado- 
res fazido prender por todas as Cidades de Hespanba 
.os Lavradores, Artistas, e pais de familias sem exce- 
pgao alguma , assim ajuntarao mais de dez mil homens, 
¢scondendo-se entre tanto os que podido servir para a 
guerra ; de maneira, que querendo 9 Duque do Infa- 
tado, e outros Grandes, apromptar certo numero de 
Soldados a que erao obrigados, e¢ promettendo dezescis 
reales (440 reis) de soldo diario, ninguem concoreo 
a assentar praga. | 

Como a Franga tinha preparado hum grande ar- 
Mamento maritimo em auxilio dos Eseados Geraes, 
commandado por Henrique de Escorbeau Sordis, Ar- 
cebispo de Bordeaux (1), € se reagava viesse atacar al 
guma das Pragas de Galliza, recebeo ordem o Marquez 
de Val-Paraiso, Governador d’aquelle Reino, para se 
premunir contra qualquer invasao. Em consequencia cha- 
mou 4 Corunha todas as tropas, ¢€ ajuntou dezoito mil 
homens, quasi todos bisonhos , porém faltavdo yiveres, 
e até munigdes para tanta gente amontoada em huma 
‘pequena Cidade, e¢ comegarao logo a grassar as doencas. 
Para obstar a que os Francezes penetrassem no Porto, 


C1) Este Prelado guerseiro tinha commandado outra Esquadra Frate 
ceza no anno antecedente, e sobre a Costa de Biscaia ataccu oito nz 
vios de guerra Hespanhoes, cos quacs fomeou,-ou cucimiou sete, es 
pando lium sd. 


. 840 
Sposa Napoles; e D. Joio Ascenso no Galcio 

» Joao. « : 

“"  Distribuido-se cada dia a.bordo desta Armada vin- 
té e-cinco mil ragdes, e levava abundancia de muni- 
goes de toda a especie, e dinheiro para pagar os sol- 

OS, y 

Antes de sahir a Armada da Corunha , susciton- 
se.a duvida se a devia commandar D. Antonio de 0- 
ve gue tinha o Titulo de Almirante Real do 

r Oceano, ou D. Lopo de Hoses, que governava 
muito maior numero de navios; principalmente porque 

as-Instrucg6cs de Oquendo erio em termos geraes, e 
nio comprehendido o caso presente. Para decidir este 
qusstdo chamou o Marquez de Val-Paraiso a conse. 

os Officiaes Generaes , € o Duque de Villa Formo- 
$2, € seu irm4o0, que tinh%o vindo em soccorro da Co 
tunha. A proposta do Marquez continha dois artigos: 
1.° Que forma se daria dquella Armada, para que ti- 
vesse hum Chefe unica? 2.° Como se preencheriio me- 
lhor os dois fins para que ElRei a destinava ? Cumpre 
adgbrtir , que as Ordens Regias determinavZo, que @ 

Armada Hespanhola buscasse a Franceza, e a destruis 
Se; e que tendo-se esta ja retirado das Costas de Hes-. 
panha, para se hir ajuntar com a de Hollanda (como 
se receava), a perseguisse, e procurasse destruir mesmo 
dentro dos Portos de Inglaterra, sem embargo de ser 
huma Nac#o amiga, e de se quebrantar 2 neutralida- 
dé; porque a razae d’Estado assim o pedia, por ser 
mais facil satisfazer depois as queixas d’aquekle Monar-. 
eha, do que organizar outra forga tal, que podesse ar 
Fostar as forcas das duas Nagoes. | 

Sobre o primeiro artigo, todo o Conselho pro 

ndia para dar o commando a D. Lopo, gue tinha ab 

j muitos amigos, pelos saber grangear com prudencia, 
¢cultivar com beneficios ; ao contrario de Oquendo, bo- 


342 


da’: D. Antdnio de’ Oquendo chamou para Coinman- 
dante do ‘seu Galedo a0 General Miguel de Orna, e ceo 
a.commando do nayio deste a D. Jeronymo de Aragio. 
Doze navios Inglezes afretados accompanhavio esta ex- 
pedicao, carregados de tropas para Flandres. Navegou 
a: Armada cam bom vento até ao.dia 11 de Serembro, 
que achando-se por 48° 40' de Latitude, conhecco pe- 
las sondas estar na bocca do Canal de Inglaterra:, peio 
qual entrou com vento largo, e.4 vista de Cabo Lizart 
se athou toda: reunida ,-:excépto,.os doze navios Ingie- 
zes, que na noite: da sahida se amar4r30 tanto, que 
nurca mais apparecérZ0, e.f6r30 cahir nas mZos dos 
Hollandezes ; © gue: muitas ‘pessoas j4 de antemio sus- 
peitavao. re 
.  Lodos os navios de guerra,.que paquelles tempos 
navegavio no Canal, er#0 obrigados a abarer a bax 
deira 4 Capitanea Real de Inglaterra. - Encontrou-se .2- 
qui huma_ pequena Fragata, a qual ‘vindo 4a -falla de 
Oquendo, pedio a devide acatamento d Coroa de In- 
laterra, na falta da sua Capitanea. O General 
espanhol respondeo: Oue quando se emcontrasse com 
a Capitanea Real da Grado Bretanha., ssaria com 
ella das cortezias que ElRei seu Senbor lhe mands- 
va, € assim o podta certificar ao General Inglez lw 
£9 queo visse. 

Fallou-se no dia 15 a hum mercante Inglez, que 
disse haver encontrado no dia antecedente a Esquadra 
Hollandeza no estreito de Calé. Com effeito, os Esta- 
dos Geracs, sabendo da expedigao preparada na Cor- 
nha, tinh’o armado quarenta’e quatro navios para a 
combater , dos quaes déra4o o commando ao famo- 
so. Almirante Tromp, sendo seu Vice-Almirante D. 
Witt , e Contra-Almirante Van Kart. Espalhada a- 
quella noticia, forao a bordo de D. Antonio de O- 
guendo os principaes Officiaes Generaes, para. recebe- 


844 


‘© Almirante Tromp, talvez por ignorar a verds- 
deira forza, e navegac’o dos Hespanhocs, havia diri- 
dido a sua: Armada em: tres: Esquadras: com a ‘primei- 
ra, composta dos onze navios melhores , que tomon pa- 
-Ta si, ficou cruzando.sobre as.Costas da Flandes; man- 
dou a segunda, commandada por Van Kart para o 
Norte, a fim de interceptar os Hespanhoes se quizessem 
rodear por aquelles mares, como. na realidade projecz- 
vJ0 primeiro; e. enviou a terceira, as ordens de De 
Witt, a correr os Porros de Inglaterra , e estes erio os 
\meis Navies que se avistés3o em outro bordo. Achando- 
se agora diante de hum inimigo tres vezes mais forte 
-do que elle ,.nao recusou a batalha, e formou mbil- 
mente a sua Esquadra em huma linha tao cerrada, que 
© gorupcs de cada navio tocava quasi na grinalda co 
que o precedia. -. a , 

. Como o projecto de Oquendo era abordar o Almi- 
ante Hollandez, sem disparar hum tiro, foi-se prolon- 
gando com elle por barlavento, mas quando arribou, 

i fora de tempo, e ficou a ré delle: tornou entioa 

-hir de 16, seguindo entre tanto os Hollandezes a bordo; 
e querendo elle abordar outro navio, este igualmente o 
-evitou. A Esquadra Holandeza, que tinha agora des- 
passado a linha dos Hespanhoes , virou par davante a0 
mesmo tempo, e a Capitanea Hespanhola recebeo m 
passagem o fogo de toda ella, de que teve grandes 2- 
varias, e mais de cento e cincoenta mortos, e feridos. 
Desenganado Oquendo de que Ibe convinha servir-se da 
sua artilheria, respondeo ao fogo, causando muito da- 
mno aos Hollandezes, portomarem parte na acco osau- 
tros navios Hespanhoes, que ficavao na pdépa do Gene 
ral, e a distancia em que se achav4o ser tao pouca, que 
a mosguctaria laborava de huma, e outra parte, em 
que os Hespanhoes tinh3o grande vantagem , pelas mui- 
tas tropas, que trazido. No meio desta baralha se rer 


$46 


fundedrao. mais avante. Seri§o. onze horas (da - noite 
quando Tromp se fez 4 vela, e veio acccmetter os 
Hespanhoes, havendo ordenado aes seus Commandar- 
tes, que sc.conservassem féra de tiro de mosquete, 
confiado na sua artilheria, que era melhor servida. 0 
combate foi horroroso, por sera noite, ainda que be 
nangosa , muito escura; mas a perda n4o correspondeo 
de parte a parte ao dispendio das munigédes. 

~ Com a luz da manhd se continuou a pelejar sobre 
vela, ecom mais. furia, porém naa com mais unio 
dos Hespanhoes , porque Oquendo nenhumas ordens 
deo: huma parte da sua Armada achava-se em forms 
tura combatendo com o inimigo, mas o resto espalhado 
em filas de quatro, e cinco navios a traz da |inba 
Tromp, organizando a sua Esquadra em duas colur 
pas , penetrou 4 testa de huma por entre a linha de be 
talha dos Hespanhoes, e os navios desordenados, qe 
estavao amparados com ella; em quanto De Witt cm 
a outra columina se batia contra a linha Hespanhola, 
que se achou assim atacada de fronte e-de revez. 0 
ogo da columna de Tromp, era tcrrivel por ambos 0s 
bordos, e os Hespanhoes nado podizo responder-lhe com 
outro igual na sua posig4o, porque se offendiao huns 
aos outros. O Galeao Santa Thereza foi o que mais 
illustrou nesta accdo, rechagando todos os navios Hol- 
landezes que ousavao aproximar-se d’elle; e era tio ra- 
pido o seu fogo, que da banda de estebordo disparon 
1520 tiros de canhdo. Oquendo igualmenre se distix 
guio mais como Commandante particular, que como Ge- 
neral , porque nenhum signal fez, nem menos o Almi- 
rante General D. André de Castro. Muitos Comma 
dantes de navios, e alguns Officiaes Generaes se com 
portdardo mal; e mesmo hum delles tentou por duas ve 
ges fugir. O Almirante Francisco Sanches Guadalupe 
foi partido cm duas metades por huima bala de artilhe 





350 


repartindo pelos que ficdrio a gente, e municdes one 
tirou d’clles; e como necessitava muito de antennas pu 
ra vergas, € mastareos, comprou em Dower com gran 
de segredo algumas arvores grossas, e enviou escaleres 
para as trazerem de noite a reboque, sendo a distas- 
cia tres leguas, Sabendo disto o Almirante Tromp, 
destacou huma Fragata a comboiar os escaleres Hespa- 
nhoes, o Commandante da quil, depois de os accom 
panhar até ds Dunas, foi a bordo de Oquendo, e \he 
disse : Owe era tanto o desejo que tinbha o seu Alm- 
vrante de se ver em batalba com tao grande Gensral, 
gue ordenava d sua Esquadra ajudasse em tudou 
apresto da Hespanbola, e que como bom amigo se je 
dia servir delle, em quanto concorresse para o effti- 
to, gue ambos pertcndido.. Respondeo Qquendo a este 
recado com igual civilidade, enviando hum presente de 
excellentes vinhos para a guarnicio da Fragata Holla 
deza, em lugar do dinheiro que primeiro The manda 
dar, e o seu Commandante nao acceitara. 

_ Parece, que nesta occasizo sovberao os Hollande- 
zes, que o Governo Inglez determinava nao dar protee 
¢io alguma aos Hespanhoes; porque comecdrio a fazer 
todos os dias tres, ¢ quatro Conselhos a bordo da sua 
Capitanea ; e de noite passdvao em armas, dando tiros 
de artilheria, e descargas de mosquetaria. OQ Almirante 
Penington escreveo a Oquendo, dizendo; Owe o ses 
inimigo crescia fa tanto em poder , camoem soberba; 
e de tal modo, que elle receava, que no mesmo Ports 
mao estivesse segura a Esquadra Hespanbola; pr 
quanto, ainda que a Ingleza faria quanto lhe com 
pria pela observancia da neutralidade, com tudo sev 
do ella tao inferior em forcas aos Hollandezes, ew 
trava em duvida se estes lhe guardariao o respeite 
devido;, o que elle tanto mais temia, quanto estavs 
certoem que E/Rep Carlos lhe néo ordenava, que or 


363 


fex 4 vela apts.a Capitanea, e logo na sia popa foi 
sahindo D. Jodo Ascenso,.o Almirante Feijé , .c outros 
mavios mais bem. commandados. Os Hollandezes envyia- 
rio. tres Brulotes’ incendiados contra a Capitanea, de 
ue se livrou por meio de escaleres armados , que O$ 
desviirdo , estand ja quasi atracades com ella.’ Qytros. 
dois Brulotes vierao contra a Santa. Thereza, que 09 
evitou por igual modo, porém como navegava nas a- 
guas da Capitanea, embaracgou-se com os tres Brulo-> 
tes, de que havia escapado. J)... Lopo, a quem duag da- 
Jas de artilheria haviao levado huma perna, e hum bra- 
¢0, deo assim mesmo as‘ordens necessarias para des- 
viar os Brulotes; mas ainda que os seus escaleres con- 
sepuirao com temerario valor arredar dois delles, nao 
podérdo evitar 0 tercciro, que cahindo na proa do Ga- 
eao, em hum instante lhe communicou o fogo em que 
vinha ardendo em altas labaredas. Desta maneira foi 
queimado o Galedo Santa Thereza, sendo ja morto D. 
Lopo, e nelle acabér4o mais de seiscentos Portugue- 
zes, e Hespanhoes. Com a perda deste grande navio, des- 
animérao de todo os Commandantes Hespanhoes, e 
huns trat4tao de render-se, outros de salvar-se como 
odessem, e tainbem alguns de vender caras as vidas, 
p. Antonio conseguio recolher-se a Mardick , com ou- 
tro navio, quepeucos dias depois naufragou, salvan- 
do-se a gente. Tudo quanto fizerao os Inglezes em de- 
fensa da sua neutralidade, se reduzio ‘a alguns tiros inu- 
teis dos Castellos de Dower ,'e das Dunas. 

Perdérao os Hespanhoes nesta batalha seis mil ho- 
miens, € quarenta e tres navios, com sciscentas pecas 
de artilheria de bronze, e grande numero de Officiaes : 
dos Portuguezes morrério novecentos. | 

Quasi metade dos navios naufragdrao pelas Cos- 
tas de Hollanda, Franga, e Inglaterra; e alguns alli 

Lomo. II 45 


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' achdrfo ‘refugio, Os “Hollandezts “perdbito alguns nas 


vios, e mais de mil homens. 

1640 — Partio da India (1) o Vice-Rei JoZo da 
Sitva Telfo cont duas Néos, e dois Patachos, de cuja 
Esquadra foi por Chefe Jofo de Sequeira Varejao, com 

uem hia embarcado o Vice-Rei. Cheparao todos a 

a salvamento. 


(1) Faria, Asia Portugeosa 


FIM DA PRIMRIRA PARTE. 


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